A PROIBIÇÃO DO NEPOTISMO NO PODER JUDICIÁRIO: um grande passo para o acesso à justiça

 

 

Roberto Fernandes da Silva 

Rômulo Moraes Chagas[1]

 

 

Sumário: Introdução; 2 Conceitos preliminares acerca do CNJ; 3 O que é nepotismo; 4 (Co) Relação do anti-nepotismo como o acesso à justiça; 5 O CNJ e sua atuação contra o nepotismo; Conclusão

 

RESUMO

 

Parte-se do conceito de que o Conselho Nacional de Justiça, por ser órgão supervisor do Poder Judiciário e controlador dos deveres dos juízes, este por sua vez deve zelar pelo bem da sociedade, e assim sendo criar normas para igualar a população, ou seja, não permitir que uns tenham mais privilégios que outros. Sendo assim, o CNJ deve conter de todas as formas práticas de nepotismo no Poder Judiciário, pois com esta prática de “laços familiares” apenas uma parte da população se beneficia, o que está totalmente errado. Dessa forma, o CNJ edita a Resolução n° 7, coma finalidade de extinguir toda prática de nepotismo existente no Poder Judiciário.

 

PALAVRAS-CHAVE

 

              Conselho Nacional de Justiça. Nepotismo. Acesso à Justiça.

 

INTRODUÇÃO

 

O Conselho Nacional de Justiça tem um papel fundamental no acesso à justiça, pois é um órgão voltado à melhoria do Poder Judiciário e um melhor serviço público de prestação da justiça, ou seja, é um órgão fundamental para a consolidação de um eficaz acesso à justiça, se inserindo nesse sentido a uma prática injusta e antiga prevalecente no nosso sistema judiciário, qual seja o nepotismo, e este será o tomo principal do artigo.

Neste artigo, se fará necessário investigar a essência do Conselho Nacional de Justiça no que tange constitucionalmente e politicamente o problema referente ao nepotismo na engrenagem do Poder Judiciário, fazendo uma ligação essencial ao acesso à justiça, pois a proibição do nepotismo foi um grande marco para a caminhada de uma justiça igualitária, com um melhor acesso por parte da sociedade, além de apontar a importância do CNJ na consolidação de uma ordem democrática.

             

2 CONCEITOS PRELIMINARES ACERCA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

O Conselho Nacional de Justiça foi criado pela Emenda Constitucional 45/2004, com sede na Capital Federal, sem nenhuma função jurisdicional, e com a finalidade de supervisionar a atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, também controlando o cumprimento dos deveres dos magistrados; é presidido pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal. A composição do CNJ não vem a comprometer a independência do STF, assim não tendo o poder de julgar, pois esta é uma função do Judiciário, como bem destacou o STF, sendo citado por Alexandre de Moraes:

Como bem salientou o Supremo Tribunal Federal, a composição híbrida do CNJ não compromete a independência interna e externa do Judiciário, porquanto não julga causa alguma, nem dispõe de atribuição, de nenhuma competência, cujo exercício interfira no desempenho da função típica do Judiciário, a jurisdicional. [2]

Este Conselho é composto por 15 membros, sendo a maioria membros do Poder Judiciário, podendo ser dividido em: membros do Judiciário, membros das funções essenciais à Justiça (advocacia e Ministério Público) e membros da sociedade escolhidos pelo Legislativo. O STF, citado por Moraes, afirmou que a existência de outros membros, estes não sendo magistrados, vem facilitar o acesso da sociedade ao Judiciário, ou seja, facilitando o acesso à Justiça. Vejamos essa afirmação:

Como afirmado pelo Supremo Tribunal Federal, a existência, no Conselho, de membros alheios ao corpo da magistratura, além de viabilizar a erradicação do corporativismo, estende uma ponte entre o Judiciário e a sociedade, permitindo a oxigenação da estrutura burocrática do Poder e a resposta a críticas severas. [3]

