Felora Daliri Sherafat é autora de uma Nova Teoria de Hierarquia das Necessidades Humanas. Esta teoria foi registrada primeiramente no seu livro “Você ainda Via Nascer”, publicado em 1996, e posteriormente defendida pela autora na sua dissertação de mestrado realizada em 2002 na Universidade Federal de Santa Catarina, quando a nova Teoria foi estendida para o campo de profissão e trabalho.

Na referida dissertação, ela mostra as deficiências das teorias anteriores, como as de Maslow e Herzberg, que na prática não funcionam, e há necessidade de estender esta hierarquia também às necessidades espirituais. Em 2006 a teoria foi publicada no livro “Trabalho e o Reencontro de Interesses!”.

Nessa teoria as necessidades humanas basicamente se dividem em três Níveis distintos, a saber: as necessidades materiais; as necessidades intelectuais e as necessidades espirituais.

 A Realidade Humana

Na maioria dos estudos, principalmente nos trabalhos dos pesquisadores que surgiram no último século, o homem é analisado como uma espécie de animal, mas inteligente. Desta forma, ao invés de aproximar o homem de suas necessidades legítimas e verdadeiras, podem afastá-lo. E eventualmente, devido a esta falha, o conceito de trabalho, as suas regras, o ambiente, as organizações e os relacionamentos, cada vez mais podem se afastar do seu objetivo original.

Levando em consideração que o trabalho é uma atividade essencialmente humana, que depende do potencial da criatividade, então, para entender melhor o verdadeiro significado do trabalho é necessário, antes de tudo, conhecer a realidade do homem, as suas características e suas necessidades, das mais primárias até as mais íntimas e elevadas e como devem ser atendidas estas necessidades.

O conhecimento da natureza do homem e do propósito da existência é importante no processo de desenvolvimento das faculdades da percepção e compreensão humanas, e indispensável para seu pleno desempenho e progresso.

Sobre a verdadeira natureza do homem há muita discussão e inúmeras explicações, mas uma das abordagens mais sustentáveis foi feita por ‘Abdu’l-Bahá no seu livro “O Esplendor da Verdade”. Ele define que a realidade do homem é constituída por três “entidades”1: a sua forma material ou o corpo, a mente ou intelecto e a alma racional ou espírito humano. É evidente que cada entidade representa a sua essência e individualidade, e tem sua própria característica:

 Corpo: “O corpo é o estágio físico ou animal do homem; o corpo como animal possui as faculdades dos sentimentos e é composto de elementos ligados pela lei da atração.”2

Mente: “A mente é a inteligência humana e sede dos poderes intelectuais. Sua qualidade essencial é representar o poder e a perfeição do espírito. A inteligência humana é a intermediária e o elo de comunicação entre o corpo e o espírito.”2

Espírito: “O espírito é a sede de revelação das qualidades e poderes espirituais. É o poder de descobrimento”. “Espírito humano ou alma racional abrange tudo” e, “dentro dos limites da capacidade humana, percebe a realidade das coisas.”2

Hoje em dia, há grande preocupação a respeito do estado físico e mental do indivíduo cuja importância, de certa forma, tem sido reconhecida. Porém, a verdade sobre a existência do espírito e as suas necessidades continua praticamente oculta ou mal interpretada.

A aceitação das três entidades é crucial para a descoberta das verdadeiras necessidades do indivíduo, e o reconhecimento desse fato é essencial para a promoção do pleno desenvolvimento das potencialidades humanas. Seguramente, o homem não poderá alcançar sua plena potencialidade se não conhecer as necessidades das três entidades.

 

As Necessidades das três Entidades do Homem

Levando em consideração que a realidade humana é composta de três entidades, cada qual deve ter suas próprias necessidades. De acordo com esta teoria, a autora apresenta a hierarquia das necessidades das três entidades de acordo com as próprias exigências e inerentes a suas essências, da seguinte maneira:

Corpo: como a estrutura de uma construção que é feita para abrigar, o corpo — estrutura física — tem o nobre objetivo de ser o ninho do espírito. Esta estrutura deve crescer e ser mantida em perfeita condição de saúde, de tal forma que permita o repouso e desenvolvimento do espírito.

No início da vida, o crescimento do corpo é rápido, mas, gradualmente, esta velocidade diminui até que o corpo chegue a um equilíbrio físico, onde o crescimento é mínimo, mas a renovação e reposição das células devem ser constantes. Obviamente, para melhor resultado, é necessário que, no percurso da vida, a pessoa siga precisamente os padrões ideais, onde todas as condições como alimentação, higiene, hábitos e o ambiente estejam favoráveis. Portanto, as necessidades básicas do corpo são: uma alimentação adequada, o esporte, a higiene e o sono. Estes são os direitos mais elementares do indivíduo.

