A Natureza Social e Literária da Pós-modernidade

O objetivo maior do presente trabalho é apresentar os parâmetros teóricos a partir dos quais discutimos a temática do estudo que aqui desenvolvemos. A fim de alcançarmos uma compreensão maior do nosso objeto de estudo, consideramos necessário situar os referidos parâmetros em dois importantes contextos, um de natureza histórico-cultural, outro de natureza estética.
Nosso procedimento baseia-se no fato de ambos os contextos serem percebidos intrinsecamente interrelacionados. Apenas por uma questão didática, eles aqui se acham tratados em dois subitens, separados apenas em razão do privilégio dado a certos aspectos da natureza específica de cada um.

2. 1 A Sociedade Pós-moderna

A sociedade pós-moderna apresenta-se sobremaneira ambígua e de difícil compreensão até mesmo para os estudiosos do assunto que sentem dificuldade em sistematizar muitos dos aspectos a ela relacionados. Dela se diz ser uma sociedade marcada pelos avanços da tecnologia, da mídia e da produção de bens de consumo.
Com base em Connor (1989), a realidade, neste novo modelo de vida, é forjada todos os dias em telenovelas e o sujeito pós-moderno não sabe mais separar o real do fictício. A produção em massa e a apologia ao consumo desregrado têm criado ainda uma sociedade que não consegue enxergar suas primeiras necessidades, transformando o que é supérfluo em bem essencial. Para o mesmo autor, vivemos numa sociedade de pós-cultura, ou seja, numa cultura vinculada a todo tipo de superação, fruto de um momento pós-Holocausto, pós-industrial, pós-humanista, pós-cultural, resultante da queda de paradigmas vigorantes até os anos iniciais do século XX. Na verdade, temos dois lados do prefixo pós e os debates sobre este assunto são muitos e polêmicos.
O que temos é uma discussão sobre continuidade ou ruptura com o moderno. De um lado, designar algo sob a forma do prefixo acima citado é admitir certa exaustão, diminuição ou decadência de uma realidade anterior. De outro lado podemos ver o prefixo como sendo uma renúncia ao moderno. Conforme Connor (1989, apud SOBRAL e GONÇALVES, 1996, p. 58):


Poderíamos dizer que a característica do pós-modernismo é essa relação peculiarmente complexa que ele tem com o modernismo - que é no seu próprio nome, ao mesmo tempo invocado, admirado, tratado com suspeita ou rejeitado.


Tratar de pós-modernidade não é uma tarefa fácil, visto a complexidade do tema. Segundo Sevcenko (1995, p. 45): "Pós-moderno como está evidente, é um conceito que supõe uma reflexão sobre o tempo, antes de mais nada." Diante desta afirmação surge uma pergunta inevitável: de que tempo estamos tratando? Em primeiro lugar fica claro que não se trata de um tempo homogêneo, linear, daí sua complexidade; recortes e determinações didáticas são impensáveis. Não tendo um ato inaugural que nos auxilie no processo de desbravação da sociedade pós-moderna utilizemos as palavras de Sevcenko (ibid) que diz:

A pós-modernidade é uma atitude que nasce do espanto, do desencanto. Da amargura aflitiva, que procura se reconstruir em seguida como uma alternativa parcial, desprendida do sonho de arrogância, de unidade e poder, de cujo naufrágio participou, mas decidiu salvar-se a tempo, trazendo consigo a esperança que restou.

A pós-modernidade é vista, pois, como um momento talvez de transição, emancipação ou ruptura com o moderno. No entanto, não podemos fazer afirmações precisas quanto a este aspecto, já que, para muitos teóricos, dentre os quais Lipovetsky (s/d), Saviani (1992), Vattino (2001). Estes autores apresentam maneiras diversas de entender pós-modernismo.
Para Vattino (op cit, p.6):

A chamada "pós-modernidade" aparece como uma espécie de Renascimento dos ideais banidos e cassados por nossa modernidade racionalizadora. Esta modernidade teria terminado a partir do momento em que não podemos mais falar da história como algo de unitário e quando morre o mito do Progresso. É a emergência desses ideais que seria responsável por toda uma onda de comportamentos e de atitudes irracionais e desencantados em relação à política e pelo crescimento do ceticismo face aos valores fundamentais da modernidade.
[...]
Como pode o homem ser feliz no interior da lógica do sistema, onde só tem valor o que funciona segundo previsões, onde desejos, paixões, necessidades e aspirações passam a ser racionalmente administrados pela lógica da eficácia econômica que o reduz ao papel de simples consumidor.

