Autores: Aidil Lucena Carvalho; Bertoldo Klinger Barros Rego Neto; Filipe Franco Santos.


Alunos da Faculdade UNDB - São Luis (MA)


Sumário: Introdução; 1 Os fundamentos da pec  n º 341/09; 2 O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado na constituição de 1988; Conclusão;  REFERÊNCIAS.

 

RESUMO

O presente trabalho pretende elaborar um estudo a respeito da necessidade de efetivar uma proteção ambiental sob o viés constitucional, que construa sua racionalidade apoiada em uma perspectiva do bem ambiental como um direito fundamental, que deve ser protegido e garantido à coletividade. Dessarte, fundamental será a análise crítica desenvolvida sobre o projeto de emenda constitucional nº 341/09, que tem como escopo “enxugar” a Constituição brasileira, retirando portanto, o artigo 225, que dispõe sobre a proteção ao meio ambiente. Desta forma, partir-se-á da premissa dos estudos geracionais dos direitos fundamentais, estipulando as peculiaridades da terceira geração de direitos e a necessidade da proteção ecológica pela Constituição, como meio de concretizar as formulações epistemológicas da teoria constitucional e também conferir maior força normativa ao dispositivo concernente à proteção ambiental.

 

PALAVRAS-CHAVE

Proteção ambiental. Direitos Fundamentais. Constituição brasileira.

 

INTRODUÇÃO

 

 

Ao longo da trajetória dos direitos fundamentais, a realidade social foi constantemente moldando e gerando subsídios para mais interpretações e deliberações sobre esta matéria, neste processo de racionalização tivemos no primeiro momento os direitos de primeira geração, que “correspondem aos direitos individuais do modelo clássico de Constituição. (...)resguardando direitos considerados indispensáveis a cada pessoa humana.”[1]; posteriormente, a segunda geração trouxe a noção de um Estado assistencial, que deve conferir a seus cidadãos um mínimo de garantias sociais essenciais à sua subsistência. Nesse mister, temos a partir do segundo quartel do século XX um processo crescente de codificação de valores transindividuais, que marca a consolidação da terceira geração de direitos, cuja destinação não se restringe a um único indivíduo, tampouco a uma sociedade pátria. Há o que chamamos de cosmopolitização de direitos, ou seja, “esses novos direitos visam à proteção de todo gênero humano e não apenas de um grupo de indivíduos. No rol desses direitos, citam-se (...), o direito ao meio ambiente.”[2] (grifo nosso).

Abrangendo essa nova dimensão dos direitos fundamentais, o texto constitucional brasileiro de 1988 foi o primeiro na história do Brasil a reconhecer o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado como uma responsabilidade estatal a ser regulada pela Constituição.[3] Em seu artigo 225 ela traz uma série de princípios e responsabilidade (para o Estado e para sociedade) cuja função é solidificar uma consciência de preservação ambiental no âmbito nacional.

Contudo, um projeto de emenda constitucional tramita no Congresso Nacional. Tal projeto tem como finalidade (nas palavras de seus próprios proponentes) “enxugar” o texto de nossa carta magna. Nessa “mutilação” à nossa Constituição, teremos um texto com 70 artigos, onde nada se regulará sobre o meio ambiente, sobre a ordem social. Destarte, tendo em vista que a tensão entre o direito a um meio ambiente saudável e o direito à liberdade e propriedade estão em constantes conflitos, retirar da Constituição o capítulo sobre Meio Ambiente seria abrir mão do relevante bem, que é a natureza. Isto porque, deixando de ser constitucional, e o direito a propriedade permanecendo, este se sobrepujará. Parafraseando as palavras do professor NICOLAU DINO, esta PEC representa o “’indiferentismo social’ implantado pela ideologia neoliberal, representado por uma concepção excessivamente individualista de coexistência.”[4]. O interesse difuso ficou longe de ser lembrado por essa PEC, portanto, longe de reafirmar as maliciosas palavras dos “enxugadores” da Constituição, é preciso que consideremos a conquista que ela representou para o povo brasileiro, e assim será feito.

