A NECESSIDADE DE REFORMULAÇÃO DA SAÚDE MENTAL NO BRASIL COM ENFOQUE NOS SERVIÇOS SUBSTITUTIVOS

Lívia Oliveira Bevilacqua
Graduada em Terapia Ocupacional pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas ? PUC em Campinas - SP
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Resumo: O artigo abordará como questão principal os denominados "serviços substitutivos" pensados para o início da Reforma Psiquiátrica e como estes se encontram atualmente. A princípio, contextualizaremos sobre o movimento da Reforma Psiquiátrica com enfoque no equipamento Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), já que este é o cenário cotidiano da minha prática profissional. Outro aspecto de grande importância para refletirmos é a necessidade destes serviços criados serem avaliados e supervisionados, uma vez que, sem estes parâmetros não se faz possível a melhoria da qualidade da assistência oferecida aos usuários, bem como a qualificação dos profissionais que exercem o serviço prestado por estes equipamentos de saúde mental. Este estudo foi possível a partir do levantamento de referências bibliográficas e correlações com as experiências vividas no cotidiano da prática de um serviço de saúde mental que se constitui em um CAPS III. Portanto, criaremos possibilidades de reflexões a cerca do tema aqui abordado.

Palavra chave: avaliação, CAPS, saúde mental, reforma psiquiátrica.

Abstract: The article will address the main issue as the so-called "alternative services" for the beginning of the psychiatric reform and how they are now. At first, we contextualize on Psychiatric Reform movement with a focus on equipment Psychosocial Attention Center (CAPS), since this is the daily stage of my professional practice. Another important aspect is to reflect the need for these services created have being evaluated and monitored since, without these parameters is not possible to improve the quality of care offered to users as well as the training of professionals engaged in the service for these mental health equipment. This study was possible from the survey of references and correlations with the daily experiences of the practice of a mental health service which constitutes a CAPS III. Therefore, we will create opportunities for reflection about the topic addressed here.

Key-words: avaliation, CAPS, mental health, psychiatric reform.

Introdução

Nos dias atuais, percebemos que as políticas públicas de saúde mental no Brasil, estruturadas para aquele determinado momento histórico, não suprem mais às necessidades da população que busca este tipo de serviço; não dão suporte suficiente para os trabalhadores que neles atuam, o que torna o trabalho insalubre e com alto índice de periculosidade; não possibilitam a tão mencionada "desinstitucionalização", entre outros problemas no campo do tratamento em saúde mental.
Em suma, os profissionais foram se adaptando às novas políticas públicas de saúde mental, influenciados pelos seus ideais, saberes científicos e políticos e aprendendo a construir e reconstruir os então denominados "serviços substitutivos", os quais tinham como objetivo principal, acolher os usuários que viviam, muitas vezes desde seu nascimento, dentro dos manicômios. Hoje, o cenário é composto por outras características e estes serviços ainda surgem com a mesma proposta de anos atrás. Que momento é este que vivenciamos e construímos na saúde mental? As "reformas" já foram reformadas?

As "reformas" psiquiátricas

O surgimento das primeiras "reformas psiquiátricas" se deu após o período da 2ª Guerra Mundial. Neste momento, a sociedade passou a notar o tratamento que era oferecido aos pacientes que se encontravam internados em hospitais psiquiátricos sob condições de vida desumanas e eram igualadas às mesmas oferecidas nos campos de concentração (AMARANTE, 2007).
No mesmo contexto histórico, o pós-guerra, vários países foram sofrendo importantes transformações psiquiátricas as quais, no geral, questionavam o modelo hospitalocêntrico e como estes eram gerenciados. Para aprofundarmos este assunto, que não é o objetivo deste artigo, há sugestões dos seguintes conceitos: psicoterapia institucional e as comunidades terapêuticas, sendo que estas representam as reformas restritas no âmbito asilar, a psiquiatria de setor e psiquiatria preventiva, representando um nível de superação das reformas referidas ao manicômio e, finalmente, a antipsiquiatria e as experiências surgidas a partir de Franco Basaglia, instauradoras de rupturas com os movimentos anteriores, questionando o próprio dispositivo médico-psiquiátrico e as instituições e dispositivos terapêuticos a ele relacionados. (AMARANTE, 2007).

