A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO/A EDUCADOR/A NA EQUIDADE DE GÊNERO E NA DIVERSIDADE SEXUAL


Joquebede Santos de Jesus*
Miguel Arturo Chamorro Vergara*




RESUMO: O presente artigo é o resultado das discussões e leituras direcionadas na formação de educadores/as sobre o "gênero e diversidade na Escola". O cerne do trabalho busca refletir a importância da Educação Sexual na prática pedagógica do professor do Ensino Fundamental, como elemento relevante na orientação e fortalecimento da equidade do gênero e no respeito às diversidades sexuais manifestadas no espaço escolar. Reforça-se o papel do educador enquanto agente motivador do ensino e aprendizagem no trato com as divergências produzidas pela dinâmica da diversidade cultural na Sociedade Brasileira, à medida que analisa e visualiza a construção social de gênero nas relações de poder que se submergem de padrões que foram e são ditados pela classe de comando. A partir disso, constata-se como os tabus, preconceitos e estereótipos sociais desvirtuaram a concepção de sexualidade no processo histórico e nas relações pertencentes a ela. Daí levanta-se a necessidade do educador inserir na sua prática pedagógica metodologias que vislumbrará a inserção no projeto educacional os grupos excluídos pela sociedade e pelos seus veículos de comunicação.

Palavras chaves: Gênero. Sexualidade. Educador.















1. INTRODUÇÃO
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A escola sempre foi modeladora de padrões por isso, mesmo afastada da convivência social, sempre respondeu as expectativas da sociedade, pois ela reproduzia, e repetia também os castigos, abusos, preconceitos presentes no meio social. Porém com a nova narrativa que a humanidade está tomando, o educador ver a necessidade de quebrar os paradigmas construídos na modernidade e desprender-se dos tabus imanentes nela.

É notório que a educação escolar tem um alcance ilimitado, significativo na disseminação da justiça, na formação de sujeitos críticos, atuantes no contexto em que vive. No tocante, espera-se que suceda nela, um processo de construção de ações pedagógicas contra a proliferação de ações preconceituosas em relação a sexualidade e atenuação da violência homofóbica ,misogênica, e outros estigmas e estereótipos que procede nela, sendo o reflexo do contexto social. Desta forma, a escola contribuirá para a diminuição do abismo expresso nas relações das diferenças de gênero, culturas e orientações sexuais diferentes da "normalidade" tão disseminada na sociedade vigente.

No ínterim, as questões de gênero e diversidade sexual vêm sendo discutidas por especialistas, filósofos, teóricos sociais e educacionais, como também é discurso visivelmente presentes na mídia, através das novelas, do cinema, da publicidade, dos programas de auditório, das revistas e livros voltados para o público adulto e infanto- juvenil.

Essas repercussões do "gênero" têm forçado a escola a debater o tema neste espaço onde são manifestadas as vivências da sexualidade - na fala, nas ações, gestos que são expressões de pensamentos e atitudes também elaboradas a partir de leituras do meio em que vive. Nesse sentido, o artigo inicialmente abordará alguns recortes históricos que foram influenciadores na construção do gênero no meio social a luz dos escritos de alguns autores estudiosos e teóricos tais como Foucault(1984;1988); Braga ( 2006); Figueiró (2001);Louro (1997;2004); Bourdieu (1999) e o livro Gênero de Diversidade na Escola ( 2009). Além disso, apartir das postulações dos PCNS(1996), este trabalho explorará como a escola pode contribuir nessa formação, na valorização da equidade e respeito as diversidades sexuais.E a metodologia e recursos que o educador deve estar atento para inserir na sua prática a orientação sexual.



2. O GÊNERO E DIVERSIDADE SEXUAL NO ESPAÇO ESCOLAR

A escola é palco de disputas e de conflitos importantes, é o espaço onde se visualiza as multiplicidades de identidades sociais, definidas e disputadas por diferentes movimentos como os feministas, os movimentos de libertação nacional, os étnico-raciais, os gays e lésbicos, os ambientalistas e todos estes grupos se fazem representar no espaço escolar e nos currículos que nele se desenvolvem. A disputa de gênero liderado pelos movimentos sociais em prol de liberdade e igualdade são lutas e expressões contra o jugo e os ditames da sociedade em relação ao que o indivíduo tem de mais íntimo e pessoal: suas emoções e seus desejos sexuais.