 

 

1 OS FUNDAMENTOS DA PEC  n º 341/09

O projeto de Emenda à Constituição nº 341/09 é uma proposta metalingüística e com víeis sintético, criada pelo Deputado Federal Regis de Oliveira (PSC – SP), o seu intuito é condensar o atual texto Constitucional em apenas 70 artigos. Dentre os artigos que serão possivelmente suprimidos da Carta Magna temos o artigo 225 que reza matéria de cunho ambiental. A PEC 341/09 é um projeto que apresenta uma metodologia reformista da Constituição, tendo em vista uma reestruturação dos dispositivos constitucionais, ou seja, alguns artigos que não oferecem materialidade constitucional podem ser retirados para assegurar uma “pureza” da Constituição, deixando apenas os que possuem relevância na organização e funcionamento do Estado além das garantias e Direitos Constitucionais. A proposta está em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania, onde no dia 17 de Setembro desse mesmo ano, foi aprovado o requerimento que requer audiência publica para discutir a PEC 341/09.

Segundo a justificativa do projeto as matérias que não possuem uma essencialidade material da Constituição, seriam reguladas por leis complementares e por leis infraconstitucionais. Destarte, podemos intuir que a fundamentação usada pelo autor se concentra no conceito material de Constituição, de acordo com Bonavides “Constituição é o conjunto de normas pertinentes à organização do poder, à distribuição de competência, ao exercício da autoridade, à forma de governo, aos direitos da pessoa humana”. Ressalva ainda que algumas regulamentações presentes na Constituição não se direcionam a coletividade ao um tudo, apenas a um determinado grupo. Assegura também que a C.F deveria consagrar apenas a base da convivência social, pois os princípios inseridos axiologicamente nesse texto se expandem naturalmente através da legislação infraconstitucional, sendo assim, não é plausível uma Constituição dilatada de normas sem caráter material.

É mister analisar a proposta do ilustre Deputado, porém usando uma cautela no que refere-se a certos direitos, indubitavelmente no que concerne aos direitos fundamentais. É perceptível que nossa Constituição possui uma dilatação, contudo, no Estado Democrático de Direito não é plausível extrair direitos e garantias conquistadas por um processo dialético social, os chamados direitos fundamentais. Pretende esse projeto valorizar o legislativo e suprimir matérias sem relevância constitucional, entretanto, a PEC nº 341/09 leva em seu bojo algumas propostas de modificações que podem ferir esses direitos e garantias fundamentais. O artigo 225 que regula o Direito Ambiental e garante um meio Ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações, seria um desses Direitos suprimidos pela emenda. Podemos apontar um problema nesse projeto, pois uma vez esse dispositivo sendo retirado do texto constitucional estaria indo contra a teoria constitucional consagrada pelo Estado Federativo do Brasil. A explanação de Bonavides sobre essa teoria mostra a importância do direito Ambiental para a integridade da dignidade da pessoa humana e de sua cátedra como um direito transindividual, “dotados de altíssimo teor humanístico e universalidade, os direitos da terceira geração tendem cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um individuo de um grupo ou de um determinado Estado”.

Tendo em vista a substancialidade do meio Ambiental como um bem essencial para a qualidade de vida, não podemos nesse momento de crise ecológica desconstitucionalizar esse direito. Esse dispositivo configura uma proteção ao eco sistema brasileiro, direcionando o Sistema Nacional do Meio Ambiente e sua respectiva política de preservação ambiental. De fato é de se observar que esse artigo correlaciona princípios que seguramente podem garantir tal dispositivo no âmbito constitucional, temos o principio da dignidade da pessoa humana, temos o principio da razoabilidade que são normatizados dentro dessa norma de preservação do meio ambiente. Como já foi exposto acima se trata de um direito transindividual superior até mesmo a propriedade e deve ser consagrado na C.F como um direito inviolável.

