A PRERROGATIVA DA DESAPROPRIAÇÃO DO PODER PÚBLICO À LUZ DO PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO1

 

Jéssica Cristina P. B. Pinheiro e Jéssica Valéria S. Lima2

Prof. Dr. Leonardo Valles Bento3

 

RESUMO

 

Este paper se propõe a realizar uma análise crítica do princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, demonstrando que na desapropriação, que é procedimento de direito público, faz-se uma ponderação entre o direito individual à propriedade e o interesse público, verificando a presença de todos os pressupostos aptos à prevalência deste ultimo. Para isto, é condizente a utilização da regra de ponderação de valores, tendo em vista que não é lícito à Administração Pública valer-se de medidas restritivas do direito de propriedade dos particulares além daquilo que for estritamente necessário para a realização da finalidade pública almejada.

 

Palavras-chave: Supremacia do interesse público. Desapropriação. Princípio da proporcionalidade.

 

 

1 INTRODUÇÃO



O regime jurídico do Direito Administrativo é baseado por regras e princípios que visam resolver os conflitos entre a proteção da coisa pública e a busca do interesse público pela administração e da liberdade dos particulares contra o arbítrio do administrador.

A Administração pública, para cumprir seu escopo, se instrumentaliza com os poderes-deveres que ora colocam o administrador em posição privilegiada frente os particulares e ora impõe restrições ao agir do administrador no trato com a coisa pública.

O princípio da Supremacia do Interesse Público compõe o regime jurídico da Administração pública e é o postulado fundamental que baliza o agir do administrador na ponderação do interesse público e do interesse privado devendo ele, no exercício dos seus poderes-deveres, pautar-se na lei atendendo o interesse público.

Nesta análise, observar-se-á o conflito entre o princípio da supremacia do interesse público e o interesse privado diante da prerrogativa da administração pública em desapropriar, procedimento de direito público que gera a transferência de determinada propriedade para o Estado mediante prévia e justa indenização em dinheiro consoante artigo 5° da Constituição Federal.

Para isto, como não se pode excluir os princípios do ordenamento jurídico em detrimento de outro, é necessário se utilizar a regra da proporcionalidade, fazendo-se a ponderação de valores pelo intérprete jurídico onde um princípio prevalece no caso concreto afastando a aplicação do outro.

O procedimento da pesquisa será calcado em técnicas de pesquisas bibliográficas: coleta de dados, organização dos dados bibliográficos, análise, interpretação e redação. Sua finalidade é colocar o pesquisador em contato com o que já se produziu e registrou a respeito do seu tema de pesquisa, logo, vai se partir dos estudos de doutrinadores e pesquisadores do Direito Administrativo brasileiro, bem como das jurisprudências.

 

2 O PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERSSE PÚBLICO



A Administração pública pauta suas atividades nos princípios administrativos que estão expressos na Constituição Federal de 1988 cuja observância é obrigatória a todas as pessoas administrativas de qualquer dos entes federativos. A conduta destes só será considerada válida se estiver com patível com estas normas fundamentais. São princípios expressos: o princípio da legalidade (art. 5°, II, CF), o princípio da impessoalidade (art. 37, CF), o princípio da moralidade (art. 37, §4°, CF), o princípio da publicidade (art. 37, CF) e o princípio da eficiência (art. 37, caput, CF).

Existem ainda outros princípios que orientam o administrador público, porém estão implícitos no ordenamento jurídico brasileiro. Eles possuem a mesma relevância que aqueles e possuem forte reconhecimento da doutrina e da jurisprudência. Para José dos Santos Carvalho Filho (p.29, 2011) estes princípios são reconhecidos e dentre eles se encontra o princípio da supremacia do interesse público. Este pode ser depreendido de inúmeras regras constitucionais que a ele aludem ou impliquem sua manifestação.

As atividades do Estado devem se voltar para o interesse da coletividade e se não for assim estará caracterizado o desvio de finalidade pelo ente público. Pois não é o individuo em si o destinatário da atividade administrativa, mas toda a coletividade. Este princípio tem a sua gênese depois de superado o primado do Direito civil e do individualismo, que tornava o homem o centro das ciências e das normas. Atualmente, se prima pelo bem-estar social.

