UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ – UVA

PRÓ – REITORIA  DE  EDUCAÇÃO CONTINUADA - PROED

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUES  E  LITERATURA

DISCIPLINA: SEMINÁRIO LITERÁRIO I

PROFESSORA: MS. LICIANY RODRIGUES

A REIFICAÇÃO DA MULHER NA OBRA “SÃO BERNARDO” DE GRACILIANO RAMOS

ACADÊMICO: MOÉSIO MUNIZ LOPES

SOBRAL / CE

OUTUBRO DE 2011

1   PALAVRAS – CHAVE

  1. Reificação.  Obra.  São Bernardo.  Graciliano Ramos.

 2   JUSTIFICATIVA 

Desde o princípio dos tempos, homens e mulheres costumam desempenhar papéis distintos na sociedade. Vista como "sexo frágio", “ser indefeso”, para os homens, a mulher não tinha capacidade de assumir o comando do grupo familiar o que acabou favorecendo a sua submissão ao homem.

O ser masculino, associado ao pensamento de autoridade devido a sua força física, assumiu o poder dentro da sociedade. Dessa forma originaram-se as sociedades patriarcais, fundamentadas na força dominadora do homem como chefe familiar.

A motivação para fazermos um estudo bibliográfico a respeito dessa situação de dominação da mulher vem do fato de não compartilharmos com esse pensamento machista que inferioriza o ser feminino, muitas das vezes o reduzindo a um objeto de uso pessoal.

A situação de inferioridade da mulher não é exclusiva apenas das relações sociais dos séculos XIX ou XX, ainda hoje presenciamos várias situações onde as mulheres são inferiorizadas. Na questão salarial, por exemplo, às vezes no mesmo cargo há disparidade entre homens e mulheres, o que poderíamos chamar de preconceito do gênero. Seríamos hipócritas se afirmássemos que nos tempos contemporâneos a mulher é tratada em pé de igualdade com o homem e que ambos assumem o mesmo grau de importância no contexto social.

Temos que reconhecer também que a mulher do século XXI a cada dia  vem lutando para assumir um lugar mais igualitário na sociedade, com novas liberdades, possibilidades e responsabilidades, dando voz altiva ao seu senso crítico.  Em “tese” deixou-se de acreditar numa inferioridade natural da mulher diante da figura masculina nos mais diferentes âmbitos da vida social. Como quebra de tabu temos a eleição de uma mulher para presidir a nação brasileira.

Nesse contexto nos questionamos: por que a mulher ao longo dos anos e até mesmos na atualidade, apesar de que digam o contrário, em alguns aspectos social é tratada como “propriedade” do homem?

 Em um ensaio literário sobre a obra “São Bernardo” de Graciliano Ramos intitulado “ O Mundo à Revelia”, o crítico  Luiz Lafetá compartilha do nosso pensamento ao colocar a reificaçao como sendo a tentativa de apropriação das pessoas como se fossem objetos sendo úteis apenas enquanto rendesse  algum fruto para a parte dominadora.

 

 

3   DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA

 

3.1 HIPÓTESES

            Herança cultural transmitida pelos mais velhos de geração em geração através dos tempos.

            Resultado de uma sociedade altamente machista que não aceita que as mulheres estabeleçam alguma relação de  superioridade no meio social.

            Acomodação da maior parte das mulheres que reconhecem a força do homem como ser naturalmente dominador.

 

3.2    CONTRIBUIÇÃO DA PESQUISA

 

          O material levantado nesse estudo de caráter bibliográfico terá grande valia, pois proporcionará ao leitor fazer um retrocesso na nossa história cultural na primeira metade do século XX, uma vez que a personagem investigada faz-se presente nesse contexto histórico.

          Através do prazer da leitura literária do livro “São Bernardo” de Graciliano Ramos, o leitor compreenderá as aflições da mulher vista como “propriedade” através da personagem Madalena..

          De posse desse material esperamos contribuir para que seus possíveis leitores reflitam a situação da mulher na nossa sociedade, deixando de lado os tabus e preconceitos que inferiorizam o sexo feminino.

 

4   OBJETIVOS

 

 

4.1 OBJETIVO GERAL

 

Evidenciar através da obra “São Bernardo” de Graciliano Ramos o papel da mulher vista como objeto do ser masculino, no contexto social da primeira metade do século XX.

 

 

4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

 

Retroceder na história brasileira para mostrar como era tratada a mulher no início do século XX.

Comparar a mulher do início do século XX com a mulher contemporânea.

Observar até que ponto chegava a submissão da mulher aos caprichos do sexo masculino.

 

 

5   METODOLOGIA

 

            A palavra método está ligada à origem do termo Méthodos, criado pelos gregos na antiguidade. Na Grécia antiga método significa caminho para se chegar a um fim. Com o passar do tempo essa significação generalizou-se e o termo passou a ser empregado também para expressar outras coisas como “maneira de agir”, “tratado elementar”, “processo de ensino” etc.

