A possibilidade de dano moral resultante da inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito[1]

 

 

Maryanna Coelho Pessoa e Raul César da Rocha Vieira[2]

Humberto Oliveira[3]

 

Sumário: 1 Introdução;  2 Os bancos de dados e o cadastro de consumidor; 3 Procedimento para a inclusão e exclusão do nome nos cadastros restritivos; 4 Os danos morais resultantes da inscrição indevida nos sistemas de proteção ao credito pela empresa credora; 5 Considerações finais; Referencias.

 

RESUMO

O artigo tem por objetivo apresentar os motivos que demonstram a incidência do dano moral quando credores inscrevem indevidamente alguém nos cadastros de proteção ao crédito. Dessa forma, analisar-se á, essa inscrição indevida tanto do ponto de vista da inexistência de dívida, quanto da falta de comunicação ao devedor de que este sofrerá restrições ao seu crédito. Assim, busca-se analisar esse fenônemo do dano moral, sob o prisma dessas inscrições, uma vez que a inscrição indevida acarreta inúmeros problemas para o “devedor”, como a impossibilidade de realizar negócios perante inúmeros fornecedores, além de ter sua imagem e moral feridas perante a sociedade que irá se referir a este como “mal pagador”.

PALAVRAS – CHAVE

 

Fornecedor; Consumidor; Cadastro de Porteção ao Crédito; SPC; SERASA; Inscrição indevida; Dano Moral.

 

 

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa discorrer sobre a “possibilidade de dano moral resultante da inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito”. Como é sabido, as relações de consumido tem crescido cada vez mais e com elas a possibilidade de inadimplência de alguns consumidores perante seus fornecedores.

O único meio que os consumidores encontraram para si prevenir e prevenir outros fornecedores de futuros “calotes” foi inserindo o nome desses consumidores inadimplentes em cadastros de proteção ao crédito. Os cadastros de proteção ao crédito mais conhecidos são o SPC e o SERASA e é neles que se encontram todos os consumidores inadimplentes.

Quando o consumidor se torna inadimplente perante um fornecedor ele acaba se tornando inadimplente perante todos, pois o seu nome uma vez inscrito nesses cadastros de proteção ao crédito todos os fornecedores terão acesso a seus dados referente as suas transações de relações de consumo e acabaram constatando que o consumidor não honrar com suas obrigações gerando ao consumido a impossibilidade de negociar com outros fornecedores.

Apesar desses cadastros de proteção ao crédito ter a finalidade de proteger o fornecedor de possíveis “calotes” muitas vezes ele acaba sugindo da sua finalidade funcionando como uma meio de cobrar/obrigar o consumidor a pagar suas dívidas ou então ele acaba violando o Direito de Comunicação a qual o consumidor é resguardado e por conta disso acaba inscrevendo nomes de consumidores que não possuem débito causando um desconforto a este consumidor que ficará com o seu nome negativado e “fujo” perante a sociedade de consumo podendo essa situação resultar em danos morais.

Este trabalho procura fazer uma breve analise sobre os danos morais resultantes da inscrição indevida do consumidor nos cadastros de proteção ao crédito que na maioria das vezes decorre dos abusos desses órgãos de proteção ao crédito.

2 Os bancos de dados e o cadastro de consumidor

Devido ao grande índice de inadimplência no mercado globalizado, para que um credor (fornecedor) conceda um credito a um devedor (consumidor) ele, primeiramente, busca informações sobre esse futuro devedor nos bancos e cadastros de reservas para fazer uma análise do seu perfil e posteriormente ceder ou não o crédito.  Como é sabido, a concessão de crédito é uma operação que exige confiança e como um credor não é obrigado a conhecer todos os seus devedores este só alcançará a confiança através das pesquisas nos bancos e cadastros de consumidor.

