A NATUREZA JURÍDICA DA CONDUTA PREVISTA NO ART. 28 DA LEI DE DROGAS: DESCRIMINALIZAÇÃO OU DESPENALIZAÇÃO.[1]

 

 

Eva Danielle Silva Pedrosa[2]

Letícia Nicácio Araújo Feitosa[3]

Luenna Costa Oliveira[4]

Maria do Socorro Almeida de Carvalho[5]

Sumário: Introdução; 1 A antiga e a nova lei de drogas; 2 Breve conceito de crime; 3 Natureza Jurídica do art. 28 da lei 11.343/06; 3.1 Descriminalização; 3.2 Despenalização; 3.3 Posição do STF; Considerações Finais; Referência.

 

 

 

RESUMO

 

A presente pesquisa aborda a celeuma doutrinária resultante da mudança da lei n° 6.368/76 para a lei n° 11. 343/06, correspondentes, respectivamente, a antiga e a nova lei de drogas, pois enquanto a lei anterior previa pena com restrição de liberdade ou multa para quem portasse entorpecentes para consumo próprio, a lei posterior apenas prevê aos usuários de drogas advertência, prestação de serviços à comunidade e comparecimento a programas educativos, deste modo tal alteração cominou em controvérsias quanto a natureza jurídica deste crime, se a modificação na lei resultou em uma descriminalização ou apenas uma despenalização desta conduta.



PALAVRA CHAVE: Drogas; despenalização; descriminalização; usuário; art. 28.

INTRODUÇÃO

O conceito de Drogas segundo a definição do observatório brasileiro de Informações sobre Drogas (OBID) é qualquer substancia não produzida pelo organismo capaz de atuar sobre um ou mais de seus sistemas, produzindo alterações em seu funcionamento. Assim, o porte de drogas para consumo próprio está expresso no Código Penal porque é uma conduta que afeta saúde e segurança pública.

Inicialmente esta conduta fora regida pela lei n° 6.368/76, a qual penalizava o usuário com detenção de seis meses a dois anos e multa de vinte a cinquenta dias-multa. Atualmente a lei que prevê a conduta do porte de drogas é a lei n° 11. 343/06, a qual não determina mais a pena privativa de liberdade ou restritiva de direito. A partir da nova lei de drogas, o agente sofre então apenas advertência, prestação de serviços à comunidade e comparecimento a programas educativos, o que dividiu doutrinadores e tribunais quanto a natureza jurídica desta conduta, pois o conceito de crime sempre esteve relacionado a uma pena. Por isto, muitos autores defendem que o fato de abolir a pena privativa de liberdade para o porte de drogas recai na descriminalização deste ato, o que indica a retirada do caráter criminoso da conduta, ou seja, não configura mais uma infração penal, enquanto outros doutrinadores buscam razão em outros pontos do ordenamento, como na Constituição Federal que em seu art. 5° XLVI, que adota ao conceito crime varias modalidades de pena, e uma delas é a prestação social alternativa, e assim afirmam que com o advento da nova lei ocorreu apenas uma despenalização, que significa que a conduta tem sim caráter de crime, porém possui penas mais brandas.

A presente pesquisa exploratória fará uma analisa dos diversos posicionamentos quanto a temática utilizando-se do método indutivo, se dividirá em partes, primeiramente para analisar a antiga e a nova lei de drogas, esclarecer de forma breve o conceito de crime para o direito penal para então adentrar no questionamento quanto a natureza jurídica da conduta de porte de entorpecentes para consumo próprio, estudo que será feito abordando os argumentos para a teoria da descriminalização, despenalização e finalizando com o posicionamento do STF sobre o assunto.

1 A ANTIGA E A NOVA LEI DE DROGAS

A nova Lei de Drogas (lei 11.343/06) alterou drasticamente vários conceitos e definições dos artigos constantes na lei de drogas anterior (lei 6368/76). Uma das mudanças mais significativas foi a substituição da expressão “substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica” pelo termo “droga” que, como explica a professora Solange de Oliveira Ramos, não é restrito à categoria de entorpecentes ou de substâncias causadoras de dependência física ou psíquica, ampliando para todas as substâncias ou produtos com potencial de causar dependência, porém condicionadas à inserção em dispositivo legal competente, publicadas periodicamente pelo Ministério da Saúde, segundo estabelece o art. 14, I, a, do Decreto n. 5912/06.