            Segundo RUIZ (2002, p. 138): “Método é um conjunto de normas padrão que devem ser satisfeitas, caso se deseje que a pesquisa seja tida por adequadamente conduzida e capaz de levar a conclusões merecedoras de adesão racional”.

            Em termos mais simples a assertiva acima nos mostra que método é um modelo padrão que o pesquisador deverá seguir para a satisfatória realização do seu projeto.

             No projeto será usado o método hipotético-dedutivo, pois toda pesquisa possui sua gênese a partir da elaboração de um problema existente na sociedade e pelo o qual se anseia por melhorias.

            O pesquisador analisará as possíveis hipóteses causadoras do problema e por meio das comprovações, buscadas através pesquisas bibliográficas, se tentará fechar as lacunas nelas existentes.

            Para a realização do projeto será usada à pesquisa bibliográfica. De acordo com RUIZ (2002, p. 58):

 

Bibliografia é o conjunto dos livros sobre determinado assunto, por autores conhecidos e identificados ou anônimos, pertencentes a correntes de pensamentos diversos entre si. E a pesquisa bibliográfica consiste no exame desse manancial, para o levantamento e análise do que já se produziu sobre determinado assunto que assumimos como tema de pesquisa cientifica.

 

            Percebemos assim que em toda pesquisa é essencial o levantamento do acervo bibliográfico. É importante não só para referendar o que o pesquisador está argumentando, mas também como uma forma de propiciar o confronto de ideias entre distintos autores; sejam elas convergentes ou não. 

            Inicialmente se levantará um vasto leque de críticos literários que abordem: a questão da inferiorização da mulher na sociedade, a reificação oriunda dos que detém o poder principalmente contra o sexo feminino e a visão da mulher como “propriedade” do marido em “São Bernardo”.

            Para a concretude do projeto será necessário à realização de muitas leituras individuais, fichamentos, anotações críticas, consultas a sites, resumos; enfim o pesquisador deverá ter certa disponibilidade de tempo para constantes visitas as bibliotecas, a internet, periódicos, ou seja, qualquer meio de aquisição informacional. É de fundamental relevância constantes releituras da obra “São Bernardo” para retirada de trechos que comprovem o tratamento reificador que Paulo Honório demonstra nas suas atitudes com Madalena.

 

 

6   EMBASAMENTO TEÓRICO

 

6.1 VISÃO DA MULHER NO CONTEXTO SOCIAL DE “SÃO BERNARDO”

 

A obra graciliânica, produzida na primeira metade do século XX, revela um grande potencial como documento, não apenas por referir-se a uma determinada época, ou a acontecimentos fundamentais na história brasileira, mas por traçar o retrato de uma sociedade representada por homens, mulheres e crianças, brancos e negros, ricos e pobres, letrados e iletrados. Dessas  situações destacamos principalmente a submissão da mulher, foco principal da nossa discussão.

Delumeau (1990) destaca que durante milênios a mulher foi associada às forças da natureza devido à fertilidade e ao seu papel na reprodução da espécie. Ela gerava medo no homem devido aos acontecimentos que eram enigmáticos, como a maternidade. Esse temor provocado pelo desconhecido levou o homem a manter a mulher sob seu controle, garantindo sua superioridade.

No século XX as mulheres principiaram uma luta organizada em defesa de seus direitos onde se observavam dois intuitos distintos: a luta das mulheres contra as formas de opressão a que eram submetidas sendo chamada de feminismo e a organização das mulheres em prol de melhorias na infra-estrutura social conhecida como movimento de mulheres.                                       Devia-se ter muita coragem para entrar numa luta de engajamento social. As mulheres que adotaram o movimento feminista foram vistas como "mal amadas" e discriminadas pelos homens e também pelas próprias mulheres que aceitavam passivamente o seu papel de subordinadas numa sociedade patriarcal.

            Apesar de muitas das conquistas das mulheres se darem muito lentamente observamos grandes aquisições sociais importantes para o sexo feminino. No início dos tempos a mulher chegou até a ser comparada com uma espécie de “bruxa” devido a estranheza do seu corpo.

            No contexto temporal da obra “São Bernardo” a mulher já havia conquistado alguns avanços dentre eles o direito a estudar, entretanto poucas tinham esse privilégio e as que tinham não eram vistas com bons olhos pela sociedade machista da época que tinham o ser feminino como sinônimo de dona de casa e maternidade. A personagem Madalena pode ser apontada como um exemplo: mulher instruída, intelectual, culta que estava à frente do seu tempo e por isso representava uma ameaça às conquistas de Paulo Honório. As qualidades intelectuais de Madalena são vistas pelo pretendente como um perigo, exemplo disso é quando ele fica sabendo que a mesma escreve artigos para um jornal:

 

- Ah! Faz artigos!

- Sim, muito instruída. Que negócio tem o senhor com ela?