 

2 O DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

 

A tão ovacionada Constituição cidadã de 88, não obstante as diversas estipulações sobre direitos individuais e sociais, trouxe também dispositivos que regulam não indivíduos, nem cidadãos, mas a comunidade como um todo, direitos que transcendem os limites nacionais e transcendem à sociedade internacional. Nesse âmbito, a proteção do Meio Ambiente é uma nobre responsabilidade incumbida à Constituição, trata-se de uma regulação que atende interesses transindividuais, ou seja, que abrange à sociedade como um todo, e surge com a “preocupação com a ‘questão social’, decorrente do surgimento da ‘sociedade de massa’, em que a maioria das relações econômicas e políticas é marcada pelo desaparecimento da individualidade do ser humano, diante da padronização dos comportamentos e das regras correspondentes”[5]. Desta forma, a professora MARIA HEILMANN se refere à Constituição como o “marco do ordenamento jurídico nacional, contemplando as principais teses e princípios consagrados em documentos internacionais adotados a partir da Conferência de Estocolmo de 1972 sobre o Meio ambiente”[6].

Partindo desta compreensão sobre natureza constitucional da proteção ambiental, a Constituição, “ além desses meios de atuação do Poder Público, impõe condutas preservacionistas a quantos possam direta ou indiretamente gerar  danos ao meio ambiente”[7]. Portanto, a proteção ecológica constitucional é não apenas um direito garantido à sociedade, mas também um dever de todos que compartilham com os bens naturais, o que é definido pela doutrina ambientalista como democratização da democracia, que refere-se à sociedade como um pólo ativo nas deliberações e no processo de “formação de decisões que repercutem em seus interesses específicos.”[8].

Com essa base na Constituição, a proteção ambiental passa a adquirir uma elevada hierarquia normativa, e por isso que faz-se indispensável a constitucionalização, que vincule os indivíduos e sobretudo as grandes empresas de exploração natural, desta forma, o desenvolvimento econômico estará vinculado cada vez mais a uma proteção do meio ambiente, efetivando o desenvolvimento sustentável, que concilie aspectos econômicos e ambientais.

É notável a evolução dos debates sobre preservação do meio ambiente desde sua constitucionalização, a professora MARIA HEILMANN pontua neste ponto que

sem dúvida, se pode concluir que a nova ordem jurídica ambiental evoluiu muito nas duas ultimas décadas, tanto para garantir, como implementar a proteção constitucional do Meio Ambiente, abrangendo o patrimônio ambiental natural e artificial , cultural.[9]

Logicamente que esse avanço não foi um mérito apenas da Constituição, muitas discussões e também muitas perdas ecológicas aconteceram nas ultimas décadas, que desencadearam nas codificações ambientais das ultimas décadas, porém, como salienta BENJAMIN,

somente por mediação do texto constitucional enxergaremos – espera-se – um novo paradigma ético-jurídico, que é também político-econômico, marcado pelo permanente exercício de fuga da clássica concepção coisificadora, exclusivista, individualista e fragmentária da biosfera.[10] (Benjamin. P. 65 – 66)

A proposição supracitada traz a tona uma importante reflexão que se choca com o projeto de emenda constitucional em trâmite no Congresso, por um lado os parlamentares pretendem excluir a proteção ambiental do texto constitucional, deixando sua regulação apenas para normas infraconstitucionais, contudo, nossos estudos doutrinários nos fazem perceber que nossa sociedade não pode se privar dessa conquista democrática, até porque podemos cair no erro de por não ser mais constitucional, a proteção ambiental perder força de efetividade, e também ser suprimido pelos interesses individuais (que permaneceram inclusos na Constituição).

