O Hobsbawm diz que a crise do século XVII está mais centrada na mudança de uma mentalidade de um antigo colonialismo (antigo regime) para um tipo novo (Imperialismo do século XIX) fundamentada numa racionalidade econômica numa perspectiva capitalista. A Inglaterra, entretanto, nesse período possui uma especificidade. Quando Henrique VIII cria a Igreja Anglicana, ele acaba por desconstruir as influências continentais na Grã-Bretanha e criando certa independência.

Enquanto nessa fase do século XVI para o XVII há a perda da hegemonia no mediterrâneo e ocorre uma hegemonia transatlântica em razão do comércio colonial, a Inglaterra – não somente pela sua posição geográfica, mas por construir condição de domínio atlântico e um eixo comercial com a América do Norte – acaba por criar condições capitalistas. A especificidade da monarquia inglesa em relação às monarquias francesas, espanholas e a portuguesa era de não haver estabelecido um poder Absolutista como aconteceu em outros Estados europeus – com o poder centrado nas mãos e o controle absoluto da economia e da política. Uma vez que o rei não tinha um controle mercantil para oferecer base de sustentação econômica para manter ideologicamente a idéia de prerrogativas reais, de comando.

No século XVII, meio a crise que se expande na Europa, também enfrentado pela monarquia inglesa, o rei não tem poder político para sustentar a guerra e controle do mercantilismo. Isso porque a base do poder inglês estar restrita ao Parlamento. Neste, sobretudo na Câmara dos Comuns (composta principalmente pelos burgueses, àqueles que começavam a ter um domínio de mercado sobre as relações não somente transatlântico como dentro da própria ilha), estes capitalizados para financiar o rei. Tratava-se de um modelo político diferenciado de outros Estados europeus como França, Portugal e Espanha, não havendo esta configuração ao rei inglês porque o poder absoluto estava muito mais dissolvido entre as camadas sociais, e essencial e fundamentalmente o dinheiro era controlado pelos Comuns.

Outro motivo que justifica o enfraquecimento do poder real são as guerras civis. Havia uma complexidade para as grandes potências mercantis européias deflagrar um ataque à ilha inglesa, uma vez que esta detinha um grande poderio militar naval e contribuindo ainda mais para o seu isolamento. Contudo, as dissidências dentro do território inglês eram grandes. Embora o rei tivesse a prerrogativa, segundo o costume, de domínio não somente de seus súditos da Inglaterra como daqueles que compõe a Grã-Bretanha, mas não havia este reconhecimento da soberania do rei pela Irlanda e Escócia. Sendo assim, acabava por gerar conflitos e, consequentemente, em guerra. Se o rei está descapitalizado, não havendo cabedais para financiar uma guerra, é necessário um apoio dos Comuns. Estes, em contrapartida, percebem que a partir de seus privilégios comerciais, mas na concepção do antigo regime ainda tinham um conceito de inferioridade por estarem associado ao trabalho. Apropriando-se da ideologia protestante, analisam que: o anglicanismo sustenta e fundamenta o poder do rei, e uma vez que adotasse a crença da Igreja Anglicana estariam concedendo sustentabilidade que é controlada pelo rei. Explicando esse processo, quando a Inglaterra faz essa ruptura com a Igreja Romana, o próprio rei passa ser o chefe de Estado e da Igreja.

Sendo assim, se os burgueses que estão sendo desprestigiados pelo rei porque fazem parte da Câmara dos Comuns, caso assuma a religião oficial do Estado representaria que apoiaria as políticas reais e, necessariamente, não somente o ponto de vista político como também econômico. Neste caso, não era conveniente a esta classe financiar uma política de desejo de ascensão comercial. Entretanto, as revoltas, em virtude do enfraquecimento do rei, sobretudo da Irlanda e da Escócia fazia os Comuns analisar por outras perspectivas.

Quando é falado da Inglaterra pensa no “Reino Unido” de uma maneira geral, é preciso desconstruir uma idéia que será muito mais fortalecido no século XIX com o Imperialismo a pensar nessa Grã-Bretanha como um grande império que nunca morre. Trata-se de uma visão ideológica que é trazido para pensar da Grã-Bretanha, sendo nada mais que uma construção política. Se não havia essa homogeneidade no século no século XIX, evidentemente não havia no século XVII com os diversos conflitos econômicos e culturais dentro da ilha.

A primeira era de que se esses componentes vencessem a guerra, o rei já enfraquecido viria perder o trono e essa classe que quer emergir como classe social dominante vir substituir o próprio rei e instaurar uma nova forma de governo. A segunda foi perspicácia de Cromwell em fazer-se perceber o seguinte: a Inglaterra está em guerra e meio a uma crise política e econômica, mas o rei tem um exército nacional que, embora não tenha fundamentação financeira para ser sustentada, está em conflito e auxilia ainda mais o enfraquecimento; por outro lado, se os escoceses e irlandeses vencem a guerra podem ser eles a vir tomar o poder na Inglaterra, levando não somente a queda do rei como os burgueses emergentes.

