RESUMO


A prisão provisória está prevista no Código de Processo Penal Brasileiro, com a fundamentação básica de assegurar a ação da justiça, preservando provas e garantido a segurança da sociedade. Mantendo o criminoso em custódia, mesmo antes do trânsito em julgado de setença penal condenatória, facilita as investigações policiais e evita-se a fuga do criminoso até que seja julgado. É uma medida cautelar da justiça que contraria as garantias e direitos individuais asseguradas na constituição do Brasil e na declaração universal dos direitos humanos, no entanto a medida, é por muitos, considerada ilegal, em virtude dos direitos que foram constituídos. Apesar de ser contraditória ou ilegal, é uma medida necessária para a ação da justiça e é dessa forma que deve ser pensada.
É preciso mudar a opinião pública que se formou a respeito da prisão provisória, que a entende como uma prisão arbitrária e abusiva, porque ocorre antes da apuração da verdade, mas é preciso entender que sem essa forma de ação, não se poderá chegar a verdade nas maiorias dos crimes, onde a falta de uma ação imediata da justiça pode implicar em riscos para a segurança social. É claro que precisamos encontrar técnicas de ação mais coerente com a nossa evolução social e cultural. Esperamos que as prisões sejam instrumentos para resolver o problema de segurança e ordem social e não casas de concentrações de criminosos onde se estabelece comandos para o crime.




INTRODUÇÃO


Redigir um discurso sobre a prisão requer um entendimento do que significa a liberdade individual. Prisão e liberdade são contradições que fazem parte de uma amostragem de força e poder por parte do Estado e de uma problemática envolvendo a organização social e a segurança do indivíduo. O teor dos disparos críticos depende muito de uma concepção de uma liberdade individual e segurança para viver em liberdade.
Procurei produzir um discurso com fidelidade à temática da prisão provisória, explorando a possibilidade de uma participação social mais ativa no processo de direito e justiça.
Mesmo não podendo apontar um caminho seguro para superar de uma forma mais humana a questão da punição com privação da liberdade, o discurso desenvolvido não deixa de ser um percurso para um avanço rumo a um sistema mais coerente com a sociedade civilizada.
Foi necessário justificar as razões, os problemas e a necessidade de reformular as medidas cautelares que permitem a prisão provisória.












A RAZÃO DA PRISÃO PROVISÓRIA
A JUSTIÇA NÃO PODE ESPERAR



Por mais que se procure tornar a justiça eficiente ao ponto de reduzir os índices criminais, ela se mantêm restrita apenas ao poder de punir, sem nenhum efeito para redução das práticas criminosas. Por séculos a justiça, aplicou o suplício e a humilhação pública dos criminosos. O uso da tortura no período medieval e até mesmo nos regimes militares de nossa história contemporânea chegou aos extremos na exploração de todos os modos que se conseguiu imaginar até então. No período medieval, o suplício serviu de espetáculo público, mais não serviu para inibir os atos criminosos. Na execução das penas, a ação da justiça, passou a ser vista como uma ação criminosa e o criminoso que suportava a pena do suplício com coragem, passou a ser visto como um herói, pelo povo, porque uma vez condenado à morte com as piores torturas que se poderia imaginar, não havia nada mais a temer, e desafiava o poder do Rei, dizendo contra o sistema, tudo o que o povo tinha vontade de dizer. Tal fato somado ao triunfo do capitalismo conduziu o poder judiciário à reformas onde se procurou uma divisão do poder de punir e a preservação da reputação pública, limitando-se a justiça mais a julgar, que a punir.
Nas reformas que vêm sendo feitas, a modalidade da pena deixa de atingir o corpo, procurando atingir apenas a liberdade e a economia. A prisão representa um modo medieval de punir. É uma pena contraditória ao sistema capitalista, pois se mantêm criminosos parados totalmente, sem produzir, gerando apenas custos para o Estado.
A prisão é necessária para substituir a importância da justiça para atingir a liberdade através de outras formas que ofereça segurança para a sociedade. Por enquanto, a prisão continua sendo o único meio para deter o criminoso. Ainda assim, não se pode considerar esse meio, totalmente seguro. As prisões enfrentam os problemas, de rebeliões cada vez mais constantes e difíceis de controlar. A própria natureza do criminoso em geral, impossibilita a justiça de abrir mão da prisão na aplicação de pena, porque de outros recursos não sugerem efeitos. Para o criminoso pouco importa se é privado de alguns direitos, se fica sem documentos de identificação, se é divulgado como perigoso. O criminoso não necessita de documentos de identificação para praticar crimes e se é divulgado como perigoso, isso só o torna mais respeitado pelos comparsas no mundo do crime, o que para ele é bom.