Outra importante mudança foi a introdução do artigo 33, par. 3º na nova lei, que separou a conduta de oferecer droga para pessoa de seu relacionamento do tráfico de drogas. Sob a ótica da antiga lei, estas condutas eram vistas da mesma forma, pois quem oferecia drogas para qualquer pessoa, independentemente de ser ou não do seu relacionamento, estaria cometendo o crime de tráfico.

Contudo, o que mais chama atenção é a nova forma do legislador encarar o porte de drogas para consumo próprio, o que causou verdadeira revolução na doutrina. A lei anterior previa pena de detenção para esta conduta, in verbis:

“Art. 16. Adquirir, guardar ou trazer consigo, para o uso próprio, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - Detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de (vinte) a 50 (cinqüenta) dias-multa.”

Esta visão foi radicalmente alterada no art. 28 da Lei 11.343/06, que prevê a mesma conduta, porém uma punição totalmente diferente, com aplicação de penas alternativas e medidas educativas:

“Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I - advertência sobre os efeitos das drogas;

II - prestação de serviços à comunidade;

III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.”

Houve uma ampliação no alcance das punições previstas neste artigo, abrangendo também aquele semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica, conforme redação do § 1º do referido artigo. Contudo, este parágrafo pode causar confusão e estranhamento quando lido pela primeira vez, posto que é semelhante ao crime de tráfico. Por isto, o próprio legislador determina os critérios para fazer esta diferenciação, no § 2º do ar. 28:

“§ 2o Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.”

Com exceção da pena de advertência, que possui exaurimento imediato, há uma limitação no tempo de aplicação das penas previstas nos § § 3º e 4º, os quais determinam a duração máxima de 5 meses para os agentes sem antecedentes em conduta semelhante e de 10 meses para os reincidentes.

O legislador determinou, também, a forma como a prestação de serviços à comunidade, sanção prevista no inciso II do art. 28 da nova lei, deverá ser cumprida:

“§ 5o A prestação de serviços à comunidade será cumprida em programas comunitários, entidades educacionais ou assistenciais, hospitais, estabelecimentos congêneres, públicos ou privados sem fins lucrativos, que se ocupem, preferencialmente, da prevenção do consumo ou da recuperação de usuários e dependentes de drogas.

§ 6o Para garantia do cumprimento das medidas educativas a que se refere o caput, nos incisos I, II e III, a que injustificadamente se recuse o agente, poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a:

I - admoestação verbal;

II - multa.”

Como é possível observar, a nova lei trouxe diversas mudanças no tocante ao porte de drogas para consumo próprio, estabelecendo divergências doutrinárias quanto à sua interpretação, pois alguns entendem ter havido mera despenalização nesta conduta, enquanto outros afirmam ter havido uma descriminalização, tendo este fato deixado de ser apreciado pelo direito penal como crime e sendo encarado agora como conduta ilícita ou infração sui generis. A explicação destas duas teorias e seus argumentos serão abordados mais adiante.

2 BREVE CONCEITO DE CRIME

Para entender o que significa crime para o direito penal deve- se ter em mente o que o define. Neste trabalho será abordada uma breve explicação, visto que este é um conceito bastante amplo.

A este respeito, assevera Luiz Regis Prado que o ordenamento jurídico adota a teoria tripartida para caracterizar a infração penal, sendo esta toda ação ou omissão típica, antijurídica e culpável. Rogério Greco ensina que esses elementos, na ordem em que foram apresentados, é um antecedente lógico e necessário à apreciação do elemento seguinte (2007, p.135), ou seja, analisa- se em primeiro lugar a tipicidade e levando a análise ao seu esgotamento, passa- se à antijuridicidade da conduta, e assim por diante. Deixando de se enquadrar em uma das três características, nem é necessário que se ocupe das demais.

Alguns autores trazem a culpabilidade como elemento fundamental do crime, mas para Capez (2005, p.108) esta não integra o conceito de crime, uma vez que se apresenta como um juízo de valor externo, posterior à sua ocorrência, sendo usado apenas para a aplicação ou não de pena e sua dosimetria.