Como podemos perceber, para Vattino a sociedade pós-moderna representa uma ruptura com os valores e crenças da sociedade moderna. Talvez este sentimento de ruptura seja, segundo o mesmo autor, causado pelos grandes avanços do capitalismo que tem reduzido tudo à mercadoria. A esta, via de regra, é atribuída caráter de descartável, dada a produção em larga escala, em ritmo sempre mais acelerado e com previsão de vida útil mínima, o que acaba tornando a própria sociedade pós-moderna um tanto descartável também.
O pós-modernismo passa a dar valor a tudo que se refere às sensações, como escapismo para algum tipo de sentido que vai além da realidade. Entrando em uma breve contradição, percebemos que alguns autores, com base neste aspecto pós-modernista, falam em "hipermodernismo"; a pós-modernidade seria os ideais modernistas levados a todo e qualquer extremo. O filósofo francês Gilles Lipovetsky é um deles, pois considera não ter havido uma ruptura com os tempos modernos, e sim que os tempos atuais são modernos com acentuado exagero de algumas características das sociedades modernas, tais como o individualismo, o consumismo, a ética hedonista, que diz respeito ao prazer individual e imediato; e a fragmentação do tempo e do espaço (LIPOVETSKY, s/d).
Saviani (1992, p. 7), um dos expoentes da filosofia da educação brasileira, na sua pedagogia histórico-crítica, de fundamentação marxista, reconhece no pós-moderno tão somente efeitos de uma época de "fragmentação" e "superficialidade". Um período de "decadência da cultura", de "esvaziamento do trabalho pedagógico na escola", enfim, seria mais um meio ardiloso da produção ideológica ?pós-capitalista? para encobrir a percepção dos homens a respeito do desenvolvimento histórico.
O indivíduo pós-moderno é consumista, problema que o pós-modernismo trouxe, devido ao alto grau de sofisticação dos arsenais de sedução e domínio, obrigando o sujeito a consumir. É hedonista, acredita que o prazer individual e imediato é a finalidade da vida; tornando-se ainda narcisista; nunca as pessoas se preocuparam tanto com a beleza física esquecendo até de princípios básicos da sociedade ocidental. Isso se daria segundo Oliveira (1995), pelo fato de que a condição pós-moderna aconteceria no interior de sociedades pós-industriais, de sociedades informatizadas.
A sensação do indivíduo pós-moderno é de irrealidade, niilismo e confusão. O mundo atual é representado por simulacro, informação, consumo, individualismo. Nada tem identidade definitiva. O pós-modernismo ameaça encarnar hoje estilos de vida e de filosofia nos quais viceja uma idéia tida como arqui-sinistra com a total descrença nos seres humanos e na vida. O nada, o vazio, a ausência de valores e de sentido para a vida têm criado, conforme Baudrillard (1968), Jameson (1984) e Lyotard (1974), uma sociedade confusa, com indivíduos fragmentados. Baudrillard (1968, apud SOBRAL e GONÇALVES, 1996, p. 48) diz que:

Já não é possível separar o domínio econômico ou produtivo dos domínios da ideologia ou da cultura, porque os artefatos culturais, as imagens, as representações e até os sentimentos e estruturas psíquicas tornaram-se parte do mundo econômico.

