A RESPONSABILIDADE CIVIL PELA INSCRIÇÃO INDEVIDA DE TÍTULO DE CRÉDITO NOS SISTEMAS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO - Uma análise acerca da possibilidade de indenização em decorrência da inscrição indevida de título de crédito no SPC/SERASA[1] 

Camilla Canuto Tanios[2]

Isabela Tereza Barros Silva²

Humberto Oliveira³  

Sumário: Introdução; 1 Elementos caracterizadores dos títulos de créditos; 2 Aspectos gerais da inscrição de títulos de crédito nos sistemas de proteção ao crédito; 3 Responsabilidade civil decorrente da inscrição indevida junto aos órgãos de proteção;  4 Anotação indevida em cadastro de proteção ao crédito e suas consequências; Considerações Finais; Referências

RESUMO 

A possibilidade de responsabilidade civil pela inscrição indevida de título de crédito nos sistemas de proteção ao credito, SPC e SERASA, é de significativa relevância na sociedade. Trata se de uma situação presente no cotidiano a qual todos estão sujeitos. Tendo isso em mente, o presente trabalho busca fazer a priori uma abordagem da emissão, pressupostos e validade dos títulos de crédito. E a posteriori uma análise da possibilidade de indenização em decorrência da inscrição indevida do titulo no sistema de proteção ao credito bem como os efeitos, as consequências e a responsabilização civil decorrente de tal feito.

Palavras-chave: Título de crédito; Inscrição Indevida; SPC; SERASA; Indenização.

Introdução

 

Apesar de não parecer, a responsabilidade civil decorrente de inscrição indevida de título de crédito é um tema muito comum, presente no dia a dia da sociedade e é fonte de algumas divergências entre a doutrina e a jurisprudência em alguns pontos específicos. Um desses casos diz respeito às consequências que levarão a essa inclusão indevida.

Ante o exposto, surgem indagações como os seguintes: Como valorar um possível dano moral devido ao erro de incluir a pessoa como inadimplente? Quem deve ser responsabilizado? Quem deve arcar com as consequências de tal erro? E no caso de haver uma inclusão devida anterior a uma inclusão indevida, cabe algum tipo de responsabilidade civil? Quais os efeitos e as consequências de tal inclusão? Cabe dano moral?

Sendo assim, o presente trabalho terá por objetivo a analise dos elementos caracterizadores do titulo de credito, quais sejam: pressupostos, emissão e validade. Demonstrar as características principais dos sistemas de proteção ao crédito (SPC e SERASA), demonstrar e caracterizar a possibilidade de responsabilidade civil devido a uma inclusão indevida de Titulo de Crédito junto aos sistemas de proteção ao crédito, caracterizar que medida o consumidor deve adotar diante da inscrição indevida, bem como suscitar outras questões relevantes no decorrer da pesquisa.

1 Elementos caracterizadores dos títulos de créditos

 

Os títulos de créditos desde o inicio eram considerados instrumentos de circulação de crédito, contudo, com o passar dos anos, foram evoluindo e firmando suas características à medida em que as necessidades da sociedade iam surgindo. 

Inicialmente os títulos de crédito tinham uma natureza individual, pessoal baseados nas relações de confiança e boa-fé em que as pessoas deveriam cumprir a obrigação assumida, pois, caso contrário, deveriam pagar com a própria vida.

Em 429, Justiniano através da “lex paetelia papiria” determinou que os maus pagadores deveriam pagar suas dividas não mais com a vida e sim com o seu patrimônio. Já na Idade Média, houve uma mudança na natureza dos títulos que antes eram individuais, pessoais e agora passaram a ter a possibilidade de serem transferidos. Nessa mesma época, surgiram os primeiros documentos de crédito de papel bem como a cláusula à ordem em que se permitia a transferência de titularidade.

Nos dias atuais, os títulos de crédito são regidos tanto pelo Código Civil quanto por leis especiais para determinados títulos de crédito. Segundo André Luiz Santa Cruz Ramos (2012, p.426), o regime jurídico aplicável aos títulos de créditos é um “regime jurídico recheado de regras, princípios e características especiais, criados especialmente para que os títulos de créditos consigam desempenhar de forma eficiente e segura a sua principal função, que é a circulação de riqueza”. Portanto, conforme André Ramos (2012, p431) os títulos de crédito possuem natureza “essencialmente comercial”.

Em relação aos elementos caracterizadores dos títulos de créditos tem se a presença de cinco principais características: a literalidade, a cartularidade, a abstração, a autonomia, o formalismo e a circulabilidade. Essas características podem ser facilmente perceptíveis pela própria leitura dos artigos do Código Civil que rege os Títulos de Créditos.