A estratégia de Cromwell, que está entre os Comuns, é criar um Exército de Novo Tipo. Não se trata de um exército real que está ligado ao rei para defender o Estado, mas formado fundamentalmente pelos excluídos que não possuem privilégios reais e taxados de impostos como burgueses e camponeses. Surge na Inglaterra, no século XVII, um clima de participação política e militar. E esse exército que concedeu sustentabilidade para que os Comuns tivessem domínios efetivos não só de cabedais, deste capitalismo que começava desenvolver, mas também de poder político.

A primeira medida tomada por Cromwell com a criação do exército é buscar um acordo com o rei que não se torna possível por viver numa sociedade de estamentos. Se um rei cede às pressões da canalha, rafaméia, ele estaria negando o próprio poder que Deus havia concedido. Movido pela tensão ideológica há uma negação do rei que o leva a ser destronado em 1640. Passa a ser construído um Estado mais comunal (não comunista, sem igualdade) onde há uma maior participação política não no sentido democrático, mas uma participação daqueles que estavam no estamentos inferiores de uma sociedade e pertencentes a uma classe subalterna e idealizando um mundo de ponta-cabeça.

Analisando por uma perspectiva mais ampla na primeira década do século XVII é notável uma forte tensão: o rei sendo agredido militarmente tanto pelas colônias como pela sustentabilidade econômica e pelos Comuns. Em suma, não havia uma alternativa. Uma vez que não tinha nem mesmo a possibilidade de sustentar o Estado que o cerca. Acontece então que, quando o rei é destronado na Inglaterra, há a tentativa de instituição de uma nova forma de governo, mas acaba por não encontrar um denominador comum devido as inúmeras disputas que se sucedem.

Cromwell foi aquele que derrubou o rei e, apesar não ser um idealista, foi ele o responsável pelo modelo inglês de governo contemporâneo criando uma constituição política na Inglaterra existente nos dias atuais onde o rei não tem qualquer representação política, apenas ideológica. O comando está a cargo do Primeiro-Ministro.

Quando há a restauração do trono, ao longo de aproximadamente duas décadas de projetos políticos de combate e conflito sem conhecimento de que tipo de modelo de governo seria estabelecido, quando a rafaméia percebe não haver um acordo entre as elites da Câmara dos Comuns, é pensado a possibilidade destes virem tomar o poder. Esse grupo quando começa a receber força política, existe uma aproximação junto à família real pelo mesmos Comuns e o próprio Cromwell para estabelecer um acordo na qual o rei seria tronado sob a circunstância de que receberia apenas uma representatividade do espírito inglês, dos costumes e da Inglaterra, mas o poder político ficaria restrito à Câmara dos Comuns.

A busca de apoio da rafaméia foi importante somente no primeiro momento, pois no segundo não existe um mesmo valor por perceberem que é possível virar o mundo de ponta-cabeça, ou seja, chegar não necessariamente ao poder e sim ganhar voz dentro de um processo político. Para as elites inglesas, para a aristocracia que emergia no poder, o acordo político seria fundamental. Todos da elite, fosse ela aristocracia ou a burguesia, percebem a ameaças. A associação visa combater as idéias revolucionárias de poder popular, desarmando a rafaméia e financiando não mais o Exército de Novo Tipo, mas aquele do Estado.

Nesse momento a Inglaterra ganha novamente composição de Estado Nacional forte, sólido, com exército, com recursos e o rei, que apesar de perder o mínimo poder que detinha, torna-se um símbolo de unidade nacional pacificando e apaziguando aqueles reclamantes no País de Gales, na Escócia, na Irlanda... Tratando-se nada mais que uma espécie de jogada política.

Utilizando da concepção marxista, a Revolução inglesa foi uma preparação para as revoluções liberais ainda que tenha sido a Revolução Francesa a verdadeira “Revolução Burguesa”. Não havia uma hegemonia política, mas uma constante disputa pelo poder da aristocracia com o rei e da burguesia. Segundo Marx, é importante perceber a Revolução Inglesa como a primeira revolução liberal com a participação da burguesia negociando um espaço no poder político na Câmara dos Comuns através de leituras republicanas. E embora não tenham alcançado seu objetivo na Revolução Inglesa, esse seria somente o precursor de um processo que levaria ao desencadeamento de uma revolução burguesa repetitiva, desenvolvendo-se gradualmente até alcançar seu ápice na Revolução Francesa.

A burguesia alcançaria, nesse momento, não somente o poder econômico como também político. Em suma, a Revolução Inglesa é uma das revoluções burguesas da idade moderna, sendo que a principal revolução burguesa que atingiu seu pleno desenvolvimento foi a Revolução Francesa.


Referência:

HILL, Christopher. Oliver Cromwell e a Revolução inglesa In: O Eleito de Deus. São Paulo: Companhia das Letras. pp.13-32