 - Eu sei lá! Tinha um projeto, mas a colaboração no Cruzeiro me esfriou. Julguei que fosse uma criatura sensata. (S. Bernardo p.85)

 

 

 

            Notamos que o fato de Madalena ser uma pessoa muito culta deixa Paulo Honório um pouco receoso quanto ao seu projeto de casar com ela. Isso ocorre devido ao fato dele ter planos de reificá-la, ou seja, transformá-la em uma espécie de objeto de uso pessoal pronto a atender os seus caprichos pessoais e ela sendo uma moça bem instruída não se deixaria ser dominada tão facilmente. Antonio Cândido (1961) afirma que, a partir do sentido reificador, o narrador-personagem reduz tudo a objeto. É assim que, na recapitulação final, Paulo Honório vê seus empregados como "bichos", conforme enaltecemos no trecho:

 

- Quanto a mim, acho que em questões de sentimento é indispensável haver reciprocidade.

- Qual reciprocidade! Pieguice. Se o casal for bom, os filhos saem bons; se for ruim, os filhos não prestam. A vontade dos pais não tira nem põe. Conheço meu manual de zootecnia. (S. Bernardo p. 87)

 

 

 

            Paulo Honório em diálogo com D. Glória sobre Madalena tem uma visão muito limitada do mundo. Para o mesmo a mulher é a mesma coisa que um “bicho”, não é preciso ter amor, compreensão, sensibilidade, qualquer demonstração de afeto, ou seja, o que importa é ela ser uma boa reprodutora, assim como uma vaca ou outro animal qualquer da sua fazenda o qual lhe pertença. É justamente a sua tirania que faz com que a opressão assuma, no romance, diferentes formas: desde a física, verificável no tratamento que ele dispensa aos empregados, até a opressão ao nível das vivências psicológicas (humilhações que faz passar Madalena etc).

Em uma conversa entre Gondim, Padilha, João Nogueira e Paulo Honório, ressaltamos o seguinte trecho onde está bem caracterizado o tratamento de reificação dado a mulher:

 

 

- Estava aqui pensando na escola, murmurou Padilha.

- E eu. Tirou-me a palavra da boca, atalhou João Nogueira. Convide a Madalena, seu Paulo Honório. Excelente aquisição, mulher instruída.

- Até lhe enfeita a casa, seu Paulo, gritou Azevedo Gondim. (S. Bernardo p.49)

 

Quando Nogueira usa a expressão “aquisição” em seu discurso remetemos um pensamento de compra e por sua vez quando Gondim fala em “enfeite” lembramos de meros objetos decorativos. Observamos dessa forma como a mulher do início do século xx era tratada: tipo de artefato que se podia comprar.

Certa ocasião Paulo Honório discute com Madalena e a faz sofrer humilhações psicológicas:            “(...) professorinhas de primeiras letras a escola normal fabrica às dúzias. Uma propriedade como S. Bernardo é diferente”. O protagonista inferioriza a figura da esposa rebaixando-a, dando preferências explícitas a sua propriedade em detrimento de Madalena.

Uma manhã Paulo Honório age ríspido com Padilha falando assim:

 

- (...) apanhando flores, homem! Olhe o relógio.

- Foi dona Madalena que mandou tirar umas rosas.

- Você é jardineiro? A d. Madalena não dá ordens. Você me anda gastando o tempo com falatórios! (S. Bernardo p. 124)

 

            No trecho supracitado o narrador-personagem deixa bem evidente quem é que manda na casa. O mesmo desfaz as ordens que a esposa dá aos empregados, passando-nos uma total situação de dominação “machista” com relação à figura da mulher.

          Conforme podemos perceber e demonstrar por meio dos trechos expostos acima, a narrativa “São Bernardo” de Graciliano Ramos apresenta em seu enredo várias evidências de reificação no trato com a mulher. Paulo Honório é um típico sujeito reificador que reduz tudo e todos a sua volta a mera posição de objeto. Durante toda a obra a personagem Madalena é posta numa situação de mercadoria, produto do seu dono e senhor absoluto que não aceita qualquer tipo de contestação. Todavia observamos que Madalena não se deixa ser reificada por inteiro, luta e resiste, tornando-se um empecilho na vida do feroz capitalista. O casal passa a viver numa vida de extremos conflitos até que a antagonista prefere suicidar-se a ser dominada por completo.

 

 

7 SUMÁRIO

 

       A estruturação da pesquisa apresentará três tópicos norteadores principais:

  1. O contexto histórico Modernista da obra “São Bernardo”.
  2. A visão da Mulher no contexto social da obra graciliânica.
  3. A reificação da mulher refletida na personagem Madalena em “São Bernardo”.

 

8 INDICAÇÃO BIBLIOGRÁFICA

 

OBRAS DO AUTOR

RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro. 1ª ed. Record, 1980.

 

CRÍTICA SOBRE O AUTOR

CÂNDIDO, Antônio. Ficção e confissão. São Paulo, 1961.

 

GERAL

RUIZ, João Álvaro. Metodologia científica: guia para eficiência nos estudos. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2002.

DELUMEAU, Jean. História do medo no Ocidente: 1300-1800. São Paulo: Cia. das Letras, 1990.