O criminoso carrega uma contradição que se define em um agir cada vez mais indiferente aos seus deveres e cada vez mais atento aos seus direitos. Os direitos impõe como uma força maior, limites à justiça, impossibilitando-a de chegar aos deveres e usá-los para a sua realização.
A prisão provisória tem o seu sentido voltado para garantir ou assegurar a apuração dos fatos, evitando a ausência dos envolvidos e que se apresentam como suspeitos, garantindo a preservação das provas. Mas se há um mandato de prisão provisória, tem que haver nisso um subentendimento de culpa, que pode ferir o direito, pondo a justiça em contradição com os nossos direitos constitucionais, onde prevê a nossa Constituição Federal no artigo 5º parágrafo LIV, quando diz que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens, sem o devido processo legal. E no parágrafo LVII do mesmo artigo diz ainda a Constituição, que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
Para que se prenda uma pessoa, é preciso, considerá-la culpada de algum crime. Se a prisão é provisória é porque não houve ainda o trânsito em julgado da sentença penal condenatória e a pessoa que é presa provisoriamente, está sendo considerada culpada, antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, ou não poderia ser presa senão houvesse a consideração da culpa. Torna-se portanto, a prisão provisória, uma medida que contribui para a realização da justiça, mas que por outro lado fere um dos conceitos mais relevantes da justiça, sobre a culpa.
A justiça torna-se historicamente insuficiente para ações imediata. Faltas de estruturações físicas, de pessoal e entraves na própria legislação, causa morosidade na ação da justiça e é essa morosidade que exige medidas como a prisão provisória, para assegurar a ação da justiça dentro de sua morosidade.
Somente um grande investimento em estruturas físicas e de pessoal poderá agilizar os processos, tornando a prisão provisória desnecessária.
Mesmo sendo provisória, a prisão conserva o seu caráter de penalidade, e como tal, só poderia pela lógica, atingir aquele que é considerado culpado, tendo já o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
Desenvolver novos conceitos sobre provas e testemunhas pode possibilitar uma ação mais rápida por parte da justiça contribuindo para suprimir a necessidade da prisão provisória. Um estudo sobre considerações de evidências por exemplo pode oferecer fundamentações para aplicações de penas dispensando apresentações de provas concretas, pois em todo crime existirá sempre, a culpa ou dolo, mais provas concretas, nem sempre existirão, principalmente nos crimes dolosos, onde o criminoso, enquanto mais frio e calculista ele for, agirá sempre com os cuidados e providências para ocultar as provas e armas do crime.
Para se chegar a definição de uma lei que possa substituir a prisão provisória e que seja aceita universalmente, é preciso partir da reunião dos conceitos éticos já elaborados, sobre a liberdade humana e a privação dessa liberdade. Não se pode negar avanços de estudos a nível internacional sobre a questão de direitos, mas buscando a discussão sempre dentro da especialidade própria do direito, perdendo contribuições importante de especialistas dos diversos ramos de formação em ciências humanas, para discutir a liberdade individual e a privação da liberdade quando se torna insuficiente a aplicação das medidas judiciais para garantir a segurança pública.
A prisão provisória possui uma razão que a justiça encontra e considera, para assegurar a sua própria realização, onde não pode ela faltar. Trata-se no entanto de uma medida que pode garantir, a ação da justiça, mas agindo, a mesma, fora da lei. Mas é uma medida que em muitos casos se faz necessário sua aplicação, onde envolve fatores que podem oferecer risco à sociedade. Se permite-se a permanência do suspeito do crime em liberdade, põe em risco a vida de testemunhas que estão sendo arroladas no processo de apuração da verdade sobre o crime e aplicação de pena. Outro fator relevante é a possibilidade que o suspeito de crime, enquanto livre, tem para fugir da ação da justiça. Em certas situações de crimes, ou a justiça decreta a prisão de quem seja suspeito, ou tem a relação com o crime, mesmo antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, ou busca primeiro julgar o ato e fica impossibilitada de punir, devido ao desaparecimento do criminoso. Mas quando se decreta uma prisão provisória, a justiça está usando de um recurso, do poder de punir, que é um poder que o Estado adquiriu historicamente sobre o cidadão. Independente de leis que determinam ações, a justiça procura manter-se suprema na questão do poder.