No art. 887, do Código Civil, tem se as características da cartularidade, literalidade, autonomia e formalismo: “o titulo de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei”. De acordo com André Ramos quanto a literalidade quer se dizer que “o título de crédito vale pelo que nele está escrito. Nem mais nem menos. Em outros termos, nas relações cambiais somente os atos que são devidamente lançados no próprio título produzem efeitos jurídicos perante o seu legítimo portador”(RAMOS, 2012,p.434).

Pela cartularidade, André Ramos (2012, p.432) entende que “o título de crédito é o documento necessário ao exercício do direito nele mencionado. [...] Em síntese, o princípio da cartularidade nos permite afirmar que o direito de crédito mencionado na cártula não existe sem ela, não pode ser transmitido sem a sua tradição e não pode ser exigido sem a sua mensuração”.

Pela autonomia, André Ramos entende que o “titulo de crédito configura documento constitutivo de direito novo, autônomo, originário e completamente desvinculado da relação que lhe deu origem” (RAMOS, 2012, p.434). Decorrentes da autonomia, há dois subprincípios importantes: o da abstração e a inoponibilidade das exceções pessoais ao terceiro de boa-fé. Segundo André Ramos (2012, p.435-436) entende-se pela abstração “a completa desvinculação do título em relação à causa que originou sua emissão. [...] Posto em circulação, o título passará a vincular outras pessoas, que não participam da relação originária, e que por isso, assumem obrigações e direitos tão somente em função do título, representado pela cártula”. A abstração pode ainda ser auferida pelo art. 888, CC: “a omissão de qualquer requisito legal, que tire ao escrito a sua validade como título de crédito, não implica a invalidade do negócio jurídico que lhe deu origem”. A oponibilidade das exceções está prevista na Lei Uniforme em seu art. 17: “as pessoas acionadas em virtude de uma letra não podem opor ao portador exceções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com os portadores anteriores, a menos que o portador ao adquirir a letra tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor”. Nesse mesmo sentido, o art.916, CC dispõe que: “as exceções fundadas em relação de devedor com os portadores precedentes, somente poderão ser por ele opostas ao portador, se este, ao adquirir o título tiver agido de má-fé” Portanto, o portador de boa-fé deverá demonstrar que não agiu de má-fé para que possa exercer seus direitos ao crédito sem a incidência de vicio algum.

Pelo formalismo se entende a obediência aos requisitos legais, como se vê expressamente no art.887, CC. E por fim a circulabilidade que compreende a possibilidade de transmissão da titularidade do crédito pelos meios legais.

Conforme André Ramos (2012, p.431),

Pode-se dizer ainda quês os títulos de crédito (i) são documentos formais, por precisarem observar os requisitos essenciais previstos na legislação cambiária, (ii) são considerados bens móveis (nesse sentido, aliás dispõem os arts. 82 a 84 do Código Civil), sujeitando-se aos princípios que norteiam a circulação desses bens,[...] e, (iii) são títulos de apresentação, por serem documentos necessários ao exercício dos direitos neles contidos. Outra característica dos títulos de crédito é que eles constituem títulos executivos extrajudiciais (art.585 do Código de Processo Civil) por configurarem uma obrigação líquida e certa.

Ademais, André Ramos (2012, p.431) ainda complementa em relação às características dos títulos de crédito que:

os títulos de crédito representam obrigações quesíveis (quérable), cabendo ao credor dirigir-se ao devedor pra receber a importância devida, e que a emissão do título e a sua entrega ao credor têm natureza pro solvendo, isto é, não implica novação no que se refere à relação jurídica que deu origem ao título: a relação jurídica que originou o título, portanto, não irá se confundir coma relação cambiária representada pelo título emitido. Por fim cabe ressaltar que o titulo de crédito é titulo de resgate, porque sua emissão pressupõe futuro pagamento em dinheiro que extinguirá a relação cambiária, e é também um título de circulação, uma vez que sua principal função é, como já afirmamos reiteradas vezes, a circulabilidade do crédito.

Há, contudo, conforme Ricardo Negrão (2010, p.175), “um grande número de documentos que se regem pela normatividade dos títulos de crédito, mas não representam relação de crédito. A doutrina os denomina títulos impróprios ou atípicos”. É o caso do cheque, por exemplo.