As infrações dividem- se em crimes (também chamados delitos) e contravenções, utilizando- se como critério para esta diferenciação a gravidade da conduta, que deverá ter uma pena proporcional (PRADO, 2002, p. 207- 209). Sobre esta divisão, Rogério Greco aborda exatamente o art. 28 da lei nº 11.343/06

“Embora o artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Penal nos forneça um critério para a distinção entre crime e contravenção penal, essa regra foi quebrada pela nova lei 11343/06, haja vista que, ao cominar, no preceito secundário do seu artigo 28, as penas relativas ao delito de consumo de drogas, não fez previsão de qualquer pena privativa de liberdade, tampouco da pena pecuniária. Assim, analisando o mencionado artigo 28, como podemos saber se estamos diante de um crime ou de uma contravenção penal? A saída será levar à efeito uma interpretação sistêmica do artigo, que está inserido no capítulo III, que diz respeito aos crimes e às penas. Assim, de acordo com a redação constante no aludido capítulo, devemos concluir que o consumo de drogas faz parte do rol dos crimes, não se tratando, pois de contravenção penal.” (GRECO, 2007, p. 137).

 

Capez analisa o conceito de crime sob três aspectos: material, formal e analítico. À respeito do aspecto material, o jurista explica que é a análise que se faz da essência do conceito, ou seja, porquê tal fato é considerado criminoso. Sob esta visão, o crime pode ser definido como todo fato humano que, propositada ou descuidadamente, lesa ou expõe à perigo os bens considerados fundamentais para a existência da coletividade e da paz social (CAPEZ, 2005, p.106).

No tocante ao aspecto formal, é a mera subsunção da conduta ao tipo legal, considerando como infração tudo aquilo que o legislador descreve como tal. Porém, ao proceder desta maneira, não se leva em conta a lesividade material causada, o que fere o princípio da dignidade humana (CAPEZ, 2005, 106).

Greco defende que esta distinção não é muito viável, pois este conceitos não são capazes de informar com precisão o que seja crime; “surge, assim, outro conceito, chamado analítico, porque realmente analisa as características ou elementos que compõem a infração penal, sem que com isso se queira fragmentá-lo” (2007, p. 142). Esta é sua função.

A respeito dos elementos do crime, Greco ensina de forma lacônica:

“O fato típico, segundo uma visão finalista, é composto dos seguintes elementos:      a) conduta dolosa ou culposa, comissiva ou omissiva; b) resultado; c) nexo de causalidade entre a conduta e o resultado; d) tipicidade.

A antijuridicidade é aquela relação de contrariedade, de antagonismo, que se estabelece entre a conduta do agente e o ordenamento jurídico.

Culpabilidade é o juízo de reprovação pessoal que se faz sobre a conduta ilícita do agente. São elementos integrantes da culpabilidade, de acordo com a teoria finalista por nós assumida: a) imputabilidade; b) potencial consciência sobre a ilicitude do fato; c) exigibilidade de conduta diversa.” (GRECO, 2007, p. 143-144).

 

Assim, as infrações são divididas em contravenções e crimes, devendo o crime ser concebido como um fato típico, ilícito ou antijurídico e culpável, respeitando a definição destes conceitos para uma análise precisa e inequívoca.

3 NATUREZA JURIDICA DO ART. 28 DA LEI 11.343/06

3.1 DESCRIMINALIZAÇÃO

O decreto lei 3.914/14, que se refere a lei de introdução ao Código Penal, em seu artigo 1° define o crime como:

“Art. 1º: Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas. alternativa ou cumulativamente.”

 

Deste modo entende-se que o conceito de crime está relacionado à pena de prisão ou multa. Descriminalizar então significa retirar da conduta o caráter criminoso, esta, portanto, não configura mais uma infração penal, existem duas formas de descriminalizar, uma é retirando o caráter ilícito da conduta, mas não a legalizando e a segunda, é retirar da conduta o caráter criminoso, tornando-a legal (GOMES. 2006, p. 108).