A reforma psiquiátrica no Brasil

No Brasil, a Reforma Psiquiátrica surge entre os anos de 1978 e 1980, mais precisamente a partir do episódio conhecido como "Crise da DINSAM" (Divisão Nacional de Saúde Mental). Este é o órgão do Ministério da Saúde que tem como função formular as políticas de saúde do subsetor saúde mental.
Amarante (1998) descreve tal episódio, mais detalhadamente em sua obra Loucos pela vida ? a trajetória da Reforma Psiquiátrica no Brasil e que, em resumo, esta crise é desencadeada após a denúncia de três médicos bolsistas do Centro Psiquiátrico Pedro II, no RJ, os quais relatavam no livro de intercorrências do mesmo serviço, as irregularidades ali presentes, trazendo a público todo e qualquer tipo de problema que envolvia funcionários e/ou pacientes. Todos esses fatos permitiam o nascimento do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM), que possibilitou a realização de vários outros movimentos, instituições, militâncias e entidades (associações, federações, comissões, entre outros).
Em suma, é com o desenvolver do MTSM que surgem propostas de reformulação do sistema de assistência à saúde mental no Brasil e a consolidação do pensamento crítico ao saber psiquiátrico. Inúmeros eventos e acontecimentos importantes ocorreram, em meados da década de 80, para a sociedade brasileira e para a saúde mental do país. Um importante destaque é dado para a 8ª Conferência Nacional de Saúde e a I Conferência Nacional de Saúde Mental, entre outros. Mas, o destaque que nos interessa para a redação do presente artigo é a criação do primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS Professor Luís da Rocha Cerqueira, em São Paulo, 1982) o qual exerceu influências para transformações nos serviços já existentes e criação de novos ao longo do Brasil.
Outro conceito importante de ser citado é o de "desinstitucionalização" que expressa o deslocamento das práticas psiquiátricas, realizadas anteriormente no ambiente asilar, para a sociedade, comunidade (nos Estados Unidos), setor (na França), território (na Itália) ou qualquer que seja o nome dado ao contexto extra-hospitalar.
Para Delgado (2001), a criação de equipamentos substitutivos aos hospitais psiquiátricos desencadeia uma série de questões. Na modelagem brasileira estas são referidas no sentido de caráter técnico-administrativo, sendo elas: a necessidade de eficiência do sistema ambulatorial, a qual apresenta alta resolutividade nos casos graves e no número de internações. Aqui, o autor exemplifica os com os casos chamados de "emergências" e que para ele é algo meramente administrativo, ou seja, tem como objetivo controlar apenas os números das internações desnecessárias e a ampliação de recursos entre os leitos hospitalares e o ambulatório (desenvolvimento de ações para atendimento em hospitais gerais), como por exemplo, pensões protegidas, hospitais-dia e hospitais-noite.
Portanto, para que possamos repensar a modelagem de assistência à saúde mental brasileira com a finalidade de reformulação da mesma, faz-se necessário um estudo minucioso de quais são as demandas sociais, psicológicas e políticas da demanda que acessa atualmente estes serviços. Levando em conta critérios avaliativos de que casos de saúde mental são esses, atentando sobre as mudanças ocorridas, de uns anos para o atual, em relação ao crescimento no número de casos (epidemiologia da saúde mental) e variações nas suas características etiológicas, cada vez mais complexas. Ainda, não podemos deixar de citar a necessidade urgencial de instrumentos de avaliação para estes serviços, uma vez que implantados ainda não houveram avaliações da assistência prestada aos sujeitos portadores de sofrimento psíquico e a clínica executada pelos profissionais da saúde mental que compõe as equipes multiprofissionais de tais equipamentos de saúde.

