* Heráclito Ney Suiter

 

 

   Em julgamento ocorrido no dia 17/06 no STF – Superior Tribunal Federal, a Lei de Imprensa (Lei nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967) a ser revogada resultou em um grande debate, em função de duas questões melindrosas, a do direito de resposta (qual já tecemos alguns comentários jurídicos em outro artigo) e a obrigatoriedade do diploma de jornalista para o exercício profissional. A decisão só teve um voto favorável à obrigatoriedade do “canudo”, colocando uma pá de cal sobre um tema que dividiu opiniões dos profissionais da área, inclusive no meio de quem já detinha o diploma para o exercício do jornalismo.

 

   Essa polêmica se arrasta desde 1969, quando o regime militar ditatorial decretou a lei 972, exigindo a obrigatoriedade do diploma de nível superior para o exercício do jornalismo, na época, uma estratégia dos militares como forma de restringir o direito à crítica.

 

   Historicamente, é fato inconteste que a categoria dos jornalistas, não acompanhou, por incrível que pareça (até porque se trata de um profissional da área de comunicação/informação) o desenvolvimento tecnológico referente aos direitos trabalhistas. No inicio da década de 80, um comunicador (jornalista, repórter, apresentador de telejornal e/ou radialista) em qualquer função que exercesse, ganhava bem mais do que atualmente (no mínimo, em valores atualizados, o dobro), o profissional da área não se mobilizou por melhorias salariais até então (a última vez que me lembro foi em 1979, um caso ocorrido de forma isolada na Folha de São Paulo).

 

   Além dessa desvalorização do salário do ‘jornalista’, ocorreu também que ele passou a trabalhar em grande parte das vezes para um conjunto de mídias sem ser remunerado. Tem grandes jornais por aí que dá celulares para que as pessoas possam enviar fotos para veiculação não só nos jornais impressos como nos segmentos do grupo de comunicação, como blogs e outros, fulminando com a profissão do repórter fotográfico.

 

   A relação de trabalho dos profissionais de comunicação modificou bastante em função da mudança de um sistema que passou de um capitalismo patrimonialista para um sistema de holdings (a criação de um tipo de empresa para administrar outras) o que é bastante evidente na área das empresas de comunicação, e foi um fator decisivo para a queda da representatividade social dos jornais e consequentemente, a desvalorização da classe trabalhista dos jornalistas. Isso veio ocorrendo paulatinamente desde a implantação da República e a abolição da escravatura em nosso país, sendo que antes desses eventos, nossos jornais tinham uma participação na política local mais evidenciada.

 

   Nenhum diploma será capaz de impedir o exercício abusivo de uma atividade profissional, bons e maus profissionais existem em todas as áreas em que o homem labora, inclusive em algumas áreas como a medicina e o direito podem ser extremamente catastróficas. Comportamento ético profissional não se resolve com emissão de um título de nível superior, nem com provas de proficiência como a OAB vem praticando a um bom tempo - haja vista as irresponsabilidades cometidas por profissionais do direito. Outro ponto polêmico é que, em plena era da informação, obrigar diploma de jornalismo seria um absurdo, é estar na contramão do que ocorre em países de primeiro mundo como EUA, Alemanha, França, Itália, Inglaterra, entre muitos outros.

 

   Sem essa de querer comparar profissões como medicina, direito e engenharia – que por lei, são obrigados a estarem registrados em um órgão profissional regulador (puro corporativismo, pois nas nossas leis todos devem responder pelos seus atos) que na maioria das vezes protegem os maus profissionais que cometem verdadeiras aberrações. Todas as profissões são de vital importância, não é uma obrigatoriedade de diploma que vai fazer a diferença, ademais, sabemos dos danos de uma comunicação manipulada e tendenciosa e o quanto ela é capaz de destruir toda uma nação em apenas um golpe (a história vem comprovando isso).

 

   O jornalista da atualidade (sem generalizar, pois existem os bons) não está comprometido com a verdade e sim com o capital dominante, e com ele ninguém pode. Esse é um problema que também sofrem os administradores formados, que a muitos anos lutam pela obrigatoriedade do diploma de nível superior. Pensem, o capitalista não quer saber se a pessoa tem ou não diploma, para ele isso pouco importa, o que vale mesmo é resultado, o lucro, e essa é a lógica de um sistema que há muito tempo vem sendo defendido e paulatinamente implantado, principalmente pela mídia, o campo de trabalho do jornalista...  o pior é que essa devassa lógica de mercado começa a tomar corpo na área de saúde, justiça e educação, imaginem no que vai dar...

 

   Com a revogação da obrigatoriedade do diploma para o exercício de jornalista os meios de comunicação vão poder continuar contando com profissionais de alto grau de conhecimento em diversas áreas do saber humano. Vários são os jornalistas com “J” (maiúsculo) que nunca foram formados em jornalismo (mas sim em advocacia, economia, administração de empresas e até filosofia) que a título de salário poderiam ganhar muito mais atuando em suas profissões originais, e isso é fato, são profissionais que gostam do que fazem e dão lucro para as empresas que o contratam...

 

   Ridículo mesmo são aqueles que, mesmo antes de se formarem em jornalismo já exerciam a profissão com certa destreza e qualidade, e agora, só porque estão cursando jornalismo ou são portadores de um certificado emitido pela desqualificada indústria de diplomas, passaram a defender ardorosamente a insanidade da continuação da vigência de uma lei do regime militar em pleno século XXI.

 

   Liberdade de expressão é um dogma, não se discute. Defendê-la é um argumento tão parco como querer equiparar a obrigatoriedade do diploma de certas atividades profissional com o jornalismo (formação cultural, domínio do idioma, retidão de caráter, compromisso com a informação e com o público não se aprende em banco de faculdade), na realidade a decisão do STF deu vitória a ‘liberdade de amar o que se faz’, e quando isso acontece, ou seja, FAZER COM AMOR, aí surge o verdadeiro jornalista, totalmente comprometido com a verdade e com a ética, cuja curiosidade e a busca constante servem como mola propulsora para mantê-lo vivo em uma sociedade eminentemente corporativista, e não simplesmente, um profissional comprometido com o dinheiro e com a insanidade de alguns grupos...

 

 

* Heráclito Ney Suiter cursou pedagogia e administração de empresas, é bacharel de direito com pós-graduação em direito ambiental e trabalha como comunicador a 17 anos. Nesse ínterim atuou como produtor executivo de rádio-jornalismo em uma afiliada da Rede Globo no Tocantins, foi produtor e radialista de rádio AM e FM em Góias e Tocantins, foi gerente geral de telejornalismo em uma afiliada SBT no Tocantins e atualmente é sócio proprietário de uma agência de publicidade e um jornal impresso em Gurupi – TO.