Vários artigos, teses e outros trabalhos acadêmicos já trataram do desempenho de alunos de 1o, 2o e 3o graus, todos eles discutindo problemas de produção de textos. Pécora (1983), Lemos (1977) e Geraldi (1986) e outros lingüistas levantaram essa questão, porém alertam para o estudo das condições de produção escrita às quais o aluno é submetido para expressar o seu pensamento. Pécora, descobre quais são os problemas mais comuns da produção textual de acadêmicos e chama a atenção para a análise dos critérios de caracterização dos problemas; também afirma que o texto do aluno não é exatamente a sua palavra, não conta a sua história, mas a já contada na escola e pela escola.

Assim, entendo que muitas dessas dificuldades do ensino/aprendizagem do texto escrito se explicam pelo fato de a escola operar com um modelo de língua que retira as marcas lingüísticas da subjetividade, como: a dialogicidade, a intersubjetividade e a historicidade do texto. A escola tem trabalhado com artificialidades, ao que Lemos considerou como estratégias de preenchimento, onde a organização do discurso não resulta da reflexão sobre o tema, porém de uma matriz ou esquema pré-estabelecido. Nesse caso, na visão de Geraldi, ocorre uma perda da dimensão discursiva durante a produção do texto pela interferência da imagem do professor.

Desse modo, o aluno nunca se torna sujeito do seu dizer, e as práticas de ensino de redação não dão conta das suas condições concretas de produção. Por isso não pode haver domínio da escrita sem domínio da língua de modo interativo em que o aluno diz algo de alguém para outro alguém, que tenha uma função social representativa de um autor sobre seu mundo e que se justifique como prática histórica.

Em se tratando de analisar textos de alunos, torna-se mais cômodo e até mais fácil considerar os casos de desvios, erros, inadequações, etc.; no entanto, o mais urgente e árduo é superar os limites dessa confortável posição e buscar os motivos destes, numa perspectiva interacional, professor e alunos juntos numa cumplicidade que comporte o diálogo e a troca.





Para isso, sugiro, aos educadores, abandonar a idéia de que a competência textual resulta de dons como criatividade e inspiração. Também, a idéia de que a redação não se ensina nem se aprende deve ser rejeitada (espontaneísmo), pois isto afasta a escola e o professor do seu papel de interventor na ação educativa, especialmente em se tratando de ensino de produção de textos.

Pensando numa teoria vinculada à prática, considero a abordagem pragmática, em plena expansão, como um estudo real da utilização da linguagem, a análise do modo como os enunciados têm um sentido em determinadas situações não se limita a análises estruturais de fonética, morfologia, sintaxe e semântica, mas ao como o usuário utiliza a linguagem em contexto de situações ou atos discursivos. As tentativas para situar a linguagem em uso no âmbito de uma teoria pragmática provocam outros problemas, conceitos operatórios e análises decorrentes de outros ângulos de estudo da linguagem: da teoria da enunciação, da análise do discurso, da semiótica, da lingüística textual e da lingüística aplicada.

A problemática que levanto para mudanças acontecerem no ensino de redação na escola e na aprendizagem efetiva do aluno acerca da escrita provoca a necessidade de um esforço conjunto entre a Lingüística, a Filosofia da Linguagem, a Psicologia Social, a Sociologia e a Psicanálise; tudo isso para ser possível descrever o fenômeno e seu funcionamento. Isso, na opinião de Geraldi (1996:53), constitui-se de uma mudança de concepção:



Antes de mais nada, o deslocamento da noção de representação para a noção de trabalho lingüístico exige incorporar o processo de produção de discursos como essencial, de modo que não se trata mais de apreender uma língua para dela se apropriar, mas trata-se de usá-la e, usando-a, aprendê-la. Em segundo lugar, a eleição do acontecimento enunciativo como lugar de produção de língua faz intervir a noção de movimento, de modo que processos como a metáfora e a paráfrase se tornam lugares da ação com e sobre a língua dos sujeitos envolvidos no ensino- aprendizagem.



A meu ver, o ato de passar a palavra ao aluno para ele se exibir em suas histórias, aceitando-as, é uma exigência do próprio objeto de ensino e não só um compromisso com a ideologia das classes populares. Nesse ponto, também‚ concordo com Geraldi quando afirma ser esse proceder já uma metodologia.

Em Marxismo e Filosofia da Linguagem essa posição de Bakhtim fica clara; ele expõe a necessidade dessa abordagem em linguagem e em todos os domínios das ciências humanas, como psicologia cognitiva, a etnologia, a pedagogia das línguas, a comunicação, a estilística, a crítica literária, e coloca, de passagem, os fundamentos da semiologia moderna. Enfim, faz uma análise sobre as relações entre linguagem e sociedade, do ponto de vista da dialética acerca das estruturas sociais.

Analisando o papel social da escrita, no cotidiano de quem ensina/aprende, acredito que o objetivo do ensino de redação na escola é preparar cidadãos conscientes para atuar na sociedade como produtores competentes de textos, nas mais diversas situações, dizendo por escrito o que tem a dizer e não o que se espera que seja dito. Para isso, é preciso que nela se multipliquem os projetos interdisciplinares, as atividades multidisciplinares e as relações interacionais entre professores e alunos, no uso concreto e efetivo da língua escrita.

Nessa perspectiva e com tais objetivos, as escolas atuais já vêm incorporando eixos básicos e domínio de habilidades, como: a relação entre ler e escrever; os objetivos pragmáticos; os aspectos textuais da língua; a escrita como complemento da oralidade; o texto escrito como espaço e interlocução; o professor como orientador da produção de textos; o texto como ponto de partida e de chegada; o aluno como sujeito do fazer lingüístico através do permanente aprendizado da escrita.