Entender a ação do mundo pós-moderno nas artes exige um longo trabalho de estudo sobre as condições do mesmo. Segundo Rouanet (1987, p. 6-7) "[...] vivendo num mundo ameaçado pela aniquilação atômica, pela ressurreição dos velhos fanatismos políticos e religiosos e pela degradação dos ecossistemas, o homem contemporâneo está cansado da modernidade". Todos esses males são atribuídos ao mundo moderno. Essa atitude de rejeição se traduz na convicção de que estamos transitando para um novo paradigma. "O pós-moderno é muito mais a fadiga crepuscular de uma época que parece extinguir-se sem glória do que um hino de júbilo de amanhãs que despontam" (ROUANET, op cit). Na realidade parece que temos uma consciência pós-moderna, não um momento pós-moderno.
Para muitos estudiosos a pós-modernidade tem formado sujeitos apáticos que buscam no sucesso profissional toda a sua felicidade. Para Santos (1995, p.71), "[...] o pós-modernismo está ancorado na insustentável leveza de não crer nem na realidade nem na ficção". Os simulacros televisivos invadiram a consciência humana, a globalização trouxe consigo uma forte descrença em tudo, formando uma sociedade niilista.
Como vimos uma das características do indivíduo pós-moderno é que ele atua na micrologia individual. Se o sujeito parece fragmentado é porque o pós-modernismo (ou hipermodernismo) está levando às últimas consequências as mínimas liberdades individuais. Estes fatores fazem do cidadão senhor de suas escolhas, com uma infinidade de possibilidades, menos a do não-consumo. O que podemos notar com bastante frequência nos estudos antropológicos é uma tentativa de entender os rumos que o homem pós-moderno está tomando.
O consumo de bens e serviços, as novas tecnologias e a rapidez das informações tornaram o mundo mais simples. No entanto, criaram novas necessidades que não resolveram as inquietações do homem, que cada vez mais necessita da família, da escola e da sociedade para descobrir seu rumo, o que parece um tanto contraditório, pois ao mesmo tempo em que ele nega valores e crenças associando-se ao pensamento niilista, ele também precisa deles. O sujeito pós-moderno não tem uma referência segura, fica à deriva.
Se a modernidade prometia a felicidade através do progresso da ciência ou de uma revolução, a pós-modernidade promete um nada que pretende ser o solo para tudo. A sociedade pós-moderna fragmentada em seus valores e deturpada em seu significado vive um momento de busca de identidade.
Poderíamos levantar os seguintes questionamentos: A pós-modernidade está marcada pela contradição, ruptura, negação ou consolidação do sistema moderno? Aquela não influencia a configuração da contemporaneidade? Não podemos definir com clareza, talvez estudiosos que venham posteriormente a analisar os aspectos da sociedade pós-moderna e da contemporânea, quando percebidas como ciclos fechados e vencidos, tenham mais êxito em suas delimitações e caracterizações. Hoje o que temos é um emaranhado de incertezas e dúvidas.

2. 2 A Literatura Pós-moderna

A literatura e a realidade estão em constante contato, interrelacionam-se, por isso se influenciam mutuamente. Se a sociedade pós-moderna traz em si características próprias, isto será retratado na literatura, se atualmente temos um mundo confuso, de simulacros, descrenças, niilismo, narcisismo, individualismo e fragmentação nossa literatura retratará este momento já que esta é a representação hiperreal da mesma. Acrescentaríamos a este aspecto o fato da arte literária ser produzida pelo homem, para o homem e sobre o homem, esta arte representa as tristezas e felicidades, as angústias e as certezas, o modo de perceber e sentir do homem ante a realidade que o circunda, como previa Aristóteles ao pensar o processo mimético da arte.
Nesse contexto, toda obra literária reflete peculiaridades de uma determinada época, embora também o faça em relação ao que é universal em termos de humanidade.
Acerca do primeiro ponto, Coutinho (2003, p. 184) posiciona-se:

Cada época e nação nos oferece um gênero de visão de mundo, de concepção de vida. Ocorre, digamos, um timbre que se manifesta nos vários campos da atividade humana, desde a culinária até a filosofia.


Ora, um dos campos mais profícuos da atividade humana é a arte, em especial, a arte literária. Temos, portanto, a arte imitando a vida, daí por que as características da literatura pós-moderna espelharem a sociedade na qual foi produzida.
Considerando que a literatura não apenas sofre a influência do meio, mas também é influenciadora em seu modo de alcançar os sujeitos, sendo um canal para o novo, a literatura aqui focada corresponde exatamente a uma novidade complexa, que se vai construindo sob o ritmo acelerado dos acontecimentos e ao sabor deles. Como fruto de um novo momento, apresenta algumas limitações, como a dificuldade em compreender o pós-moderno, em estabelecer classificações sistematizadoras e outros procedimentos de estudo.


