A PRESCRIÇÃO DESLEIXADA O CÓDIGO PENAL E A OBSCURIDADE DO LEGISLADOR NA PUNIÇÃO DE MÉDICOS NEGLIGENTES Autor: Francisco César Gregório de Oliveira Júnior¹ Coautor: Rafael Lopes de Morais² Coautor: Cícero Fernandes de Figueiredo³ Somos involuntariamente envoltos por diversos princípios e garantias constitucionais que nos abrangem por toda a vida, no objetivo de prover o necessário para o desenvolvimento natural, social, psíquico e racional. Deste modo, somos detentores de direitos passivos relacionados ao nosso nascimento, ou seja, somos constitucionalmente contemplados com o direito a saúde, a previdência social, a segurança e etc. todos esses, direitos positivados obrigacionais do Estado para a coletividade. Para garantir estes direitos, o Estado conta com a ajuda de pessoas físicas e jurídicas que, aliadas a este, devem garantir dia a dia o cumprimento das leis e cláusulas pétreas às quais estamos protegidos, passando pelos principais direitos, até os mais ínfimos, porém, de importância gigantesca para uma sociedade democrática de direito. Advogados, professores, médicos, etc. Todos os profissionais que são de extrema importância para o funcionamento de uma sociedade democrática de direitos, que fomenta o desenvolvimento coletivo. Os médicos, por sua vez, têm papel fundamental nas políticas públicas necessárias para o bom funcionamento do estado, profissionais dotados de conhecimento relacionados ao corpo humano, com inegável importância histórica, devem prezar e zelar pela manutenção da saúde pública, buscando garantir não somente o principal dos direitos: o direito à vida; mas agir com todas as ferramentas necessárias para garantir o direito à saúde. Diante de tamanha necessidade do Estado para com esses profissionais, o que se vê hoje é uma parte considerável dos médicos brasileiros usam dessa premissa, dessa importância, usando de arbitrariedade para com seus pacientes, descartando o juramento à qual foram submetidos Pertinente discussão é esta que mostra o total descaso do legislador brasileiro no tocante a punição desses profissionais que lesam os patrimônios mais importantes do cidadão: a vida e a saúde. É sabido que esta categoria profissional é beneficiada de todas as maneiras pelo legislador pátrio, com base na sua importância perante a máquina administrativa do Estado, porém, até onde pode ir esta falta de punição, esta liberdade que não pune a irresponsabilidade própria do médico, mas sim, do farmacêutico ou balconista que será tão prejudicado quanto o paciente? Neste artigo, abordaremos a problemática da má prescrição medicamentosa nos atestados médicos, no que toca tanto a má grafia, até a negligência de deixar de fora vários requisitos básicos para uma prescrição perfeita, recomendada pelo Conselho Regional de Medicina no seu Código de Ética. Não obstante a constante falta de médicos por cidadão brasileiro que assola o nosso país, e a deterioração da saúde que estamos passando, alguns profissionais pelos motivos mais variados, deixam de cumprir regras específicas de seus estatutos e leis de saúde nacional no tocante à prescrição de medicamentos, ou seja, é uma constante entre os médicos a falta de “cuidado” e “atenção” com a grafia e até deixar de fora alguns requisitos básicos necessários, ao prescrever medicamentos e determinar posologias para os seus pacientes, deixando os outros profissionais da saúde como enfermeiros, farmacêuticos e até balconistas de farmácias totalmente perdidos em relação ao medicamento ali escrito, podendo vir a calhar um mal mais danoso ao paciente. Culturalmente, estamos diante de uma espécie de folclore associado aos médicos: o uso indevido e desleixado da grafia; o que nos remota a uma problemática extremamente importante, dado que estamos tratando da vida de pessoas, da saúde de muitos que, às vezes não sabe nem ler e considera aquele médico parte da família, até mesmo um santo. O Código Penal brasileiro, em seu artigo 280 da parte especial, afirma de modo enfático “fornecer substância medicinal em desacordo com receita médica”, deixando de lado o fato de quando a receita já vem errada do médico? Ou quando a grafia é tão desleixada que à torna impossível de decifrá-la, afinal, nenhum profissional é obrigado a ser especialista em decifrar códigos. Assim, quando falamos de prescrição, falamos da maneira mais direta – depois da pessoal - que um médico comunica-se com a pessoa que irá fornecer aquele medicamento, bem como dando a segurança para o paciente levar adiante e saber quais medicamentos farão parte do seu tratamento. A receita, além de ser um documento extremamente importante para as pessoas em tratamento, trata-se – literalmente – do caminho que a pessoa levará para curar-se de sua condição, ou, se no pior das hipóteses, aliviar-se das mazelas causadas pela tal. O Código Penal é obscuro quando falamos da penalização desta conduta aqui em tela, fica claro que o legislador colocou panos quentes e protegeu os profissionais desta categoria, escolhendo por punir apenas aqueles que são “indiretamente” afetados por essa negligência de mão própria, pressionados pela má qualidade da saúde nacional, se veem obrigados a tentar adivinhar o medicamento ali escrito, para poupar o paciente de pegar novamente várias filas para o atendimento, para apenas pegar uma nova receita. Por isso, é de suma importância coibir e punir a prática deste ato tão danoso, que lesa o Estado na figura de seus cidadãos, praticando assim, ato de incolumidade pública danosa direta para à saúde pública. Sendo assim, estamos diante de um