1.  HISTÓRICO DO INSTITUTO DA PENHORA ON LINE NO DIREITO BRASILEIRO

 

            O direito não é estável, as inovações tecnológicas e os novos parâmetros sociais ensejam modificações em todas as esferas de inter-relacionamento humano. Novas atitudes e posicionamentos são cobrados do Estado, especialmente do Poder Judiciário na busca pela efetividade da Justiça e na correção dos atos lesivos aos cidadãos jurisdicionados que nas portas dos tribunais batem todos os dias na busca da satisfação de seus direitos.

 

            No Brasil, o Código de Processo Civil que regula o devido processo legal e também, por consequencia  a expropriação dos bens dos devedores, data do ano de 1973 e embora tenha sido considerado um marco para sua época,  tornou-se nos últimos anos absolutamente defasado.

 

            O volume de ações na Justiça do Brasil, especialmente após a Constituição Federal de 05 de outubro de 1988 subiu em progressão geométrica, fruto da constitucionalização dos direitos da imagem e da pessoa, em especial do dano moral, além do advento em 1990 do Código de Defesa do Consumidor que visou igualar perante os Tribunais a situação do consumidor como parte fragilizada na relação de consumo e transferiu todo o ônus probatório para as empresas produtoras ou prestadoras de serviços. Hoje tramitam na Justiça brasileira cerca de 90 milhões de processos, conforme estimativa do Superior Tribunal de Justiça (  Consulta realizada em 29/12/2012 – link: http://www.valor.com.br/brasil/2618526/volume-de-penhora-line-e-crescente.).

 

            Em 1995, foi editada a Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais (Lei Federal nº 9099) para tentar contar a demanda de causas de menor valor na esfera civil, visando essencialmente as relações de consumo de pequeno vulto, todavia o processo de execução, ou seja, os atos processuais deveriam seguir o mesmo tramite das regras do Código de Processo Civil.

 

            Aqui há de esclarecer uma das grandes falhas do procedimento então vigente no Código de Processo Civil, quando o juiz proferia a sentença e após a interposição dos recursos legalmente previstos, iniciava-se um “novo” processo que exigia uma nova citação do devedor da obrigação (geralmente de pagar) e somente após a penhora de bens desse é que lhe nascia o direito de contestar os valores da sentença com direito à uma nova defesa e recursos cabíveis tornando o processo executivo um  verdadeiro martírio para os credores.

 

            Muitas vezes a localização de um bem demorava anos e quando encontrado começava a disputa sobre valores, prescrição intercorrente, etc.

 

            Era esse o quadro caótico então existente, lembrando também que as mesmas normas se aplicavam na Justiça do Trabalho que no Brasil é órgão jurisdicional destinado a resolver as disputas judiciais entre os empregados e seus empregadores.

 

            Deve-se ressaltar aqui que as ações promovidas contra do Estado em suas esferas federal, estadual ou municipal segue um regramento próprio que não é objeto deste trabalho.

 

            A  economicamente a resolução das questões pela via judicial, embora ainda seja a ultima ratio, era um símbolo na ineficácia da administração pública na execução dos atos destinados a reparar toda forma de lesão seja ao patrimônio do cidadão como ao do próprio Estado.

 

            Como já dito, o direito não estático, exige novas posturas e ações de todos os chamados operadores do direito, advogados, juízes, procuradores das três esferas do Estado e o Ministério Público, em suas esferas federal e estadual e a solução para dar uma melhor efetividade às decisões judiciais veio dos mecanismos de administração bancária que estão sobre a jurisdição, fiscalização e controle do Banco Central do Brasil.

 

            No inicio da década de 1.990 os procuradores federais da fazenda nacional passaram a solicitar informações através do Banco Central do Brasil para que este, através de seu sistema de informações determinasse aos Bancos, Caixas Federais e Estaduais e outras instituições financeiras que informassem a existência de contas-correntes e ativos financeiros em nome dos devedores e  outras pessoas acusadas de crimes contra a economia e a ordem tributária, como por exemplo a “lavagem de dinheiro”.

 

            Esse primitivo sistema  exigia o envio de cartas e ofícios a todos os bancos e entidades financeiras sujeitos à fiscalização do Banco Central do Brasil.