A razão científica fica distante de qualquer conclusão quando se discute medidas de aplicações penais para determinados crimes, sem discutir paralelamente, medidas de prevenção que possam ser trabalhadas a nível de educação social. O próprio código penal poderia ser transformado em uma disciplina em seus conceitos básicos e que muito poderia contribuir na formação do cidadão, já desde a adolescência, no ensino básico. Existem mais razões na lógica de investir prevenindo o crime que investir no combate ao crime. Construi-se uma moral social que traz em si, condições para reduzir os índices de criminalidade. O devido conhecimento das leis por toda a sociedade pode dar a cada cidadão, uma visão clara de seus limites no seu relacionamento social, que pode evitar uma série de desentendimentos que tendem a levar as pessoas, a cometimento de crimes contra a vida. Muito do tempo que juizes poderiam estar dedicando a julgamentos de crimes graves, agilizando os processos, é perdido em julgamento de pequenas causas, pelo simples fato de uma ou ambas as partes dos envolvidos na causa, não ter conhecimento das leis.
A Constituição Federal cuidou de prever no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias no Art. 64 a distribuição gratuita de um exemplar da Constituição do Brasil a cada cidadão brasileiro (Art. 64. A Imprensa Nacional e demais gráficas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, promoverão edição popular do texto integral da Constituição, que será posta à disposição das escolas e dos cartórios, dos sindicatos, dos quartéis, das igrejas e de outras instituições representativas da comunidade, gratuitamente, de modo que cada cidadão brasileiro possa receber do estado um exemplar da Constituição do Brasil.) É lei constitucional que está em vigor a mais de dez anos e até hoje, eu particularmente, não vi, uma escola pública, uma biblioteca pública, um cartório, um quartel militar, nenhuma instituição que seja mantida pelo Poder Público distribuir edição popular do texto da Constituição a um só cidadão brasileiro, e se eu tenho um exemplar, é porque o comprei em uma livraria a preço de qualquer outro livro do mesmo número de páginas.
O pouco conhecimento da constituição que a população brasileira no geral, possui, trata-se de citações ocasionais pelos meios de comunicação, mais referidamente, o jornalismo do rádio e da televisão.
A educação na escola precisa ter uma ênfase voltada para o condicionamento à vivência social, onde o direito deve ser a disciplina principal. O direito não pode ser tratado como uma ciência de advogados e juizes, mas de toda a população. Uma sociedade que tem bom conhecimento de suas leis e direitos torna-se imune à corrupções e inibe as diversas práticas de crimes em seu meio. Uma sociedade bem informada, pode participar ativamente na elaboração de leis para que se possa de uma forma melhor, praticar a justiça com observação plena dos direitos humanos. Enquanto isso não acontecer, a justiça estará prejudicada para tratar dos crimes que exigem uma ação imediata com a prisão dos criminosos para garantir a segurança social e proteger provas e testemunhas.
Para que possa haver uma prisão provisória é necessário que tenha havido um crime e que o criminoso tenha sido identificado e uma lei aceita internacionalmente, definindo e ordenando a prisão imediata do criminoso independente do julgamento do ato. O julgamento dar-se-á nesse caso para analisar as particularidades do crime, ou a individualidade do criminoso e a duração da pena de acordo com a análise da individualidade do criminoso.
A elaboração de leis facilitando o ato de punir da justiça, se por um lado pode tornar a justiça mais eficiente, por outro lado abre uma janela para que se cometa abusos de poder servindo-se da lei e pessoas sejam punidas injustamente, porque o maior problema nesse caso não está na lei, mas na pessoa que a executa, que pode ter natureza passível à corrupção. Uma lei que regulamente a prisão provisória deve ser tratada com o máximo de cuidados para que junto apresente recursos para evitar abusos de autoridades policiais no cumprimento da lei.
A prisão provisória possui razões que a opinião pública desconhece porque não há um sistema de informações para orientar a população sobre a ação da justiça. Desorientada sobre o assunto, a população não compreende a ação da justiça quando acompanha a prisão de um criminoso e a sua soltura em pouco tempo, por falta de provas. Na medida em que isso acontece, vai sendo transferido para a opinião pública, um conceito negativo sobre a justiça. Um conceito de incompetência e irresponsabilidade. Ao mesmo tempo que a opinião pública pode receber como abuso de poder, a prisão sem antes, dar-se o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, pode também receber como incompetência e irresponsabilidade a soltura de criminosos por falta de provas. Isso compromete a confiança pública na justiça. Se no entanto a população, recebesse orientação esclarecendo razões e necessidades da prisão provisória para garantir a ação da justiça e a segurança pública, a população poderia até participar de uma forma ativa promovendo ações para apoiar a justiça a prender ou manter presos, criminosos, sem a necessidade de ficar esperando o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, condenada pela morosidade dos processos.