Hely Lopes Meirelles ensina que o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado “é inerente a atuação estatal e domina-a, na medida em que a existência do Estado justifica-se pela busca do interesse geral, ou seja, da coletividade; não do Estado ou do aparelho do Estado” (p. 108, 2011). Para o autor o interesse público é a própria condição de existência do Estado e ele é extraído da ordem jurídica em cada caso concreto.

Quando o interesse público e o interesse privado estão conflitando o correto é a prevalência do primeiro. Nesse sentido, vale ressaltar a lição de José dos Santos Carvalho Filho:

O indivíduo tem que ser visto como integrante da sociedade, não podendo os seus direitos, em regra, ser equiparados aos direitos sociais. Vemos a aplicação do principio da supremacia do interesse público, por exemplo, na desapropriação, em que o interesse público suplanta o do proprietário; ou no poder de polícia do Estado, por força do qual se estabelecem algumas restrições às atividades individuais (p. 29, 2011).

O autor observa que a própria prerrogativa da desapropriação mitiga o interesse privado. Este não é suplantado totalmente, o particular não fica a mercê do poder público, neste caso, pois a própria Constituição Federal prevê a indenização justa e prévia.

Vê-se então que a Administração, por este princípio, atua em um patamar de superioridade em relação ao particular, mas não significando o desrespeito aos direitos deste ultimo. A atuação estatal deve respeitar os princípios democráticos e os direitos fundamentais. Nas palavras de Maria Helena de Souza Marques Carneiro, “pondera-se que, a relação entre Estado e cidadão deve ser pautada no postulado da reciprocidade, o qual implica constante ponderação dos interesses reciprocamente relacionados, fundamentados na sistemática das normas constitucionais” (p. 11, 2012). Para ela, quando há o desrespeito por parte da administração pública, nos casos em que ocorrer desapropriação irregular ou ilegal, os proprietários dos imóveis declarados como de utilidade pública podem recorrer a Judiciário, caso entendam necessário, uma vez que supremacia não é sinônimo de arbitrariedade.

Entende-se que arbitrário é um ato que desrespeita o Direito e a Ordem Jurídica. Quando o Estado agiu ou se omitiu e a norma não permitia tal ação ou quando deveria agir e não agiu indo de encontro à norma.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro ensina que o princípio da supremacia do interesse público está expressamente previsto no art. 2°, caput, da Lei n° 9.784/99, e especificado no paragrafo único, com a exigência do “atendimento a fins de interesse geral, vedada renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei” (inciso II). Este princípio está presente “tanto no momento da elaboração da lei como no momento da sua execução em concreto pela Administração Pública” (p. 65, 2013). Para esta autora o princípio inspira o legislador e vincula a atuação da autoridade administrativa como anteriormente apontado. No primeiro caso, o interesse público ira prevalecer no momento de elaboração das normas de Direito Público, ao contrário do Direito Privado que contém normas de interesse individual. Porém, a mesma autora adverte que existem normas de direito privado que objetivam defender o interesse público como, por exemplo, as concernentes ao Direito de Família, e existem normas de direito público que objetivam defender o interesse privado como as de saúde, segurança pública e outras.

José dos Santos Carvalho Filho adota a posição de que a prevalência do interesse público é indissociável do direito público, pois, citando Saygués Laso, ele é a harmonia entre o Estado e o indivíduo (p. 30, 2011).

Alguns doutrinadores contrapõe o princípio da supremacia do interesse público com os direitos fundamentais dos indivíduos, afirmando que esta supremacia gera a ofensa das garantias constitucionalmente consagradas, necessitando-se fazer com que os interesses individuais prevaleçam por estarem baseados nestes direitos fundamentais. Porém, existe outra corrente, da qual José dos Santos Carvalho Filho se filia, que observa que o princípio em comento não viola qualquer garantia individual sequer. Pois quando o sistema jurídico assegura aos particulares garantias contra o Estado em certo tipo de relações é evidente que deve-se respeitar o interesse coletivo, pois este é corolário do regime democrático, calcado na predominância das maiorias (p. 30, 2011). Nesse sentido, é imperioso destacar o que ensina Isabelle de Baptista:

É a vinculação com o interesse dos indivíduos inserido numa comunidade que justifica a atuação estatal garantidora e protetora dos direitos e garantias fundamentais, evitando, por via de consequência, possíveis práticas injustificadas e indesejadas por parte das autoridades públicas envolvidas e responsáveis pela administração da res publica.

