A TITULARIDADE DO PODER FAMILIAR

1 - Introdução

O Poder Familiar é um instituto que existe desde o Direito Romano, porém, que já sofreu diversas modificações até chegar à roupagem que se vê atualmente.

Na Roma Antiga tal instituto era revestido de um ordenamento um tanto estranho e curioso, natural do tempo e costume da época. Denominado de Pátrio Poder, surgiu com a Lei das XII tábuas, especificamente na IV tábua, cuja matéria disciplinava o "De Iure Pátrio".

Este direito concedia poderes extremamente excessivos para o instituto, a exemplo do poder de matar o filho que apresentasse alguma anomalia física. Ademais, diferentemente do que é modernamente, o Pátrio Poder estendia-se ao avô, sogro ou marido, isto é, o poder era exclusivamente do homem.

No Brasil, o Pátrio Poder sofreu diversas modificações com o avanço das épocas e a constante evolução dos costumes introduzidos nas relações sociais familiares, o que criou a necessidade de alterar o instituto e torná-lo mais adequado.

Atualmente, com o advento da Constituição Federal de 1988, do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8069/90) , da Lei n. 4.121/62 (Estatuto da Mulher Casada), bem como do Código Civil de 1916 e posteriormente o novo Código Civil, foram alterados muitos dispositivos, inclusive o próprio nome do instituto, que passou a se chamar Poder Familiar.

Ademais, foram consagrados diversos princípios, cite-se o princípio da igualdade jurídica dos cônjuges, expresso de forma mais específica e taxativa no artigo 226, §5º da C.F./88, o que repercutiu diretamente na titularidade do poder familiar, e que consiste no objeto de discussão deste artigo.

2 ? Titularidade do Poder Familiar

Feita esta breve introdução, é mister discorrermos sobre a importante crítica configurada sobre a titularidade do Poder de Família.

Como exposto no item anterior, os dispositivos atuais deram nova roupagem a este instituto. A partir da C.F/88 se consagraram os mesmos direitos e obrigações entre homens e mulheres face ao casamento, o que fundamentou o princípio da igualdade jurídica dos cônjuges, prevista no artigo 226, §5º.

Atendendo às mudanças introduzidas pela Constituição Federal de 1988, o Código Civil de 2002 modificou a expressão "Pátrio Poder", que foi alterada para "Poder familiar" devido a uma sugestão do jurista Miguel Reale, afirmando que a expressão anterior denotava a prevalência do cônjuge varão sobre a pessoa dos filhos.

Assim, a fim de adequar o instituto ao princípio isonômico expresso constitucionalmente, prevaleceu esta alteração, que substancialmente não adicionou nenhuma novidade ao instituto.

Pelo princípio da igualdade jurídica dos cônjuges, o pólo ativo do poder familiar corresponde aos pais, que, partilhando dos mesmos direitos e obrigações, têm responsabilidades sobre a prole.

Portanto, não há que se falar em competências ou encargos diferenciados apenas por serem de sexos diferentes.

Não obstante, é sabido que na prática tal princípio não tem plena aplicabilidade, pois que, há muitas diferenças e discriminações tanto do lado masculino quanto do feminino.

Analisando terminologicamente a expressão "Poder Familiar", verifica-se a possibilidade de concessão deste direito a outros integrantes da família.

No entanto, esta interpretação não está correta, primeiro pela própria natureza do instituto, que foi estabelecido em razão do vínculo de paternidade e maternidade, depois porque a inclusão de terceiro não possui qualquer respaldo legal.

Ademais, estabelece a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 229, primeira parte, que os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores. In verbis:

Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.

Aliado a este dispositivo, os artigos 1.634, e 1.635, I, do Código Civil prevêem o seguinte:

Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar:
I - pela morte dos pais ou do filho;

Completa o artigo 1.638 caput do Código Civil de 2002:

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:
Desta forma, a titularidade no pólo ativo do poder familiar compete somente aos pais.

