Danilo Lemos de Miranda

1 INTRODUÇÃO; 2 EM QUE CONSISTE A REGRA-MATRIZ: NORMA OU ENUNCIADO?; 3 OS ELEMENTOS DA REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA; 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS.

RESUMO

Trata-se de estudo a respeito da regra-matriz de incidência tributária, responsável por definir os elementos de hipótese e de consequência de qualquer espécie tributária. Com o objetivo de compreender a teoria envolvida nesta temática, definido o significado linguístico da regra-matriz, serão estudados os seus elementos a partir da doutrina de Paulo de Barros Carvalho e da leitura de Aurora Tomazini Carvalho.

Palavras-chave: Regra-matriz. Incidência tributária. Tributo.

1 INTRODUÇÃO

A incidência de determinado tributo depende, necessariamente, do preenchimento de algumas condições e pressupostos, os quais vêm, como regra, prescritos na lei instituidora do próprio tributo, sempre em conformidade com as determinações genéricas da Constituição Federal acerca do Sistema Tributário Nacional, bem como do Código Tributário Nacional, diploma legislativo responsável por cuidar desta matéria no ordenamento jurídico brasileiro.

Todas essas circunstâncias necessárias para a incidência tributária consubstanciam aquilo que, sugestivamente, se chama de regra-matriz de incidência tributária, norma abstrata que prescreve os elementos de hipótese e consequência deste tributo, seja ele um imposto, uma taxa, uma contribuição de melhoria, ou qualquer outra espécie que eventualmente fuja a esta tríade.

Neste sentido, com o objetivo principal de compreender os elementos que fundamentam essa teoria, serão trabalhados neste estudo os elementos da regra-matriz de incidência tributária a partir das lições de Paulo de Barros Carvalho (2005) e da leitura de Aurora Tomazini Carvalho (2009).

2 EM QUE CONSISTE A REGRA-MATRIZ: NORMA OU ENUNCIADO?

Em termos diretos, regra-matriz de incidência tributária é a norma jurídica, geral e abstrata, que determina a forma de incidência de um determinado tributo, o que se faz através da prescrição de critérios de hipótese e consequência para esta prestação pecuniária. Neste sentido, Paulo de Barros Carvalho (2005, p. 250) ensina que há subsunção de uma norma tributária “quando o fato (fato jurídico tributário constituído pela linguagem prescrita pelo direito positivo) guardar absoluta identidade com o desenho normativo da hipótese (hipótese tributária)”.

A partir da diferenciação proposta por Hans Kelsen entre texto normativo e norma jurídica (1998), a regra-matriz de incidência tributária deve ser vista como norma e não como enunciado normativo. Em verdade, os seus elementos são extraídos dos enunciados normativos das leis instituidoras de cada tributo (CARVALHO, 2005).

Nada obstante, cumpre observar que Aurora Tomazini Carvalho (2009), orientada por Paulo de Barros Carvalho, ao conceituar cada um dos critérios da regra-matriz de incidência os define sempre como “expressão” ou “enunciado”.

Por outro lado, embora cada um dos critérios (objeto) seja efetivamente constituído por enunciados normativos (linguagem), objeto e linguagem não se confundem, possuindo identidade própria cada um, de modo que os critérios não são os próprios enunciados.

(...) Ambos têm identidade própria. Mas, apesar dos signos serem autônomos, devido a sua natureza, eles só existem em razão dos objetos a que aludem, porque precisam de algo para se referir.(grifo nosso). (CARVALHO, 2009, p. 402).

3 OS ELEMENTOS DA REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA

Superada essa análise terminológica, os critérios de hipótese da regra-matriz indicam, em “número finito, mas não determinado” as situações em que o tributo deve incidir (CARVALHO, 2009, p. 288). Noutro passo, os critérios de consequência indicam, igualmente em “número finito, mas não determinado”as notas da incidência de um tributo, isto é, os elementos da relação jurídica criada a partir da subsunção da norma tributária ao fato (CARVALHO, 2009, p. 302).

Conforme ensina Paulo de Barros Carvalho (2005), são elementos de hipótese o material, o espacial e o temporal; e de consequência o pessoal e o quantitativo.

O critério material “delimita o núcleo do acontecimento a ser promovido à categoria de fato jurídico”, sendo a sua estrutura composta por um verbo seguido de um complemento capaz de particularizar a ação. Evidenciando a importância da sintática no estudo da regra-matriz, Aurora Tomazini Carvalho ensina ainda que este verbo deve ser necessariamente pessoal, “pois pressupõe que alguém o realize”. (CARVALHO, 2009, p. 289-290).

Por sua vez, o critério especial delimita os locais fisicamente considerados nos quais incide a norma tributária (CARVALHO, 2005). Luciano Amaro (2007, p. 267), embora sem fazer referência à regra-matriz de incidência tributária, ensina que na análise deste âmbito espacial é preciso, além da verificação do “âmbito espacial de aplicação da lei”, averiguar a existência de possíveis isenções regionais, até para solucionar eventual conflito normativo. Anote-se, contudo, que, embora relacionados, são institutos distintos o campo de vigência territorial e o critério espacial, segundo Aurora Tomazini Carvalho (2009).