(...) as mudanças no paradigma educacional acontece graças, historicamente, à pressão dos grupos feministas e dos grupos gays e lésbicos que denunciaram a invisibilidade de suas representações de mundo nos currículos escolares "². (GDE,2009 : p.181)

Assim ao questionar a prática pedagógica do educador referente à temática do gênero e sexualidade nos remota ao processo e contexto histórico social que formou a construção de gênero e que tornou-se base para repensar a concepção atual de sexualidade. Nesse sentido o gênero vai além das concepções biológicas, genéticas e morfológicas. Nas palavras de Braga (2006) "a diferença biológica é apenas o ponto de partida para a construção social do que é ser homem ou ser mulher". (Braga 2006, p.214).

A boa reflexão de Foucault (1988) acerca da sexualidade como um dispositivo da modernidade constituído por práticas discursivas e não-discursivas produziram uma concepção do indivíduo enquanto sujeito de uma sexualidade, ou seja, voltado para os saberes e poderes buscando normalizar, controlar e estabelecer "verdades" acerca do sujeito na relação com seu corpo e seus prazeres.

As convenções relativas ao gênero podem variar segundo a cultura, a classe social e o momento histórico. Como afirma Louro (1997) o conceito de gênero "(...) obriga aquelas/es que o empregam a levar em consideração as distintas sociedades e os distintos momentos históricos de que estão tratando. Afasta-se de (ou se tem a intenção de afastar) proposições essencialistas sobre os gêneros; a ótica está dirigida para um processo, para uma construção, e não para algo que exista a priori. O gênero passa a exigir que se pense de modo plural, acentuando que os projetos e as representações sobre mulheres e homens são diversos." Louro (1997, p. 23).
No ínterim, a sexualidade humana tem sido durante séculos fontes de tabus e interdições, das verdades ocultas, dos desejos não realizados, das inclinações sublimadas pressionada por instituições começando pela família, a religião e a própria escola. Assim, a sexualidade tornou-se vigiada e controlada segundo padrões ditos como normais, que correspondia aos interesses e modelos sociais então vigentes. Nesse sentido reforçava-se que, ser ou pensar diferente em relação a sua sexualidade eram motivos de discriminações, maldições perseguições. Sentiu muito isso os homossexuais, transvestis, bissexuais e as mulheres na luta pela igualdade, e todos que fossem contra os moldes da época.

Embora fosse possível encontrar relações sexuais e afetivas entre pessoas do mesmo sexo conforme Foucault (1984), na história antiga, é somente no século XIX que se utiliza pela primeira vez o conceito de "homossexualidade" para se referir a uma identidade sexual a ser vigiada e controlada: "(...) foi por volta de 1870 que os psiquiatras começaram a constituí-la com objeto de análise médica: ponto de partida, certamente, de toda uma série de intervenções e de controles novos". Foucault (1984, p.144)

Por outro lado a preocupação esta na escola como reprodutora do saber da sociedade, ela reforça os estereótipos e preconceitos dissipados no social. Segundo Louro (2004), "a escola se incumbiu de separar os sujeitos: primeiramente os que nela estavam eram considerados diferentes dos que estavam fora". Mas, esses sujeitos que estavam dentro dela , ela também dividiu, classificou, ordenou. "Separou adultos de crianças, católicos de protestantes, ricos de pobres, meninos de meninas". Essa teoria de classificação, separar, é o que se complementa o paradigma da ciência moderna se torna perverso as diferenças.

Deste modo, em vez de libertar os oprimidos a escola regulamenta a disciplina dos corpos, reforçando fortemente neles marcas concepções preconceituosas de gênero. É visivelmente denotado por Bordieu(1999) quando afirma que:
As relações de dominação (de gênero e outras) se inscrevem no corpo e na subjetividade de educadoras/es e alunos/as, como um habitus ou identidade estável. São somatizadas e naturalizadas numa relação de causalidade circular entre as estruturas objetivas do espaço social (roupas, brinquedos, espaços de meninos e de meninas) e as disposições psicossomáticas produzidas nos sujeitos (preferência por bolas ou bonecas, matemática ou português, rebeldia ou obediência); constituem expectativas coletivas inscritas nos ambientes que reproduzem a oposição entre mundo público/produtivo/masculino e mundo privado/reprodutivo/feminino. (Pierre Bordieu, 1999, p.70)

As relações de gênero são expostas no campo educacional nas interações da conformação das famílias, dos papéis e do comportamento de homens e mulheres, meninos e meninas, nos textos e imagens utilizados pelo professor e nas diversas ações pedagógicas, a partir das vivencias sociais demonstradas na escola seja ela particular ou no coletivo. Essas questões de gênero e sexualidade extrapolam as diferenças de meninos e meninas e seus questionamentos biológicos, é um tema polêmico e contundente, pois parte das respostas aos estímulos que o sujeito dá no social."Portanto a orientação sexual deve-se dar levando em consideração o contexto social do aluno, seus valores, sentimentos, tabus, medos, desejos e emoções". ( PCN, 1998; vol.9)