A doutrina classifica os títulos de créditos quanto à circulação em nominativos à ordem (indicação do beneficiário e pode ser transferido por endosso); nominativos não à ordem (indica o beneficiário mas não pode ser transferido por endosse, apenas por cessão ordinária de crédito) e ao portador (não identifica o beneficiário e pode ser transferido por simples tradição). Quanto ao conteúdo, a doutrina classifica em próprios (apresenta todas as características); impróprios (deixa de apresentar pelo menos uma característica, ex: cartão de crédito); de legitimação (garante o direito de acesso a um bem ou serviço) e de participação (dão direito à um resultado). Quanto à natureza podem ser abstratos (relação inicial desaparece) ou causais (mentem-se o vinculo inicial e em regra possui natureza contratual). Quanto ao emitente pode ser público ou privado. Quanto à nacionalidade: nacionais ou estrangeiros. Quanto ao prazo: à vista ou à prazo. Quanto ao número: individuais ou seriados.

Vale ressaltar a existência de títulos virtuais, previstos no art. 889, CC que também estão submetidos às normas dos títulos de créditos e possuem validade jurídica.

2 Aspectos gerais da inscrição de títulos de crédito nos sistemas de proteção ao crédito

 

As transações comerciais normalmente têm por base a boa-fé e a confiança entre credor e devedor. Contudo, nem sempre as obrigações assumidas são cumpridas. Nesse contexto, o Código de Defesa do Consumidor assevera que “na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça” (art. 42, CDC), esta conduta inclusive é prevista como crime nos conformes do art. 71 com pena de detenção de três meses a um ano e multa. No art. 42-A, o CDC estabelece os aspectos gerais para a cobrança de débitos quais sejam: nome, endereço e o numero de inscrição no Cadastro de Pessoas Fisicas- CPF ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica- CNPJ do fornecedor correspondente.

Contudo, no art. 43 do CDC estão as regras para os cadastros e inscrições nos sistemas de proteção ao crédito que deverão ser seguidas:

Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes. § 1° Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos. § 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele. § 3° O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros, poderá exigir sua imediata correção, devendo o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários das informações incorretas. § 4° Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congêneres são considerados entidades de caráter público. § 5° Consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão fornecidas, pelos respectivos Sistemas de Proteção ao Crédito, quaisquer informações que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores.

 

Porém, para que o consumidor seja considerado inadimplente e haja a consequente inscrição nos órgãos de proteção ao crédito é necessário que haja o Protesto de título. Consoante a lei n° 9.492/97, art. 1º.:

 Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.
Assim o protesto é um ato jurídico, que constitui a prova da falta de pagamento de um título de crédito. Para a efetivação do protesto devem ser cumpridas duas fases:
a) o apontamento do título para protesto, momento em que ocorre a notificação do devedor a fim de efetuar o pagamento do título no prazo especificado; e
b) a lavratura do protesto no cartório de protestos, que se concretiza em decorrência do não pagamento do título por parte do devedor dentro do prazo estabelecido na notificação do apontamento.

Nesse sentido, Morais ressalta que “havendo a ocorrência da negativação através do protesto, o devedor passa a ser considerado inadimplente, e sofrerá restrições em relação a créditos e outras circunstâncias afins ate que haja o cancelamento desta ordem negativa”. E complementa que se trata de um protesto “facultativo, também conhecido como protesto probatório, faz o papel de notificação, uma vez que constitui faculdade do credor a apresentação do título a protesto, contudo o objetivo principal deste, é a constituição do devedor em mora, além de interromper a prescrição. Efetivado o protesto, esta ordem restritiva poderá ser sessada através de duas formas, qual seja, a sustação e o cancelamento do protesto”.

Morais aponta ainda os procedimentos que devem ser tomados pelo credor para efetivação do protesto do título:

Para que o credor, proceda o envio de um título ou documento de dívida a protesto, deve comparecer no Tabelionato de Protesto (Interior) ou na Central de Protesto de Títulos (na Comarca em que houver mais de um Tabelionato de Protesto), e apresentar o título ou o documento de dívida, bem como o endereço atualizado do devedor e pagar as custas referentes ao apontamento e as despesas com postagem. O apontamento restritivo deve ser feito no Tabelionato da praça indicada para o pagamento da cártula. Caso a praça de pagamento não seja indicada no título ou no documento de dívida, deverá ser apresentado no Tabelionato da praça do domicílio do devedor.

Em relação as custas do protesto e a quitação do débito, Morais ressalta:

As custas de apontamento serão cobradas, correspondentes ao valor do título ou documento de dívida apresentado. A intimação devera ser pessoal, contudo sendo o devedor desconhecido ou não for localizado no endereço fornecido, poderá ser intimado através de Edital (Lei n° 9.492/97, art. 15). [...] Não sendo o título pago, nem retirado, nem sustado por ordem Judicial, o Tabelião lavrará o Instrumento de Protesto e o entregará juntamente com o título protestado ao Sacador/Portador. Após o protesto o devedor não pode mais pagar o título no Tabelionato. Deverá ele quitar seu débito perante o credor e logo providenciar o cancelamento do protesto.

