A TEORIA DAS IDEIAS DE PLATÃO APLICADA AO NÍVEL DE DEFINIÇÃO DOS COMPONENTES DE UM PROJETO

Uma das principais críticas dos profissionais com perfil mais pragmático à cultura de gerenciamento de projetos difundida principalmente pelo PMI (Project Management Institute) é da baixa aplicabilidade do que foi planejado nos projetos, da inconsistência das suas linhas de base. Ampliam suas críticas, afirmando que os planos de projeto viram papel, algo desenvolvido “para inglês ver”, sem poder ser aplicado na prática.

Para tentar discutir esta complexa questão, vamos considerar, para este estudo, um retorno à filosofia de Platão, mais especificamente a teoria das ideias (ou teoria das formas). Platão acreditava que os seres humanos participam de dois mundos diferentes, um desses é o mundo físico, que experimentamos através dos nossos sentidos, e o outro mundo, o ideal,  é composto de essência imaterial e eterna que aprendemos com nossas mentes (Nash 1999). Para o gerenciamento de projetos, o mundo físico será o dos resultados mensuráveis, e o ideal, aquele que planificamos.

Segundo as boas práticas de gerenciamento de projetos (Institute 2008), um projeto deve ter documentos suficientes que o definem e um plano que estabelece como o trabalho do projeto será conduzido. Portanto, pode-se considerar que este todo compreende o Projeto Ideal, ou seja, aquilo que as mentes estabeleceram como referência no mundo ideal – de Platão – que, se transformado no mundo físico, tal qual como pensado, seria um projeto bem sucedido, atingindo os objetivos do projeto.

Esse é o grande desafio do mundo dos projetos, uma transposição exata do mundo perfeito – das ideias – para o imperfeito – mundo físico. Contudo, o projeto perfeito deve existir apenas na mente das pessoas, pois no momento em que tentamos planificar este, já nos deparamos com o primeiro anteparo do mundo físico – a linguagem – que limita a capacidade de descrição daquilo que está presente no mundo das formas.

Além disso, muitos profissionais de gerenciamento de projetos dão as costas para o mundo físico, estabelecendo estimativas com bases nas próprias percepções, ignorando as dificuldades inerentes desse trabalho no mundo físico, ampliando ainda mais a distância entre o planejado e o realizável.

Para se minimizar a possibilidade de um projeto ser sustentado nestas bases, deve-se realizar, durante o projeto, uma análise crítica do nível de definição dos componentes do projeto, através uma retroalimentação do físico para o  ideal, buscando melhorar as bases, de acordo com o que já foi feito, seja no próprio projeto, ou em projetos similares – que seria o uso efetivo de lições aprendidas.

 

O nível de definição, ou de confiança, de que o que se idealizou no planejamento pode ser realizado pode ser classificado em 4 (quatro) níveis:

  • ·         Nível 4 (Estéril): este nível não permite que o Gerente do Projeto conduza o projeto com base nas informações disponíveis. Os componentes do projeto que estiverem no nível 4 são facilmente questionados por qualquer integrante da equipe ou especialista externo.
  • ·         Nível 3 (Presumido): é o nível em que o componente foi definido a partir de uma base anterior sem análise crítica do cenário próprio do projeto, assumindo muitas premissas e baseado em analogias. Muitas vezes esse é o nível inicial dos componentes, entretanto muitos projetos já estabelecem esse nível como linha de base e executam o projeto sem refinamento necessário.
  • ·         Nível 2 (Proeminente): nível de definição ainda abaixo do adequado, mas que contém dados confiáveis, baseados nas especificidades do projeto, porém não há integração entre os componentes.
  • ·         Nível 1 (Fértil): nível de definição otimizado, permitindo a decomposição do componente em níveis adequados, permitindo simulações de cenários. Integração e previsibilidade são as palavras-chave desse nível de definição.