É importante esclarecer que a escola não é o primeira, nem a única a falar de sexualidade e discutir as questões de gêneros, a mídia também exerce uma pressão muito forte na construção de gêneros, e na exposição do corpo, no conhecimento da sexualidade. Imagens ambíguas são apresentadas toda hora, desde o consumismo, como a valorização da estética, o crescente erotismo e pornografia são exibidos, e o público sempre é o mesmo crianças, jovens e adultos.
Além da influência midiática, a educação formal de dá também no contexto social que a criança vive.
Um beijo entre um homem e uma mulher em uma telenovela ou programa infantil. A cena de um parto. As relações sociais e afetivas vivenciadas dentro de cada família (Vale lembrar que esse aprendizado é diferente para cada criança, dependendo, entre outros, do arranjo familiar: apenas mãe e avô, família extensa, com pai e mãe, duas mães etc.). Cruzar na rua com um casal de meninas caminhando de mãos dadas. Revistas voltadas ao público adolescente, como Capricho, Toda Teen, Atrevida e outras. Sites na internet. Conversas entre amigas e amigos. Conversas familiares, mesmo daquelas em que as/os jovens não participem ativamente. As múltiplas maneiras de aprendizagem sobre sexualidade e orientação sexual não podem ser desconsideradas quando se pensa a sexualidade de uma perspectiva cultural e histórica. Elas precisam, portanto, ser levadas em conta em projetos educativos voltados para este assunto. É possível, por exemplo, conversar sobre algum tema em pauta em alguma novela ou em outro programa televisivo assistido pelas/os estudantes, como um namoro, a relação afetiva e sexual entre duas mulheres, a gravidez de uma jovem ou um casamento inter-racial. (GDE 2009)

Fica explicito que independente dos educadores realizarem as abordagens ou não a sexualidade se coloca no discurso o tempo todo no ambiente escolar, mais uma vez encaixa o papel do educador na Educação Sexual, em ajudar a filtrar essas informações muitas vezes banalizadas no cotidiano, mas que provoca inquietudes e desafios na criança e adolescente.

3. ANALISE E INTERVENÇÕES NA METODOLOGIA DO PROFESSOR

Os fatos mostram que a escola valoriza os aspectos cognitivos, e pouco ou nada dos afetivos, tanto no que diz respeito ao processo do desenvolvimento, quanto ao da aprendizagem, contribuindo bastante para o distanciamento na vivência das relações afetivas presentes nos relacionamentos.

Conforme os PCNS (1998, vol. 9) a orientação sexual deve ter o começo na infância à idade adulta, e sempre haverá interrogações sobre ela, em virtude de estar sempre em construção no gênero. A violência realizada contra crianças e adolescentes deve fazer parte da discussão escolar, junto com os abusos sexuais, incestos, prostituições entre outros.

Como disse Figueiró ( 2001) são as necessidades sociais que impulsionam falar da sexualidade na escola, isto decorre do fato da família não estar preparada para isso. Os crescentes problemas sexuais ocasionadas na gravidez na adolescência, inúmeros abortos juvenis e aumento de DSTs em jovens, revela que a falta de orientação sexual pode levar. Sem mencionar o HIV/ Aids, caso corrente hoje em dia entre milhões de adolescentes.

Partindo do pressuposto trabalhado neste artigo, constata-se que discutir os temas transversais no espaço escolar tem um caráter obrigatório e emergencial. Com esta perspectiva o quadro que apresento abaixo, expõe ações interventivas que é uma ponte de reflexões para a prática pedagógica do educador e responderá a questão premente voltado à discussão da equidade de gênero e diversidade sexual no espaço escolar. Desta forma ressalta-se a importância do educador/a em analisar sua postura diante dos dispositivos didáticos que utiliza para a sua efetiva práxis. O campo de reflexão se concentra no planejamento; no currículo; no espaço escolar e na gestão. Destes, três estão atrelados ao trabalho do professor: o planejamento, o currículo, e o espaço escolar. A gestão é um suporte que dará força a esse trato, pois facilita comunicação; a partilha e busca de soluções para os problemas que surgem no processo ensino aprendizagem e na vivência escolar. Neste ultimo, está o segmento de apoio: pais; profissionais da escola; comunidade do bairro ou povoado da escola; instituições e outros agentes que podem ser atuados na contribuição do projeto educacional.
QUADRO COM AÇÕES DE PRÁXIS PEDAGOGICAS