 

CONCLUSÃO

 

 

A proteção jurídica do Meio Ambiente foi uma das conquistas democráticas da Constituição de 1988, não obstante as garantias individuais e sociais, esta constituição trouxe também um rol de interesses transindividuais, que destinam-se a toda coletividade, inclusive à comunidade internacional. Nessa estipulação constitucional sobre a proteção ambiental (contida no artigo 225), constata-se um poder de participação popular vinculada a uma força normativa devido a natureza constitucional do dispositivo e a relevância plural aos indivíduos.

Contudo, um novo projeto de emenda constitucional que tramita no Congresso Nacional, busca reduzir a Constituição cidadã para 70 artigos, e nessa redução (ou “enxugamento” como os parlamentares propõem) estaria incluso o capítulo referente ao Meio Ambiente. Neste caso, como já foi visto, percebe-se que o risco ao ambiente ecologicamente saudável é grande com essa proposta, uma vez que as normas ambientais seriam apenas mais uma em meio à infinitude normativa existente no sistema jurídico brasileiro.

Portanto, pretendemos que aquilo que foi exposto acima seja o reflexo da decisão no Congresso, que se decida pela manutenção de um Meio Ambiente saudável regulado pela Constituição, e não por uma colcha de retalhos sem uma referência magna à Constituição..

 

 

REFERÊNCIAS

 

BENJAMIN, Antônio Herman. Constitucionalização do ambiente e ecologização da Constituição brasileira. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito constitucional ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 57-130.

BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 10. Ed. São Paulo: Malheiros. 2000.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 37. Ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2005.

COSTA NETO, Nicolau Dino de Castro. Proteção jurídica do meio ambiente: florestas. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

DA SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 19ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2001

HEILMANN, Maria de Jesus Rodrigues A.. Breves considerações sobre o ordenamento jurídico ambiental: realidade brasileira e o direito comparado. In: Revista do Ministério Público do Estado do Maranhão: Juris Itinera/ Procuradoria Geral de Justiça. v. 1, n. 1, (jan./dez.1991-  ) – São Luís: PGJ, 2008. n. 15.

MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2008.

PINHO, Rodrigo César Rabello. Teoria geral da constituição e direitos fundamentais. 2ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2001.

WEIS, Carlos. Os direitos humanos e os interesses transindividuais. Disponível em: < www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/.../Tese3.doc >. Acesso em: Nov. de 2009.

 



[1] PINHO, Rodrigo César Rabello. Teoria geral da constituição e direitos fundamentais. 2ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 61.

[2] MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2008, p.52.

[3] BENJAMIN, Antônio Herman. Constitucionalização do ambiente e ecologização da Constituição brasileira. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato (org.). Direito constitucional ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007,pp. 57 – 64.

[4] COSTA NETO, Nicolau Dino de Castro. Proteção jurídica do meio ambiente: florestas. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p.42.

[5]WEIS, Carlos. Os direitos humanos e os interesses transindividuais. Disponível em: < www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/.../Tese3.doc >. Acesso em: Nov. de 2009, p.13.

[6] HEILMANN, Maria de Jesus Rodrigues A.. Breves considerações sobre o ordenamento jurídico ambiental: realidade brasileira e o direito comparado. In: Revista do Ministério Público do Estado do Maranhão: Juris Itinera/ Procuradoria Geral de Justiça. v. 1, n. 1, (jan./dez.1991-  ) – São Luís: PGJ, 2008. n. 15. p.57.

[7]DA SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 19ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2001, p.821.

[8] COSTA NETO. Op. cit., p.41. 

[9] HEILMANN, Maria de Jesus Rodrigues A.. Breves considerações sobre o ordenamento jurídico ambiental: realidade brasileira e o direito comparado. In: Revista do Ministério Público do Estado do Maranhão: Juris Itinera/ Procuradoria Geral de Justiça. v. 1, n. 1, (jan./dez.1991-  ) – São Luís: PGJ, 2008. n. 15. p.63.

[10] BENJAMIN. Op. cit., 66 – 67.