O início da implantação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)

No projeto original de implantação (São Paulo. SES, 1986:02) destes equipamentos substitutivos aos serviços de saúde mental com modelagem manicomial, o CAPS apresentava como objetivos segundo Amarante (1998, p.82):

Criar mais um filtro de atendimento entre hospital e a comunidade com vistas à construção de uma rede de prestação de serviços preferencialmente comunitária; (....) se pretende garantir tratamento de intensidade máxima no que diz respeito ao tempo reservado ao acolhimento de pessoas com graves dificuldades de relacionamento e inserção social, através de programas de atividades psicoterápicas, socioterápicas de artes e de terapia ocupacional, em regime de funcionamento de oito horas diárias, em cinco dias da semana, sujeito a expansões, caso se mostre necessário.
Para melhor contextualização destes serviços substitutivos de saúde mental, abordaremos alguns fatos importantes que aconteceram no Brasil. Um episódio de destaque significativo ocorreu no dia 03 de maio de 1989, na cidade de Santos-SP, a partir da intervenção da Secretaria de Saúde do município citado, mais especificamente na Casa de Saúde Anchieta. Foram constatadas situações deploráveis incluindo óbitos, o que desencadeou o fechamento deste hospital psiquiátrico. Neste momento, o processo de reforma psiquiátrica ganha repercussão nacional. São criadas condições para a implantação dos serviços substitutivos ao modelo manicomial: os Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS), associações, cooperativas, instituições de moradia residencial, etc. Nestes serviços, então substitutivos ao modelo psiquiátrico tradicional, foram possibilitadas redefinições dos espaços dos antigos manicômios em inúmeros trabalhos e parcerias com o município. A partir de então, considera-se este momento um marco no período da reforma psiquiátrica no Brasil (AMARANTE, 1998).
Para Nicácio (1994) apud Amarante (1998, p.83), os NAPS apresentavam as seguintes características:

São regionalizados, funcionando 24h/dia e 7 dias/semana, devendo responder à demanda de saúde mental da área de referência. (...) Diferentemente de ambulatórios, dirigidos aos sintomas, a prática terapêutica do NAPS coloca a centralidade da atenção na necessidade dos sujeitos e, por isto, tem múltiplas valências terapêuticas: garantia do direto de asilo, hospitalidade noturna, espaço de convivência, de atenção à crise, lugar de ações de reabilitação psicossocial, de agenciar espaços de transformação cultural. O NAPS se orienta criando diversidade de redes de relações que se estendem para além de suas fronteiras, ao território.

A partir de documentos é possível uma melhor compreensão do que eram estes serviços, então pensados para suprir a demanda psiquiátrica que existia no Brasil naquele contexto histórico e que subsidiaria o início da abertura de vários equipamentos da saúde mental para atender a população brasileira.
O primeiro documento descrito neste artigo será o projeto original do CAPS Prof. Luiz da Rocha Cerqueira (inaugurado em 1987). Este foi elaborado pela Coordenadoria de Saúde Mental antes da construção do próprio serviço em si, com o objetivo de justificar e adquirir recursos para sua implantação; sendo assim não havia nenhuma fundamentação teórica. O projeto original do CAPS define a estrutura de seu funcionamento e o público-alvo o qual será assistido pela equipe de profissionais e caracterizado como aquele "socialmente invalidado", que apresentavam "patologias de maior complexidade", com "formas diferentes e especiais de ser". A população a ser atendida, ainda era eleita como "pessoas que tenham enveredado por um circuito de cronificação", "pessoas com graus variáveis de limitações sociais" e com "graves dificuldades de relacionamento e inserção social". O mesmo projeto ainda definia o CAPS como "estrutura intermediária" entre comunidade e hospital psiquiátrico e que possibilita às pessoas "um espaço institucional que buscasse entendê-las e instrumentalizá-las para o exercício da vida civil". A assistência proposta é integral, individualizada e executada através de "programas de atividades psicoterápicas, socioterápicas de arte e de terapia ocupacional" (Coordenadoria de Saúde Mental, 1987); com abordagem "multidisciplinar" e "pluri-institucional" (AMARANTE, 2001).
Por fim, o projeto do CAPS propõe que o referido equipamento de saúde mental funcione como:

Um núcleo de reflexão dos serviços, de sistematização de informações e experiências, gerando uma tecnologia capaz de ser transmitida aos profissionais de saúde mental, realizando investigações epidemiológicas, clínicas e institucionais na construção desta rede de serviços preferencialmente comunitária. (AMARANTE, 2001, p.29)

Cabe-nos refletir aqui, o quão este serviço sofreu mudanças em seu modo de atuação. Ou se é que mudamos os termos utilizados na nossa prática profissional? Os profissionais aprenderam no dia-a-dia a construir um serviço "pré-determinado" e sem saber ao certo o que teríamos como resultado. Posteriormente, abordaremos melhor a necessidade de haver avaliações destes equipamentos o mais breve possível, pensando que muitos destes serviços funcionam ao molde do projeto original e será que não há uma reprodução do manicômio, mas contemporâneo?

Os Núcleos de Atenção psicossocial (NAPS)
Tratando-se do projeto original do CAPS, se faz necessário explicitarmos sobre o projeto que deu origem aos NAPS. Este serviço nasceu em setembro de 1989, no contexto da transformação da saúde mental na cidade de Santos-SP, em decorrência à intervenção na Casa de Saúde Anchieta.
Diferente do surgimento do primeiro CAPS, o projeto em questão foi pensado após a criação do primeiro NAPS, o citado acima, e elaborado com embasamento em fundamentos teóricos de autores como Rotelli, Basaglia e Gramsci (AMARANTE; TORRE, 2001). Tem como eixo principal a "desconstrução do manicômio", focando a não segregação e a não exclusão institucional.
Este projeto dos NAPS aborda ainda estratégias e ações de base para a concretização de seus objetivos, sendo elas citadas a seguir. A primeira é de "regionalização", termo o qual expressa o significado de mudança de olhar, possibilitando considerar transformações culturais, ou seja, não sendo apenas uma divisão administrativa da cidade. Aqui, o profissional que estiver atuando em determinada região, terá a oportunidade de conhecer melhor as demandas e necessidades daquele território, bem como intervir nos demais serviços que tecem a região. Outra estratégia importante é a de "abertura do debate aos cidadãos", que constitui no diálogo com a comunidade através de outras instituições (igrejas, associações, etc.). É a possibilidade de o profissional técnico estar no território, que se dá em momentos ímpares como as visitas domiciliares, o contato para a coleta de dados a partir do diálogo com os vizinhos, entre outros.
Outra estratégia de suma importância, se não a principal (lembramos aqui que todas são essenciais para a construção do conjunto de ações), é a ação de elaborar um "projeto terapêutico". Este envolve o cuidado direto com o ser humano, permitindo o profissional tomar para si a responsabilidade de atender à demanda, evitando o abandono; atender à crise, a nosso ver, dar subsídios técnicos para o indivíduo realizar o tratamento. Por último, não podemos deixar de citar a estratégia de "transformação da equipe", que engloba o conceito de equipe e convida os profissionais a pensar e repensar a construção do próprio serviço, do trabalho juntos e se disponibilizarem internamente para discussões de relações de poder e de saber técnico da especificidade de cada profissão.
Ao abordarmos estes dois temas, os projetos originais de CAPS e NAPS, podemos concluir que estes são um tanto distintos e o quanto são essenciais e referências para nos auxiliar em reflexões e para a construção de novas experiências no campo da saúde mental. Vale citar ainda as portarias 189/91 e 224/92 do Ministério da Saúde, que instituem e regulamentam os novos serviços de saúde mental. Como foram referências para a implantação de vários novos serviços, percebemos ao analisarmos as mesmas, que estes tratam CAPS e NAPS como sinônimos