Com base nesse entendimento, o autor Luiz Flávio Gomes, afirma:

“a nova lei de drogas descriminalizou, no art. 28, descriminalizou a conduta de posse de drogas para consumo pessoal. Retirou-lhe a etiqueta de ‘infração penal’, porque de modo algum permite a pena de prisão e sem pena de prisão não se pode admitir a existência de infração penal no nosso país” (GOMES, 2006, p. 109-110)

Para o referido autor o legislador de 2006 aboliu o caráter criminoso da conduta do porte de drogas para consumo pessoal, afirmando que houve sim uma descriminalização, mas não uma legalização (GOMES. 2006, p. 108), que na verdade nem uma infração é, pois não possui previsão de prisão ou multa, ou seja, acrescenta ainda que a posse de drogas para consumo pessoal passou a figurar uma ‘infração sui generis’. Não se tratando de “crime” nem de “contravenção penal”, porque somente foram cominadas penas alternativas, desta maneira, a conduta de porte de drogas pra uso próprio constitui um caráter ilícito, porém não penal, e sim ‘sui generis’ (GOMES, 2006, p. 110)

3.2 DESPENALIZAÇÃO

Despenalizar é mitigar a responsabilidade penal, a conduta possui o caráter de crime, mas não se faz uso da pena restritiva de liberdade e sim de penas mais brandas, são as ditas penas alternativas (GOMES. 2006, p. 109).

Os defensores desse posicionamento tem como base o art. 5°, XLVI, da Constituição Federal, que diz:

art. 5°, inc. XLVI: a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:

a) privação ou restrição da liberdade;

b) perda de bens;

c) multa;

d) prestação social alternativa;

e) suspensão ou interdição de direitos;

Assim estes julgam que o art. 1° da lei de introdução do Código Penal é insuficiente para definir o crime e ainda não seria este se o legislador não tivesse expressamente inserido o art. 28 no rol “dos crimes e das penas”, o que pode ver visto nos ensinamentos de Renato Marcão, Manoel Maia, Damásio de Jesus e Fernando Capez, respectivamente:

“As molduras estreitas que decorrem do referido dispositivo legal não permitem uma melhor visão da realidade atual e, em decorrência, não se prestam a uma completa, acabada e irretocável classificação do que seja ou não crime ou contravenção, nos limites que a Lei de Introdução cuidou de definir. A ausência de cominação privativa de liberdade não afasta, nos tempos de hoje, a possibilidade de a conduta estar listada como crime ou contravenção (...) Há que levar em conta, ainda, que o art. 28 se encontra no Título III (Das Atividades de Prevenção do Uso Indevido, Atenção e Reinserção Social de Usuários e Dependentes de Drogas), Capítulo III, que cuida "Dos Crimes e das Penas", e que a Lei n. 11.343/2006, lei federal  e especial que é, cuidou de apontar expressamente tratar-se de crimes as figuras do art. 28 (caput e § 1º), não obstante a ausência de qualquer pena privativa de liberdade cominada.” (MARCÃO)

" a despenalização se torna patente quando levamos em conta a própria vontade do legislador, que ao inserir o art. 28 no capitulo III, sob rubrica "dos Crimes e das Penas", revela sua inquestionável intenção de capitular a posse de drogas para consumo pessoal, como uma figura criminosa (...)  embora fora mantida a tipificação, esta não guarda cunho punitivo, mas sim de auxilio ao usuário e ao dependente de drogas, tanto que as medidas sancionatórias não preveem pena privativa de liberdade, ou seja, continua-se  responsabilizando o usuário e o dependente, mas sem transformá-lo num criminoso que precisa ser punido custe o que custar." (MAIA. 2008.p. 53)

“Os fatos definidos no dispositivo constituem crimes, do ponto de vista formal e material. De registrar-se que, sob o aspecto formal, a definição contida no art. 1.º da LICP está defasada. Desse modo, não cabe falar em ilícito de natureza especial, invocando o vetusto dispositivo legal. Deve-se observar que Constituição Federal no art. 5°, XLVI, declara: “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos”. Nota-se, portanto, que a Carta Magna expressamente autoriza a existência de crime sem a cominação de pena privativa de liberdade. Acrescentar-se que o disposto no art. 28 insere-se em Capítulo designado “Dos crimes e das penas (...) não convence, ainda, o argumento de que não são infrações penais pelo fato de as penas ali contidas não admitirem conversão em prisão”. (DAMÁSIO. 2007)