Antigamente, cada fornecedor tinha que buscar informações sobre seus consumidores com outros fornecedores ou deveriam ter o seu banco de dados com todas as informações dos seus clientes. Os bancos de dados e os cadastros de consumidores surgiram na década de 50 com o intuito de tornar menos oneroso e menos trabalhoso o cadastro de informações de consumidores para os fornecedores e possibilitando que as informações sobre os consumidores estejam sempre atualizadas e disponíveis para os fornecedores.

Os bancos de dados que sugiram nessa época e que atuam até hoje é o SPC (Sistema de Proteção ao Crédito) e o SERASA. Ambos são entidades privadas que são caracterizadas como bancos de dados. Segundo Altair Rodrigues Lopes Filho,

“O SPC é uma associação civil, que possibilita o tráfego de informações acerca da saúde financeira do consumidor. É ferramenta que possibilita ao comerciante avaliar a probabilidade de recebimento do crédito, além de conceituar o bom consumidor mesmo em lugares que ninguém o conhece. Ademais, confere maior segurança às informações arquivadas, que antes eram mantidas de forma isolada por cada fornecedor.” (FILHO, A R Lopes, pag 5).

O SERASA (Centralização de Serviços dos Bancos S/A) fugiu na década de 60, sob forma de sociedade anônima e foi criada pelas instituições financeiras com o intuito de ser um cadastro único de consumidores para, assim como o SPC, dar suporte as transações econômicas. Essas informações que eram colhidas e armazenadas sobre os consumidores começou a crescer e essa prática começou a ser regulada pelo art.43° CDC com a finalidade de evitar os abusos que esses órgãos poderiam vir a praticar. O SPC e o SERASA periodicamente atualizam e transmitem informações sobre os consumidores que se encontra no seu sistema aos fornecedores. Essa atualização e transmissão não precisam ser autorizadas pelo consumidor e nem ser do conhecimento dele como ocorre nos cadastros de consumidores.

Esses órgãos de proteção ao crédito cadastram todos os consumidores que praticaram uma transação econômica e que por conta dela se tornaram inadimplentes. As informações sobre a inadimplência de consumidores é prestada pelos fornecedores que sofreram o “calote”. O STF entende que é de suma importância os arquivos de consumo, como pode ser visto:

“O SPC, instituído em diversas cidades pelas entidades de classe de comerciantes e lojistas, tem a finalidade de informar seus associados sobre a existência de débitos pendentes por compra dos que pretendam obter novo financiamento. É evidente o beneficio que dele decorre em favor da agilidade e da segurança das operações comerciais, assim como não pode negar ao vendedor o direito de informar-se sobre o crédito do seu cliente na praça, e de repartir com os demais os dados de que dele dispõe" (STF, REsp.22337/RS,  Rel. Min. Ruy Rosado Aguiar, j. 13/02/1995).

O art. 43° do CDC dispõe como deve ser o cadastro dos dados e dos consumidores nos Bancos de Dados e nos Cadastros de Consumidores. Ele dita que esse cadastro deve ser objetivo, claro, verdadeiros, de fácil compreensão e não pode conter informações negativas referentes a um período superior de cinco anos; que o consumidor deve ser solicitado por escrito da sua inscrição nos bancos de dados ou nos cadastros de consumidores; em caso de erro detectado pelo consumidor esse tem o direito de pedir a correção do erro e esta tem que ser feita no prazo de cinco dias pelo arquivista; prescrita a divida, o SPC não pode mais fornecer informações que possam impedir ou dificultar o crédito do consumidor que estava negativado.

Há uma discussão a cerca do caráter público ou privado dos arquivos de consumo, porém o CDC trás no seu art. 43°, parágrafo 4, que elas são de caráter público e isto significa que eles são de interesse de toda a sociedade e por conta disso elas devem ter obrigações e limitações para que não ocorra abuso no seu exercício e nem desvio de finalidade.  

Devido a esse caráter público dos arquivos de consumo, os consumidores que possuem informações nos arquivos de consumo possuem quatro direitos que são garantidos pelo CDC que é o direito ao acesso, de retificação, de comunicação e de exclusão.