Mente: Assim como o corpo, a mente requer desenvolvimento num ambiente saudável. Ela dispõe como instrumento bilhões de neurônios que a auxiliam no processamento e armazenamento das informações. O cérebro constitui-se de aproximadamente dez bilhões de neurônios. Cada neurônio recebe informação de milhares de outros e envia sinais a tantos outros. Portanto, o poder da mente é proporcional ao volume de informações, conhecimento e experiências adquiridas.

A sua evolução deve ser constante e nos mais variados aspectos, através de convivência com a natureza, de estudos, aquisição de ciências, artes e ofícios, invenções, descobertas, trabalhos, serviços e tudo o que aumenta o grau de percepção do homem. A seguir, algumas necessidades essenciais da mente, que são atividades que devem acontecer sempre para o desenvolvimento intelectual.

Curiosidade, alimentar o desejo de ver, examinar, saber, desvendar, aprender e conhecer;

Convivência com a natureza, para ter conhecimento abrangente de todos os seres e objetos que constituem o universo;

Organização, para estabelecer ordem em tudo que pertence à pessoa;

Adquirir Conhecimentos através da aprendizagem e o estudo das ciências;

Apurar o dom da Criatividade, oferecer oportunidade à capacidade criativa e à imaginação produtiva e inventiva;

Acelerar o Raciocínio, exercer atividades que ampliem o poder de raciocínio e desenvolvam a lógica;

Aumentar a Percepção, pôr em ação a faculdade de perceber, distinguir as verdades ocultas.

Perfeição, melhorar e aperfeiçoar constantemente tudo o que faz, no trabalho, no ofício e nos relacionamentos;

Associação, associar-se aos outros e cooperar nos assuntos de interesse coletivo;

Comunicação, interagir com os outros e expressar sua própria opinião;

Trabalho, ocupar-se com uma atividade que resulte em benefícios para outros e dela retire o próprio sustento.

Pesquisa, desvendar os segredos e mistérios dos seres, da natureza e da criação;

Ofício, desenvolver suas habilidades;

Arte, estudar e desenvolver a capacidade de pôr em prática, transmitir e cristalizar idéias e sentimentos;

Música, ouvir belas e harmoniosas melodias.

Espírito: O espírito é uma dádiva divina que se manifesta no corpo humano. Seu progresso e aperfeiçoamento, enquanto estiver ligado ao corpo, estão condicionados ao estado físico, à capacidade mental e aquisição das virtudes. Antes de o indivíduo atingir a maturidade, o progresso do espírito é lento, porque é preciso tempo para que a mente e o corpo atinjam o ponto mais elevado do desenvolvimento. Quando estes atingem a condição e combinações apropriadas, tem início um acelerado progresso do espírito que, com sua potencialidade, ilumina o corpo e a mente, dando-lhes maior maturidade e equilíbrio, o que, por sua vez, impulsiona mais o seu próprio desenvolvimento.

Os cuidados com o espírito têm como objetivo levar o homem a alcançar a perfeição espiritual e lhe conferir a sua verdadeira posição. Destinam-se a retificar o seu caráter, capacitá-lo a produzir frutos nobres. Tais cuidados e necessidades, durante a infância e adolescência, são basicamente da responsabilidade dos pais e educadores, e constituem a criação de um ambiente favorável ao desenvolvimento espiritual da criança. São eles:

Amor, alimentar o “feto do espírito” com amor e calor humano, através de palavras carinhosas e gestos cativantes.

Confiança, depositar confiança nela, criando desta forma o sentimento de segurança.

Respeito, tratar a criança com respeito, consideração e reverência.

Conhecimento do Criador, ensinar que Deus criou o mundo e que Ele é a origem da nossa existência.

Propósito da vida, explicar que o aperfeiçoamento do espírito é o nosso propósito.

, gerar confiança em Deus.

Oração, estabelecer um estado de comunicação com Deus e pedir a sua bênção e proteção.

Harmonia, o espírito da criança necessita sentir harmonia entre as pessoas e a sociedade, especialmente entre os pais.

A segunda parte das necessidades espirituais se afigura a partir da maturidade física, sendo o próprio indivíduo responsável por ela. São atitudes que devem ser incorporadas ao comportamento e ao modo de vida, algumas imediatamente, outras requerendo um exercício constante até sua completa assimilação. As mais fundamentais são:

Meditação, concentração do espírito na sua origem;

Paciência, tolerar as adversidades, conservar a tranqüilidade;

Tolerância, ser flexível e compreensivo em relação aos erros dos outros;

Veracidade, ser sincero e veraz em qualquer circunstância;

Honestidade, agir com toda honra e transparência.

Humildade, purificar-se de todo sentimento de orgulho, arrogância, vanglória e inveja.

Justiça, ser vigilante para não cometer injustiça com pessoa alguma.