“Entendemos, no entanto, que não houve a descriminalização da conduta. O fato continua a ter a natureza de crime, na medida em que a própria Lei o inseriu no capítulo relativo aos crimes e as pena (Capítulo III); além do que as sanções só podem ser aplicadas por juiz criminal e não por autoridade administrativa, e mediante o devido processo legal. A Lei de Introdução ao Código Penal está ultrapassada nesse aspecto e não pode ditar os parâmetros para a nova tipificação legal do século XXI” (CAPEZ. 2006)

Visto isto, pode-se concluir que o art. 28 da nova lei de drogas continua a ser crime, só não possui a pena restritiva de liberdade, pois o legislador optou pelas penas alternativas de prisão, o que se deve ao menor potencial ofensivo da conduta, e não por outro motivo esta fora abrandada (MAIA. 2008. p.55). Mesmo com a mudança da lei, o legislador continuou a enquadrar a conduta do porte de drogas para consumo próprio como um injusto penal, mas em virtude do aumento do uso, evidenciou uma preocupação quanto aos mecanismos para diminuir o consumo das drogas e recuperar os viciados, por isso, a previsão da advertência e do comparecimento a programas educativos. Percebe-se então que fora adotado pelo Código Penal uma politica criminal de redução de danos (MAIA. 2008, p. 59)

3.3 POSIÇÃO DO STF

O Posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 13 de Fevereiro de 2007, ao apreciar RE 430105/QO/RJ, na qual o relator foi o Min. Sepúlveda Pertence, foi que:

 “A Turma, resolvendo questão de ordem no sentido de que o art. 28 da Lei 11.343/2006 (Nova Lei de Tóxicos) não implicou abolitio criminis do delito de posse de drogas para consumo pessoal, então previsto no art. 16 da Lei 6.368/76, julgou prejudicado recurso extraordinário em que o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro alegava a incompetência dos juizados especiais para processar e julgar conduta capitulada no art. 16 da Lei 6.368/76. Considerou-se que a conduta antes descrita neste artigo continua sendo crime sob a égide da lei nova, tendo ocorrido, isto sim, uma despenalização, cuja característica marcante seria a exclusão de penas privativas de liberdade como sanção principal ou substitutiva da infração penal. Afastou-se, também, o entendimento de parte da doutrina de que o fato, agora, constituir-se-ia infração penal sui generis, pois esta posição acarretaria sérias consequências, tais como a impossibilidade de a conduta ser enquadrada como ato infracional, já que não seria crime nem contravenção penal, e a dificuldade na definição de seu regime jurídico. Ademais, rejeitou-se o argumento de que o art. 1º do DL 3.914/41 (Lei de Introdução ao Código Penal e à Lei de Contravenções Penais) seria óbice a que a novel lei criasse crime sem a imposição de pena de reclusão ou de detenção, uma vez que esse dispositivo apenas estabelece critério para a distinção entre crime e contravenção, o que não impediria que lei ordinária superveniente adotasse outros requisitos gerais de diferenciação ou escolhesse para determinado delito pena diversa da privação ou restrição da liberdade. Aduziu-se, ainda, que, embora os termos da Nova Lei de Tóxicos não sejam inequívocos, não se poderia partir da premissa de mero equívoco na colocação das infrações relativas ao usuário em capítulo chamado ‘Dos Crimes e das Penas’. Por outro lado, salientou-se a previsão, como regra geral, do rito processual estabelecido pela Lei 9.099/95. Por fim, tendo em conta que o art. 30 da Lei 11.343/2006 fixou em 2 anos o prazo de prescrição da pretensão punitiva e que já transcorrera tempo superior a esse período, sem qualquer causa interruptiva da prescrição, reconheceu-se a extinção da punibilidade do fato e, em consequência, concluiu-se pela perda de objeto do recurso extraordinário (STF, 1º Turma, RE 430105 QO/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 13.2.2007.  Informativo n. 456. Brasília, 12 a 23 de fevereiro de 2007)” (APUD: FILHO. 2008, p. 151)