A Portaria 189/91 introduz dois códigos de NAPS/CAPS na tabela SIA/SUS, um para serviço de um turno e outro para serviço de dois turnos. A Portaria 224/92 define os NAPS/CAPS como "unidades de saúde locais/regionalizadas, que contam com uma população adscrita definida pelo nível local e oferecem atendimento de cuidados intermediários entre o regime ambulatorial e a internação hospitalar, em um ou dois turnos de 4 horas, por equipe multiprofissional", e que "podem constituir-se também em porta de entrada da rede de serviços para as ações relativas à saúde mental, considerando sua característica de unidade local e regionalizada. Atendem também a pacientes referenciados de outros serviços de saúde, dos serviços de urgência psiquiátrica ou egressos de internação hospitalar. Deverão estar integrados a uma rede descentralizada e hierarquizada de cuidados em saúde mental". E ainda: "São unidades assistenciais que podem funcionar 24 horas por dia, durante os sete dias da semana ou durante os cinco dias úteis, das 8:00 às 18:00 h, segundo definições do Órgão Gestor Local. Devem contar com leitos para repouso eventual?. (MS, PM 224;91in AMARANTE, 2001, p.32)

Portanto, a partir da análise de tais documentos, podemos perceber a grande necessidade do Ministério da Saúde investir no aprimoramento destes conceitos partindo da avaliação dos serviços já existentes (talvez, uma sugestão) sem desconstruí-los; investir na formação de técnicos e profissionais, buscando a qualificação da assistência à Saúde Mental no Brasil.

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) na atualidade

Segundo o Ministério da Saúde (2004), os CAPS são um dispositivo substitutivo aos hospitais psiquiátricos e estes devem estar articulados com a rede de serviços de saúde e com outras redes sociais com o objetivo de se formarem outras redes no que diz respeito à complexidade das demandas de inclusão dos usuários que possuem transtornos mentais severos e persistentes.
Neste mesmo sentido de construção de redes, os CAPS devem servir como articuladores na tecelagem das mesmas, cumprindo suas funções da assistência e regulando a rede entre os serviços de saúde, oferecendo o trabalho em conjunto com as equipes de Saúde da Família, apoio matricial para tais equipes, contando com a articulação de todos os serviços existentes entre outras redes, como por exemplo: sócio-sanitárias, empresas, escolas, jurídicas, entre outras (MINISTÉRIO DA SAUDE, 2004).
No mesmo sentido de articulador das redes, também são funções dos CAPS: fazer o direcionamento local de políticas e programas de Saúde Mental, desenvolvendo projetos terapêuticos individuais (PTI) e comunitários, dispensando medicamentos, encaminhamentos e acompanhamentos para usuários dos serviços residenciais terapêuticos, visitas domiciliares em parcerias com os Agentes Comunitários de Saúde e outro profissional qualquer da Saúde da Família.
Os CAPS são serviços de saúde abertos e comunitários do Serviço Único de Saúde (SUS). Atuam como lugares de referência e tratamento para:

Pessoas que sofrem com transtornos mentais, psicoses e neuroses graves e demais quadros, cuja severidade e/ou persistência justifiquem sua permanência num dispositivo de cuidado intensivo, comunitário, personalizado e promotor de vida.
O objetivo dos CAPS é oferecer atendimento à população de sua área de abrangência, realizando o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários. É um serviço de atendimento de saúde mental criado para ser substitutivo às internações em hospitais psiquiátricos. (Ministério da Saúde, 2004, p. 13).