O critério temporal estabelece o momento em que a ação nuclear deve ocorrer para que incida a norma tributária, nascendo uma obrigação pecuniária compulsória, podendo este momento vir de forma expressa ou implícita no enunciado linguístico da norma instituidora do tributo (CARVALHO, 2005).

Não basta que a ação nuclear da regra-matriz de incidência tributária seja praticada em local por ela alcançado. Para que a norma tributária incida e a obrigação tributária nasça é preciso ainda que tenha sido cometida num determinado lapso temporal, pois, como diz Aurora Tomazini Carvalho (2009, p. 298):

(...) Toda ação, por mais simples que possa parecer, pressupõe uma série de atos, e por isso, pode ser desmembrada cronologicamente em várias outras ações ou, se preferirmos, em fatores de uma ação mais complexa.

A autora (2009), partindo desta premissa, ensina que para demarcar esse marco temporal, o legislador, por vezes, simplesmente seleciona um determinado momento, como o último dia do ano; e, por outras, seleciona um fator da ação, isto é, um dos instantes que integram o momento da ação, como, por exemplo, o instante em que um produto importado entre em território nacional.

Sobre os elementos de consequência (pessoal e quantitativo), vale a ressalva feita por Aurora Tomazini Carvalho (2009, p. 302) de que “configuram a informação mínima necessária para a identificação do vínculo jurídico a ser instaurado”, não havendo, por outro lado, empecilhos para que a lei aponte outras características da relação, as quais também poderão ser utilizadas na regra-matriz.

O critério pessoal permite ao intérprete determinar os sujeitos da relação jurídica tributária ou, em outros termos, quem deve adimplir com a obrigação pecuniária dela decorrente e a quem deve ser adimplida. Se um dos polos da relação for composto por mais de um sujeito, trata-se do instituto da responsabilidade solidária. (CARVALHO, 2005).

Embora somente através da regra-matriz de incidência tributária seja possível estabelecer com precisão os sujeitos da obrigação tributária, o Código Tributário Nacional, entre seus artigos 119 e 123, traz disposições gerais sobre estas figuras, preceituando que o sujeito ativo é sempre pessoa jurídica de direito público e que o sujeito passivo pode ser contribuinte – quando a relação do sujeito for pessoal e direta com o fato jurídico tributário – ou responsável – quando a obrigação decorrer da lei, e não de uma relação pessoal e direta do sujeito com o fato jurídico tributário.

Com fundamento no Art. 7º do Código Tributário Nacional, Eduardo Sabbag (2011, p. 678) ensina que “as pessoas jurídicas de Direito Público podem ser titulares, por delegação, das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos (parafiscalidade), ou executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária”. Neste sentido, o autor classifica o sujeito ativo da obrigação tributária em direto – quando se tratar dos próprios entes tributantes – e indireto – quando se tratar de entes parafiscais.

E, por derradeiro, o critério quantitativo estabelece a prestação a ser adimplida pelo sujeito passivo da obrigação tributária, e, por conseguinte, o direito do sujeito ativo (CARVALHO, 2005).

Aurora Tomazini Carvalho (2009) prefere o termo “prestacional” para se referir a esse elemento da regra-matriz de incidência. É que enquanto Paulo de Barros Carvalho trabalha a regra-matriz sob a ótica tributária, ela o faz pelo prisma da teoria geral do Direito. E, conforme ela própria, nem todo objeto de qualquer relação jurídica pode ser quantificado, tal qual ocorre no Direito Tributário, onde a obrigação é sempre pecuniária.

Dito tudo isto, é possível afirmar que a regra-matriz estabelece como (critério material), onde (critério espacial) e quando (critério temporal) a norma tributária incide, além de quem (critério pessoal) fica vinculado à obrigação tributária criada por esta incidência, e a que (critério quantitativo) estas pessoas ficam vinculadas.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da doutrina de Paulo de Barros Carvalho, pode-se afirmar que a incidência de um tributo depende, imprescindivelmente, da existência de todos os seus elementos de hipótese e de consequência, os quais corporificam a regra-matriz de incidência tributária e possuem uma relação de interdependência, de modo que a ausência de um deles faz com que a presença dos demais seja irrelevante juridicamente. Em termos mais claros, um tributo somente incide quando, onde e da forma que a regra-matriz de incidência tributária enuncia, vinculando somente quem ela prescreve e pelo que ela prescreve.

Na realidade, é a regra-matriz quem define as hipóteses de incidência de um tributo, com todos os seus elementos. Além dos critérios de hipótese (como, onde e quanto incide o tributo), ela determina ainda os critérios de consequência (quem e o que se vincula à hipótese). Logo, toda a compreensão da própria estrutura tributária depende, em primeiro lugar, do entendimento acerca de sua regra-matriz de incidência.

REFERÊNCIAS

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 1988.

BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF. 1966.

CARVALHO, Aurora Tomazini. Teoria geral do direito: o constructivismo lógico semântico. São Paulo: PUC/SP, 2009. 623 p. Tese (Doutorado) – Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2009.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. Tradução de Luís Carlos Borges. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

SABBAG, Eduardo Manual de direito tributário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.