O intervencionismo estatal é justificado na medida em que assegura o bem-estar geral, que, nesse sentido, permite que os indivíduos desfrutem da liberdade e dos direitos constitucionalmente reconhecidos. (p. 58, 2013).

 

A atividade administrativa, assim, está adequada ao modelo de Estado Democrático de Direito, que baseia suas praticas de acordo com os fins do Estado constitucionalmente, que assegura os direitos e garantias fundamentais.

 

Para Maria Di Pietro “se a lei dá à Administração os poderes de desapropriar, de requisitar, de intervir, de policiar, de punir é porque tem em vista atender ao interesse geral, que não pode ceder diante do interesse individual” (p. 67, 2013). Atrelado, então, está a este princípio da supremacia do interesse público o princípio da indisponibilidade do interesse público, pois a administração não tem o poder de disponibilidade sobre o interesse público confiado à sua guarda e realização através dos seus poderes-deveres. Diante disso que é necessário, ainda, que se observe a regra da proporcionalidade para que haja a ponderação do interesse público e do interesse privado tendo em vista a prerrogativa da administração pública em desapropriar.

 

3 O INSTITUTO DA DESAPROPRIAÇÃO

 

A desapropriação é uma prerrogativa que goza a Administração Pública que decorre do princípio da supremacia do interesse público. Alguns autores entendem que o princípio da função social também é fundamento para o instituto, como acredita Nunes (2012). Segundo esse autor, junto com o princípio da supremacia do interesse público está a função social no tipo de desapropriação extraordinária, de modo que este serve como sustentáculo ao instituto uma vez que está previsto constitucionalmente que a propriedade atenderá a sua função social. O cumprimento desse pressuposto constitucional, segundo Benjamin e Milaré (2000) consiste em restrições ou limitações administrativas devido a imposição de obrigações positivas ou negativas aos titulares das propriedades.

Não obstante, a identificação do princípio da supremacia do interesse público neste instituto é indiscutível, considerado até mesmo a forma mais drástica de intervenção do Poder Público na propriedade privada, como enfatiza a advogada da União, Souza (2004) e Meirelles (2011), pois é uma forma de intervenção supressiva quando comparado com as outras modalidades que são restritivas, a exemplo, a servidão administrativa, tombamento, requisição. Nestas verificam-se a perda de algumas faculdades de domínio da propriedade ao passo que àquela compreende a perda da propriedade de forma obrigatória, privando alguém dessa propriedade.

O instituto consiste na possibilidade de transmissão da propriedade privada para o Poder Público, desde que presente os requisitos de desapropriação. Segundo Meirelles (2011), a desapropriação consiste na transferência compulsória da propriedade para o Estado ou seus delegados, através de indenização prévia, justa e em dinheiro, por motivos de necessidade, utilidade pública ou interesse social, exceto nos casos previstos pela CF de pagamento em títulos da dívida pública de emissão prévia do Senado Federal, no caso de área urbana, e de pagamento em título de dívida agrária. O mesmo afirma que este instituto é uma forma conciliadora do direito a propriedade com a função social.

A intervenção do Estado na propriedade privada é verificada desde os romanos, segundo Souza (2004), mesmo não identificada como nos moldes atuais de desapropriação, mas em relação ao aspecto individualista que era subordinado as necessidades sociais. Contudo, o século XIX foi marcado pelas ideias liberais que propagavam o direito absoluto em relação à propriedade, o individualismo, sem interferência estatal. Ressalta Benjamim e Milaré (2000) que essa concepção de individualismo gerou conflitos, injustiças, lutas sociais e somente a partir da primeira guerra mundial houve a mudança significativa de intervenção do estado na propriedade, tendo em vista a satisfação dos interesses sociais. No Brasil, destaca os autores, que desde o império até 1930, a desapropriação era o principal instrumento utilizado e de maior eficácia para o estabelecimento do interesse público.