O Direito ao acesso permite que o consumidor confira se todas as informações contidas a seu respeito estão corretas e em caso de erro poderá pedir a retificação dos dados que deverá ser feita em até cinco dias úteis além de que essas informações erradas devem se tornar publica diante de todos os fornecedores. Esse direito de poder retificar o que está errado é o segundo direito que é dado ao consumidor. A não retificação dos dados pode gerar sanção penal como está previsto no art. 73º do CDC. O consumidor somente poderá consultar todos os seus dados enquanto o fornecedor poderá consultar os dados de qualquer pessoa, de forma individualizada, e essa consulta deverá ocorrer de uma relação de consumo.

O direito á comunicação, que também é garantido ao consumidor, dita que este deve ser comunicado por escrito sobre a sua inscrição nos bancos de dados se ele não tiver solicitado a sua inscrição, não havendo a comunicação o consumidor poderá ser indenizado por danos morais. O STJ entende que,

“A inscrição do nome do devedor no cadastro do Serasa deve ser precedida da comunicação exigida no art.43, paragrafo 2º do Código de Defesa do Consumidor. O interstício de mais de dois anos entre a inscrição do nome no Serasa e a posterior notificação judicial ao devedor, além de não ser razoável, não afasta o constrangimento que advém da inscrição, notadamente se esta for indevida, tornando cabível a indenização por dano moral” ( STJ, REsp.373219/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 12/08/2002)

Essa comunicação deve ser feita pelo o órgão responsável pela manutenção do cadastro e não o fornecedor/credor como pode ser visto na Súmula nº 359 do STJ que dita que “cabe ao órgão mantenedor do Cadastro de Proteção ao Crédito a notificação do devedor antes de proceder á inscrição”. Porém em relação à retirada do nome do consumidor (direito de exclusão) ,depois de quitada a divida, dos bancos de dados é de responsabilidade do fornecedor sob pena de serem responsabilizados civilmente pela omissão.

Pelo fato dos arquivos de consumo possuir um caráter público, ou seja, pelo fato deles serem de extrema importância para toda a sociedade a sua finalidade deve ser cumprida como dispõe o CDC assim como todos os direitos concedidos ao consumidor, para que o funcionamento desses arquivos não se torne ilegais e acabem prejudicando, de alguma forma, as transações de relações de consumos.

3 Procedimento para a inclusão e exclusão do nome nos cadastros restritivos

Os sistemas de proteção ao crédito, ao contrário do que muitos pesam, é um meio de alertar os fornecedores sobre os possíveis riscos que eles correm ao negociar com um determinado consumidor e não um meio de fazer cobrança ao consumidor para que este quite sua dívida.

O consumidor para ter o seu nome negativado precisa cumprir alguns requisitos que são obrigatórios para tal procedimento, não preenchendo os requisitos o consumidor não terá o seu nome negativado e isso não o acarretará nenhum tipo de responsabilidade. O art. 43° do CDC possibilita a negativação do nome do consumidor no SPC ou no SERASA a partir do momento que ele se torna inadimplente perante o fornecedor.

A negativação do nome do consumidor só poderá ser feita quando o débito for certo, ou seja, quando ele realmente existir. Em caso de incerteza não se pode, em hipótese alguma, negativar o nome do consumidor sob pena de poder estar cometendo abuso de direito. Existindo ação judicial questionando o débito tem-se que esperar o fim do processo para que se possa saber se o consumidor é ou não inadimplente e constatando a sua inadimplência pode-se inscrever o seu nome no cadastro de consumidor. Antes de findo o processo o consumidor, e então autor da ação, não poderá ter o seu nome inscrito nos bancos de dados pois caso inserido o nome durante o tramite da ação haveria um desvio de finalidade dos Sistemas de Proteção ao Crédito pois isso seria uma forma de obrigar esse consumidor a quitar a dívida o quanto antes para que ele não fique com o seu “nome sujo” perante a sociedade de consumo impossibilitando-o de fazer qualquer transação.