Com o auto índice de criminalidade que o país possui, é preciso discutir uma máxima da justiça que tem sido priorizada por muitos juizes na hora da sentença. "É melhor absolver um criminoso que condenar um inocente." Vamos analisar as conseqüências em caso de erro da justiça. Se por erro, um inocente é condenado, o prejuízo será para ele e para seus dependentes. Sofrerá pai, mãe, cônjuge e filhos. A pena atingirá além do condenado, as pessoas que fazem parte do círculo familiar. O erro da justiça causará conseqüências que não podem ser avaliadas, mas que estão limitadas ao condenado e às pessoas que o cercam. Se a justiça absolve um criminoso e o deixa livre, ele, sendo criminoso pode praticar uma série de outros crimes com conseqüências que não podem ser avaliadas, se trata-se de um criminoso de periculosidade, coloca-se em risco um número imprevisível de vidas humanas. Absolver um criminoso pode evitar o erro de condenar um inocente. È uma questão que traz de cada lado, um peso que deve ser avaliado para que se tome essa máxima ou que se apoie nela decisões na hora de proferir sentenças.
O uso da medida cautelar deve se dar sempre em situações extremas, onde a seguridade do processo ameaça escapar ao controle da justiça, ou a liberdade provisória do acusado seja ameaça para a segurança social.
"De acordo com o artigo 311 do código de processo penal brasileiro qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz de ofício, a requerimento do ministério público ou do querelante, ou mediante representação policial." (Luiz Antônio Câmera, Prisão e Liberdade Provisória, Juruá Editora, Curitiba, 97). Quando a medida é aplicada tendo como referência, uma triagem realizado por um delegado, de elementos apresentado pela autoridade policial, tem-se o interesse da autoridade policial em legitimar sua atuação e ignora-se o direito de defesa. Nisso encontra-se uma janela para os abusos de autoridade. Quando o indiciado tem garantido o seu direito de defesa, a autoridade age com maior cautela para evitar a possibilidade de ser desmentido pelo mesmo, caso tem de servir-se de provas falsas para incriminá-lo.
Toda situação que é apresentada à justiça depende apenas de uma questão de poder. E esta questão de poder é uma questão relacionada à posse. A justiça é um serviço caro para quem dela necessita e tem se firmado mais como um serviço de finalidade lucrativa com total monopólio de sua função e das vantagens que dela retira. Esta situação quase que mercadológica da justiça torna ainda mais drástica a aplicação da prisão provisória porque a pessoa que é acusada tem um direito garantido de provar sua inocência, mas para isso precisa se dispor de recursos para mobilizar advogados. Os recursos são necessários porque o estado não mantêm profissionais a disposição para atender a qualquer cidadão que precise se defender de uma acusação. A situação é sempre emergencial, de tal forma que uma pessoa acusada não pode esperar pela disponibilidade de recursos público. No constrangimento de uma prisão que se pode afirmar arbitrária, qualquer pessoa sente-se humilhada e denegrida perante o seu grupo social. O desespero e a insegurança que é provocado pela situação leva a pessoa, forçosamente a se desprender de todos os recursos que pode para garantir a própria liberdade e proteger sua imagem pessoal. Em tal momento de angústia e desespero o Estado não pode dar assistência, como é obrigado a dar, porque não cuida de reservar recursos para isso, mantendo uma estrutura mínima de apoio para descaracterizar a omissão, porque é do direito de todo cidadão que recebe uma acusação, ter assistência jurídica por parte do Estado. A pessoa angustiada age impensadamente, vítima por um momento inoportuno que pode significar um grande prejuízo abalando o equilíbrio financeiro e até mesmo profissional da pessoa.
Se a justiça se dispõe de tal medida cautelar para garantir sua atuação evitando a impossibilidade de agir e isso pode ser considerado como uma afronta a lei maior que trata das garantias e liberdade individuais, não se pode negar tal medida como uma grande necessidade para o sistema jurídico. É preciso no entanto discutir até em que ponto, a justiça deve respeitar a liberdade individual para não ferir os direitos à liberdade. A justiça acaba se omitindo diante de intenções de crimes, porque precisa esperar o flagrante. Não basta o criminoso estar tentando praticar algum crime. Ele precisa estar praticando o crime para que a prisão seja legitimada pelo flagrante. É louvável a observação dos direitos e garantias individuais, mas enquanto se cuida para não feri-los, são os mesmos direitos e garantias feridos no âmbito coletivo da sociedade. Aqui é preciso separar pessoas de bem daquelas que são mal intencionadas por agir de forma criminosa.