caso claro de obscuridade da justiça frente a uma problemática recorrente no dia a dia. É necessário que o legislador tome fortes providências quanto a esta conduta, dado que tratamos aqui, como supracitado, de um caso de saúde pública que não só é “levado na brincadeira” como é praticamente esquecido pelos doutrinadores do direito. Quando falamos de receitas médicas, estamos diante de um documento de vasta regularização proveniente de várias leis e estatutos, além do Código de Ética da medicina que regula e determina de maneira taxativa a prescrição medicamentosa por parte do profissional. O próprio Código de Ética Médica regulariza a forma de como a receita médica deve ser prescrita, nos termos do Art. 39 que afirma: “É vedado ao Médico: Art.39 – Receitar ou atestar de forma secreta ou ilegível, assim como assinar em branco folhas de receituários, laudos, atestados ou quaisquer outros documentos médicos.” Porém, o que vemos aqui é uma regra esparsa, sem maiores detalhes ou até mesmo uma punição que vise coibir a prática do ato; mas mesmo assim, já estamos diante de uma normatização legal que não deixa espaço para a prática negligente da má prescrição médica. Encontramos outra normatização sobre o assunto em tela, quando lemos a Lei n. 5991/73, que é a lei que “dispõe sobre o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos.”, sendo assim, damos vistas ao artigo 43 da lei supracitada: “Art.43 – O registro do receituário e dos medicamentos sob-regime de controle sanitário especial não poderá conter rasuras, emendas ou irregularidades que possam prejudicar a verificação de sua autenticidade. Os demais receituários também não deverão conter rasuras. Se presentes deverão ser justificadas em observações escritas, no mesmo receituário, pelo profissional.” Estes dois dispositivos já se configuram como eficientes fundamentações de bases teóricas para o problema aqui em tela, devido ao fato de que a receita médica se tratar de documento extremamente importante que, em seu conteúdo, carrega substâncias que usadas de maneira incorreta podem acarretar grandes problemas para o paciente, podendo levá-lo até ao óbito. O CRMP (Conselho regional de medicina da Paraíba) em cartilha distribuída para os médicos intitulada “Manual de Orientações básicas para prescrição médica”, lançada em 2009 versa de maneira taxativa os principais pontos que devem conter em uma prescrição médica eficiente, sendo os seguintes: a) Cabeçalho: impresso que inclui nome e endereço do profissional ou da instituição onde trabalha (clínica ou hospital); registro profissional e número de cadastro de pessoa física ou jurídica, podendo conter, ainda, a especialidade do profissional; b) Superinscrição: constituída por nome e endereço do paciente, idade, quando pertinente, e sem obrigatoriedade do símbolo RX, que significa: “receba”; por vezes, esse último é omitido, e, em seu lugar, se escreve: “uso interno” ou “uso externo”, correspondentes ao emprego de medicamentos por vias enterais ou parenterais, respectivamente; c) Inscrição: compreende o nome do fármaco(droga, remédio), a forma farmacêutica e sua concentração; d) Subscrição: designa a quantidade total a ser fornecida; para fármacos de uso controlado, essa quantidade deve ser expressa em algarismos arábicos, escritos por extenso, entre parênteses; e) Adscrição: é composta pelas orientações do profissional para o paciente; f) Data e assinatura. Vemos aqui um manual taxativo de como deve ser feita a prescrição médica de maneira objetiva e funcional, que, feita de maneira correta, facilita o entendimento de todos os profissionais que dependem do bom entendimento da receita, bem como o paciente, que estará ciente de quais drogas farão parte do seu tratamento. Diante disto, muitos médicos alegam que a falta de tempo e o excesso de pacientes é o motivo pelo qual eles não têm tempo de escrever com boa grafia ou ter cuidado com as receitas prescritas. Explicação totalmente infundada, tendo em vista que a conhecida “letra de fôrma”, além de ser mais fácil de ser escrita, é mais fácil de ser entendida e pode ser escrita de maneira bem mais rápida que a cursiva, além de livrar o paciente e os profissionais das idiossincrasias do médico, ou seja: “t” parecido com “l”, “a” parecido com “e” e etc. Neste foco, aponta Sabrina Vilarinho, estudante graduada em Letras em breve explicação sobre estes dois tipos de escrita: “O traçado simples das letras de fôrma dão maior liberdade no ato da escrita, ao contrário das “letras de mão” que precisam de uma organização maior. O ato de ligar uma letra a outra também dificulta o processo, pois anula a ação de tirar o lápis do papel e investir as forças na próxima letra, o que ordena um esforço motor maior.” Desta maneira, exclui-se a desculpa de que a letra desleixada e ilegível é culpa da falta de tempo, ficando claro que a letra de fôrma, além de ser recomendada pelo CRM (Conselho Regional de Medicina), é mais fácil e rápida, dando maior praticidade na hora de escrever. Podemos citar como exemplo o CREMERS (Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul) que através do seu site recebe denúncias de médicos negligentes nos atestados, podendo acarretar uma punição administrativa para o profissional. Além de tudo o que foi exposto acima, o médico tem de carregar consigo a consciência do “dever de cuidado” que sua profissão acarreta: um dever presente em todas as profissões, porém, mais latente quanto se trata da vida e da saúde, os dois pilares para todo e qualquer princípio e direito que o ser humano tem.