Os fundamentos da expropriação são identificados por Lima (2011) em três ordens: ordem política, constitucional e infraconstitucional. O fundamento político está baseado no princípio da supremacia do interesse público que prevalece em relação ao interesse privado. O constitucional é verificado pela disposição da Constituição no que se refere ao direito da propriedade e o atendimento a sua função social, art. 5º, XXIII, XXIV, art. 170, III, art. 182 e 184 da CF. Já em relação ao fundamento infraconstitucional é observado na ampla disposição legislativa da União, como a lei geral da desapropriação, a lei complementar nº 76 de 1993, a lei nº 4.132, que dispõe sobre a desapropriação por interesse social, o decreto-lei n 554 de 1969 que regula a desapropriação com a finalidade de reforma agrária, bem como a lei nº 8.629 de 1993.

Considerando a ampla disposição normativa no ordenamento jurídico sobre desapropriação, extrai-se sua classificação em ordinária e extraordinária. Há quem considere outro tipo de classificação do instituto em direta ou indireta, mas adverte Lima (2011) que não se refere à desapropriação propriamente dita já que não é regulada por lei. Segundo o autor é na verdade um apossamento administrativo de bens particulares, ou nos seus termos, um “esbulho possessório” realizado pela Administração Pública. O princípio da supremacia do interesse público é mais evidente na desapropriação ordinária, segundo Souza (2004), já que esse tipo consiste na supremacia pública sobre o interesse por meio de indenização prévia, justa e em dinheiro com o fundamento na utilidade, necessidade pública e interesse social.

Já a desapropriação de forma extraordinária é realizada quando não há o cumprimento da função social da propriedade, sendo característica o caráter sancionatório do Estado na intervenção da propriedade privada. Esta pode ser identificada em desapropriação urbanística e rural, não necessitando de indenização prévia. Há também a desapropriação confiscatória, prevista no art. 243 da CF que não admite indenização tendo em vista que acontece na perda da propriedade por utilização de cultura ilegal de plantas psicotrópicas. Nunes (2004) também acredita no tipo de desapropriação judicial a qual não se confunde com usucapião, mesmo diante da posse ininterrupta e de boa-fé por mais de cinco anos.

Considerando a desapropriação comum, na qual o princípio da supremacia do interesse público é eminente, deve-se comprovar a utilidade pública, a necessidade pública ou o interesse social, fundamentos previstos no art. 5º XXIV da CF. Entende-se por necessidade pública, consoante o entendimento de Carneiro (2012), a desapropriação realizada no contexto de urgência, em fato inesperável, que justifique a transferência para a Administração Pública. O interesse social é verificado com base na conveniência social para sua distribuição tendo em vista a previsão do art. 2º da lei nº 4.132, bem como no art. 3, III da CF com o objetivo de reduzir as desigualdades sociais. Já a utilidade pública é identificada nas oportunidades e vantagens à Administração Pública, com base no poder de discricionariedade, porém tem hipóteses previstas no decreto-lei nº 3.365, tais como abertura, conservação de vias ou logradouros públicos, criação de estádio, ou possibilitar o funcionamento de transportes.

Quanto ao procedimento administrativo, “retrata a existência de uma sequencia de atos e atividades do Estado e do proprietário, desenvolvidos nas esferas administrativas e judicial” (FILHO, 2011, p. 750), consolidando a supremacia do interesse público em relação ao particular, proprietário do bem em questão. A desapropriação é compreendida em duas fases, a declaratória e a executiva, sendo esta composta por fase administrativa ou judicial.

A primeira consiste na exposição dos motivos para tanto, com expressa indicação da necessidade, utilidade ou interesse social, sendo os efeitos jurídicos obtidos no direito da autoridade de entrar no imóvel, não confundindo com imissão de posse, segundo Souza (2004), bem como a fixação do estado do bem para fins de cálculo da indenização e definição do termo inicial do prazo de caducidade da declaração. Na fase executória são realizadas os atos necessários para a desapropriação que pode ser via administrativa, quando amigável, ou judicial quando isso não acontece, seja por discordância do valor indenizado ou por vícios administrativos, segundo Carneiro (2012).

A competência para declaração de um bem a fins de desapropriação por necessidade, utilidade pública ou interesse social é concorrente, de acordo com o âmbito da atuação e com base em lei, as pessoas indicadas como o DNIT também. Quanto a competência para a execução, é concorrente também, ou seja, é realizada pela União, Estado, Municípios, Distrito Federal, que são as pessoas política, e as pessoas administrativas, as quais são concessionários de serviços públicos, sociedades de economia mista, fundações, empresas públicas, por exemplo, desde que autorizadas por lei ou contrato. Se a desapropriação for justificada por interesse social, para realização da reforma agrária, a declaração compete apenas à União. Em relação ao objeto da desapropriação, pode ser qualquer bem desde que possa ser expropriado ou que não exista vedação legal para tanto.

