RESUMO

O presente artigo é fruto de uma pesquisa referente à Imunidade Tributária dos templos de qualquer culto, prevista no art. 150, VI, “b” da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Com um breve relato histórico e demais aspectos gerais acerca do tema, será transmitido de forma clara e precisa a intenção do legislador constituinte com a referenciada norma constitucional. 

Palavras-chave: Direito Tributário. Imunidades. Templos de qualquer Culto. 

INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 garante a não incidência tributária sobre o patrimônio, renda e serviços dos “templos de qualquer culto”, entendidos como organizações religiosas.

Neste passo, o presente tema vem anotar, nada obstante a sua previsão histórico-constitucional, o que se extrai da expressão “templo de qualquer culto”, analisar as disposições constitucionais que servem de lastro para o tema, como desfrutar de tal imunidade e a possibilidade de remuneração justa para seus dirigentes.

Confia-se na pertinência e grande relevância desse estudo.

 

IMUNIDADES DOS TEMPLOS: RELATO HISTÓRICO.

O Estado e a Religião eram vinculados pela influência direta e imediata dos dogmas da religião oficial, há época o catolicismo – dele emanava o poder do monarca e não do povo, como acontece atualmente nos Estados Seculares Democráticos. [1]

Como previsto na atual Constituição Federal de 1988, ser um Estado laico não significa que se tornara ateu, mas sim que permite a liberdade de crenças e credos para os que nele habitam. A transição da teocracia ao laicismo, no caso do Brasil, é identificada pela proteção tributária indiscriminada às instituições religiosas por meio do afastamento da incidência tributária dos impostos sobre o patrimônio, renda e serviços a elas afetos. [2]

No Brasil, a Constituição de 1824, promulgada em nome da Santíssima Trindade, no art. 5º do Título 1º (Do Império do Brazil, seu Território, Governo, Dynastia e Religião) assegurava que a religião oficial do Império era a Católica Apostólica Romana, considerando as demais, desde que os cultos fossem realizados de maneira doméstica ou em casas particulares. [3]

Na Constituição de 1890, após a publicação do Decreto nº 119-A, o Brasil se tornou um verdadeiro Estado laico, retirando o caráter confessional e concedendo à população o livre exercício de crença, bem como reconhecendo a todas as igrejas e confissões religiosas a personalidade jurídica. Ademais, em 1891, por meio do art. 72, § 3º, ainda vedou expressamente a subvenção as instituições religiosas (art. 11, § 2º e art. 72, § 7º). [4]

As Constituições de 1934 e 1937 conservaram a dialética aplicada pela anterior, impedindo a subvenção estatal, mas respeitando a prática de distintos cultos. Outrossim, a Carta de 1946, recepcionou a questão supra, contudo, vedou aos entes políticos lançar imposto sobre templos de qualquer culto, bens e serviços de partidos políticos, instituições de educação e de assistência social, desde que as suas rendas fossem aplicadas integralmente no País para os respectivos fins (art. 31, V, “b”). [5]

Com a Constituição de 1967, vê-se que o legislador constitucional criou alínea específica para a expressão “templos de qualquer culto”, vedando aos entes federativos a criação de imposto sobre tais locais. [6]

Por fim, promulgada a Constituição Federativa da República do Brasil, em 1988, a qual, em síntese, veda a subvenção às instituições religiosas (art. 19, I), mas, ao mesmo tempo, as imuniza da exigência dos impostos sobre patrimônio, renda e serviço. [7]

 

TEMPLOS DE QUALQUER CULTO: CONCEITO.

O art. 150, VI, “b”, norma de eficácia plena e de aplicabilidade direta, imediata e integral, imuniza os templos de qualquer culto da incidência de impostos, é o que se observa:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[...]

V – instituir impostos sobre:

[...]

b) templos de qualquer culto. [8]

Neste sentido, entende-se, por bem, a necessidade de se extrair os reais significados dos preceitos referidos.

Analisando a expressão “templo”, conforme as palavras de Ernesto Faria, citadas no artigo de Rafael Fochesatto Martins, significa o “quadrado delimitado pelo augure no céu e na terra, no interior do qual toma e interpreta os presságios [...]”. [9]

Com relação ao vocábulo “culto”, de acordo com as palavras de Eduardo Sabbag, “seria possível afirmar que culto é a manifestação religiosa cuja liturgia adstringe-se a valores consonantes com o arcabuço valorativo que se estipula, pragmática e teleológicamente, no texto constitucional”. [10]

Importante ressaltar, conforme pontifica Aliomar Baleeiro, que:

O templo não deve ser apenas a igreja, sinagoga ou edifícil principal, onde se celebra a cerimônia pública, mas também a dependência acaso contígua, o convento, os anexos por força de compreensão, inclusive a casa ou residência especial, do pároco ou pastor, pertencente à comunidade religiosa, desde que não empregados em fins econômicos. [11]

Assim, podemos citar os cemitérios, como sendo templos a céu aberto, onde são realizadas cerimônias de cunho religioso, enaltecendo aqueles que já não mais se encontram vivos. Devemos nos ater também pelo fato de, o dia 2 de novembro, feriado de finados, ser o dia em que as pessoas se dirigem aos cemitérios para limpar os túmulos, enfeitá-los com flores e orar em favor do finado. [12]

 

APLICABILIDADE DA IMUNIDADE AO PATRIMONIO, RENDA E SERVIÇOS.