Logo, o credor do título deverá seguir os passos indicados para a efetivação do protesto não pago e inclusão do devedor nos cadastros de proteção ao Crédito SPC e Serasa.

3 Responsabilidade civil decorrente da inscrição indevida junto aos órgãos de proteção

 

A responsabilidade civil tem sido muito utilizada para realizar a restauração de um equilíbrio moral e patrimonial desfeito. Nesse sentido leciona Silvio Rodrigues (2003, p.17), segundo o qual a responsabilidade civil constitui um ramo do Direito Civil que se refere a indenização que devera ser paga pelo agente causador do dano à vitima que o experimentou. Ele prossegue nesse sentido ao afirmar que:

Realmente o problema em foco e o de saber se o prejuízo experimento pela vitima deve ou não ser reparado por quem o causou. Se a resposta for afirmativa, cumpre indagar em que condições e de que maneira será tal prejuízo reparado. Esse é o campo que a teoria da Responsabilidade Civil procura cobrir. (2003, p.18)

           Assim toda vez que alguém sofrer um detrimento, em que for ofendido físico ou moralmente, que for desrespeitado em seus direito, certamente lançara mão da responsabilidade civil para que seja ressarcido. A responsabilidade civil é, portanto a retratação de um conflito. Essa necessidade de resolver a conduta ofensiva que trouxe em tese essa sensação de aflição, além da vergonha de ter o Crédito negado, que gerou ainda ao menos na consciência do injustiçado a ideia do nome sujo e dos comentários pejorativos entre o cidadão de seu circulo de amizade. (COGOY, 2008)

A vida humana não é apenas um conjunto de elementos matérias, pois nela se integram outros valores imateriais e morais. A constituição federal expressa muita importância a moral como valor ético social pessoal e familiar, que se impor ao respeito de meios de comunicação social, tornando a moral um bem indenizável. (COGOY, 2008) Com relação a moral tem-se ainda o conceito elaborado por Maria Helena Diniz (2005, p.349) segundo a qual a moral é um conjunto de faculdade morais ou de fenômenos mentais, que estão inseridos na consciência do ser humano, afetando dessa forma os costumes de modos de vida de cada individuo.

Assim o consumidor que quita suas obrigações em dia, e ainda assim por um erro do fornecedor tem seu nome anotado em sistemas de proteção ao credito indevidamente tem direito a uma indenização moral diante a responsabilidade do fornecedor, ainda mais se este consumidor passar por situações que expõe a sua imagem negativamente em decorrência dessa inscrição indevida. Desta forma para Carlos Alberto Bittar (1993, pag31) os danos morais se traduzem em turbações de animo, no caso de reações desagradáveis, desconfortáveis ou ate mesmo constrangedoras, ou outras desse nível, produzidas na esfera do lesado. Nesse sentido ele afirma que há dano moral quando a vitima suporta a desonra e a dor provocadas por atitudes injuriosas de terceiro, configurando assim lesões nas esferas interna e valorativa do ser como entidade individualizada. (1993. Pag34)

Com crescente avanço jurisprudencial no sentido de tutelar os direito personalíssimos é entendido que sequer há necessidade da comprovação do prejuízo ocasionado pela inscrição indevida, conforme dispõe jurisprudência abaixo do Colendo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná:

“CONSTITUCIONAL E CIVIL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – NOTA PROMISSÓRIA PAGA E POSTERIORMENTE PROTESTADA – INSCRIÇÃO DO NOME DO DEVEDOR NO SERASA – CENTRALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DOS BANCOS S/A – ABALO DE CRÉDITO CONFIGURADO – APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 5°, INCISOS V E X, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E 159 DO CÓDIGO CIVIL – INDENIZAÇÃO DEVIDA – DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA” (in Apelação Cível n° 17433, da Comarca de Curitiba, julgado pela Primeira Câmara Cível, rel. Des. Ulysses Lopes, decidido em 14/12/99)

No mesmo sentido Humberto Teodoro Junior afirma:

“É evidente, no entanto, que haverá dano moral ressarcível sempre que o lançamento realizado no cadastro do Serviço de Proteção ao Crédito  - SPC, ou no SERASA for indevido (dívida já paga ou qualquer título exigível). É que os efeitos de tais registros são nocivos ao conceito do devedor, podendo comprometer-lhe a honra e o bom nome no seio da comunidade em que vive. Se não havia razão legítima para explicar o assento, reveste-se a conduta de quem o promoveu do caráter abusivo e ilícito.”  (1999, pág. 27 e 29).

