Nos últimos trinta anos, muitas e diversificadas ações vêm sendo implementadas para combater o racismo que durante séculos foi desenvolvido em nosso meio. Nesse sentido, construiu-se excelentes espaços que tiveram importantes avanços na luta anti-discriminatória. Não obstante, essas ações não são ainda suficientes para “desconstruir” toda uma representação negativa que historicamente fora construída sobre os negros afrobrasileiros.

                   O ambiente escolar, assim como outros espaços da sociedade, constitui-se em um local onde as diferenças étnico-culturais - ou de outra natureza- nem sempre são respeitadas. Veiculam frequentemente nos meios de comunicação reportagens que apontam para a existência constante de práticas e ações que fortalecem a discriminação e o preconceito étnico nas escolas. Além disso, estudiosos que analisam os livros didáticos indicam a ausência, nesse instrumento, de conteúdos e atividades que estimulem o pensamento crítico. Para esses estudiosos, livros contendo conteúdos acríticos e atividades mecânicas são um desestímulo à criticidade do aluno.

         Além das denúncias de práticas discriminatórias no espaço escolar, vem sendo atribuído também  a ineficiência do livro didático, ( ou pelo menos a alguns deles)a existência de papéis sociais subalternos protagonizados por personagens negros e a presença de estereótipos racistas.

 É comum, nos livros didáticos, a exemplo de um livro da 1ª série intitulado “Nordeste” da autora Maria Cecília Rego Ávila Pessoa, muito utilizado na década de 1970, representações de famílias compostas por pai, mãe e dois filhos (um menino e uma menina), brancos, desfrutando de uma luxuosa casa na fazenda ou na cidade, representando perfeitamente o ideal de felicidade criado pelos americanos. Agregada a essa família “feliz” aparece a empregada doméstica: uma mulher negra, mal vestida, de avental , com um pano amarrado na cabeça e pronta para servir “gentilmente” aquela família. Alem disso, as imagens dos negros aparecem nos livros didáticos sempre de maneira “deformada” o que não corresponde à realidade, pois desconsidera que os negros e negras possuem a beleza que é especifica de sua etnia, de sua cultura. Outras vezes aparece a associação da imagem do negro a algum estereótipo. No livro didático Português: leitura e expressão (Márcia Leite e Cristina Bassi, 7ª série, São Paulo, Editora Atual), muito utilizado em escolas de várias regiões em que um dos textos que apresentam traz a letra da música “O meu guri”, de Chico Buarque de Holanda. Para ilustrar o texto aparece a imagem de um menino sem camisa, descalço, correndo no escuro, com uma tarja nos olhos, uma bolsa amarela na mão, cabelos despenteados e muito enrolados, demonstrando explicitamente a imagem de um menino negro. Esse fato lamentável mostra que apesar da feliz idéia de incluírem o texto “O meu guri” como leitura complementar, as autoras e o ilustrador evidenciam a concepção que têm sobre os negros, pois a ilustração leva o aluno-leitor a compreender que se trata de uma criança negra em fuga após assaltar alguém e levar sua bolsa. (fonte: Revista Ameríndia – v.8, n.1, maio de 2010).

 

Essas práticas, além de não serem éticas nem educativas, afetam a formação de crianças e adolescentes tanto negros quanto brancos, pois destrói a auto-estima do primeiro grupo e cristaliza, no segundo, imagens negativas e inferiorizadas da pessoa negra, contribuindo fortemente para o empobrecimento do relacionamento entre as pessoas e limitando as possibilidades de respeito à diversidade racial, étnica e cultural. Exemplos como esse são significativos para que possamos compreender que apesar de toda uma luta dos ativistas dos movimentos sociais voltados para a questão étnica contra a discriminação racial e da legislação criminalizar as práticas racistas, o racismo ainda encontra espaço para se reproduzir mesmo onde deveria ser mais combatido: no livro didático, principal instrumento utilizado pela escola para auxiliar no processo de ensino e aprendizagem.

Somando-se às representações negativas do negro, não é raro se encontrar nos livros didáticos, das diversas disciplinas, conteúdos vinculados a uma visão eurocêntrica que o menino negro foi ou à idéia de “uma história da civilização ocidental” contendo equívocos no tratamento do referencial que diz respeito à África, aos africanos e seus descendentes.

Refletindo atentamente acerca das teorias raciais, podemos considerar que estas ainda são um grande entrave para a construção de outra forma de pensar a humanidade. Entretanto, suas muitas as ações que nos últimos tempos vêm sendo desenvolvidas em resposta ao racismo e às formas de discriminação. Essas ações se traduzem , historicamente, num movimento de construção ou valorização de uma identidade positiva dos negros.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Ao analisar a imagem e representação do negro em espaços como o livro didático, percebemos que o livro como veiculo de “reprodução” de um pensamento dominante que considera as diferenças étnicas e culturais existentes entre negros e brancos uma relação de inferioridade-superioridade. Nas representações contidas nos livros didáticos, principalmente nos de 1ª a 4ª séries que foram utilizados pelas escolas durante as décadas de 1970/80, é possível constatar que as imagens reproduzidas nesses livros insistem em mostrar o negro numa condição negativa.

No entanto, ao analisar percebemos que a sociedade brasileira começa, mesmo que timidamente, a despertar e a construir uma consciência crítica em relação à opressão racial. As formas discriminatórias que predominaram durante anos agora são menos toleradas. Pessoas e entidades estão frequentemente recorrendo à Justiça para denunciar casos de discriminação e preconceito, enquanto as ações dos movimentos anti-discriminatórios estão aos poucos restringindo os espaços de reprodução do preconceito étnico.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MENEGASSI, Renilson José. A representação do negro no livro didático brasileiro de língua materna. Revista Espaço Acadêmico- nº 36 – maio de 2004- Mensal – ISSN- 1519.6181