Por fim, é importante ressaltar que a desapropriação deve ocorrer quando o interesse público é o seu destino, seja por utilidade, necessidade pública ou interesse social. Enfatiza Lima (2011) que verificando a ausência de algum desses pressupostos que justificam o instituto, está caracterizado o desvio de finalidade, sendo contra os princípios do Direito Administrativo. E a modificação dos destinos do bem desapropriado, denomina-se tredestinação. Também há de se considerar a mensuração dos indicativos e das medidas restritivas para realização da desapropriação de modo a não interferir na propriedade privada de forma arbitrária. Par tanto consiste a utilização do princípio da proporcionalidade.



4 O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DE DESAPROPRIAÇÃO



O procedimento administrativo para a desapropriação requer, segundo a majorada doutrina, a verificação das medidas utilizadas pelo Poder Público através do princípio da proporcionalidade ou razoabilidade. Carneiro (2012) afirma que não é permitido à Administração Pública a execução de atos, medidas e exigências impostas aos proprietários além do necessário para a persecução do interesse público, valendo-se do princípio da supremacia do interesse público. Deve-se buscar equilíbrio entre os meios e os fins dos atos administrativos, sobretudo porque a desapropriação refere-se a um direito fundamental de propriedade garantido constitucionalmente. E mesmo sendo ato discricionário, não é autorizado ao gestor público agir de forma ilimitada.

De acordo com Filho (2011), o fundamento do princípio da proporcionalidade é o excesso de poder, devendo a conduta estatal revestir-se do tríplice aspecto: adequação, exigibilidade ou necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, com base na doutrina alemã de Robert Alexy. A adequação consiste na verificação do ato consubstanciado com a finalidade almejada, ao passo que a exigibilidade ou necessidade permite investigar se não existe outro meio menos gravoso para a sociedade na persecução desse objetivo. E a proporcionalidade em sentido estrito, tem-se a análise custo-benefício, ou seja, a superação das vantagens do instituto sobre as desvantagens.

Carneiro (2000) afirma que deve ser analisado todos esses aspectos do princípio da proporcionalidade em relação ao caso concreto e não partir do pressuposto da subsunção legal. A título de exemplificação, o autor expõe o caso da Transcarioca, questionando a real necessidade do empreendimento e a utilidade para a população localizada ao redor. O entendimento é que a princípio essa obra traz benefício para as pessoas, pois reduzirá o tempo de deslocamento das mesmas para outra parte da cidade, inclusive ao aeroporto. Isso por si só justificaria a busca pela desapropriação já que o interesse público é eminente, porém, existem outros subníveis do principio que devem ser verificados. O resultado do caso foi visto de forma crítica, pois houve desrespeito dos agentes públicos na relação com os expropriados, em relação ao valor das indenizações e as indicações da construção em outro local.

A importância do princípio da proporcionalidade, além dos já mencionados, na opinião de Meirelles (2011), consiste no fato de que não se deve sacrificar um direito ou uma liberdade sem haver efetiva vantagem para a população, pois verificar-se-á invalidade do fundamento em razão da desproporcionalidade da medida. De acordo com esse entendimento, tem-se a seguinte jurisprudência:

STF INFORMATIVO Nº 19. Desapropriação e Desvio de Finalidade. Anulado por desvio de finalidade decreto municipal que expropriara terras para construção de ramal ferroviário ligando fábrica de cimento a linha pertencente à Rede Ferroviária Federal, para facilitar o escoamento de sua produção.No caso, considerou-se descaracterizado o fim de utilidade pública do decreto, cujo direcionamento atendia a interesse privado. Ofensa ao art. 153, § 22, da CF 69. Precedente citado: RE 64.559-SP (DJ 21.05.71.). Vencidosos Ministros Marco Aurélio e Paulo Brossar d, que não conheciam do recurso.RE 97.693-MG, rel. Min. Néri da Silveira, 13.02.96.

