1 INTRODUÇÃO


"Secularização" é nada mais que um termo metafórico, porém, seu significado semântico passou por mudanças no decorrer dos séculos. Para Marramao (1997) "a impossibilidade de reconduzir essa noção a uma concepção unitária não depende meramente, como no caso de outros termos característicos da modernidade, da sua polissemia ou polivalência semântica." Mas necessita antes, ainda em Marramao, de uma "estrutural ambivalência de significado, a qual dá lugar a premissas antitéticas ou diametralmente inversas".

A palavra "secularização" é oriunda do latim clássico que significa "século" (saeculum), porém, poder-se-ia significar também como, "idade", "época". Com o tempo, a sua significação adquiriu outros significados como "o mundo", "a vida do mundo" e "o espírito do mundo". Para os eclesiásticos, o termo foi difundido como algo mundano, hedonista.

Há divergências no que tange o uso inicial do termo. Diz-se que a palavra secularizar foi usada primeiramente por Longueville, delegado francês, em 1646. Por ele, secularizar teve significado como "a expropriação dos bens eclesiásticos em favor dos príncipes ou das Igrejas nacionais reformadas" (Marramao, 1997), nesse sentido, secularizar ficou subentendido no campo político-jurídico. Destarte, no final do século XVI, essa mesma expressão foi referenciada de forma divergente com o termo usado por Longueville. Nas disputas canônicas francesas aparece,o termo "secularização", como


um transitus de regularis a canonicus, ou seja, a passagem de um religioso "regular" ao estado "secular", ou, de um modo mais geral, como documentam outros estudos, a da "redução à vida laica de quem recebeu ordens religiosas ou vive segundo regra conventual. (MARRAMAO, 1997, p.17)


Existem ainda tempos mais remotos sobre a criação do termo. A origem da "secularização" (mas não o seu uso), entendido como processo político-jurídico, foi datado ainda no início do milênio passado, quando os primeiros ideais do estado moderno começa superar os ordenamento do medieval.

Deve-se também remontar outros palavras derivadas de "secularização", por exemplo, a palavra "secularismo". "Secularismo" foi um termo criado em 1846 por G. J. Holyoake, em Londres, seu significado era o de conceber e organizar a vida dada por Deus. Contudo "secularismo" não pode ser confundido com "secularizar" ou "secularização".


2 ORIGEM DO TERMO "SECULARIZAÇÃO"


Qual a origem do uso conceitual do termo secularização? Apesar de desse termo também ter sido usado nas disputas canônica, Marramao (1997) defende que Longueville tenha utilizado de forma mais adequada porque no canonismo francês "sua convicção -cuja única base filológica limitava-se a uma indicação dada por Jihann Gotfried von Meiern em sua edição de 1734 das Acta Pacis Westphalica Publica- era errônea, conforme foi recentemente documentado." Então, entende-se que a origem do termo secularização é do direito canônico.


3 PARADOXO SEMÂNTICO


Da mesma forma que há problemas quanto a origem do termo, o seu significado semântico também possui problemas.

O termo secularização muda de acordo com a localidade e contextualização. Por exemplo, a secularização em alguns momentos é entendida como descristianização, ou seja, abandono da vida religiosa cristã. Em outros momentos é visto como dessacralização, isto é, retirar o poder de sagrado de algo ou alguém.

Como já foi dito antes, o termo secularização pode ser usado de forma diferente em tempos diferentes dependendo do contexto. Um exemplo dessa mudança semântica é a análise feita por Marc Bloch em Les Reis Taumaturgos. De acordo com Bloch, a secularização se demonstra em dois paradoxos, um como uma espécie de soberania mundana e o outro como conflitos de poderes, vejamos.

O primeiro paradoxo apresenta que a


secularização da puissance royale em soberania absolutamente intra-mundana historicamente se apresenta como uma verdadeira e própria inversão inesperada de resultados, como um "efeito perverso" induzido justamente pela pretensões de monopólio do sagrado aduzidas pela igreja. (MARRAMAO, 1997, p.22)


Já o segundo paradoxo, mostra-se como o conflito entre Igreja, que assume uma caráter burocrático, e o Estado, que desenvolve características religiosas em seus procedimentos. É interessante ressaltar que nesse ponto, houve um inversão de valores, isto é, a Igreja se torna um ente direcionadamente Estatal e o Estado, cria características religiosas.