Assim, o STF se manifestou no sentido da defesa de que houve uma despenalização da conduta do porte de drogas para consumo próprio, retirou- se apenas a responsabilização mediante pena restritiva de liberdade, afastando assim a tese de que ocorrerá um ‘abolitio criminis’ e que tenha então configurado esta uma ‘infração sui generis’, pois desta maneira não teria como a lei 11.343/06 configurar nem infração penal, sendo então árduo definir seu regime jurídico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nota-se que a tendência da discussão é de que houve uma despenalização da conduta do porte de drogas pra uso próprio, e isto se deve porque o crime deixou de ser incondicionalmente associado a pena de prisão ou multa e  houve uma mudança da ótica sobre o consumidor de drogas; este deixou de ser visto como um criminoso e passou a ser visto como um doente, fato que explica a substituição da antiga lei de drogas, a lei n° 6.368/76, que previa pena privativa de liberdade, pela atual, lei 11. 343/06, que prevê para o portador de entorpecentes apenas penas alternativas, como advertência, prestação de serviços à comunidade e comparecimento a programas educativos. O tratamento que se dá hoje ao usuário de drogas são medidas socioeducativa, observa-se que houve uma preocupação social e pedagógica, pois nesta se busca a reinserção social, por isso a pena privativa fora abolida. A nova lei de drogas tem um caráter mais humanista (MAIA. 2008. p. 11-35).

REFERÊNCIA

 

 

BRASIL. Poder Executivo. Decreto nº 5.912, de 27 de Setembro de 2006. Regulamenta a Lei no 11.343, de 23 de agosto de 2006, que trata das políticas públicas sobre drogas e da instituição do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - SISNAD, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/Decreto/D5912.htm>. Publicado em 28 de set. de 2006. Acesso em 04 de out. de 2013. CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. v 1. 8° ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

CAPEZ, Fernando. Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006 – Das modificações legais relativas à figura do usuário Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006 – Das modificações legais relativas à figura do usuário. OAB São Paulo. 07 de Dez de 2006. Disponível em: <http://www.oabsp.org.br/noticias/2006/12/07/3962/> Acesso em 02 de Set. De 2013.

FILHO, Roberval Rocha Ferreira Filho. Principais julgamentos STF. São Paulo: Podivm, 2008.

GOMES, Luiz Flávio, CUNHA, Rogerio Sanches, OLIVEIRA, William Terro de. Nova lei de drogas comentada: lei 11.343, de 23.08.2006. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. v. 1. 9° ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.

JESUS, Damásio. Natureza jurídica das infrações do art. 28 da Lei Antidrogas. Blog Damásio. 07 de Out. de 2007. Disponível em: <http://blog.damasio.com.br/?p=74> Acesso em: 02 de Set. de 2013.

MAIA, Emanoel Ferreira. Art. 28 da Lei 11.343/2006, a análise da natureza Jurídica da conduta de portar drogas para consumo próprio. São Luís: UNDB. 2008. 66 p.

MARCÃO, Renato. O art. 28 da Nova Lei de Tóxicos na visão do Supremo Tribunal Federal. Conamp. Disponível em: <http://www.conamp.org.br/Lists/artigos/DispForm.aspx?ID=166> Acesso em 20 de Ago. 2013.

OBID. O que é a droga. Disponível em <http://www.obid.senad.gov.br/portais/mundojovem/conteudo/index.php?id_conteudo=11221&rastro=O+que+%C3%A9+a+Droga> acesso em 30 de Set. 2013.

PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal brasileiro-parte geral. v 1. 3° ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

RAMOS, Solange de Oliveira. Professora Mestre em Direito. Professora de Direito Penal do Curso de Direito das Faculdades Integradas Helio Alonso – FACHA. Comentários à Lei de Drogas, Material Didático. Disponível em: <http://www.facha.edu.br/biblioteca/dmdocuments/DROGAS_Solange.pdf>. Acesso em 04 de out. de 2013.

 



[1] Paper apresentado à disciplina Direito Penal Especial III da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco- UNDB;

[2] Aluna do 6° período de Direito noturno da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco- UNDB;

[3] Aluna do 6° período de Direito noturno da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco- UNDB;

[4] Aluna do 6° período de Direito noturno da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco- UNDB;

[5] Professora, Especialista, Orientadora.