4 Anotação indevida em cadastro de proteção ao crédito e suas consequências

 

Atualmente tramitam em nosso Judiciário muitas ações que versam sobre a inscrição indevida nos órgãos de proteção ao crédito, como SERASA e SPC, através das quais de pleiteiam indenizações por danos morais. Em decorrência disso STJ definiu que o valor razoável para indenização nesses casos seria de 50 salários mínimos. (ABREU, 2011)

Nesse sentido o fornecedor que causar danos ao consumidor em decorrência de uma inscrição indevida ficará obrigado a repara-lo conforme dispo o artigo 927 do Código Civil brasileiro:

“Aquele que por ato ilícito (art. 186 a 187), causar dano a outrem fica obrigado a repará-lo”.

Parágrafo Único. “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para o direito de outrem.”

O direito a referida indenização consubstanciada nos casos de inscrição indevida aos sistemas de credito, pode ser observada ainda na Constituição Federal que assegura em seu artigo 5º que:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e á propriedade, nos termos seguintes:

(...)

“X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”

Mas é importante observar nesse tipo de situação os dados do fornecedor que realizou a anotação indevida, e o histórico do consumidor perante os órgãos de proteção ao credito. Pois quando já existe uma inscrição legítima feita anteriormente, o STJ entende que não cabe indenização por dano moral, conforme podemos observar na sumula 385: ‘‘Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento”. (ABREU, 2011)

Assim a prevenção constitui o melhor caminho tanto para o consumidor, quanto para a empresa, que deve ser cautelosa antes de anotar o nome de um devedor em cadastro de proteção ao credito, elegendo como ato primordial a real existência do debito e sua relação com o titular do CPF, além da imprescindível notificação prévia do devedor, (ABREU, 2011) conforme disposto no artigo 43, parágrafo 2º do CDC:

Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.

§ 1° Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos.

§ 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.

Desta forma é fácil verificar que a notação indevida do consumidor em um dos sistemas de proteção ao credito pode gerar consequências graves a empresa, em virtude da indenização que esta pode ser obrigada a pagar ao consumidor que pleitear judicialmente um ressarcimento pela negativação de seu nome, independente deste sofrer algum abalo no âmbito moral. (COGOY, 2008) 

Considerações finais: 

Conforme o exposto as relações entre credor e consumidor, na qual o consumidor representa a parte mais frágil dessa relação vem sendo protegida pela legislação brasileira, a qual garante o direito a este ultimo de indenização frente a negativação em órgãos  de proteção ao credito. E quando a negativação do nome do consumidor nos órgãos de proteção ao credito ocorrer de forma indevida, sem anterior inscrição legitima, fica claro, que mesmo sem uma determinada situação que exponha o consumidor a uma situação de desgaste moral, este terá direito a uma indenização.

Referencias: 

ABREU, NABBOUH  e ASSOCIADOS.  Inscrição indevida nos orgãos de proteção ao credito e danos morais ao consumidor. 2011. Disponivel em:  http://abreu.adv.br/index.php?option=com_content&view=article&id=71:inscricao-indevida-nos-orgaos-de-protecao-ao-credito-e-os-danos-morais-ao-consumidor&catid=41:artigos-e-noticias&Itemid=15.  Acesso em: 01. Nov. 2012.

BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por Danos Morais, 2ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1993.

COGOY, Evandro de Moura. Responsabbilidade civil do credor que lança indevidamente o consumidor nos orgãos de proteção ao credito. 2008. Disponivel em: http://siaibib01.univali.br/pdf/Evandro%20de%20Moura%20Cogoy.pdf Acesso em: 01. Nov. 2012.

DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. V.3. 2 ed. São Paulo: SARAIVA. 2005.

MORAIS, Marcelo Cintra de. Protesto de Títulos. Disponível em: < http://buenoecostanze.adv.br/artigos/artigos/direito-comercial/5108-protesto-de-titulos.html>. Acesso em: 01 nov. 2012.

NEGRÃO, Ricardo. Direito Empresarial: estudo unificado. 2. ed.rev. São Paulo: Saraiva, 2010.

RAMOS, André Luiz S. C. Direito Empresarial Esquematizado. 2.ed.rev.,atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Responsabilidade Civil. V.4. 20. Ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

THEODORO, Humberto Jr. Dano Moral,  2 ª ed., ed. Juarez de Oliveira, São Paulo, 1999.


[1] Paper elaborado para a disciplina de Títulos de Crédito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

[2] Alunas do 5º período de Direito Vespertino da UNDB.

³ Professor, mestre, orientador.