O § 4º do art. 150 estende a aplicação da imunidade ao patrimônio, renda e serviços relacionados com as atividades fins da entidade, observe: 

§ 4º. As vedações expressas no inciso VI, alíneas “b” e “c”, compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas. [13]

A imunidade constitucional não atinge tão somente os templos, mas também as instituições religiosas, pessoas jurídicas de direito privado, legalmente constituídas. Protege-as da exigência, por exemplo, de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) ou ITR (Imposto Territorial Rural), IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores) – no caso dos templos móveis -, IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços), entre outros mais. [14]

Assim, verifica-se que a Constituição federal garante o livre exercício de cultos, crenças e liturgias aos cidadãos, e afasta a incidência tributária dos impostos sobre patrimônio, renda e serviços, quando estes, organizados, constituem, de direito, pessoa jurídica, cujos fins refletem nas atividades de cunho religioso.

 

INEXISTÊNCIA DE REQUISITOS PARA O GOZO DA IMUNIDADE.

A imunidade oferecida aos templos de qualquer culto é de eficácia plena, portanto, incondicionada, isto é, independe do preenchimento de requisitos legais, uma vez que a Constituição deixa de criá-los e/ou delegar competência de imputá-los a norma infraconstitucional, como bem fez na alínea “c” do inciso VI do art. 150.[15]

Seguindo a mesma linha, Leandro Paulsen, acerca da imunidade prevista na alínea “b” do art. 150, assevera que:

A alínea “b” não remete aos requisitos de lei, como fazem a alínea “c” deste mesmo art. Por isso, há quem defenda que a imunidade dos templos não é sujeita a outros requisitos senão o do § 4º deste art. 150, qual seja, a vinculação ás finalidades essenciais que, no caso, é a manifestação da religiosidade. [16]

Assim, é de se entender que inexistem requisitos autorizadores para a concessão do benefício tributário, bastando somente, a entidade, ser de cunho religioso. Hugo de Britto Machado ensina que “nenhum requisito pode a Lei estabelecer; basta que se trate de culto religioso”. [17]

Conforme ensina Rafael Fochesatto Martins,

a Administração Pública não pode criar requisitos para a concessão do benefício, sob pena de obstaculizar o exercício pleno de direito fundamental concedido ao cidadão, ofendendo o princípio da legalidade e o da reserva legal. [18]

No entanto, cabe à Administração Pública, conforme o parágrafo único do art. 194 do Código Tributário Nacional, o dever de fiscalizar possíveis desvios de finalidade das entidades religiosas. [19]

 

A POSSIBILIDADE DE REMUNERAÇÃO JUSTA PARA OS DIRIGENTES.

O ordenamento jurídico brasileiro prevê como princípio geral a questão da “busca do pleno emprego”. Observe-se que, na Constituição, o art. 6º e o inciso VI do art. 7º estabelecem como direito social o “trabalho” e o “salário mínimo”, legitimado pelo princípio da dignidade da pessoa humana, visando dar à população condições mínimas vitais.

Assim, seria ilógico vedar ás entidades religiosas de remunerar seus dirigentes, visto que estes exercem atividades e por elas devem ser remuneradas, necessitando também, como qualquer outro trabalhador, de condições básicas à vida. [20]

Observe-se o entendimento sedimentado da Secretaria da Receita Federal do Brasil:

Não perdem a condição de imunes a impostos os templos de qualquer culto que remunerem seus dirigentes. No entanto, devem ser informados na Declaração de Informações Econômico Fiscais da Pessoa Jurídica – DIPJ, os valores dos rendimentos pagos, a qualquer título, às referidas pessoas físicas, sujeitando-se estes à incidência do Imposto sobre a Renda na Fonte e na Declaração de Rendimentos dos beneficiários, visto que não gozam de imunidade ou isenção.

Por fim, deve-se entender que, tais organizações juridicamente constituídas, que atendam os seus fins sociais, sob permanente fiscalização público e privada, estas através de denúncias, rechaçando o desvirtuamento, devem, sim, gozar plenamente do benefício constitucional tributário, inclusive chancelando remuneração justa a seus dirigentes. [21]

 

CONCLUSÃO

Com base nos estudos realizados, é de se concluir que a imunidade tributária das organizações religiosas, até sua conquista expressa na Constituição de 1988, necessitava que a República Federativa do Brasil adotasse o Laicismo e a garantia constitucional de liberdade de crença para que acontecesse de forma efetiva.

Entendeu-se que, conforme previsto no § 4º do art. 150 da CRFB/88, a imunidade também abarca o patrimônio, renda e serviços relacionados com as atividades fins da instituição, ou seja, relacionados com a prática de culto religioso.