Pelo fato de não poder inscrever esse devedor nos sistemas de proteção ao crédito durante o tramite do processo muitos credores tentam fazer com que esses devedores depositem judicialmente a quantia do débito questionado com o intuito de garantir o crédito. Pelo fato da cobrança não ser uma das finalidades do sistema de proteção ao crédito esse não podem obrigar o depósito judicial.

O art.43°,§1º do CDC dispõe que “os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão...”, ou seja, isso deixa bem claro que as informações sobre o consumidor que devem constar nos bancos de dados é apenas referentes ao mercado de consumo. Outras informações são ilegais podendo gerar, a depender do caso, indenização por danos morais e materiais. Em relação a isso, Altair Rodrigues Lopes Junior leciona que:

Dados pessoais do consumidor, sobre o seu caráter, família, reputação geral, características individuais ou modo de vida não são aceitas nos arquivos de consumo, pois estão bem distantes das necessidades do mercado de consumo. Informações desta natureza uma vez arquivadas, violam a intimidade e privacidade do consumidor, que faz jus a indenização por danos materiais e morais. (JUNIOR, A R Lopes, pag 14).

Como já foi visto anteriormente, o consumidor que não cumprir as suas obrigações perante o fornecedor se torna inadimplente perante este. Durante alguns meses o fornecedor espera que o consumidor cumpra suas obrigações, não cumprindo o fornecedor tem o direito de enviar o nome do consumidor inadimplente para os sistemas de proteção ao crédito onde este deve comunicar o consumidor por escrito da inscrição do seu nome nos sistemas de proteção ao crédito para que depois efetue a inscrição desse consumidor. Após a comunicação o consumidor poderá “quitar” a sua divida perante o fornecedor. Quitando a dívida o consumidor tem o seu nome retirado dos sistemas de proteção ao crédito e está habilitado, novamente, para efetuar novas transações comerciais.

Outras possibilidades de reabilitação do consumidor ao crédito estão previsto no art.43° do CDC nos §1° e §5° que ocorre quando a dívida prescreve. O art.43°, §1° dita que o nome do consumidor não pode ficar negativado por mais de cinco anos. Inscrito o nome do consumidor inadimplente nos bancos de dados, devem-se esperar cinco anos para que este quite a divida, dado os cinco anos mesmo que a quitação da divida não tenha ocorrido deve-se retirar o nome do consumidor do banco de dados. Há uma prescrição da dívida e uma reabilitação do consumidor ao crédito. Esse posicionamento é mesmo do STJ como pode ser visto na Súmula n.º 323 do Superior Tribunal de Justiça que dita que “A inscrição de inadimplente pode ser mantida nos serviços de proteção ao crédito por, no máximo, cinco anos”. Esse prazo de cinco anos que dispõe o parágrafo primeiro é chamado pela doutrina de prazo genérico.

Outra possibilidade está disposta no §5° do mesmo artigo que dita que “consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão fornecidas, pelos respectivos Sistemas de Proteção ao Crédito, quaisquer informações que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores”. Esse prazo de cinco anos é classificado como específico. Essa dívida pode prescrever com menos de cinco anos e ocorrendo isso se exclui automaticamente o nome do devedor do banco de cadastro mesmo que a dívida ainda não tenha completado cinco anos de existências. Vale-se lembrar que esse prazo de cinco anos começa a contar da data do vencimento da dívida, pois se contado a parti da inscrição do nome do consumidor inadimplente no banco de cadastro esse fornecedor poderá inscrever primeiro em um, ai findo os cinco anos inscreve em outro e assim por diante fazendo com que essa dívida se torne perpétua.

Portanto pode-se conclui-se que para ter o nome negativado basta que o consumidor se torne inadimplente perante o fornecedor e este exerça seu direito de comunicar ao órgão de proteção ao crédito o nome do consumidor inadimplente para que o órgão comunique o consumidor de seu débito e havendo confirmação o órgão esta autorizado a inscrever o nome do consumidor inadimplente e para que ocorra a reabilitação desse consumidor ao crédito este precisa quitar sua dívida perante o fornecedor ou esperar a prescrição do prazo genérico ou do prazo específico que estão previsto no art.43, §1° e §5°.

