1. O HIV E A AIDS NO BRASIL E NO MUNDO

 A vida humana é o bem mais fundamental e o Estado garante essa integridade como um interesse acima de todos os outros. É nesta perspectiva que a proteção à vida não se dá apenas como um interesse individual, mas, acima de tudo, interesse ético e político da coletividade[1]. O Brasil figura entre os países recordistas em número de aidéticos, motivo que nos leva a análise das consequências civis e criminais do contágio e da transmissão da moléstia.

  O vírus do HIV é atualmente responsável pela infecção da AIDS de trinta e três milhões de pessoas em todo o mundo, segundo artigo do site oficial do Pró-Vida, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Os países em desenvolvimento concentram a maior parte da epidemia, sendo a África Sub-saariana a região que apresenta o maior número de casos no mundo. No Brasil, até o final de 2006 foram notificados 472.273 casos de AIDS[2]. Para o Ministério da Saúde existem no Brasil cerca de 630 mil pessoas vivem com o HIV, sendo este um valor estimado, pois se notificam apenas os casos de soropositivos que tomam medicamentos antirretrovirais. Do início da epidemia, em 1980, até dados preliminares de junho de 2009, foram realizados 544.846 diagnósticos do vírus no país[3].

A transmissão do vírus do HIV e a AIDS podem provocar a morte da pessoa. Neste sentido, está-se diante de uma condição de vulnerabilidade de doenças, de acordo com o site do Ministério da Saúde e, ao ser transmitida, fere o preceito constitucional do direito à vida. Assim, por ser um tema atual na vida e no cotidiano das pessoas brasileiras, abordar a conduta criminal daquele portador do vírus do HIV que transmite a moléstia para terceiros é tão importante quanto a busca do enquadramento penal deste delito, que ainda é tema de grande debate na doutrina e na jurisprudência dos tribunais brasileiros.

De início, vale refletir sobre a proposta de Souza[4], que explica a possibilidade de incriminar, no âmbito do direito penal, a ação da transmissão do vírus HIV, seja por dolo ou culpa (imprudência) e que esta está relacionada diretamente com a realidade social e criminológica em que contextualiza o contágio.

Para este mesmo autor na doutrina não há um consenso unânime acerca da intervenção estatal, eis que alguns doutrinadores defendem serem ineficazes as normas penais para discussão acerca da difusão do vírus, especialmente considerando os prejuízos que tal comportamento acarreta, outros ainda defendem inexistir conduta criminal relevante se considerar a ausência da vontade do contágio (sem dolo) e, outros ainda, na responsabilidade solidária da suposta vítima contaminada, que assume o risco, muito embora não tenha a informação da existência da moléstia no parceiro. Para o autor, é importante estimular a auto-responsabilidade da suposta vítima.

Para Azevedo[5] (2002), a pessoa portadora do vírus da AIDS quando transmite a moléstia a outros, deve reparar os danos sofridos Por ela, eis que o agente desrespeitou a obrigação de “não causar danos á outrem”, o que chama o autor de responsabilidade extracontratual.

Do acima referido, tem-se que o estudo do enquadramento penal do agente que transmite o vírus do HIV e a sua relação com a responsabilidade civil, que serão analisados sob a égide da culpa e do dolo, por se uma conduta relevante, uma vez que o bem jurídico que se tutela é a vida humana, se observado pelo crime de homicídio ou a saúde e a incolumidade física da pessoa, na lesão corporal ou nos crimes que estão previstos nos artigos 130 e 131, ambos do Código Penal, da periclitação da vida, é crucial para que faça a justiça plena, sem modalidade ou discriminação e, especialmente, com a dignidade ao acusado e a vítima do fato.

 2. A sanção penal como pressuposto da responsabilidade civil

O mesmo autor refere que se a sentença penal reconhecer o fato denunciado na ação penal como típico, mas não é ilícito, a exemplo quando ocorre a aplicação de algum inciso do artigo 23 do Código Penal, fato que exclui a antijuricidade do ato danoso, também exige a esfera cível, especialmente na responsabilização civil, que exige a ilicitude da conduta como pressuposto para reparação de dano, o que mais adiante será apreciado.

Isso significa que o fato típico, quando lícito, mesmo que causar danos materiais a outrem impedirá a vítima de buscar a reparação destes danos no juízo cível. Sendo assim, há casos onde a discussão acerca da culpa será necessária na esfera cível e, em outros, será dispensável, quando já reconhecido no juízo criminal.

Neste sentido, explica Nucci[6], ao comentar o Código de Processo Penal quanto à ação civil, junto ao Título IV, que a lei privilegia o sistema de separação da jurisdição, fazendo com que a ação penal destine-se à condenação do agente pela prática da infração penal e a ação civil tenha por finalidade a reparação do dano, quando houver.

De fato, o acima escorrido pelo autor vem previsto na regra do artigo 935 do Código de Processo Civil, que expressamente preceitua: “A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando as questões se acharem decidias no juízo criminal”[7].

Por isso, uma vez existente a condenação do agente no juízo criminal e a aplicação da sanção penal, restará necessário a sua execução no juízo cível para ocorrer á apuração do valor a ser indenizado.

 3. CONCLUSÃO:

 Assim, o direito penal não é a única forma de combater a doença transmissível que pode causar a morte das pessoas. A conscientização do ser humano, o conhecimento técnico sobre a doença, o comportamento da vítima, se permite ou não o uso de materiais preventivos, por exemplo, na prática de atos sexuais, a psicologia aplicada ao agente que possui a doença, que pode ser um possível agente transmissor, são realidades tão importantes quanto à condenação do agente que prática o crime que é penalizado, na esfera penal e civil, devendo o instituto da condenação penal ser aplicado efetivamente com a dignidade a que o tema merece.

 

 

 



[1] França (2008).

[2] Disponível em: <http://www.esef.ufrgs.br/provida/hiv-aids.htm>. Acesso em: 13 set. 2010.

[5] AZEVEDO, Marcos de Almeida Vilhaça. AIDS e responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2002.

 

[6] 2007, p. 178 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006