A lei e o direito devem ser para as pessoas que cumprem um contrato social firmado com o Estado. O rompimento desse contrato social que se firma para manter a ordem e a organização da sociedade, deve implicar no rompimento das garantias e direitos que o cidadão goza dentro da sociedade. Só isso tornaria a justiça livre para agir e garantir de fato a ordem social. A ação criminosa deve sempre implicar na perda dos direitos e garantias individuais, para que possa o direito ser mantido para aquele que observa e cumpre o contrato social, caso contrário, a justiça jamais estará apta a cumprir o seu papel, porque será sempre impossibilitada para agir, no cumprimento do seu papel de julgar e punir.
Quando a prisão contraria alguma lei ou desrespeita a Constituição, principalmente no tocante as regras dos direitos humanos, ela é constatada como ilegítima e neste contexto a prisão provisória tem por sua própria natureza um enquadramento maior dentro da ilegitimidade. Os recursos da justiça são fechados por alegações de lesões aos direitos privados, os direitos e garantias individuais devem ser observados com muito critério pela justiça para evitar prisões ilegais e privações da liberdade individual.
Enquanto mais se protege a liberdade, mais se cria condições para destruir os meios de garanti-la porque o criminoso, ou o transgressor, pode agir privando a liberdade e a paz das pessoas de bem e as pessoas de bem, para não se tornarem transgressoras de leis, não podem privar a liberdade do criminoso. Isso porque todos são iguais perante a lei. É uma igualdade que exalta o injusto e humilha o justo. A justiça torna-se tão complicada que as pessoas que zelam por uma conduta exemplar, mesmo sendo ofendidas e necessitando dos serviços da justiça preferem relevar os infortúnios, para não se envolver em nenhum processo complicado da justiça, que pode gerar um custo alto e um desfecho imprevisível que tanto pode resolver o problema reclamado como pode torná-lo ainda mais embaraçoso.
Cria-se a justiça para resolver os problemas de conflitos dentro das relações sociais e acredita-se hoje que é sempre melhor resolver os problemas longe da justiça. As pessoas que precisam da justiça, fogem da justiça para evitar o incômodo do processo de julgamento. Numa avaliação de uma pessoa que deseja estar em paz, o crime é menos incômodo que a justiça.
É preciso que haja uma ampla discussão do Código Penal envolvendo a participação social e cobrando resoluções do legislador, que não precisa passar pela observância da Carta Magna, desde que sejam resoluções aprovadas abertamente pela sociedade, porque é preciso armar a justiça com poderes e recursos para garantir, de fato, a paz social e proporcionar segurança para o cidadão. Não se pode é claro, deixar de criar mecanismos para evitar o abuso de poder, mas é preciso dar à justiça, condições para fazer justiça. Mudar na Carta Magna o teor que impõe tais restrições dentro de um consenso social envolvendo participação de todas as classes pode ser uma mudança legítima. A prisão deve ser analisada de um ponto de vista legal. A prisão devidamente legitimada pela lei tem sua finalidade questionada quando se avalia a recuperação do criminoso capacitando-o à vida social e também às estruturas do sistema carcerário. Se não pode oferecer recuperação de fato ao criminoso tornando-o uma pessoa confiante no retorno ao convívio social, então só se pode ser compreendido como um resíduo do sistema de punição do período medieval. Um sistema que necessita ser substituído por um meio que tenha realmente uma eficácia provada e que possa modificar o caráter da pessoa. Um novo sistema de fazer justiça visando em primeiro lugar a reparação dos danos causados sem usar agressividade contra a pessoa. Um sistema judiciário que tenha respeito pelo ser humano e busque educá-lo dentro de um nível de respeito e valorização que a princípio pode parecer contraditório, mas que tem respostas positivas em países como o Japão, onde em respeito ao preso, tira-se os calçados para entrar em sua sela.
O sistema de prisão no brasil é violento porque o preso é submetido às péssimas condições apresentadas por estruturas físicas e monitorados por profissionais preparados mais para repreendê-los que para contribuir com uma orientação para a recuperação das fraquezas apresentadas e que levaram a um modo de agir de forma criminosa e que denunciam uma falha no sistema educacional.