Dessa forma, nos termos de Borges (2007), cabe ao Judiciário uma tarefa delicada que é de decidir os conflitos, ao aferir e qualificar o interesse público, como no exemplo supramencionado, o STF anulou a desapropriação por concluir a existência de desvio de finalidade. Não obstante, a autora acredita que “a realidade viva, a todo momento, põe ante o legislador, a Administração Pública, e insistimos, ante o Judiciário, novos casos concretos não previstos, e em que a mesma se faz necessária” (BORGES, 2007, p. 18). Ou seja, a análise do caso com base no princípio da proporcionalidade pode ser anterior ao Poder Judiciário, quando a Administração Pública consegue estabelecer o equilíbrio dos seus atos em busca do efetivo interesse público. Tem-se, portanto, a relevância do princípio da proporcionalidade no procedimento administrativo de desapropriação.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O avanço urbanístico suscita espaço, porém pelo inchaço das grandes cidades este avanço vem sendo a grande dificuldade enfrentada nos últimos tempos. A desapropriação da propriedade privada é um dos caminhos achados pelo Poder Público para estruturar o crescimento urbanístico com vista a atender as necessidades coletivas. É necessário planejar urbanisticamente o espaço para se evitar, por exemplo, favelas e periferias desestruturadas.

Diante disso é que a execução do ato de desapropriar imposto aos proprietários para a persecução do interesse público é proporcional, cumprido os requisitos da lei. A supremacia do interesse público no caso em tela é o motivo da desigualdade jurídica entre a Administração e o administrado. A lei estabelece esta desigualdade e os seus limites.

Sendo assim, conclui-se que a atividade administrativa, de acordo com o Estado Democrático de Direito, deve pautar-se pela busca da satisfação dos interesses públicos condizentes com a vontade da coletividade por meio de práticas democráticas, sendo uma desta a desapropriação que visa atender precipuamente o interesse coletivo, sem desvirtuar o procedimento expropriatório em prejuízo de direitos e garantias fundamentais dos particulares. Verifica-se que esta prerrogativa encontra-se de acordo com os fins do Estado constitucionalmente definidos, pois o interesse coletivo que requer tratamento desigual por parte do Poder Público é o interesse que efetiva os direitos fundamentais.

















































 

 

REFERÊNCIAS

 

 

 

BAPTISTA, Isabelle de. O princípio da supremacia do interesse público sobre o privado: uma análise à luz dos direitos fundamentais e do Estado Democrático de Direito. In: Revista TCEMG. Jen-Fev-Mar. 2013. Disponível em: < http://revista.tce.mg.gov.br/Content/Upload/Materia/1768.pdf>. Acesso em: 03 nov. 2013

 

BENJAMIN, Antônio Herman; MILARÉ, Édis. A propriedade urbana e o direito de edificar. In: Revista de Direito Ambiental, ano 5, out-dez de 2000. Editora Revista dos Tribunais.

 

 

BORGES, Alice Gonzalez. Supremacia do interesse público: desconstrução ou reconstrução? .Revista Diálogo Jurídico,nº 15. Jan-fev-mar de 2007. Disponível em:

<http://www.direitodoestado.com.br/artigo/alice-gonzalez-borges/supremacia-do-interesse-publico-desconstrucao-ou-reconstrucao> . Acesso em 03 nov 2013.

 

 

CARNEIRO, Maria Helena De Souza Marques. Desapropriação: Interesse Público versus Interesse Privado; As expropriações feitas com base na utilidade pública. Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: 2012. Disponível em: < http://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/trabalhos_conclusao/1semestre2012/trabalhos_12012/mariahelenacarneiro.pdf> Acesso em: 28 out 2013.

 

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 26 ed.. São Paulo: Atlas, 2013.

 

FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 24 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

 

 

LIMA, Osvaldo Feitosa de. Aspectos da desapropriação por necessidade ou utilidade pública e por interesse social. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/files/

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NUNES, Jimmy Matias. Do momento consumativo da desapropriação e do papel do registro imobiliário neste ato estatal. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 96, jan 2012.

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SOUZA, Fladja Raiane Soares de. Desapropriação: o momento consumativo e o Registro do Imóvel expropriado. Portal da Justiça Federal da 5º Região. Disponível em: <http://www.jfrn.jus.br/institucional/biblioteca/doutrina.xhtml>. Acesso em: 01 nov 2013.

1 Paper apresentado à disciplina de Direito Administrativo da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

2 Alunas do 7º período do Curso de Direito, da UNDB.

3 Professor Orientador