O CNJ não é um órgão controlador do Poder Judiciário e da magistratura nacional, pois, sempre que necessário, as decisões tomadas por este Conselho poderão ser impugnadas, haja vista a “competência para o processo e julgamento de eventuais ações propostas será sempre do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, I, r, da Constituição Federal”.[4] Sua constitucionalidade é marcada por três importantes características, quais sejam: ser órgão integrante do Poder Judiciário, sua composição apresentar maioria absoluta de membros do Poder Judiciário e possibilidade de controle de suas decisões pelo STF. Diante dessas características, é notável a constitucionalidade do Conselho, as quais reforçam, também, o ordenamento jurídico brasileiro, assim o tornando “sua cúpula administrativa, financeira e disciplinar”. [5]

Como já foi dito, ficou estabelecido na EC n° 45/04 o poder do CNJ de controlar a atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, além de controlar o cumprimento dos deveres dos juízes. Sendo assim, são algumas das competências do Conselho Nacional de Justiça: a) zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito da sua competência, ou recomendar providências; b) representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso de autoridade; c) rever, de oficio ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano.

Com o intuito de garantir a total eficácia do CNJ, ficou estabelecido na EC n° 45/04 a criação, por parte da União e do Distrito Federal e Territórios, de ouvidorias de justiça, as quais têm competência para receber denúncias e reclamações contra os membros do Poder Judiciário, estas logo sendo apresentadas ao Conselho. Dessa forma, é possível notarmos uma preocupação com a sociedade, pois com a criação desta emenda garantiu-se um maior acesso à justiça, levando-se em conta a tentativa de um maior controle administrativo e financeiro do Poder Judiciário.

2.1 Conselho Nacional de Justiça, órgão constitucional?

A Emenda Constitucional 45/04 foi questionada pela Associação dos Magistrados do Brasil quanto a sua constitucionalidade no que diz respeito à criação do Conselho Nacional de Justiça, fundamentando seu questionamento na possibilidade da Emenda ter violado ao Princípio da Separação de Poderes e ao Princípio Federativo. A tese de afronta ao Princípio da Separação de Poderes foi rejeitada pelo Tribunal, este “enfatizando que, tal como concebido, o Conselho Nacional de Justiça configura órgão administrativo interno do Poder Judiciário e não instrumento de controle externo, e que, em sua maioria, os membros que o compõem são integrantes do Poder Judiciário”. [6] Logo, não fora aceita a impugnação referente à afronta ao Princípio Federativo.

3 O QUE É NEPOTISMO?

 

Chama-se de nepotismo o vínculo de parentes nas relações de trabalho, o qual substitui a avaliação de competência do indivíduo, desfavorecendo uma grande parte da população, pois em se tratando de cargo público a relação de parentesco na maioria das vezes prevalece. Ou seja, como bem define o Conselho Nacional de Justiça, nepotismo é:

A prática que viola as garantias constitucionais de impessoalidade administrativa, na medida em que estabelece privilégios em função de relações de parentesco e desconsidera a capacidade técnica para o exercício do cargo público. O fundamento das ações de combate ao nepotismo é o fortalecimento da República e a resistência a ações de concentração de poder que privatizam o espaço público. O nepotismo está estreitamente vinculado a estrutura de poder dos cargos e funções da administração e se configura quando, de qualquer forma, a nomeação do servidor ocorre por influência de autoridades ou agentes públicos ligados a esse servidor por laços de parentesco. Situações de nepotismo só ocorrem, todavia, quando as características do cargo ou função ocupada habilitam o agente a exercer influência na contratação ou nomeação de um servidor.[7]

Com a finalidade de supervisionar o Poder Judiciário, o CNJ, em 18 de outubro de 2005, editou a Resolução n° 7, a qual pôs fim a práticas de nepotismo do Poder Judiciário. Logo após três anos da edição desta resolução, o STF decidiu que nepotismo é uma prática proibida constitucionalmente, sendo vedado em todos os Poderes da República.

 

4 (CO) RELAÇÃO DO ANTI-NEPOTISMO COM O ACESSO A JUSTIÇA

 

Com base no renomado autor do livro Acesso à Justiça, Mauro Cappelletti, entende-se que o acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental, o mais básico dos direitos humanos de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos[8]. Nessa perspectiva encaixa-se perfeitamente o Conselho Nacional de Justiça, o qual tem um papel fundamental no acesso à justiça, pois é um órgão voltado à reformulação de quadros e meios no Judiciário, sobretudo no que diz respeito ao controle e à transparência administrativa e processual viabilizando um aperfeiçoamento do judiciário e um melhor serviço público de prestação da justiça.