Como salienta Connor (1989, apud SOBRAL e GONÇALVES, 1996, p.13):

Estamos no e pertencemos ao momento que tentamos analisar, estamos nas e pertencemos às estruturas que empregamos para analisá-lo. Quase poderíamos dizer que essa autoconsciência terminal (?terminal? é glamuroso, mas impreciso, porque a questão é que autoconsciência nunca é terminal) caracteriza nosso momento contemporâneo ou ?pós-moderno?.



Contudo, para analisarmos e definirmos a literatura pós-moderna precisamos entender como esta arte se caracteriza como nova, que aspectos a diferenciam da literatura moderna e por que o cenário artístico tem mudado tanto. Se entendermos que a literatura, de certa forma, é a representação da realidade, temos, portanto, uma explicação mais simples: se a sociedade muda é porque os seres humanos mudam, se estes mudam suas manifestações artísticas não poderiam permanecer estáticas.
Em se tratando da literatura pós-moderna em si, tida como uma nova literatura, porque percebida como diferente da literatura moderna, posiciona-se Sevcenko (1995, p.50):


A expressão nova justifica-se assim pela mudança de perspectiva desses criadores aturdidos. Eles já não voam na mesma direção e na mesma velocidade do vento do progresso. Já não gozam do privilégio de se fundirem com a fonte única de todo poder, de toda vontade e de toda justiça. Não estão mais voltados para o infinito radiante do futuro e sim para a tragédia impronunciável do passado. Não acreditam mais no absoluto, nem se deixam levar por suas falsas promessas. Estão sós reduzidos aos limites de suas fraquezas, seu horror e sua fúria. Essa é a condição do novo que se manifesta após a modernidade.


O moderno tinha sua força na esperança da revolução e da glória, já o povo que se manifesta após a modernidade é um todo de frustração e amargura por vivenciar um progresso devastador e não criador. Se temos problemas quanto as delimitações e descrições do pós-moderno na sociedade, as contradições não diminuem em suas manifestações nas artes. Sevcenko (1995, p.53) salienta as contradições dos estudiosos americanos na definição do que seria a literatura pós-moderna:

Para muitos estudiosos principalmente os americanos, em geral, tendem a considerar o pós-modernismo como uma mera correspondência na área cultural do advento da tecnologia pós-industrial, baseada nos recursos da cibernética e informática. Outros autores o entendem como uma crítica voltada à negação total das vanguardas que exalta o período anterior ao modernismo e se inclina para um retorno às fontes da história e do passado. Outros ainda o denunciam como uma mera pasteurização dos cacoetes das vanguardas, sem vitalidade e sem compromisso.



Como vemos, ainda não é ponto pacífico a conceituação do que seja literatura pós-moderna, nem mesmo de um certo parâmetro histórico ou cultural que indicie seu surgimento propriamente dito. As dificuldades neste sentido adveem de múltiplos aspectos, alguns dos quais comentados adiante.
Em busca de sistematizar as tendências formuladas a respeito das concepçẽs em tela, Svecenko (1995), considera que elas sejam todas de fundo reacionário e esvaziam o sentido crítico profundo do movimento, como uma proposta de práticas culturais alternativas. Nesta perspectiva, emergem inúmeras propostas estéticas, o que determina a dificuldade de sistematização conceptual, do que é designado como pós-modernismo, fato possível de antever nas palavras de Coutinho (2003, p.236) ao tratar do assunto:

A questão da conceituação de pós-modernismo já em si é bastante problemática, uma vez que se trata de um fenômeno fundamentalmente heterogêneo, que não pode jamais definir-se como algo coeso e unânime. Na verdade, não há apenas um pós-modernismo, mas vários, e cada uma dessas construções foi cunhada num contexto distinto para servir a fins diferentes.


Assim sendo, o pós-modernismo deve ser analisado levando-se em conta toda a sua pluralidade e ao contrário do que pensam alguns autores, esta nova manifestação estética não é sem vitalidade ou sem compromisso, ela é, a estética do novo, do contemporâneo, cheia de peculiaridades próprias de sua época.
Não podemos negar que em toda esta discussão existe uma bela generosa e multifacetada esperança, diversas manifestações que se interligam e complementam. O anseio de uma justiça que possa ser sensível ao pequeno, ao incompleto, ao múltiplo, à condição de irredutível diferença que marca a materialidade de cada elemento, de cada ser humano, de cada comunidade, de cada circunstância, ao contrário do que muitos imaginam. O pós-modernismo seria como nos diz Sevcenko (1995, p. 54):


O aprendizado humilde, que já tarda, da convivência difícil mas fundamental com o imponderável, o inefável ? depois de séculos da fé brutal de que tudo pode ser conhecido, conquistado, controlado.