4 Os danos morais resultantes da inscrição indevida nos sistemas de proteção ao crédito e pela empresa credora

 

Neste tópico será abordado o dano moral que decorre das inscrições indevidas de não devedores, realizadas pelas empresas credoras, nos arquivos de sistemas de proteção ao crédito. Assim, para um melhor entendimento, cabe inicialmente conceituar o dano moral, para que dessa maneira, seja possível entender os motivos pelos quais se é possível pleitear judicialmente o dano moral em decorrência dessa inscrição indevida.
Segundo a doutrina, o dano moral configura-se quando ocorre lesão a um bem que esteja na esfera extrapatrimonial da vítima, tendo a indenização o objetivo de possibilitar ao lesado uma compensação, atenuando, em parte, o sofrimento suportado, já que na seara do dano moral é impossível restabelecer o status quo ante, pois a dor sentida não pode ser simplesmente apagada, nem restabelecida.
Nesse sentido, Venosa conceitua o dano moral como:

“Dano moral é o prejuízo que afeta o animo psíquico, moral  e intelectual da vítima. Sua atuação é dentro dos direitos da personalidade. Nesse campo, o prejuízo transita pelo imponderável, dai por que aumentam as dificuldade de se estabelecer a justa recompensa pelo dano.” (VENOSA, 2007. p38)

 
Dessa maneira, percebe-se que o dano moral difere do patrimonial pela sua dificuldade de aferição, no que tange ao dano causado, e, por extensão, uma maior dificuldade ao magistrado em atribuir uma justa compensação pela lesividade sofrida pela vitima. 
Dessa maneira, o apontamento indevido do nome da vítima para protesto e a consequente inscrição nos sistemas de proteção ao crédito, como SPC, SERASA e outros, impõe a empresa credora a obrigação de indenizar os danos morais sofridos, haja vista que essas inscrições originam a mácula da boa índole da vítima, fama e honra, além da preocupação e intranquilidade em ter sido injustamente negativada (termo corriqueiramente usado para referir-se à uma inscrição em sistemas de proteção ao crédito), em razão de uma dívida que já havia sido paga, ou de um débito inexistente.
Cabe ressaltar que a vítima de inscrições está amparada legalmente sob a égide da nossa Carta Magna, bem como outros dispositivos infraconstitucionais. A Constituição Federal prevê dentre os direitos e garantias fundamentais do indivíduo, a devida reparação dos danos materiais e morais que venha a sofrer, nestes termos:
 
 
 
“ART. 5°  [...]
 
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”
 
Outrossim, os artigos 186 e 927, do Código Civil de 2002, assim estabelecem:
 
“Art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
 
“Art. 927 – Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”
 
Ainda na guarda do direito da vítima, legislação mais específica, disciplina o dever de indenizar nos casos em que o indivíduo sofre um dano injusto e inesperado. Dessa forma, o Código de Defesa do Consumidor prevê no artigo 6º, VI, como direito básico, a reparação dos danos morais que venha a sofrer no âmbito das relações de consumo, prevendo inclusive que o prestador responderá objetivamente pelos danos decorrentes da má prestação do serviço:
 
“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.
 

Sob o prisma da responsabilidade, houve significativa alteração quanto a possibilidade da associações de arquivos de consumo figurarem como parte passiva legitima em eventual ação judicial. A princípio, se tinha o entendimento semelhante ao do doutrinador Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin:

“(...) os arquivos de consumo são sempre parte passiva legítima em ação proposta pelo consumidor , não podendo ser alegada a ilegitimidade ad causam na forma do art. 267, IV e VI do CPC, porco importando, na apuração da sua responsabilidade perante o consumidor, tenha o registro indevido sido feito ou  as informações incorretas ou omissivas sido apresentadas ou assentadas pelo próprio cliente ou associado do banco de dados. A legitimidade passiva do arquivista não decorre de atos físicos de registro das informações por ele praticados, mas da sua operação e fornecimento a quem as solicita.” (GRINOVER, 2007. p.485)