 

            A busca pela localização de bens dos devedores passou no ano de 1991 a ser requerida aos juízes da esfera civil e comercial, que inicialmente foram contrários a tais postulações. Mais que isso o sistema exigia a expedição de um ofício (comunicado) físico ao Banco Central do Brasil que por sua vez solicitava aos bancos e entidades financeiras que informassem ao juiz da causa a existência valores passíveis de penhora.

 

            Ainda que inovadora a ideia e o procedimento ainda se mostravam ineficientes, todavia uma nova evolução tornou o sistema extremamente eficiente para a administração pública que foi a criação da “penhora on line”, destinada a bloquear, de imediato, valores do devedor, em qualquer lugar do Brasil, por via eletrônica, através de ordem judicial.

 

            A “penhora on line” demorou mais de dez anos para evoluir, tendo alcançado sua ampla aceitação no final do ano de 2000, quando foi firmado um Convênio entre o Banco Central do Brasil e o Poder Judiciário, criando-se o sistema denominado BACENJUD[1], através do qual a ordem de bloqueio de valores e respectiva penhora passou a ser feita eletronicamente por uma ordem que parte do próprio juiz, autorizada mediante senha e enviada pela rede mundial de computadores (internet) ao Banco Central do Brasil e repassada aos bancos e entidades financeiras  e de forma quase imediata, bloqueia a conta-corrente e demais ativos financeiros pertencentes ao devedor.

 

            Mas foi somente no ano de 2006[2] que o legislador brasileiro levou a cabo institucionalização dessa forma de atuação judicial através de uma verdadeira mini reforma do Código de Processo Civil na parte relativa à execução dos valores devidos aos credores.

 

            A penhora de dinheiro foi colocada em primeiro lugar no rol de preferência de bens penhoráveis e o bloqueio por via eletrônica, a através do Banco Central do Brasil, foi legalmente autorizada, com isso o sua aplicação se alargou em especial no âmbito da justiça do trabalho, aonde vem sendo amplamente aceita.

 

            Anualmente milhares de ordens de bloqueio são dirigidas ao Banco Central do  Brasil e aos entes sob a fiscalização e orientação do mesmo com uma ampla efetividade.

 

2. ANÁSE DO INSTITUTO SOBRE A ÓTICA DA  ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO

 

            Passamos, agora, a analisar o instituto da “penhora on line” sob a ótica da Análise Econômica do Direito e para tanto se faz necessário fazer as considerações  sobre os conceitos dessa disciplina e para tanto socorremo-nos às palavras de  Serau Júnior[3]:

                                      A Economia é a ciência da eleição racional  em um mundo onde os recursos são limitados em relação às necessidades humanas. A tarefa da Economia, portanto, consiste na exploração das implicações de supor que o homem procura, de forma racional,  (POSNER, 2007, p. 25).

                                      À partir desses fundamentos a AED raciocina sobre a utilização e distribuição de recursos sociais, tidos como escassos, de acordo com 3 princípios fundamentais:  racionalidade, equilíbrio e eficiência (POSNER, 1998, p. 11; RODRIGUES, 2009, p. 12; COOTER ULEN, 1999 p. 24-25).

                                      ...

                                      A relação de equilíbrio ademais, ocorre  através da chamada  lei de  oferta e procura a qual pode ser deixada ao livre alvedrio dos componentes do mercado, ou ao revés  ser conduzida por atos de autoridade.

                                      O conceito de eficiência, por sua vez, pode ser entendido  como a hipótese  em que, alteradas algumas condições (tal como a modificação das leis já existentes) melhora-se a condição de alguém  ou alguns . sem piorar a situação dos demais, num axioma conhecido como ótimo de Pareto. A piora da situação de alguns  só poderia ocorrer a partir do consentimento destes e, sobretudo, mediante algum grau de compensação – conforme o modelo  de Kaldor-Hicks (RODRIGUES, 2007, p. 26-28; ROEMER, 2008, p. 27-32, POSNER, 2007, p. 40; COOTER, ULEN, 1999, p. 66).