Esta nova estética traz a possibilidade do novo, não como verdade absoluta, mas como o direito à dúvida, à contradição e à fragmentação da realidade. O pós-modernismo se permite ser ao mesmo tempo original com sabores passados, características de outras estéticas são incorporadas. A respeito nos diz Fontenelli (2009, p.20):


Vemos, então, a utilização de características apoiadas em estilos anteriores ao próprio Modernismo, como o apego à cultura popular, vocabulário e sintaxes nacionais, características do Romantismo brasileiro, ou a objetividade, a presença do herói problemático - anti-herói -, herança, então, do Realismo.


A literatura apresenta, pois, segundo o autor um novo olhar sobre a idéia de continuidade, o que faz do pós-modernismo um momento de volta ao passado com grande originalidade.
Para alguns que não acreditam na existência da estética pós-modernista, consideram-na como um castelo de areia que desmoronará a qualquer momento, Svecenko (op. cit) nos diz ser isto uma vantagem e um alívio, que o pós-moderno se apresente como um castelo de areia e não mais como uma nova Bastilha. Apenas um castelo de areia, frágil, inconsistente, provisório, tal como todo ser humano. "Um enigma que não merece a violência de ser decifrado". Com estas palavras Sevcenko (1995, p.55) faz sua defesa ao pós-moderno, uma verdadeira apologia à nova estética, colocando-a em patamar de representante do ser humano frágil, inconsistente e provisório.
A discussão que envolve o pós-modernismo é muito ampla, corremos o risco de nos perdermos no caminho, então voltemos. Nesse contexto múltiplo de uma sociedade envolta no mais alto grau de tecnologia e que presencia ao mesmo tempo a miséria e o analfabetismo, o pós-modernismo como expressão literária e artística, só pode ser visto de modo múltiplo, o que inclusive vem ao encontro da heterogeneidade com que ele tem sido caracterizado nos referidos contextos. Ele se configura como um conjunto de traços que na órbita da literatura nacional, diferenciam a produção da segunda metade do século XX.
O Modernismo foi dividido em três fases sendo que sua terceira fase hoje tem se tornado motivo de polêmica. A terceira fase modernista tem sido caracterizada também como pós-modernista. O que sabemos é que a partir dos anos 60 a produção literária nacional, se não chegou a romper com os paradigmas modernos, distanciou-se bastante, e de lá até os dias atuais as características modernas têm se exaurido das obras literárias.
A produção literária da década de 80 até os dias atuais tem apresentado características próprias de uma época distanciando-se ainda mais do modernismo. O que vemos nas obras literárias deste período é a forte fragmentação da narrativa, de incorporação da mídia e caráter predominantemente espetacular e auto-indagador. Esta acentuação da fragmentação do texto e da polifonia de vozes bem como a narrativa metalinguística com ampla intertextualidade, são características das produções pós-modernistas.

Como podemos ver em Santos (1995, p. 61):

Alguma coisa experimental e lúdica igual ao modernismo emergia irredutível, no entanto, ao modernismo, excluindo muitos dos seus dogmas. Vinha sem revelações epifânicas; descartava o privilégio do artista como guia para iluminar os porões da subjetividade; substituía a psicologia por uma sociologia meio alegórica meio delirante; trocava a originalidade formal pela reciclagem, em paródia, dos vários gêneros; desfazia ou recompunha o enredo sem aludir a uma grande mítica tomada como quintessência da realidade; criava enfim sem se pretende ?cultura superior?.