 
Esse entendimento também era partilhado pelo STJ, como nos explica Leonardo Garcia:

“(...) nos casos de inscrição indevida, ou seja, naqueles em que o nome do consumidor não poderia estar inscrito, seja porque não está inadimplente, seja porque não foi o responsável pelo débito (hipóteses em que o consumidor tem documentos clonados e o falsário faz dívidas em nome daquele, tendo o nome incluído nos arquivos), o STJ vinha entendendo que a responsabilidade era solidária do fornecedor e do arquivo de consumo.”  (GARCIA, 2010. p.283)

 

Todavia, o STJ parece ter mudado o posicionamento, quanto a responsabilidade das entidades responsáveis pelo cadastro, a medida em que que torna a admitir a responsabilidade, nesses casos de inscrição indevida, apenas do fornecedor, como exemplifica jurisprudência da Corte:

“Reconhecida a responsabilidade exclusiva da empresa pela inclusão injustificada do nome da autora em cadastro negativo de credito, caracterizadora do dano moral, a esta cabe a legitimidade passiva para a demanda e não à associação mantenedora do serviço de proteção ao crédito.” (STJ, REsp. 748561/RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, DJ 18/09/2006)

 
 
Restando comprovados, por outro lado, a negligência e má administração da empresa credora, ao permitir e autorizar que o nome da vítima fosse incluído indevidamente na lista de inadimplência dos arquivos de consumo, sendo submetido a situação vexatória,  os Tribunais vem reiteradamente reconhecendo como ensejadora de responsabilidade civil:
 
“Civil e Processual Civil. Indevida inclusão de nome em cadastro de inadimplentes. Ação de indenização por danos extrapatrimoniais. Recurso Especial. Prévia decisão. Presunção de dano extrapatrimonial.
- É parcialmente inadmissível recurso especial, quando ausente prévia decisão no acórdão recorrido a respeito de determinadas questões federais suscitadas.
-       Da indevida inclusão de nome de devedor em cadastro de inadimplentes decorre a presunção de existência de dano extrapatrimonial indenizável.” (grifou-se) (AGA 467798 / RJ; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2002/0104758-(0))
 
*******
 
“Responsabilidade civil. Protesto de título e inclusão indevidos em cadastro de inadimplentes. Danos morais. Cabimento. Sucumbência recíproca. 1 — O protesto de título e a inclusão indevidos em cadastro de inadimplentes caracterizam dano moral, independentemente da demonstração objetiva de prejuízo, ou de repercussão do dano material naquele, ou ainda de que o incidente tenha chegado ao conhecimento de terceiros (Carta Magna, art. 5.º, X). Precedentes desta Corte e do STJ. 2 — Atento aos 
princípios de que na “reparação de danos morais ou extrapatrimoniais, deve ser estipulada cum arbitrio boni iuri, estimativamente, de modo a desestimular a ocorrência de repetição de pratica lesiva; de legar à coletividade exemplo expressivo da reação da ordem pública para com os infratores e compensar a situação vexatória a que indevidamente foi submetido o lesado, sem reduzi-la a um mínimo inexpressivo, nem elevá-la à cifra enriquecedora” (AC 96.01.15105-2/BA, Rel. Des. Fed. Mário César Ribeiro, 4.ª T., DJ de 21-5-1998, p.79), bem como considerando que a autora não comprovou dano moral superior ao que ocorre na generalidade dos desagradáveis casos de protesto indevido e inscrição em cadastro de inadimplentes, e levando-se em conta, ainda, o valor do protesto — R$ 158,00 (cento e cinqüenta e oito reais) —, e o curto espaço de tempo em que ela teve seu nome indevidamente inscrito no SPC e no SERASA, mantenho o valor da indenização fixado pela sentença, de R$ 10.000,00 (dez mil reais), quantia esta que não é elevada de forma a causar o enriquecimento ilícito da autora, e que se encontra dentro do limite considerado razoável pelo STJ para casos semelhantes. 3 — Inocorrência de sucumbência recíproca a atrair a aplicação do disposto no art. 21, caput, do CPC, pelo fato de a autora haver pedido indenização de 283 mil reais e de a sentença ter concedido 10 mil reais, uma vez que o valor pedido a título de indenização por danos morais é apenas estimativo. Precedentes do STJ. 4 — Apelação da CEF a que se nega provimento. Apelação da autora provida em parte”. (TRF-1.ª R.; Ap. Cív. 1999.38.00.018643-2/MG; Apte.:  Papelaria Kriativa Ltda. e Caixa Econômica Federal (CEF); Advs.: Ana Paula Cantão, Patrícia Soares Antonacci e outros;)
 