Ainda para o Ministério da Saúde (2004) estes serviços têm como ações a serem realizadas: atendimentos em regime de atenção diária; gerenciamento de projetos terapêuticos que ofereçam cuidados clínicos e personalizados; promoção e inserção social dos usuários através de ações intersetoriais; organização da rede de saúde mental do seu território; oferecer apoio matricial na rede básica de saúde; regulação da porta de entrada da rede de assistência em saúde mental de sua área; coordenação em conjunto com o gestor local das atividades de supervisão de unidades hospitalares psiquiátricas que atuem no seu território e, finalmente, manter atualizada a lista com a identificação dos pacientes de sua região que utilizam medicamentos para a saúde mental.
Em relação aos espaços físicos dos CAPS, estes devem possuir espaços próprios de acordo para atender à população usuária e demanda específica, oferecendo um ambiente estruturado e continente. Os recursos físicos mínimos são: consultórios para atividades individuais, salas para atividades em grupos, espaço de convivência, oficinas, refeitório (as refeições são oferecidas a partir do tempo de permanência de cada usuário no serviço), sanitários e área externa para oficinas, recreação e esportes. (ÍDEM, 2004).
Os usuários que devem ser atendidos nos CAPS são aqueles que apresentam intenso sofrimento psíquico e que a partir deste são impossibilitados de viver e realizar suas atividades diárias e projetos de vida. São também pessoas que possuem algum tipo de transtorno mental severo e/ou persistentes, com grave comprometimento psíquico, incluindo transtornos relacionados ao uso de substâncias psicoativas (álcool e outras drogas), além de crianças e adolescentes com transtornos mentais.
O modelo de funcionamento destes serviços depende do tipo de CAPS que há em determinada região. O primeiro critério a ser considerado, quando o município decide implantar um serviço desses, é o número de habitantes da cidade. Ou seja, municípios com população entre 20.000 e 70.000 habitantes, implanta-se um CAPS tipo I. Já os municípios que possuem população entre 70.000 e 200.000 habitantes um CAPS II. E os municípios com população acima de 200.000 habitantes é implantado um CAPS III (este será o enfoque de nossa pesquisa, como mencionado anteriormente). Em relação aos CAPS Infantil (CAPSi), estes são possíveis de serem construídos em municípios com população acima de 200.000 habitantes e os CAPS Álcool e Drogas (CAPSad) podem ser implantados em cidades que possuam acima de 100.000 habitantes.
Focando os CAPS III, estes funcionam 24 horas, diariamente, também em feriados e finais de semana. São aptos à oferecer acolhimento noturno e permanência nos finais de semana, conforme o projeto terapêutico de casa usuário, sendo proporcionado como mais um recurso terapêutico, assim, evitando possíveis internações psiquiátricas. É importante resaltar que este recurso do acolhimento noturno deverá ser oferecido, preferencialmente, aos usuários que já estão vinculados ao serviço (MINISTERIO DA SAÚDE, 2004), considerando o vínculo com os profissionais do serviço, com o tratamento e adequando a real situação de demanda intensa que os CAPS vivem atualmente.
Além destes dados anteriores, o Ministério da Saúde (2004) preconiza ainda um número mínimo de profissionais para cada serviço desta complexidade (CAPS III), sendo: 2 (dois) médicos psiquiatras, 1 (um) enfermeiro com formação em saúde mental, 5 (cinco) profissionais de nível superior de outras categorias profissionais: psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional, pedagogo, professor de educação física ou outro profissional necessário de nível superior e 8 (oito) profissionais de nível médio: técnico e/ou auxiliar de enfermagem, técnico administrativo, técnico educacional e artesão (ÍDEM, 2004).
Considerando a prática cotidiana deste serviço aqui estudado, percebemos que este quadro de profissionais está bastante distante do ideal, pois este foi pensado para aquela situação em que os usuários estavam sendo desospitalizados e necessitariam realizar algum tipo de tratamento, bem como desocupar leitos de internações de hospitais psiquiátricos fechados. Mas como o passar dos anos este cenário foi sendo modificado, bem como a população que estava chegando aos serviços. Hoje, as pessoas que procuram e necessitam dos serviços de saúde mental, estão apresentando outro perfil de demanda e de sofrimento psíquico também. Este fator é um dos principais no que se relacionam às necessárias alterações que deverão ocorrer nas políticas públicas de saúde mental do Brasil.

