A REMIÇÃO DA PENA

No âmbito da execução penal, o instituto da remição visa possibilitar ao preso condenado ou provisório a diminuição da sua pena em um dia a cada três trabalhados, trazendo em seu âmago, características extremamente relevantes dos próprios objetivos da LEP, entre as quais, podemos citar a buscar da ressocialização através da atividade laboral, cujos fatores encontram-se intrinsecamente relacionada à ausência de falta grave na conduta do encarcerado.

Neste viés, até no passado o diploma legal disciplinava no art. 127 da LEP que “o condenado que for punido com falta grave perderá direito ao tempo remido, começando o novo período a partir da data da infração disciplinar”, situação amparada pelo então vigente entendimento jurisprudencial da Suprema Corte brasileira no sentido de caracterizar este instituto como um benefício sujeito a condição resolutiva[1], ou seja, relacionado ao bom comportamento carcerário, não sendo um direito adquirido, inexistindo na sua hipotética perda qualquer ofensa à coisa julgada[2].

Contudo, este entendimento acabou sendo pacificado[3] pelo STF no ano de 2008 através da edição da Súmula nº. 9, que se deu nestes termos "O disposto no artigo 127 da Lei 7.210/84 foi recebido pela ordem constitucional vigente e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58

Posteriormente, o incremento da Lei 12.433/11 revogou o entendimento pacificado pela Súmula Vinculante nº. 9 do STF, alterando o art. 127 da LEP de modo substancial,  trazendo a baila a seguinte disposição, que desde então passou a viger:

Art. 127.  Em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar.

Assim, a remição de dias ganhou status de um direito adquirido parcial, facultando ao magistrado a revogação com base no art. 57 da LEP, ou seja, com base na “natureza, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato, bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão”, o que deu certa margem de discricionariedade ao juiz.

No condizente à concessão da remição, o caput do art. 126 da LEP preconiza a sua possibilidade a condenados do regime aberto ou semiaberto, de maneira que, não há a previsão legal da sua aplicação na apenados do regime aberto.

De outra banda, com relação à possibilidade da remição de dias trabalhados para presos provisórios, a jurisprudência[4] e a doutrina[5] já pacificaram o entendimento sobre a sua possibilidade, sobretudo em razão da inteligência do art. 42 do CP.

Sem embargo, há precedentes jurisprudenciais[6] contrários a possibilidade da remição de dias trabalhados para presos provisórios, alegando, para tanto, bis in idem em relação ao instituto da detração estabelecida no art. 42 do CP, sendo a remição, um benefício exclusivo do preso sentenciado, inexistindo previsão legal com relação aos presos provisórios.

No condizente ao cumprimento de pena no regime aberto e a possibilidade da remição, pairam diversas divergências doutrinárias e jurisprudenciais a respeito. A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul possui decisões nos dois sentidos, nestes termos:

AG Nº. 70.060.145.455AG/M 2.324 - S 26.06.2014 - P 55 AGRAVO DA EXECUÇÃO (ART. 197 DA LEP). REMIÇÃO. REGIME ABERTO. POSSIBILIDADE. O apenado que cumpre a sua pena carcerária no regime aberto e exerce atividade laboral tem direito à remição da pena, sob pena de restringir o âmbito de aplicação de institutos de valor real à sua máxima ressocialização do apenado, mormente quando ele já está em vésperas de reinserção social definitiva, decorrente do cumprimento da reprimenda penal que lhe foi imposta. Precedentes desta Corte. AGRAVO PROVIDO. (Agravo Nº 70060145455, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aymoré Roque Pottes de Mello, Julgado em 26/06/2014)

De outra banda, encontramos decisões do TJ/RS igualmente contrárias:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. REMIÇÃO. TRABALHO EXTERNO. APENADO CUMPRINDO PENA EM REGIME ABERTO. IMPOSSIBILIDADE. O art. 126 da Lei de Execução Penal expressamente prevê a possibilidade da remição de pena, pelo trabalho, somente aos condenados que cumprem pena em regime fechado ou semiaberto. No regime aberto, portanto, não há como se reconhecer o direito ao mencionado benefício. Precedentes do STJ. Agravo ministerial provido. (Agravo Nº 70049709058, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Osnilda Pisa, Julgado em 25/03/2014)

Da mesma forma, grande parte da doutrina brasileira, como é o caso de MIRABETE[7], posiciona-se de modo desfavorável a remição nestas condições, in verbis:

“A remição é um direito privativo dos condenados que estejam cumprindo a pena em regime fechado ou semi-aberto, não se aplicando, assim, ao que se encontra em prisão albergue, já que a este incumbe submeter-se aos papeis sociais e às expectativas derivadas do regime, que lhe concede, objetivamente, a liberdade do trabalho contratual”

De toda a sorte, a remição encontra-se relacionada ao direito do preso ao trabalho, cuja norma encontra-se descrita na forma do art. 6º da Constituição Federal[8] e, igualmente, no caput do art. 28 da Lei de Execução Penal[9],, sendo considerado como “dever social e condição de dignidade humana”.

CÔMPUTO DOS DIAS REMIDOS PARA TODOS OS FINS

Com relação ao cômputo dos dias remidos para fins de cumprimento de pena e progressão de regime, desde tempos vige o entendimento doutrinário majoritário no sentido do seu perfeito cabimento[10], isto, pois, o antigo texto do art. 128 da LEP tão somente preconizava que “o tempo remido será computado para a concessão de livramento condicional e indulto”, deixando uma lacuna com relação à remição e a sua influição no cômputo do prazo do cumprimento da pena e no desconto do lapso temporal necessário a progressão de regime.

Neste sentido, segundo MIRABETE[11], não restava dúvidas acerca do cabimento da aplicação da remição no condizente ao cumprimento de pena e no cálculo da progressão de regime, sobretudo, em razão da própria previsão legal do art. 111 da LEP de quepara a determinação de regime de cumprimento, deve ser observada, inclusive , a remição” .

Da mesma maneira, NUCCI[12] sustenta o seguinte:

 “Os dias remidos são computados para todos os fins e não somente para a concessão de livramento condicional ou indulto”.

Assim, como modo de corrigir os erros do art. 128 da LEP, a Lei 12.433/11 alterou o seu texto legal, aderindo ao clamor jurisprudencial e doutrinário reinante, passando a descrever que “o tempo remido será computado como pena cumprida, para todos os efeitos” cuja aplicabilidade é estendida a progressão de regime.



[1] HC 78.178-SP (DJU de 9.02.99),  rel. Min. Carlos Velloso, 16.6.2014.

[2] HC 77592/SP (DJU de 12.3.99). HC 85552/SP, rel. Min. Carlos Britto, 16.6.2014.

[3] AI 580259 AgR Publicações: DJe nº 131/2007, em 26/10/2007 DJ de 26/10/2007, 16.6.2014.

[4] TJSP – RT 811/604

[5] Mirabete, Julio Fabbrini, Execução Penal, São Paulo, Atlas, 2004, p. 519.

[6] TJMG – RT 617/337).

[7] Mirabete, Julio Fabbrini, Execução Penal, São Paulo, Atlas, 2004, p. 518..

[8] Artigo 6º: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

[9] Artigo 28, caput: “O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva”.

[10] MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal. 11ª Ed. São Paulo: Jurídico Atlas. São Paulo, 2004, p.547.

[11] MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal. 11ª Ed. São Paulo: Jurídico Atlas. São Paulo, 2004, p.547.

[12] NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 5ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 575.