Em face do ora exposto, inserirmos neste momento uma relação fundamental entre o ato de proibir o nepotismo como forma de garantir um ditame no acesso à justiça, pois, tal acesso constitui a principal garantia dos direitos subjetivos em torno do qual giram todas as garantias destinadas a promover a efetiva tutela dos direitos fundamentais, amparados pelo ordenamento jurídico. Abordando um viés constitucional, a Constituição declara em seus direitos fundamentais a igualdade a todos, o nepotismo principalmente no âmbito jurídico e na administração pública vai contra tal principio da igualdade, pois, quando funcionários desses ramos são nomeados por uma simples indicação de um parente até mesmo de terceiro grau que está hierarquicamente acima no quadro institucional acaba cometendo uma grande injustiça, quando deveria conquistar a vaga num processo seletivo honesto, o concurso público.

Inserindo-nos restritamente ao âmbito judiciário é contraditório um magistrado que deve prezar e argüir de condutas ilibadas se valerem de tamanha injustiça que é a contratação de parentes sem nenhum processo seletivo justo, ou seja, o magistrado que compõe tal ato acaba se valendo de injustiça para proveito próprio ou de parentes promovendo uma injustiça notória até mesmo transformando nesta perspectiva um ente público em parte privado, pois o magistrado deveria e deve dar exemplo congruente com condutas ilibadas perante a sociedade.

A Resolução nº 7, de 18 de outubro de 2005, editada pelo CNJ, vedando, entre outras práticas, o exercício de cargo de provimento em comissão ou de função gratificada, no âmbito do Tribunal ou juízo, por cônjuge, companheiro ou parente, em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados, bem como dos servidores investidos em cargo de direção ou de assessoramento. Tal resolução significa um grande passo para um pleno acesso a justiça e um grande avanço nos objetivos do CNJ que é a transparência administrativa e processual viabilizando um aperfeiçoamento do judiciário e um melhor serviço público de prestação da justiça consolidando uma moralização da justiça brasileira tirando seu caráter elitista além de fazer valer os princípios constitucionais fundamentais do Brasil e sua respectiva constituição.

 

5 O CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA E SUA ATUAÇÃO CONTRA O NEPOTISMO

O Conselho Nacional de Justiça como vimos é um órgão voltado para melhoria do judiciário em vários âmbitos e uma dessas melhorias foi de extrema importância para o cenário jurídico brasileiro que foi o combate ao nepotismo no poder judiciário. Como já  era “costume” a nomeação de parentes e “afins” pelos magistrados sem um honesto processo seletivo o CNJ se propôs a resolver o problema e com tamanha competência editou a Resolução nº 7, de 18 de outubro de 2005, vedando, entre outras práticas, o exercício de cargo de provimento em comissão ou de função gratificada, no âmbito do Tribunal ou juízo, por cônjuge, companheiro ou parente, em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados, bem como dos servidores investidos em cargo de direção ou de assessoramento com o intuito de proibir o nepotismo e excluir essa prática tão injusta no poder judiciário brasileiro.

O caríssimo Alexandre de Moraes membro do Conselho Nacional de Justiça em uma entrevista concedida ao jornalista Wallace Nunes, do jornal Gazeta Mercantil, em uma quinta-feira (08/02/2007), faz uma breve citação a respeito do nepotismo que é de grande importância:

O nepotismo foi um dos grandes problemas que tivemos que resolver. Obviamente que houve uma reação, pois foi uma medida traumática para vários tribunais. Entretanto, o Conselho teve uma postura rígida e rápida. Foi polêmico e ganhou repercussão na mídia porque se criou a idéia de que o Conselho estaria legislando para acabar com o nepotismo. Essa polêmica ganhou força quando editamos a resolução n° 7. Mas em nenhum momento foi idéia nossa legislar. O que fizemos foi pegar uma competência constitucional. A Constituição Federal determina que o CNJ deva fazer valer para o Judiciário o princípio da legalidade, moralidade, eficiência e todos os dispositivos do artigo 37. E com base nisso, proibimos o nepotismo.[9]

               