Avaliação dos serviços de saúde mental: CAPS

Para embasamento teórico e prático no campo da saúde mental e com a abordagem sobre este tema avaliação, encontramos poucos materiais que trabalhem este assunto com mais precisão e que sejam norteadores para nossa prática profissional e da assistência ao usuário da saúde, em específico a saúde mental.
Tratando-se do conceito de avaliação estes são vários e se constituem a partir do referencial teórico de cada avaliador. Almeida e Escoreal (2001) definiram "avaliação", autores como Gula e Lincoln (1989), Contandriopoulos, et al. (1997), Carvalho (1999), Donabedian (1990), Vouri (1991), entre outros e, finalmente a Organização Mundial de Saúde (OMS), a qual será nosso embasamento para a finalização deste subtítulo do respectivo artigo.
A OMS apud Almeida; Escoreal (2001, p. 37) entende avaliação como um processo significativo:

Na medida em que permite a formulação de juízos apoiados em análises de situações específicas, com o objetivo de chegar a conclusões bem fundamentadas que subsidiem ações futuras. Os julgamentos formados não devem pressupor uma sentença final, ao contrário, devem ser pertinentes, sensíveis e acessíveis a todos os que deles possam fazer uso. Dessa forma, a avaliação só justifica-se quando permite uma retroalimentação dos processos em curso, a fim de corrigir, sanar ou evitar eventuais ?erros?, estabelecendo estratégias para melhorar a qualidade da assistência prestada.


Cabe ressaltarmos a importância do conceito de avaliação em outros campos, como o social, por exemplo; mas é de pleno interesse que abordemos o tema citado no campo da saúde mental. Sabemos que este é um campo de estudos recentes no Brasil e que trazem propostas com o objetivo de criarem novos instrumentos de avaliação apontando para o aprimoramento da qualidade dos mesmos e não só permanecer nos modelos de avaliação tradicionais utilizados pela clínica psiquiátrica contendo número de altas, diagnóstico e remissão de sintomas. Vale destacar aqui o fato da história dos modelos substitutivos ser recente e assim, apresentando-se em um momento em que a implementação e o cotidiano da clínica geram novos fluxos e demandas a partir das atuais políticas e programas implementados na área da saúde mental.
Outro fato importante e que deve ser considerado quando se pensa em criar indicadores avaliativos para um serviço de saúde mental, é o caminho percorrido para a construção destes novos indicadores. É necessário que haja a circulação para o interior dos serviços e não só a utilização de teorias ou "técnica-pura" (Amarante e Carvalho, 1999), possibilitando assim a interação entre o pesquisador e a instituição.
Quando pensamos nos possíveis indicadores a serem incluídos neste processo de avaliação de um serviço de saúde mental e as tentativas já ocorridas em alguns serviços de três estados do Brasil (Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo), percebemos que todos apontam para a dificuldade de se mensurar variáveis, uma vez que estas trazem fatores explícitos e implícitos como motivação dos profissionais trabalhadores, expectativas e satisfações da equipe com o serviço, número de profissionais contratados para aquele serviço, carga horária, entre outras. Consideramos ainda que adotar critérios avaliativos pragmáticos para este processo, não é suficiente para abranger a complexidade da experiência de um público específico como os usuários portadores de sofrimento mental.
Finalmente, consideremos a importância de existir uma definição de um modelo teórico como etapa anterior a construção e implantação de programas e serviços públicos, o que acaba não acontecendo como parte de projetos em nosso país:

(...) um processo de avaliação pode incluir também a construção de um modelo teórico da realidade a ser estudada, a partir dos objetivos implícitos e explícitos existentes, de modo que o produto final seja discutido e legitimado pelos atores sociais envolvidos. Pode-se afirmar que pra realizar qualquer tipo de avaliação é preciso que estejam disponíveis indicadores capazes de quantificar e/ou qualificar de forma o mais próxima possível do real fatos, processos e situações complexas que não podem ser apreendidas sem mediações. Dessa forma, "(...) o indicador é, simplesmente, uma forma de nos aproximarmos do conhecimento de algo que não podemos captar diretamente" ou então podemos compreendê-lo como "(...) medidas específicas (explícitas) e objetivamente verificáveis das mudanças ou resultados de uma atividade" (AGUILAR; ANDER-EGG, 1994, pp. 123-124). Cabe ressaltar que por mais numerosos que sejam os indicadores utilizados, estes não refletem totalmente um conceito. (in ALMEIDA; ESCOREAL (2001, pp. 43-44).