 
No mesmo sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que tem sido pacífica no sentido de que “o protesto indevido de duplicata enseja indenização por danos morais, sendo dispensável a prova do prejuízo[4] Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça entende que, "em se tratando de indenização decorrente da inscrição irregular em cadastro de inadimplentes, a exigência de prova de dano moral (extrapatrimonial) se satisfaz com a demonstração da existência da inscrição irregular nesse cadastro"[5].
Sendo assim, a demonstração da conduta danosa da Ré, da lesão suportada e do nexo de causalidade entre eles, é suficiente para gerar a obrigação de indenizar a vítima nas relações de consumo.
Dessa forma, a partir da análise dos julgados, resta indubitável outro aspecto de significativa relevância: a desnecessidade de prova quanto ao dano moral, como observado por Leonardo Garcia:

“A jurisprudência atual do STJ entende que a simples inscrição irregular já é por si só suficiente para configurar o dano moral, não havendo necessidade da prova do prejuízo sofrido (...)” (GARCIA, 2010. p.285)

 
Com isso, não há a necessidade de efetivamente demonstrar-se algum dano ocorrido na esfera extrapatrimonial da vítima, tendo em vista que nesses casos de inscrição indevida em sistemas de proteção ao crédito, o dano moral é presumido.
 
5 Considerações finais
Com o recrudescimento das relações de consumo, há um crescimento significante no número de inadimplentes. Assim como já explanado, torna-se imperioso a criação de um mecanismo de proteção entre os lojistas e as empresas de um modo geral. Dessa maneira, foi concebido os arquivos de consumo dos sistemas de proteção ao crédito, que tem como escopo o registro de maus pagadores em âmbito regional ou nacional, para que assim os credores possam ter mais segurança na realização de futuros negócios comerciais.
Dessa forma, este artigo, trouxe de forma objetiva, uma visão holística de como se formaram os bancos de dados de consumidores, e os tipos de serviços que essas associações oferecem. Ainda foi possível observar, quais os procedimentos para inclusão e exclusão de consumidores em tal cadastro, haja vista que essa operação trás intrinsecamente inúmeras relações jurídicas por consequência da responsabilidade civil das empresas credoras e associações.
Não obstante as diversas decorrências jurídicas decorrentes da inscrição em cadastros de sistemas de proteção ao crédito, restringiu-se ao estudo da possibilidade de dano extrapatrimonial resultante da inscrição indevida em arquivos de consumo. Dessa forma, analisou-se à quem incumbe o ônus de indenizar, bem como a (des)necessidade de prova do dano material.
RERÊFENCIAS

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GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor: código comentado, jurisprudência, doutrina, questões. 6 ed. Niterói: Impetus, 2010.



[1]  Paper apresentado a disciplina de Títulos de Creditos da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Alunos do 5° periodo noturno do Curso de Direito da UNDB.

[3] Professor Mestre, Orientador.

[4] (REsp 312.597/SP, 4.ª T., Rel. Min. Aldir Passarinho Jr., DJ de 24-6-2002, e REsp 389.879/MG, 4.ª T., Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 2.09.02).

[5](REsp 165.727/DF, 4.ª T., Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 21-8-1998).