A questão da mutabilidade da língua portuguesa e seus benefícios (ou não) já é algo que é altamente discutido no mundo dos lingüistas, escritores, gramáticos, professores e até leigos no assunto, porém chegar a um consenso em relação a ela parece cada vez mais complicado. O fato é que ocorreram, sem dúvidas, grandes modificações desde a introdução da língua lusitana em terras brasileiras e que provavelmente continuará em metamorfose. Luiz Fernando Veríssimo como um dos escritores (e também cronista, jornalista, humorista etc.) mais renomados do país e tendo assim uma opinião que sempre é levada em conta, escreveu o texto "O gigolô das palavras" abordando o assunto de uma forma inteligente, criativa e irônica como sempre é de se esperar.

Alguns gramáticos e professores acham que as regras que são ditadas pelas gramáticas se sobrepõem à própria unidade da língua portuguesa, que para eles deveria ser falada e ser rigorosamente escrita como o livro tão adorado ensina. Veríssimo, em seu texto, baseia-se no pressuposto que escrever ou falar bem não condiz necessariamente em escrever certo e sim numa questão de habilidade, de dom e que o importante é comunicar, ou seja, tornar comum a idéia/pensamento/opinião que o autor ou locutor deseja transmitir. Essa questão do rigor que deveria ser imposto ao nosso português, é visto por Luiz Fernando como algo negativo ao desenvolvimento da língua, já que, apesar do desgosto de alguns, não está morta, parada, estática e sim em constante renovação com tendências globais de simplificar a linguagem e de torná-la mais acessível aos diversos grupos presentes na sociedade. Realmente é inimaginável que no mundo contemporâneo, onde a simplicidade e a globalização regem o modo de vida das pessoas, ocorra um desejo de tornar a língua (seja ela qual for) mais complicada ou mantê-la estagnada. O poder da comunicação atualmente é de suma importância para que alguém seja inserido ou fique à margem da sociedade e por isso fica clara a intenção de fazer com que a língua portuguesa se desprenda mais de suas regras e possa ser falada e escrita por quase todas as pessoas sem causar estranheza ou comicidade se algo sair dos conformes.

Veríssimo, em seu texto se diz como uma pessoa sem intimidade com a gramática, classificando-a como dispensável já que ele ganha a vida escrevendo sem precisar se submeter às suas regras. Porém, as regras dão até certo ponto uma organização à linguagem e isso deve ser levado em consideração, não podendo abandonar todos os tipos de regulamentação instituída na gramática, pois a efetivação da comunicação ficaria comprometida. O próprio Luiz Fernando se submeteu às regras de concordância e acentuação para que seu texto seja entendido e seja visto com bons olhos, afinal um texto totalmente fora dos padrões não teria credibilidade. A gramática é um livro que deve servir de apoio, mas que deve estar sempre de acordo com as modificações que ocorrem na sociedade, o autor de um texto não deve ser submisso das palavras e das regras. Como Veríssimo afirma, não interessa a origem ou quem usa a palavra, nós devemos usá-las se acharmos que são apropriadas ao momento. Novos modelos de português que se distanciam do padrão devem ser aceitos pela sociedade, já que o Brasil é um país heterogêneo e desde sempre teve sua língua modificada e adaptada à sua realidade, ou por acaso algum desses conservadores chama uma moça na rua de "rapariga" com uma naturalidade lusitana "ora pois"?