O pós-modernismo nasce, pois, do modernismo excluindo de algum modo muitas das características do mesmo. O que Santos chama de substituir a originalidade pela reciclagem é a representação da forte intertextualidade presente nos textos pós-modernos. Desfazer ou recompor o enredo trata-se da fragmentação da narrativa, traço estilístico peculiar da nova literatura, que tanto pode ser visto numa perspectiva alegórica de reflexo da complexa fragmentação da nova realidade, quanto de uma atitude do artista em assumir-se limitado para dar conta sozinho da suprarealidade romanesca, confiando ao leitor/ouvinte a função de copartícipe do ato criador, podendo ordenar intelectualmente os fatos ficcionais narrados.
Tendo ainda como foco as características estéticas desta nova narrativa podemos observar o processo metaficcional como sendo de vital importância para os textos atuais. O romance passa a ser uma imitação deliberada do romance, dos gêneros literários ou de qualquer outro texto que possa lhe servir de base. Ou seja, é a hora e a vez da metaficção, literatura sobre literatura, texto que expõe sua fraude e renega o ilusionismo. Dentro desta tendência metaficcional temos o burlesco, que é o exagero cômico.
Sendo considerado por alguns como gênero menor, modo temático ou estilo narrativo, o burlesco é, segundo Santos (1995, p.63):


Um dispositivo de paródia que faz rir pela incongruência entre o fundo e a forma. Para fazer rir, o burlesco convoca toda a baixaria: sexo, violência, drogas, loucura, perversão, escatologia ? a parte maldita com a qual o pós-modernismo sem ilusões ante a sociedade tecnológica, desanca o projeto Iluminista em sua crença na emancipação do homem pelo conhecimento e o progresso. Nessa mesma trilha, o burlesco é ainda a ponte intertextual por onde os autores pós-modernos cruzam o fosso (bem modernista) entre arte culta e arte de massa.


A metaficção, tendo como uma de suas características o burlesco, pretende ser uma nova epistemologia literária, um desmascaramento das convenções ficcionais mantidas intactas pelo próprio Modernismo. Connor (1989, apud SOBRAL e GONÇALVES, 1996, p.45) fala de metaficção da seguinte maneira:

Ficamos com aquele jogo puro e aleatório de significantes que denominamos pós-modernismo e que já não produz obras monumentais do tipo modernista, mas rearranja sem cessar os fragmentos de textos preexistentes, os blocos de construção da produção social e cultural mais antiga, em alguma nova e exaltada bricolagem: metalivros que canibalizam outros livros, metatextos que unem pedaços de outros textos.


Diz Santos (1995, p.63) que sob o signo da metaficção as narrativas pós-modernas apresentam-se vitimada pela entropia, caotizando por isso espaço, tempo e enredo: "[...] o enredo é destruído também por saturação. Acontecem sempre mais coisas do que a memória pode reter".
A curva dramática da nova narrativa inexiste. O fim não traz nenhuma mensagem ética; é antes lugar para glosas. Os personagens são cômicos a começar pelo nome, são emblemas bidimensionais com rala psicologia. A técnica narrativa está fixada na incerteza, que na metaficção é constante.
O texto perde sua unidade, a carga de incerteza provoca resistência à leitura, representando assim a opacidade do mundo frente à interpretação. A nova literatura marcada por uma entropia causada pelo grande acúmulo de informações, busca seus temas no improvável.
Segundo Santos (1995, p. 66):

Pynchon, o entropólogo, está sugerindo que; na sociedade atual, paradoxalmente, o mistério aumenta com o volume de informação. Falhando ao ordená-la, ao interpretá-la, o indivíduo é descartado pelo sistema, deslizando para o lixo onde se acha, no romance, a fina flor dos deserdados sociais. Improvável, a ordem supõe uma desordem crescente. Lixo, asilo, prisão, sanatório, marginalia são a entropia tornada palpável.



Quanto mais informações nós temos, mais ficamos alheios a um grande número de outras informações, isto reflete na literatura como forma de grande incerteza. Na entropia da sociedade atual os novos autores buscam sua inspiração. Temas como os citados formam uma literatura voltada para todos os aspectos da sociedade.
Para finalizarmos vejamos um apanhado geral das características desta tão discutida literatura contemporânea. Para Alves (2007, apud FONTENELLI, 2009, p.21) alguns elementos são distintivos da literatura pós-moderna:


[...] é marcada por uma estrutura caótica (desaparecimento do enredo, fragmentação da narrativa, superposição de situações ocorridas em tempo e espaço diferentes, indefinições das personagens, destruição arbitrária das relações normais entre homens e realidades).


Temos, portanto a literatura do experimental, do novo, onde todos os recursos são válidos para uma produção literária verdadeiramente, representativa do ser humano. A literatura do novo e do experimental que nos deliciou no estudo da obra em questão.