                                      Outro conceito de ótimo econômico, igualmente importante define como o ponto em que  o custo marginal se iguala ao benefício marginal. Quer dizer, um tomador de decisões aumenta comparativamente ao nível inicial, o que esteja fazendo , aumentando, assim, o custo da transação, agora identificado como  custo marginal.  Obterá , porém, um benefício ou utilidade adicional, do  que aquilo  eu fora  considerado  no nível inicial,  agora identificado  como benefício marginal (COOTER, ULEN, 1999, p. 36-37).

                                      Para a AED as normas jurídicas  seriam em relação às condutas  pessoais como preços em relação  aos bens e serviços. Ademais, o sistema jurídico também, tenderia  à eficiência, considerada como maximização  de riqueza ou das preferências (ROEMER, 2008, p.14-25).

 

 

            Aplicando-se os conceitos acima surge inicialmente a análise do princípio da racionalidade uma vez que a penhora “on line” deriva de uma  norma focada na melhor forma de se obter recurso pecuniário para que um débito posto a apreciação do Poder Judiciário seja saldado de forma lógica e menos tormentosa ao credor.

 

            O equilíbrio social e negocial ficam mantidos e são  conduzidos por ato de autoridade cujo objeto é a satisfação de um direito do credor em oposição a indevida resistência do devedor.  A tendência é de tornar mais ativa a posição do devedor no sentido de qual saldar o débito ou compor a dívida mediante parcelamento do débito, transação ou dação em pagamento é melhor do que sofrer a penhora de valores em sua conta-corrente e ou aplicações financeiras, embora isso em muitos casos não ocorra, apensar do aumento do custo para o próprio devedor.

 

            Com referência ao princípio da eficiência a alteração legal, precedida pelo Convencionado,  melhorou a situação dos credores, simplificando o recebimento dos valores que lhe são devidos.

 

            Some-se o princípio da eficiência a diminuição do tempo de tramitação do processo executivo que poderia levar anos a fio como ocorre em muitos casos onde não se obtém o bloqueio de valores em espécie.

 

            Mas não é só: o custo do processo para a parte e para o Poder Judiciário diminui grandemente, caso a penhora ocorra sobre um bem móvel ou imóvel é necessária a avalição do bem, com aumento dos custos para as partes  com os honorários do avaliador a ser nomeado pelo juiz, a publicação de editais tanto eletrônicos como físicos (jornais de grande circulação), arrematação ou não do bem, o que com certeza demanda muito tempo e custo, de maneira que o instituto da  penhora “on line”  se gera na prática um resultado de ótimo econômico pois fica claro que seu custo extremamente baixo (porque o ato parte de utilização de sistemas eletrônicos de baixo custo e efetividade quase imediata) gera um benefício marginal com a redução dos prazos e tramites processuais bem como a  diminuição do quadro de juízes e funcionários destinados cuidar dos processos em andamentos, ou seja, menor utilização da maquina estatal sem contar, como já dito, a rápida e efetiva satisfação do credor.

 

            Naturalmente não é um sistema perfeito, existem erros, abusos do sistema, penhoras indevidas de valores impenhoráveis como, v.g. salários, benefícios da previdência social e pensão alimentícia, mas são questões que, na maior parte das vezes,  pode ser corrigida.

 

3. CONCLUSÃO:

 

            O instituto da penhora “on line” alterou substancialmente o processo judicial de execução de bens do devedor para satisfação do credor em diversos aspectos e simplificando a tramitação de grande parte das ações em andamento com larga aplicação não somente perante a justiça civil e comercial, mas especialmente na justiça do trabalho onde tem ampla aplicação.

 

            Essa forma de penhora atende aos fundamentos econômicos da racionalidade equilíbrio e eficiência contribuindo para a rápida e efetiva solução dos milhares de processos em tramite pelos Tribunais Brasileiros.

 



[1]  O sistema  BacenJud 1.0, surgiu em 2001 por meio do Comunicado Bacen n° 8.422.

[2] Le Federal 11.382, de 6/12/2006, publicada no Diário Oficial da União em 7/12/2006.

[3] SERAU JUNIOR, Marco Aurélio, Economia e Securidade Social Análise Econômica do Direito Seguridade Social, Curitiba, Juruá, 2010, p. 53-54.