Seus dirigentes tem a prerrogativa de remuneração eis que exercem atividade passível de contraprestação pecuniária e necessitam, como qualquer outro trabalhador, de condições básicas à vida.

Sem mais delongas, com as sábias palavras de Hugo de Bitto Machado, “a imunidade deve constituir um estímulo à prática do culto religioso”. 

 

REFERÊNCIAS

ARTIGOS.COM. Imunidade x Isenção Tributária para os Templos de qualquer Culto. Disponível em: http://www.artigos.com/artigos/sociais/administracao/planejamento-tributario/imunidade-x-isencao-tributaria-para-os-templos-de-qualquer-culto-8903/artigo/. Acesso em 22.05.2012 às 21:33 horas.

 

BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

 

BRASIL. Constituição Política do Império do Brazil de 1824. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm. Acesso em 22.05.2012 às 22:37 horas.

 

BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm. Acesso em 23.05.2012 às 21:36 horas.

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acesso em 23.05.2012 às 22:09 horas.

 

BRASIL. Código Tributário Nacional. Disponível em: http://www.dji.com.br/codigos/1966_lei_005172_ctn/194a200.htm. Acesso em 26.05.2012 ás 20:46 horas. 

COLA DA WEB. Constituição de 1891. Disponível em: http://www.coladaweb.com/historia-do-brasil/constituicao-de-1891. Acesso em 23.05.2012 às 18:54 horas. 

JURISWAY. Imunidades Tributárias dos Templos de Qualquer Culto. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=6401. Acesso em: 23.05.2012 às 21:57 horas. 

MACHADO, Hugo de Britto. Curso de Direito Tributário. 31 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2010. 

MARTINS, Rafael Fochesatto. Instituições Religiosas: Panorama Tributário Constitucional. In Revista de Estudos Tributários. São Paulo. vol. 83. 2012. 

PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da Doutrina e Jurisprudência. 12 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. 

REVISTA FÓRUM. A Religião contra o Estado. Disponível em: http://www.revistaforum.com.br/conteudo/detalhe_materia.php?codMateria=9291/A%20religi%C3%A3o%20contra%20o%20Estado. Acesso em 22.05.2012 às 22:21 horas. 

SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 



[1] ARTIGOS.COM. Imunidade x Isenção Tributária para os Templos de qualquer Culto. Disponível em: http://www.artigos.com/artigos/sociais/administracao/planejamento-tributario/imunidade-x-isencao-tributaria-para-os-templos-de-qualquer-culto-8903/artigo/. Acesso em 22.05.2012 às 21:33 horas.

[2] REVISTA FÓRUM. A Religião contra o Estado. Disponível em: http://www.revistaforum.com.br/conteudo/detalhe_materia.php?codMateria=9291/A%20religi%C3%A3o%20contra%20o%20Estado. Acesso em 22.05.2012 às 22:21 horas.

[3] BRASIL. Constituição Política do Império do Brazil de 1824. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm. Acesso em 22.05.2012 às 22:37 horas.

[4] COLA DA WEB. Constituição de 1891. Disponível em: http://www.coladaweb.com/historia-do-brasil/constituicao-de-1891. Acesso em 23.05.2012 às 18:54 horas.

[5] BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm. Acesso em 23.05.2012 às 21:36 horas.

[6] JURISWAY. Imunidades Tributárias dos Templos de Qualquer Culto. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=6401. Acesso em: 23.05.2012 às 21:57 horas.

[7] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acesso em 23.05.2012 às 22:09 horas.

[8] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acesso em 23.05.2012 às 22:09 horas.

[9] MARTINS, Rafael Fochesatto. Instituições Religiosas: Panorama Tributário Constitucional. In Revista de Estudos Tributários. São Paulo. vol. 83. 2012. p. 80.

[10] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 319.

[11] BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 137.

[12] MARTINS, Rafael Fochesatto. op. cit. p. 81.

[13]  BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acesso em 23.05.2012 às 22:09 horas.

[14] MARTINS, Rafael Fochesatto. Instituições Religiosas: Panorama Tributário Constitucional. In Revista de Estudos Tributários. São Paulo. vol. 83. 2012. p. 82.

[15] MARTINS, Rafael Fochesatto. op. cit. p. 84.

[16] PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da Doutrina e Jurisprudência. 12 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 229.

[17] MACHADO, Hugo de Britto. Curso de Direito Tributário. 31 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 304.

[18] MARTINS, Rafael Fochesatto. Instituições Religiosas: Panorama Tributário Constitucional. In Revista de Estudos Tributários. São Paulo. vol. 83. 2012. p. 85.

[19] BRASIL. Código Tributário Nacional. Disponível em: http://www.dji.com.br/codigos/1966_lei_005172_ctn/194a200.htm. Acesso em 26.05.2012 ás 20:46 horas.

[20] MARTINS, Rafael Fochesatto. p. 86.

[21] MARTINS, Rafael Fochesatto. Instituições Religiosas: Panorama Tributário Constitucional. In Revista de Estudos Tributários. São Paulo. vol. 83. 2012. p. 87.