Religião e razão são complementares ou antagônicos? Só pela razão não se pode penetrar os mistérios da fé. Muitos tentaram unir fé e razão (Tomás de Aquino), outros julgaram-nas inconciliáveis (Pascal). De qualquer forma, a religião se apresentou para o pensamento ocidental como uma “anti-racionalidade” ou uma irracionalidade: Kierkegaard, por exemplo, entendia a religião como um campo de contradições e paradoxos.

O mito e a religião são formas de explicar a realidade e possuem real homogeneidade, como atesta o fato de tradições míticas comuns serem encontradas entre os povos mais diversos. Da mesma forma, o pensamento (ou sentimento) religioso é o mesmo entre as diferentes crenças. O simbolismo da fé aparece em sua essência em todas as formas de crença. Contudo, o mito em si não é teórico, é não-sistematizável e não-empírico. A filosofia, por seu lado, procura interpretar as alegorias dos mitos. É preciso considerar, todavia, que a tentativa de explicar lógica e racionalmente o mito acaba por matá-lo. A abordagem atual na interpretação dos mitos procura revelar a estrutura de significação inconsciente que presidiram à sua criação. Busca-se, pelos vieses objetivo e subjetivo descobrir o(s) motivo(s) ou objeto(s) que os originaram. Para Freud, tal origem está na questão da sexualidade puramente. Há porém, estreita ligação entre o mito e a arte, em especial a poesia. Diferentemente da arte, contudo, o mito se prende ao real que lhe fornece o objeto. Por outro lado, o mito também é dinâmico e, como tal, não se prende a uma realidade estática, ele mescla o conceitual com o perceptual (emoção e razão).

O pensamento mítico não é analítico, mas fluido, seu mundo não é o da constância e generalidades, mas de embate de forças, de conflitos. O sentimento, assim, é parte essencial do mito, e assim, coisas inertes ganham vida e, por conseqüência, novos e múltiplos sentidos e significados. Por isso o mito se distingue da verdade como esta é entendida pela ciência. E é por isso também que a ciência procura apagar a experiência do mito, só o conseguindo, porém, parcialmente, no seu aspecto cosmológico, e não no antropológico, uma vez que o mito é estruturante do homem e este acaba por criar mitos e mitificar a própria ciência. O homem não vive sem mitos, e o melhor meio de entendê-los é buscar o seu sentido qualitativo, muito mais do que o empírico-quantitativo. O mito não é engessado no dogma, mas é vivo e dinâmico: o mito é ação, uma ação que se origina no social, de onde se projeta a vida. O pensamento mítico entende a realidade como um conjunto de elementos que se relacionam misticamente e daí brotam os sentidos que significam para um sujeito coletivo. Desse modo, é preciso ver a realidade conforme via o pensamento mítico para bem compreender o próprio pensamento mítico. Para tanto, é preciso uma conexão entre os elementos da realidade que formam um todo.

Perceber o todo e senti-lo, e mais, perceber-se parte do todo. Nessa forma de pensamento, o que vale é o sintético e não o analítico. A natureza é a sociedade da vida, na qual o homem está inserido como mais um membro do todo, e não como algo externo ou superior.