Em outro ponto da entrevista o caríssimo Alexandre de Moraes explica o processo de formação da resolução que proíbe o nepotismo:

Aplicamos os princípios constitucionais e pegamos um parâmetro que o Congresso Nacional havia estipulado para os tribunais federais. Utilizamos a definição do nepotismo exatamente como que está na lei federal. Nós interpretamos a Constituição e estendemos a vedação aos parentes e afins até terceiro grau. Não inventamos, não legislamos. Mas gerou uma celeuma muito grande e acabou caindo no Supremo. Para o CNJ foi muito bom. O Supremo deu um passo adiante que o Conselho ainda não havia dado e reconheceu o poder normativo primário do CNJ. O nepotismo não afetou nenhum juiz de primeira instância. Eles não nomeavam parentes. A partir de então, trabalhamos e verificamos quase 3000 casos de nepotismo. Fizemos a analise de caso por caso, desconstituímos a nomeação, porque não poderíamos editar uma norma geral para vedar.[10]

É notório que o CNJ fez valer a constituição principalmente pelo fato da resolução ter aprovação do STF fazendo valer a constituição, pois, de acordo com a Súmula Vinculante n° 13, que dispõe da seguinte maneira:

Nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

Em suma o CNJ na resolução acaba cumprindo sua função constitucional e fazer valer alguns princípios constitucionais que são o da igualdade e da eficiência além de elencar o artigo 37 da Constituição Federal, que determina a observância dos princípios da moralidade e da impessoalidade na administração pública e notou-se que de fato não existe uma lei nacional impeditiva da prática do nepotismo como demonstra o artigo 37 da constituição federal e o CNJ com analise a isto propõe a resolução e o STF fundamentando em sua decisão que o nepotismo é ilícito por força do princípio da moralidade, bem como dos demais dele decorrentes, abrigados no artigo 37, caput, da CF de 1988 acata a resolução assim iniciando uma luta árdua contra práticas tão arcaicas e injustas como é o nepotismo.

 

6 CONCLUSÃO

 

Diante o exposto, percebe-se que o CNJ, como órgão controlador do Poder Judiciário, deu início a uma importante luta contra o nepotismo ora existente no Judiciário. Com a Resolução n° 7 editada pelo CNJ e sua aprovação pelo STF, constata-se que o CNJ acaba cumprindo sua função constitucional, principalmente zelando pelos princípios constitucionais mais essenciais à sociedade e promovendo uma moralização à Justiça.

 Sendo assim, conclui-se que ainda há muito a permear para se atingir uma justiça igualitária e uma eficaz consolidação do acesso à Justiça. Felizmente, o CNJ ainda cumpre com sua função, a de zelar pela melhoria do Poder Judiciário, assim o fiscalizando e controlando, para que não haja mais práticas tão maléficas à sociedade, como o nepotismo.

Referências

CAPPELLETTI, Mauro, GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1988.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. O que é nepotismo? Disponível em: <http://www.cnj.jus.br>

MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de Direito Constitucional. 3. ed. ver e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.

MORAES, Alexandre de. Curso de Direito Constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

MORAES, Alexandre de Moraes. É preciso ampliar o acesso à Justiça. Jornal Gazeta Mercantil. Brasília, 08 de fevereiro de 2007. Disponível em: <http://ouro01.cnj.gov.br/>

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 29. ed. revista e atual. São Paulo: Malheiros, 2007.



[1] Alunos do 3º período noturno do curso de graduação em Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB, turma 2010.1. E-mails: [email protected]; [email protected].

[2] MORAES, Alexandre de. Curso de Direito Constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

[3] Ibid.

[4] MORAES, Alexandre de. ob. cit.

[5] Ibid.

[6] MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de Direito Constitucional. 3. ed. ver e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.

[7] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. O que é nepotismo? Disponível em: <http://www.cnj.jus.br>

[8] CAPPELLETTI, Mauro, GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1988.

[9] MORAES, Alexandre de Moraes. É preciso ampliar o acesso à Justiça. Jornal Gazeta Mercantil. Brasília, 08 de fevereiro de 2007. Disponível em: <http://ouro01.cnj.gov.br/>

[10] MORAES, Alexandre de Moraes. ob. cit.