PLANEJAMENTO CURRÍCULO ESPAÇO ESCOLAR GESTÃO
Análise dos materiais didáticos e paradidáticos se são adequados a missão escolar, e atende as expectativas propostas;
Avaliar constantemente os resultados do processo educativo;
Ao planejar o educador/a deve pensar na prática que resultará em:
Aproximar o máximo o aluno do conceito de valorização das diferenças de gênero e sexuais, como existencial, não como fonte de risco.
Refletir e reescrever o conhecimento escolar vigente, levando em consideração as diversidades,as relações de gêneros e as diferentes raízes étnicas e os diferentes pontos de vista envolvidos em sua produção.
Lançar o olhar crítico para as representações de gênero no livro didático, tomando nota de como os conteúdos de gênero são trabalhados. Estar atento as manifestações das relações de gênero e como os alunos encaram a sua sexualidade e em relação ao outro;
Organizar o espaço na sala ao gerir ações;
Trabalhar a interdisciplinaridade e transversalidade na valorização das diferenças de gênero e a sexualidade.
Reuniões com os pais para que possam fazer todos os seus questionamentos, ter suas dúvidas esclarecidas e se posicionar, participando no processo de trabalho escolar.
Articulado com a coordenação pedagógica da escola, convidar quando necessários órgãos, organizações governamentais ou não; especialistas de outras áreas com ações políticas e sociais sobre o tema.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta perspectiva conclui-se como necessário que os educadores insiram na sua prática pedagógica a Orientação Sexual como área temática, como ponte para tratar de questões como as relações de gênero e sexualidade. Cabe lembrar que o livro didático deve ser considerado como suporte não como livro sagrado e limitar-se a pura exposição de seus conteúdos é afirmar que gênero e diversidades sexuais restringem-se aos estudos genéticos, morfológicos e biológicos do desenvolvimento humano. Negando o ensino para a vivência da sexualidade, visto ser uma construção social. Outro fator importante é que a escola estabeleça a transversalidade nesta ótica que se defende hoje, como prioridade na proposta pedagógica da escola, questionando se os objetivos estão claros e a quem está atendendo.
É sensato que os professores repensem a forma de produzir, veicular, pensar, dizer, agir e viver a realidade diversa e complexa que envolve os sujeitos da educação. Verificando se de alguma forma ressalta preconceitos, na sua linguagem e ações, ou até mesmo se omitindo disso, diante de atitudes que exacerbem o desrespeito e intolerância para com as expressões do próximo referente a sua sexualidade e modo de vida.
Destaca-se também a premente necessidade de educar para a afetividade, alcançando os alunos e olhando-os como seres humanos, expressando carinho, pois é o caminho a ajudar-lhes a lidar com a imaturidade, insegurança e o desequilíbrio emocional imanente a criança e ao adolescente. È necessário que a escola faça aflorar a afetividade nas relações com os colegas, alunos e professor, esta é a função social da escola, que não deve ser negado. Deste modo, dizer que todos têm acesso a escola implica em garantir a permanência e na qualidade de educação, desprovida de preconceitos, sem distinção de classe social, religião, etnia, orientação sexual, como forma de garantir o direito de todos os sujeitos presentes na educação de acesso ao conhecimento historicamente produzido.




















REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BORDIEU, Pierre. A Dominação Masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999.

BRAGA, E. R. M. A Questão do gênero e da sexualidade na educação. In: RODRIGUES, Elaine e ROSIN, Sheila Maria. Infância e práticas educativas. Maringá-Pr: EDUEM, 2007. p. 211-220.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: pluralidade cultural, orientação sexual. Brasília, DF: MEC/SEF, 1997.

FIGUEIRÓ, Mary.N.D. A Formação de Educadores Sexuais: possibilidades e limites. Tese de Doutorado, Universidade Estadual Paulista, Marilia, 2001.

FOUCAULT, M. História da sexualidade II: o uso dos prazeres. São Paulo: Graal, 1984.

FOUCAULT, M. História da sexualidade I: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Graal, 1988.

Gênero e Diversidade na Escola. Formação de Professores/as em Gênero, Sexualidade, orientação Sexual e Relações Étnico-raciais. Livro de conteúdo. Versão 2009, - Rio de Janeiro: CEPESC; - 266 p. ISNB 967-85-89737-11-1.Catalogação ?Sandra Infurna. CRB-7- 4607.

LOURO, G.L. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós estruturalista. Petrópolis: Vozes, 1997.

LOURO, G.L. (Org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.