A VERDADE NÃO ESTÁ LÁ FORA

 

                          O mundo foi surpreendido durante a semana com o relato de um astrônomo inglês, mencionando a existência de um corpo celeste de proporções definidas, grande velocidade e em provável rota de colisão com a terra. Seria o prenúncio da destruição? A precisão dos cálculos matemáticos e das conseqüências do bizarro evento, previsto para talvez chocar-se à terra em 2019, retoma a discussão da perplexa possibilidade do fim da civilização. Ao mesmo tempo, fantasmas do armagedom voltam a sondar as mentes de milhões de pessoas. Mas será que a paranóia da destruição já povoa as mentes dos seres humanos?

                         A indagação acima nos faz refletir sobre a condição humana em diversos “matizes” de sua tumultuada e breve existência. A ciência afirma que na escala evolutiva somos seres relativamente recentes, se comparados a outros “produtos da natureza”, os quais aqui se desenvolveram em épocas mais recuadas que a nossa. Mas o que torna os seres humanos diferentes é sem dúvida, sua capacidade de inovar e transformar o meio em que vivem. Aliás, nos últimos duzentos e cinqüenta anos, as mudanças proporcionadas pelos “ranços e avanços”  da raça humana, têm provado o quanto somos efetivamente seres dialéticos.

 

                         Considerações escatológicas à parte, convém lembrar que apesar de tantas diferenças raciais, culturais, econômicas e sociais, estamos todos juntos num único lugar, a mãe-terra, ao menos até que as especulações científicas e a ficção cinematográfica sejam desbancadas por evidências concretas e palpáveis, estamos literalmente sozinhos na imensidão do espaço. Apesar de muitos, tão diversos e aparentemente sozinhos no universo, não parece ser o “novo flagelo dos céus”, a grande ameaça a nossa existência.

 

                         O futuro da existência humana estaria irremediavelmente selado? Tais considerações nos remetem ao passado, quando assim foi narrada uma visão catastrófica da hecatombe final: “(...) o sol se tornou negro como saco de crina, a lua toda como sangue, as estrelas do céu caíram pela terra, como a figueira, como abalada por vento forte, deixa cair os seus figos verdes, e o céu recolheu-se como um pergaminho quando se enrola. Então todos os montes e ilhas foram movidos dos seus lugares” (Ap 6:12-14).

 

                         Qual visão apocalíptica de incontáveis mentes do imaginário humano dos anos da Guerra Fria foi abrandada nos dias atuais e irradia pensamentos míticos, fantasmas, tormentos e angustias da realidade final, os quais não estão lá fora, ao revés, aqui estão, são o fruto das mazelas humanas, do modo de produção capitalista, o qual, cria e recria uma sociedade mórbida, desigual, hedonista, consumista e  ultra egoísta,  sobretudo exploradora de si mesma, a reproduzir diariamente a velha fórmula contida na máxima: “homini lupus homini”.

 

                         Existirá então um amanhã? Acordaremos um dia e contemplaremos “novos céus e nova terra”? Sentiremos o perfume das flores do campo, o sorriso das crianças, a felicidade dos velhos? Será possível um dia sonhar e viver num mundo novo, libertos de doenças, poluição, pobreza, guerras, fome? A paz e a continuidade da vida são meros devaneios, utopias ou quimeras? A resposta a estas e outras questões que perseguem os homens há séculos, não estão lá fora, na escuridão e vazio do espaço infinito. Elas estão aqui bem perto, de mim, de você, de todos nós, no pulsar do coração, na partilha do pão, no aperto de mão; no abraço fraterno ao irmão, na preservação da vida e do planeta.

 

                         A contemplação e adoração em espírito ao que Foi e sempre Será nos remete unilateralmente à prática do bem e ao amor ao próximo. Olvidar tal prescrição milenar importa na condenação e na prática da exclusão ao semelhante, agir assim é desconhecer nossa origem e destino, pois somos um só e complexo organismo.

 

                         A sociedade humana não suporta mais a tensão e o desgaste perpetrado pelo modo de produzir, sustentar e relacionar-se inerente aos nossos dias. Toda forma de indiferença e exclusão ao outro, representa o perigo da continuidade de nossa própria existência e essência. A sociedade do futuro, não será erigida sob os cânones da economia predatória e capitalista atual. Uma sociedade de futuro jamais permitirá a destruição do planeta unicamente pelo desejo ardente do lucro.

 

                         A verdade não está lá fora! As gerações do porvir não merecem viver sob o signo do legado da estupidez, e dos descaminhos passados. Hoje é tempo de reverter as ações inconsequentes de nossos relacionamentos sociais, afinal sobrevivemos do que retiramos da “mãe-terra”, e dela mais que nunca dependeremos.

 

                                

                               Juazeiro do Norte, 28/07/02

 

 

                               George Andrade – Professor Universitário e Advogado