É difícil manter o preso que tem sua prisão legitimada por um processo legal com o trânsito em julgado e sentença penal condenatória. Quando se trata de pessoa que possui recursos excedentes paga-se pela liberdade, dando lucro ao sistema judiciário e a pena não lhe resulta em nenhuma correção. Aplicar medidas cautelar que fere direitos e garantias individuais dentro de um sistema onde o que é legítimo é precário, é contribuir com a falência do sistema que apresenta uma situação, fugindo do controle do poder maior do Estado, que é o poder de punir. Podemos no entanto encontrar um grande número de situações que iniciaram com a prisão provisória sendo depois relaxada e concedida a liberdade provisória, onde o acusado comete uma série de outros crimes, deixando provado que a medida cautelar apesar de ferir formalmente direitos humanos, é necessária para garantir a segurança social e preservar provas. No aspecto geral, a sociedade não é prejudicada porque se aplica uma medida cautelar a um criminoso ferindo direitos humanos. A sociedade é beneficiada porque vê medidas de justiça sendo tomadas para garantia da ordem social.
O trânsito em julgado de sentença penal condenatória é uma trégua longa que permite ou oferece uma possibilidade ao criminoso para que fuja da acusação e da justiça. As amplas possibilidade de articulações de defesa por parte do criminoso, mesmo quando se sujeita ao julgamento deve ser entendido como possibilidade de fuga. Nosso sistema judiciário não se comporta como uma justiça certa e aplicada, mais sim, uma luta de poder, onde vence aquele que consegue articular melhor um teatro, montando cuidadosamente para defesa ou acusação. Criando um cenário de falência para o sistema judiciário.
Se é tão difícil legitimar a prisão, mesmo quando não há dúvidas sobre a autoria do crime, como entender então, as superlotações de presídios. Partindo desse pressuposto, as pessoas que lotam nossos presídios, ou são criminosos de alta periculosidade e reincidências constantes nos atos criminais ou fazem parte de um não poder que forma uma massa incapaz para defender-se. Com tantos recursos de defesa que os direitos individuais sustentam para manter a liberdade, torna-se até difícil entender como se realizam as prisões. São tão poucas as situações que a legitimam que comparados aos direitos e garantias individuais parece impossível imaginar prisões super lotadas. Um complicador que surge em toda questão de justiça é que não há uma regra que sirva em todos os casos. As punições não podem ser tabeladas porque cada situação é diferente.
O crime é sempre um ato particular e deve ser avaliado dentro das particularidades do criminoso. A prisão provisória permite que seja realizada a análise do crime avaliando a individualidade do criminoso. São os fatores que envolve essa individualidade que devem influenciar na aplicação da sentença penal condenatória.
Para que não se cometa erros, a própria justiça exige uma avaliação de todos os aspectos do criminoso. A pena deve envolver o entendimento perfeito do crime tratado. Essa busca de análise da individualidade apesar de significar um julgamento diferenciado em virtude da razão e da emoção do criminoso, o que contraria a igualdade de todos perante a lei, é um entrave para o alcance dos objetivos de punir para inibir a ação criminosa.
Um trabalho sério e minucioso. Uma tabela de aplicação de penas em relação a cada situação. Esse processo no campo religioso, tabelando sacrifícios ou penitências a uma relação de modos de agir, fora da aceitação do grupo ou dos conceitos de fé, garantiam as ordens religiosas por milênios de anos e um sistema judiciário estruturado por essa forma pode alcançar o mesmo êxito no controle da segurança pública e na manutenção da ordem social.
O período medieval pode ser tomado como referência para discutir o tema porque é praticamente a base que deu origem ao nosso sistema. A história do nosso sistema judiciário teve suas manifestações extremas do poder de punir no período medieval com desenvolvimento de técnicas de torturas. É claro que não se pode pensar a prisão através de uma lógica medieval. Ela deve ser pensada dentro da lógica capitalista. A tortura medieval foi o trauma de toda uma geração. A época marca o período máximo de abuso do poder de punir, marcando o final da época, o início de um retrocesso dos métodos utilizados, permanecendo por um longo tempo como armas nas ditaduras militares. Também estas com o tempo retrocederam pressionadas por sistemas de capitalismo.
O poder judiciário sempre procurou manter o tradicionalismo, resistindo às mudanças sistemáticas do poder. Tida sempre como dona da verdade, as alterações de leis e direitos sempre significaram para a justiça a admissão de um erro, motivo que influenciou a resistir à mudanças. Surge o direito adquirido e a não retroação da lei para não tirar a verdade da justiça. Questão de ordem lógica, mas que atribui para aceitação de mudanças.