Unidade, considerar todos os seres humanos como células de um único corpo.

Eqüidade, ter disposição de reconhecer igualmente o direito de cada um.

Castidade, ser puro, abster-se dos prazeres sensuais ilegítimos;

Fidedignidade, ser digno da confiança dos outros.

Desprendimento, reconhecer o valor limitado e transitório das coisas materiais;

Perdão, aprender a perdoar os erros dos outros.

Gratidão, ser grato por toda a existência e não focalizar a mente nas pequenas adversidades.

Servitude, dedicar-se ao serviço da humanidade;

Cooperação, trabalhar em grupo e contribuir com sua opinião e seu esforço para o progresso coletivo;

Lealdade, ser sincero, franco e honesto. Fiel aos seus compromissos;

Sabedoria, ter percepção das coisas invisíveis e ver as coisas visíveis da dimensão mais espiritual;

Auto-avaliação, examinar a si mesmo, cada dia, reconhecendo as falhas e corrigindo-as;

Auto-realização, colocar suas potencialidades em ação;

Autocontrole, ter domínio sobre suas emoções e sentimentos egoísticos;

De acordo com esta teoria, as necessidades mais essenciais do ser humano, como foi visto, se dividem em três grupos: as necessidades do corpo, da mente e do espírito. E o desenvolvimento pleno do indivíduo depende do grau de seriedade e da dedicação com que se empenha em cada item, no dia-a-dia da sua vida. A questão agora é como atender a estas necessidades?

 

Como Atender aos três Níveis de Necessidades

Em todos os momentos deve-se ter na mente os três níveis de necessidades do ser humano:

As necessidades materiais;

As necessidades intelectuais;

As necessidades espirituais;

Durante a infância é responsabilidade dos pais proporcionar atmosfera favorável para atender aos três níveis de necessidades dos filhos. Depois, a missão é completada com atividades escolares e estudos na universidade. Entretanto, quando o indivíduo se torna adulto, deve assumir toda a responsabilidade de dar continuidade ao processo de seu desenvolvimento em todos os aspectos. Este é um processo contínuo que evolui a vida inteira. 

Quando adulto, em primeiro lugar, o indivíduo deve sustentar a sua família e a si mesmo, suprindo suas necessidades básicas. Em segundo lugar vêm as necessidades mental e intelectual, que consistem em estudo, desenvolvimento de arte, ofício, ciência e todos os itens citados no segundo grupo das necessidades. É importante lembrar que, da mesma forma que qualquer célula viva necessita de alimento, os neurônios almejam por conhecimento e informação. A ausência destes é tão fatal para os neurônios quanto o alimento para o corpo.

Em terceiro lugar, o indivíduo precisa valorizar a sua dimensão espiritual e agir de acordo com a sua consciência transcendental. Para isso, é necessário atuar dentro dos padrões dos atributos dignos que consistem no aperfeiçoamento das virtudes. Assim, a terceira dimensão humana poderá ser geradora de um estado de tranqüilidade, paz e felicidade.

Contudo, na tradição dos antepassados, presume-se que o papel do trabalho é crucial e decisivo no prosseguimento deste processo e no atendimento aos três níveis de necessidades.

Para alcançar a plenitude humana é preciso atender às necessidades de todas as três entidades. Nessa nova visão, uma pessoa, a cada momento, deve se desenvolver nos três aspectos paralela e gradualmente.

 Toda atividade humana deve levar em conta estas três dimensões. Na tradição dos antepassados, presume-se que o papel do trabalho era crucial e decisivo no prosseguimento deste processo e no atendimento aos três níveis de necessidades.

É preciso trabalhar para se obter um rendimento razoável e suprir as necessidades básicas. Ainda, para o melhor desempenho no trabalho, é de extrema importância o emprego das ferramentas citadas no segundo grupo das necessidades, como criatividade, arte, conhecimento, disciplina e os demais parâmetros, pois estes garantem o desenvolvimento intelectual.

Neste mesmo raciocínio, para o entendimento e o relacionamento ponderado entre as pessoas, exige-se uma conduta adornada com parâmetros do terceiro grupo de necessidades humanas. A prática destas qualidades realça a verdadeira postura digna inerente à condição humana, e proporciona o prestígio almejado por todos.

 

A Hierarquia das Necessidades e o Trabalho

De acordo com a teoria da hierarquia das necessidades apresentada, o atendimento das necessidades, em grande parte, dependerá de um emprego, do tipo de trabalho, das atividades profissionais e da forma como se desenrolam as coisas no ambiente de trabalho.