Os principais componentes de um projeto que podem ser objeto da verificação do nível de definição são:

  • ·         Escopo
  • ·         Cronograma
  • ·         Orçamento
  • ·         Equipe

Contudo, essa análise pode se estender a outros componentes, de acordo com a necessidade.

Além da nota para o nível de definição de cada item de cada componente, deve-se estabelecer também um peso para cada um, caso seja necessária esta estratificação do componente em itens, conforme Tabela 1. O resultado de cada item será o nível de definição multiplicado pelo percentual do peso de cada subitem do componente. O resultado do componente será a soma da nota de cada item.

Tabela 1 – Exemplo de Análise do Nível de Definição do Escopo de um projeto:

Escala x Escopo

Entrega 1

Entrega 2

Entrega 3

Entrega 4

Resultado do Componente

Nível de Definição

1

1

1

1

 [resultado]

Peso

40%

10%

20%

30%

1

Resultado

0,4

0,1

0,2

0,3

 

 

 

Tabela 2 – Exemplo de Análise do Nível de Definição do Cronograma de um projeto:

Escala x Escopo

Fase 1

Fase 2

Fase 3

Fase 4

Resultado do Componente

Nível de Definição

4

4

3

4

å [resultado]

Peso

25%

25%

40%

10%

3,6

Resultado

1

1

1,2

0,4

 

 

 

Tabela 3 – Exemplo de Análise do Nível de Definição do Orçamento de um projeto:

Escala x Escopo

Pacote A

Pacote B

Pacote C

Pacote D

Resultado do Componente

Nível de Definição

1

3

3

2

 [resultado]

Peso

50%

30%

10%

10%

1,9

Resultado

0,5

0,9

0,3

0,2

 

 

 

Tabela 4 – Exemplo de Análise do Nível de Definição da Equipe de um projeto:

Escala x Escopo

Equipe A

Equipe B

Equipe C

Equipe D

Resultado do Componente

Nível de Definição

1

3

3

2

 [resultado]

Peso

50%

30%

10%

10%

1,9

Resultado

0,50

0,90

0,30

0,20

 

 

 

Tabela 5 – Exemplo da Análise do Nível de Definição de um projeto:

Escala x Escopo

Escopo

Cronograma

Orçamento

Equipe

Resultado do Componente

Nível de Definição

1

3,6

1,9

1,9

å [resultado]

Peso

20%

30%

30%

20%

2,4

Resultado

0,20

1,08

0,57

0,38

 

 

O nível de definição global do projeto deve seguir a mesma lógica, veja Tabela 5, e o peso de cada componente deve considerar os direcionadores do projeto analisado. Para o projeto em questão, o nível de definição global do projeto é 2 – Presumido, ou seja, a maiorias das bases do projeto são análogas, sem análise crítica do cenário do próprio projeto.

Dificilmente consegue-se prever o comportamento de todas as variáveis que impactam um projeto no mundo físico, mas a partir da constante observação e mensuração dos fatores de risco dos projetos e de resultados, pode-se melhorar a previsibilidade, melhorando assim o nível de definição, causando menores oscilações. Platão considerou o mundo físico menos real e mais imperfeito que o mundo das ideias; como no gerenciamento de projetos, o esforço dos profissionais deve ser direcionado à condução dos ideais dos projetos em resultados efetivos para nossas organizações.

Definir de forma clara os objetivos do projeto, estabelecer procedimentos que permitam que a maior parte do trabalho seja realizada sem atropelos, conhecer projetos semelhantes, avaliar com seriedade lições aprendidas, atualizar bases de dados de estimativas de prazo e custo, são alguns dos meios para retroalimentar o Projeto Ideal de forma a torná-lo mais sustentado no mundo físico, tornando-o de fato um arquétipo mais maduro do mundo das ideias no contexto do gerenciamento de projetos. 

Bibliografia

Institute, PMI - Project Management. PMBOK - Project Management Body of Knowledge. Project Management Intitute, 2008.

Nash, Ronald H. Life´s Ultimate Questions. Zondervan, 1999.