Assim, é de se entender que a secularização, nos dois paradoxos, possui um significado de oposição entre o espiritual e o secular.

A partir do fim século XVIII, a secularização se institui por mudanças, saindo do direito canônico e do direito jurídico, para um terreno categórico ligado a um novo conceito unitário de tempo histórico, que produz novas definições do termo secularização no que consiste entre espírito e o mundano. A mudança conceitual de secularização no fim do século XVIII ocorre porque nos outros dois sentidos que o termo secularização possui (direito canônico e direto jurídico)


o conceito de secularização recebe seu significado essencial da oposição espiritual/secular. O pano de fundo histórico-cultural desta antíteses pode ser compreendido somente à luz da doutrina agostiniana das duas civitates, doutrina que, em meio a numerosas metamorfoses estruturou, a cultura do ocidente medieval e moderno. (MARRAMAO, 1997, p.23)


A partir do século XIX, a secularização está contaminada pelo conceito pós-iluminista e por causa disso, o termo secularização ganha outro significado, como um rompimento dos reinos divino e real, proposto por Agostinho, e a "supressão do dualismo de eternidade e século, Além e Mundo" (Marramao, 1997). A partir desse ponto, a secularização será vista como algo mundano.

A partir do século XIX, a teologia secular entra em crise, com isso, a secularização começa a ter novos conceitos, e um desses, está na obra Die Anfänge der christlichen Kiirch und ibrer Verfassung de Richard Roth. Para este, a secularização será entendida como um fato processual de absorção da Igreja pelo Estado. Porém, isso leva ao encontro dos oposto, pois, a Igreja secularizada e o Estado dessecularizado.

O mundano, sempre esteve presente no conceito de secularização no Estado Moderno, porém, não devemos pensar que a mundanidade seja um princípio típico do caráter do Moderno, mas sim, pelo o princípio da interioridade. Marramao afirma isso porque, a evidência histórica mostra que os homens modernos não foram projetados no mundo, mas em si próprio. E ainda, ele continua a ratificar sua ideia quando afirma que:


Não por acaso, a partir de Descartes a filosofia Moderna passa a se caracterizar por "um interesse exclusivo pelo ego" e por "uma tentativa de reduzir todas as experiências, tanto no confronto com o mundo quanto com todos os outros seres humanos, a experiência entre o homem e si próprio. (MARRAMAO, 1997, p.91)

4 DEFINIÇÕES CONCEITUAIS DO TERMO

Atualmente, a ideia de "secularização se define sob três princípios fundamentais, porém, desses três, somente os dois primeiros são mais aceitos: o princípio da ação eletiva, o princípio da diferenciação e especialização progressiva; e o princípio da legitimação.

No princípio da ação eletiva, dá a ideia de uma progressiva emersão do sujeito em busca do significado do seu "eu" e da "consciência de si mesmo". De acordo com Marramao (1995), "este aspecto comporta um modo cultural particular de estabelecer a linha de demarcação entre subjetividade e objetividade e, portanto, de "construir" a realidade social."

O princípio da diferenciação e especialização progressiva afirma que quando o princípio eletivo se torna afirmativo, a adoção do critério de escolhe fica em aberto por si só. Esse critério de escolha está no âmbito tipológico racional-instrumental ou emotivo-fideísta, de tipo racional-estratégico ou de tipo racional-comunicativo, assim, ainda em consonância a Marramao (1995), "a consequência disto é a relação estreitamente biunívoca que a se instaurar entre secularização e aumento de complexidade do "mundo social""


5 CONSIDERAÇÕES FINAIS


Portanto, conclui-se que, apesar de que a secularização esteja presente até hoje, devemos pensar também que, a secularidade é vista de uma forma mais religiosas do que se pensa e também, devemos entender que dificilmente encontraremos um definição perfeita para a secularização, pois, como já foi dito antes, o conceito de secularização muda de acordo com o tempo e o contexto.



REFEÊNCIAS


BORGES, Anselmo. Secularização e Secularismo. <http://dn.sapo.pt/2006/06/04/opiniao/secularizacao_e_secularismo.html> Acessado em 2008.

MARRAMAO. Giacomo. Céu e Terra: Genealogia da secularização. São Paulo: UNESP, 1997

MARRAMAO, Giacomo. Poder e Secularização: as categorias do tempo. São Paulo. UNESP, 1995