Metodologia

A pesquisa foi realizada através de pesquisa bibliográfica, numa perspectiva qualitativa, que deram embasamento teórico.

Considerações finais

O presente artigo nos possibilita fazer algumas reflexões a respeito das reformas psiquiátricas ocorridas no Brasil há aproximadamente 20 anos, além de nos permitir sugestões para pensarmos a necessidade desta ser reestruturada, uma vez que o cenário atual apresenta-se com outras características, outras demandas e outras necessidades por parte dos usuários de saúde mental que devam se beneficiar dos serviços substitutivos que são oferecidos no campo da saúde mental brasileira.
Permite-nos explanarmos e compreendermos sobre os modelos utilizados em tais serviços substitutivos (em específico os CAPS III), como estes foram pensados e construídos para aquele determinado momento e que, atualmente, demandam uma reformulação, buscando a melhoria e o aprimoramento da qualidade do serviço prestado à saúde mental da população que sofre psiquicamente que, a cada dia, em termos quantitativos, só tem aumentado.
Outro ponto importante que pudemos perceber com a presente pesquisa, foi a demanda, por parte dos então equipamentos "substitutivos" implantados para a reforma psiquiátrica, de que estes nunca foram submetidos à avaliações periódicas, no critério de qualidade da assistência prestada e na atuação dos profissionais que os compõem, incluindo os recursos humanos e a saúde mental dos profissionais escolhidos para prestar tal serviço. Estes técnicos de saúde mental foram ocupando os espaços de trabalho sem embasamento teórico suficiente e sem norteamentos sobre a adequação de sua atuação e fazer no campo da saúde mental. Já foi, é ou será o momento de nos empenharmos na reestruturação das políticas públicas de saúde mental no Brasil?
Sobre este tema que está em processo de expansão e do surgimento de novos conhecimentos, sugerimos uma pesquisa de início recente e que podemos nos apropriar através do link: http://www.fcm.unicamp.br/cursos/indicadorescaps.
Busquemos então nos aprimorar no campo de atuação profissional para possibilitar e oferecer melhora na qualidade do serviço prestado ao usuário de saúde mental e dessa forma, contribuir para a construção de novas políticas públicas em nosso país, pois somos responsáveis por aquilo que ofertamos e nos cabe produzir conhecimento para qualificarmos tal oferta.

Referências bibliográficas

ALMEIDA, P. F. de. Da avaliação em saúde à avaliação em Saúde Mental: gênese, aproximações teóricas e questões atuais. Saúde em Debate. Rio de Janeiro, v.25, n. 58, p. 35-47, mai/ago. 2001.

AMARANTE, Paulo. Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. 4ª. edição. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1998.

AMARANTE, P. & CARVALHO, A. da L. Avaliação de qualidade dos novos serviços de Saúde Mental: em busca de novos parâmetros. Saúde em Debate. 52: 74-82, 1996.

______. Saúde mental e atenção psicossocial. 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2007.

______; TORRE, E.H.M. A constituição de novas práticas no campo da Atenção Psicossocial: análise de dois projetos pioneiros na Reforma Psiquiátrica no Brasil. Saúde em Debate. Rio de Janeiro, v.25, n.58, p. 26-34, mai/ago. 2001.

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______. Secretaria Nacional da Assistência à Saúde/Ministério da Saúde. Portaria nº 189, de 19 de novembro de 1991.

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DELGADO, P. G. G. Perspectivas da psiquiatria pós-asilar no Brasil: com um apêndice sobre a questão dos cronificados. In: COSTA, N.R.; TUNDIS, S. A. (Org.). Cidadania e loucura: políticas de saúde mental no Brasil. 7ª. ed. Petrópolis: Vozes, 2001, pp. 171-202.

http://www.fcm.unicamp.br/cursos/indicadorescaps. Acesso em fevereiro de 2011.