A infalibilidade do sistema entra em crise com a dificuldade de resolver os problemas sociais de ordem jurídica. A própria justiça é muitas vezes processada e obrigada ao pagamento de indenização por conta de erros e imputação de penas a quem provou não merecer. O maior risco da justiça em gerar motivos e processos indenizatórios é justamente quando se utiliza da medida cautelar na aplicação de prisão provisória. Não sendo possível provar a acusação deixa-se um direito de processo indenizatório que pode ser oneroso para o Poder Público. Nós não podemos concordar com erros judiciários. Se há erros, há de haver ação reparatória e a justiça não pode faltar à essa responsabilidade. Com tantos fatores de ordem problemática envolvendo a questão da prisão provisória, devemos discutir a manutenção de tal medida cautelar. Se é realmente necessária. Se está tendo resultados eficazes para garantir um andamento seguro de processos e investigações criminais onde exista o risco de se perder provas ou ameaça da segurança de pessoas envolvidas. Para manter a medida cautelar é preciso reforçar as fundamentações teóricas levando em consideração cada aspecto, tentando atender às exigências dos direitos humanos, mas não permitindo a impunidade. O que precisa ficar claro, é que mesmo contrariando os direitos e garantias individuais, a prisão provisória se justifica pelas razões que exigem uma ação rápida da justiça. São razões estabelecidas por circunstâncias graves e cautelosas que não podem esperar por provas concretas e a morosidade de um processo até chegar ao trânsito em julgado de uma sentença penal condenatória para que seja então, aplicado a pena. Sem o uso de tal medida, a justiça fica impossibilitada para agir. As provas do crime podem ser facilmente alteradas. O criminoso pode fugir facilmente e permanece como ameaça à segurança social.
Para Michel Foucaut em sua obra Vigiar e Punir, depois do período medieval, não é a punição, mas a certeza de ser punido é que deve inibir o crime. É uma concepção correta. A impunidade que se apresenta na atualidade serve como incentivo a práticas criminosas. Hoje podemos perceber nas ações criminosas a segurança com que age o criminoso. Sabe que ninguém pode prende-lo facilmente. Ninguém se sente seguro para denunciá-lo, menos ainda para testemunhar contra ele. Mesmo o poder judiciário passando por reformas, utilizando meios de punições aplicadas com moderação, dando um direito de defesa, que é hoje, um direito de fato, se mantesse uma estrutura de poder capaz de vigiar e não permitir a impunidade de forma que todo crime, não importando a gravidade, fosse investigado e não deixasse de ter os autores identificados, nem de sofrer algum tipo de punição, a justiça com certeza conseguiria inibir atos de crimes reduzindo os índices de criminalidade.
Só a certeza de ser punido é que pode parar o criminoso. Mas se o nosso sistema legal de prisão é deficiente na ação recuperadora, das distorções dos padrões morais, estabelecidos pela sociedade. Deve se questionar a finalidade da prisão provisória quando é desfechada pelo trânsito em julgado de sentença penal condenatória, onde ela passa a ser legal em virtude do trânsito em julgado e da sentença condenatória e não há recursos para a aplicação da sentença. A política néo-liberal é favorável a privatizações das prisões e é isso com toda certeza que buscará realizar dentro do Estado para socorrer o sistema judiciário da crise que se agrava cada vez mais. Isso pode levar o Estado a perder através da privatização, o seu aparato de poder. O Estado terá com isso uma grande mudança de característica, que poderá comprometer a sua estrutura e a sua função social, porque não será mais o Estado que oferecerá segurança ao cidadão, mas as empresas privadas.
"Uma coisa com efeito é clara: a prisão não foi primeiro uma privação de liberdade a que se teria dado em seguida uma função técnica de correção; Ela foi desde o inicio uma detenção legal encarregada de um suplemento corretivo, ou ainda uma empresa de modificação dos indivíduos que a privação de liberdade permite fazer funcionar no sistema legal. Em suma, o encarceramento penal, desde o início do século XIX, recobriu ao mesmo tempo a privação da liberdade e a transformação técnica dos indivíduos" (FOUCAULT, Michel, Vigiar e Punir, 19º Ed. Vozes, 99.
A prisão no brasil é uma questão complicada, não tanto pela prisão em si, mas pelas condições que obriga o preso a suportar dentro dos presídios. São condições desumanas, que serão sempre reprovadas por qualquer comissão de avaliação que se preze dentro de conceitos morais e éticos. São prisões construídas em suas maiorias, em regimes de ditaduras militares, com o objetivo único de reprimir. É preciso haver uma reforma em todo sistema. A prisão moderna deve ser construída, oferecendo condições dignas de trabalho para os profissionais que devem trabalhar na monitoração dos internos, Os internos devem ser tratados com respeito para que aprendam a respeitar. A finalidade original da prisão é substituir a aplicação dos suplícios e dar oportunidade ao criminoso para aprender a respeitar a lei e viver de acordo com o contrato entre o Estado e a sociedade, que é um contrato que mantêm na servidão uma grande parcela da sociedade, mas é um contrato de paz de direitos e garantias individuais.