Nesta visão, o emprego ou trabalho, além do rendimento financeiro, que atende às necessidades materiais, deve satisfazer as exigências cognitivas que atendem às necessidades intelectuais; e ainda deve retribuir aos anseios espirituais que correspondem às necessidades espirituais.

trabalho certamente deve gerar uma renda que atenda às necessidades básicas como: saúde, moradia, proteção, segurança e o sustento.

tarefa a realizar deve proporcionar o desenvolvimento dos neurônios e do intelecto, para que o indivíduo possa cognitivamente progredir. Pois uma pessoa deve exercitar através do seu trabalho as faculdades que são inerentes a sua capacidade, e só assim terá a satisfação da sua ocupação.

prática das virtudes nobres citadas no terceiro grupo de necessidades é crucial para garantir a integração da força de trabalho e evitar conflitos e desentendimentos.

Então, esta nova abordagem sugere três frentes de ação para as empresas com objetivo de criação dos meios necessários para a ampliação das potencialidades de seus empregados. Tendo em vista que com isso, além da empresa, a sociedade também se enriquecerá.

 

A Responsabilidade das Empresas

Uma pessoa no ambiente de trabalho pode e deve atuar de tal forma que possa se auto-capacitar e desenvolver as suas vocações. Ainda, deve agir de acordo com os parâmetros do terceiro grupo. Mas, sem apoio da empresa, e sem uma política e estratégia direcionadas para este fim, as tentativas individuais mais cedo ou mais tarde irão fracassar.

Por exemplo, devido a uma liderança inadequada, um excelente funcionário pode ser enquadrado para um serviço repetitivo. Deste modo, esta pessoa ficará abafada “no seu exílio”, sem poder aproveitar a sua criatividade ou desenvolver a sua capacidade. Esta situação pode durar anos, sem chance de mudança.

Outra situação constrangedora é quando um funcionário tenta se comportar dignamente de acordo com as virtudes relacionadas no terceiro grupo, e outros colegas de trabalho não se importam em se comportar do mesmo modo. Esta pessoa, mesmo agindo dentro dos conceitos corretos, se sentirá sufocada e se tornará vítima do ambiente desgastante do seu trabalho.

Hoje em dia é comum ocorrer este tipo de coisa no ambiente de trabalho, que além de causar desânimo e estresse para os afetados, gera enormes prejuízos para os cofres da empresa. Portanto, os dirigentes, com seriedade, devem agir na prevenção deste tipo de desencontro.

Isso requer que as instituições e empresas planejem as estratégias que possibilitam a implantação de um estilo de trabalho capaz de atender à hierarquia das necessidades nos três níveis como foi sugerido. As hierarquias de necessidades traçadas por Maslow e Herberg enfatizam o primeiro nível de necessidades, que trata mais das necessidades materiais. Nelas, as necessidades intelectuais não são abordadas de forma consistente, e as necessidades da terceira parte praticamente foram esquecidas. Talvez por isso mesmo os dois modelos não conseguiram corresponder às indagações das empresas, que ansiosamente estão buscando estratégias que possam diminuir os problemas e o  mal estar de seus colaboradores.

Baseada na nova teoria, as tarefas devem ampliar o conhecimento e a criatividade e, desenvolver os talentos do empregado, para atender suas exigências intelectuais. Normalmente, quando a pessoa se dedica a um empreendimento de iniciativa própria, ela consegue viabilizar estas condições. Por isso, muitas vezes as pessoas abandonam o emprego e partem para um trabalho autônomo.

A ausência dos parâmetros do terceiro nível, nas atitudes dos integrantes de uma empresa, também causa situações angustiantes. Por exemplo, uma pessoa pode ter um comportamento formal, distinto e educado, e ao mesmo tempo não ser honesta na sua intenção. Isso gera muitos estragos, mesmo invisíveis. Pois a avaliação de amplitude do impacto deste tipo de conduta está fora do alcance humano.

Os empresários ainda não acreditam na importância da prática dos itens do nível três e não imaginam o tamanho dos prejuízos que esta ausência causa para os empregados e para a empresa. A compreensão da questão consiste em admitir a grandeza da realidade humana.

Para estabelecer uma instituição bem-sucedida, deve-se criar campanhas de relacionamento virtuoso que promovam a atuação das qualidades nobres entre todos. A prática das qualidades e virtudes, como honestidade, fidelidade, dignidade, lealdade, bondade, humildade e desprendimento atende às necessidades espirituais dos indivíduos.

 A prática das virtudes é essencial para o fortalecimento dos laços de entendimento entre os membros de uma instituição. Esses laços são vínculos que constroem a estrutura firme e sólida da empresa. Os laços verdadeiros de companheirismo, amizade, solidariedade, sinceridade e confiança comovem as pessoas. Sem estes não haverá força, ânimo, motivação e entusiasmo suficientes para o desempenho adequado no trabalho.

Do Livro “Trabalho e o Reencontro de Interesses”, da autoria de Felora Daliri Sherafat

Felora Daliri Sherafat 


Instituto de Desenvolvimento da Nobreza Humana
Investir naquilo que não perece!