Contudo, devido ao previsto no caput do artigo 1.631 do C.C. de 2002: "Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade", formou-se a controvérsia quanto à titularidade no pólo ativo do instituto, em razão de que a partir deste dispositivo surge a seguinte dúvida: O poder familiar somente pode ser exercido por pais casados ou em união estável, ou por qualquer deles, independentemente da situação que estejam?

A resposta para esta controvérsia é óbvia, principalmente pela condição atual da sociedade em que vivemos, onde a separação e o divórcio são admitidos e até tutelados juridicamente.

Ensina Carlos Roberto Gonçalves:

"Embora o Código silencie quanto às demais entidades familiares tuteladas explícita ou implicitamente pela Constituição, a norma deve ser entendida como abrangente de todas elas. Assim, o poder familiar compete também aos que se identificam como pai ou mãe do menor, na família monoparental". (Direito Civil Brasileiro, volume VI, 2ª Edição. Revista e atualizada, Ed. Ssraiva, 2006, pg. 360-361)

"Na realidade, independentemente do vínculo entre os pais, desfeito ou jamais ocorrido, ambos os genitores exercem em conjunto o poder familiar. Bastaria, pois, que o dispositivo em apreço estabelecesse que "o poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe...", visto que o aludido múnus decorre da filiação, não do casamento ou união estável". (Direito Civil Brasileiro, volume VI, 2ª Edição. Revista e atualizada, Ed. Ssraiva, 2006, pg. 360-361)

O questionamento atinente a este dispositivo na realidade não tem razão de existir, pois, a redação dada a esta norma consiste em adaptação crassa e irreverente do artigo 380 do C.C. de 1916, com a mera alteração da expressão "Pátrio Poder" para "Poder Familiar", e a inclusão da união estável. Na verdade se trata de grave erro introduzido pelo legislador.

3-Conclusão

Podemos refletir à luz da nossa Constituição e Código Civil, que concebem outras formas de constituição familiar, diversamente do casamento e a união estável, que não poderia o legislador introduzir um dispositivo legal tão incoerente, quanto mais dentro das disposições gerais do instituto.

Tal regramento afronta diretamente o artigo 227, §6º da C.F., e é objeto de inconstitucionalidade, justamente por fazer discriminação dos filhos havidos da relação de casamento e união estável e os demais filhos.

Sabemos que o Poder Familiar é um instituto exercido pelos pais voltado para o benefício e interesse do filho. Sendo assim, não se deve fazer restrições quanto à modalidade de relação vivida pelos pais, mas, estender o disposto a todo e qualquer filho, sem discriminação e obedecendo a norma constitucional.

Isto não quer dizer que se deva então considerar o artigo 1.630 do C.C. como característica suplementar do artigo 1.631. Sendo que o primeiro aduz que todo filho está sujeito ao poder familiar, e que o segundo abrange o exercício do direito aos pais casados ou em união estável, concluiríamos por aceitar que as hipóteses do poder familiar abrangeriam outras pessoas, que não os pais, pensando-se até mesmo devido à própria expressão Poder Familiar, como já aludido, o que também seria um absurdo.

A sugestão mais acertada para a discussão em análise consiste em adequada alteração da norma do artigo 1.631 do C.C. aos pressupostos constitucionais do artigo 227 §6º da C.F.

Assim, deveria ser suprimida a primeira parte do artigo 1.631, isto é, "durante o casamento e a união estável", para que constasse apenas "compete o poder familiar aos pais", e completada pelo artigo 1.630, dando a exata compreensão de que todo e qualquer pai e mãe são sujeitos ativos do poder familiar, independentemente da relação estabelecida entre eles.

4-Bilbiografia

http://jus.uol.com.br/revista/texto/5414/poder-familiar-titularidade

http://pt.scribd.com/doc/15099353/Poder-Familiar

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm

http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406.htm

Gonçalves, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro, volume VI, 2ª Edição. Revista e atualizada, Ed. Ssraiva, 2006, pg. 360-361