O Estado não pode se omitir no papel de garantir a segurança de cada cidadão. A prisão provisória não teria uma existência necessária, se houvesse uma vigilância constante. Uma vigilância quantitativa e eficaz. Assim, todas as prisões necessárias seria por competência do policiamento, prisões em flagrante, o que é constitucionalmente legal e sem embaraço para a justiça.
É preciso saber que não são os grandes crimes que perturbam a sociedade. Os grandes crimes perturbam apenas o Poder Público, aqueles que estão no poder político ou econômico do Estado. Os crimes que perturbam a sociedade são os pequenos crimes de arrombamentos à residências, à veículos e são crimes que hoje se dão em um número tão elevado que a justiça, quando procurada, diz não poder fazer nada e é justamente nesse ponto que a sociedade precisa ser atendida e amparada pelo Estado. Devia ser direito constituído a cada cidadão, processar o Estado, quando tivesse sua residência arrombada, ficando os criminosos impunes. O não poder estar seguro na própria casa deve implicar em responsabilidade do Estado.
O mais comum na aplicação da prisão provisória é em crimes contra o Estado, para que o direito seja garantido. Crimes contra a vida em regra geral aguardam pelo trânsito em julgado de sentença penal condenatória e muitas vezes os processos são engavetados, como se fosse os processos é que devessem cumprir na gaveta, a pena do condenado.
No estágio em que se encontra o processo de globalização da economia, envolvendo as relações entre uma nação e outra, o que mudará no sistema judiciário, nas formas de penas impostas pela lei?! Com certeza as mudanças terão que atender em primeiro plano, as tendências econômicas. Para a sociedade no geral, já não há mais justiça, porque a privação da liberdade só é discutida em benefício do criminoso. A população não se sente segura para sair durante o dia ou durante a noite, para trabalhar ou para um lazer com a família, traumatizada pelo número elevado de arrombamentos à residências. Não há liberdade para sair. Não há o direito de ir e vir, sem o risco de ser molestado por criminosos.
É preciso discutir o direito social dentro das normas e morais estabelecidos na sociedade. É preciso que a lei diferencie as pessoas. Todos deverão ser iguais perante a lei, na consideração econômica, religiosa, étnica, mas não na consideração da conduta social. Quem trabalha, tem bons relacionamentos, não possui antecedentes, necessita ter crédito com justiça, ter um tratamento diferenciado em relação a quem a suspeita é evidente e apresenta conduta social duvidosa e se já possui antecedentes criminais. Quando a justiça trata todos iguais perante a lei, mostra-se cega, porque formada por um corpo de especialistas não consegue fazer distinção entre criminoso e vítima sem o trânsito em julgado.








CONCLUSÃO


O nosso sistema judiciário enfrenta uma crise que apresenta tendências ao agravamento. É formado por um número reduzido de profissionais que está se renovando e uma renovação que está fazendo surgir efeitos. Possibilidades em aumentar esse número de profissionais é uma questão que parece fugir do interesse do Estado. As grandes prisões que o Estado mantêm, assustam a sociedade, que sabe do perigo que representa o que está dentro e que pode tomar as ruas a qualquer momento. A sociedade não consegue se livrar do criminoso, ela precisa mante-los nas prisões e não há vaga nas prisões. Não há onde empregar o número crescente de criminosos. Se não há como comportar e manter prisioneiros presos legalmente, já com uma sentença condenatória determinando o cumprimento da pena de prisão, de que forma poderemos tornar eficaz a aplicação da prisão provisória. Não estamos podendo manter a definitiva, o que vamos fazer com a provisória?
É certo que a justiça precisa assegurar sua ação. Tem suas razões bem justificadas em relação ao crime, mas em relação à sociedade, qual a colaboração que traz para garantir de fato a segurança. O problema maior da opinião pública sobre a prisão provisória, não é tanto a questão de ferir direitos e garantias individuais, mas o fato de prender e soltar é que mais incomoda, porque gera uma falta de confiança na justiça.





BIBLIOGRAFIA.

CÂMERA, Luiz Antônio, Prisão e Liberdade Provisória, Juruá Editora, Curitiba, 97.
FOUCAULT, Michel, Vigiar e Punir: nascimento da prisão; Trad. Raquel Ramalhete, 19º Ed. Petrópolis, Vozes, 1999.
MARQUES, José Frederico, Tratado de Direito Processual Penal, Saraiva S.A, São Paulo, 1980.
Constituição da República Federativa do Brasil; Org. Juarez de Oliveira. 1º Ed. Saraiva, 1988.