A MULHER PEITUDA

Manuel fica sem emprego na cidade. Resolve procurar os amigos. Está totalmente duro e toma alguma coisa no bar. Já estava com quatro meses sem tomar nada. Ficou até mais corado. Procura saber com os outros onde arrumar um emprego. Tá difícil a barra - diziam todos. Manuel insiste em procurar um serviço. Não pode continuar parado.

Os amigos dizem a Manuel para procurar um emprego com políticos. É fácil, é tempo de eleição e os políticos estão a procura de eleitor como urubu por carniça. Manuel resiste. Não gosta de política e dos políticos muito menos.

Anda dias e dias pela cidade. Não acha nenhum emprego. Nos serviço de antes não há mais possibilidade. Também já acabaram a construção. Que faria Manuel?

Pelo rádio, Manuel soube de uma firma que estava contratando um encarregado de pessoal urgentemente. Era pra cuidar de um alojamento de pedreiros e serventes de uma grande empresa de construção.

Manuel foi lá. Encontrou o gerente que lhe fez umas perguntas pra ver se Manuel estava apto a assumir o cargo. Você sabe cozinhar? Sei. Sabe passar pano na casa? Sei. Pois é. Precisa cozinhar, varrer a casa, o quintal, passar pano no piso do alojamento, cortar os galhos das plantas, apontar a presença e a falta dos empregados e... Manuel arregalou um olhão. O homem continuou falando. Despachar comida, atender clientes... ué, cadê o pretendente? Manuel saiu sorrateiramente e deixou o gerente falando sozinho. Ia ter que fazer todo aquele montão de serviço?

Resolveu mesmo procurar um político. Manuel não sabia fazer nada só serviços de pedreiro. Que importa? Os políticos também não sabem. Ah sim! Os políticos faziam uma coisa muito bem feita: roubar e roubar muito. O primeiro político que procurou foi uma mulher. Era candidata a vereador. Pegou o serviço com ela. Era uma tremenda gorducha. Manuel não tinha que fazer nada. Era só entregar santinho. Estranho. Santinho? Cada político mais ladrão que outro e chamar sua caricatura de santinho. Só faltava chifre. Mas Manuel aceitou. Não tinha outra coisa a fazer no momento. Além de entregar os santinhos, teria que acompanhar a candidata em todos os comícios que ela fizesse. Isto até que não era ruim. Pena que era uma mulher feia pra burro.

Manuel passou a entregar os diabinhos que a mulher lhe pediu. O povo refugava. Jogavam os papéis na hora. Outros não pegavam. Alguns perguntavam a ele se não tinha lugar melhor pra colocar aqueles papeizinhos. Claro que tinha, ele sabia disso, no deles, é claro. Mas Manuel não poderia falar isto. Iria por a candidata na lona.

A noite ele foi ao primeiro comício. Era um blábláblá danado. Promessas e mais promessas. Teve um que prometeu até uma ponte para a cidade. Aqui não tem rio, pra que ponte? - disse um ouvinte. Melhor ainda, farei o rio aqui, rebateu o político. Manuel ficava só observando as promessas dos palhaços. Quase todos falavam mal dos outros políticos. Teve um que falou tão mal do outro que chegou a dizer que se ele ganhasse no Saara, faltaria areia no deserto e teria que importá-la de outro lugar.

Chega a vez da gorducha falar. Todos bateram palmas, Manuel também. Estava ganhando para isto. Tinha que bater palma. Tinha que puxar o saco do político para quem estava trabalhando: perdão, o político dele não tinha saco. A mulher falou, falou. Xingou todos os políticos. Chamou-os de incompetentes, sem ação, sem experiência. Só queriam roubar o povo brasileiro. Político deve ter energia, deve ter peito. Se não tiver peito neste país, o Brasil não vai pra frente. Ela era trabalhadora e peituda pra tudo. Lá isto era, ninguém poderia duvidar dela. E que peituda - pensava Manuel.

O comício foi até altas horas da noite. O povo foi indo embora e acabou ficando só os bate-paus dos políticos. Tinham de ficar. Manuel não estava aguentando mais. Ainda bem que no outro dia não teria que trabalhar. Poderia dormir o dia inteiro. Chegou em casa tarde da noite e muito cansado. Não procurou nenhum bar. Foi direto para a cama. Dormiu que só um porco.