Centro Universitário de Belo Horizonte – UNI-BH

Pró-reitoria de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão

Curso de Especialização "Lato Sensu"

em Marketing e Comunicação

A MUDANÇA DA MARCA FIAT NA VISÃO DOS CONCESSIONÁRIOS

Autoria

Izabel Arêas Munhoz1

Orientador

Carlos Calic2

Resumo:

Nos últimos quinze anos de estabilização monetária, o Brasil viu a indústria automobilística crescer, principalmente com a construção de novas fábricas e com a chegada de montadoras européias e japonesas e isso fez aumentar a competição com as indústrias já estabelecidas no país. Neste cenário competitivo, a Fiat vem se destacando há sete anos como empresa líder de vendas. Este estudo mostrou por meio de pesquisas bibliográficas e umadescritiva aplicada, realizada com concessionários da grande Belo Horizonte, que a mudança da marca, juntamente com a introdução de novos produtos de luxo foram estratégias que a montadora adotou para conquistar um novo posicionamento no mercado e enfrentar melhor seus concorrentes.

Palavras-chave: Indústria automobilística, Marketing, Fiat, logotipo, marca, mudança

1Aluna do curso de Pós-Graduação em Marketing e Comunicação do Centro Universitário UNI-BH – E-mail: [email protected]

2Professor da disciplina Gerenciamento do Esforço de Marketing do Programa de Pós-Graduação em Marketing e Comunicação do Centro Universitário UNI-BH - E-mail: [email protected]

1. Introdução

A história da Fiat começou a muitos anos, no início da industrialização italiana, país onde a empresa sempre desempenhou um papel de liderança no segmento automotivo. Desde sua criação a marca Fiat foi desenvolvida extensivamente em todo o mundo. Hoje, após uma mudança na cultura corporativa, o nome da Fiat ainda é repleto de significado, e não apenas por conta dos carros que produz, mas também devido à sua herança de tradição. A montadora vem tentando, ultimamente, desvincular-se da imagem de empresa familiar, já que sempre teve suas unidades comandadas por executivos italianos "caseiros". Com a atual administração tal prática está mudando; o presidente do Grupo Fiat e também superintendente da Fiat AutomóveisCledorvino Belini, é brasileiro e os demais diretores do primeiro nível da montadora também foram "nacionalizados". Em outro conjunto de mudanças, as pessoas estão sendo valorizadas, e também suas idéias.Além disso, a empresa também investiu na inauguração de um centro de design na fábrica de Betim e em ações visando entender as necessidades do consumidor brasileiro com muitos modelos lançados na Itália recebendo novo design quando desenvolvidos no Brasil, de acordo com o padrão e estilo do mercado brasileiro.

Por outro lado, o Chief Executive Office da Fiat, Sergio Marchioni, declarou que somente as montadoras que produzirem acima de seis milhões de carros conseguirão ter lucro e assim sobreviver num cenário tão competitivo que é o mercado automobilístico mundial. Atualmente com sua produção mundial em torno de 2,2 milhões ao ano, a Fiat vem construindo alianças estratégicas para atingir as almejadas seis milhões de unidades.

A recente crise financeira mundial contribuiu para o colapso da indústria automobilística nos Estados Unidos. Com o aumento do petróleo, os carros de grande porte denominados SUV deixaram de ser atraentes para os americanos, devido ao grande consumo de combustível. Das três montadoras estadunidenses (Ford, General Motors e Chrysler) que estavam no vermelho, a General Motors e a Chrysler aceitaram dinheiro do governo para não fecharem as portas. Porém, em troca da ajuda, o governo exigiu um plano de ação para que saiam da crise em que se encontram. Foi então que, de olho no tão sonhado mercado norte-americano a Fiat propôs uma aliança com a Chrysler. Com essa parceria a Fiat tem a intenção de alcançar a meta e chegar a seis milhões de carro ao ano, além de poder utilizar a rede de concessionárias da Chrysler nos Estados Unidos, Canadá e México. Por outro lado, a Chrysler poderá utilizar a tecnologia dos motores flex de baixo consumo produzidos pela Fiat.

A Fiat foi fundada em 11 de julho de 1899 com o nome de "Società Anonima Fabbrica Italiana Automobili Torino. Entre os membros do Conselho de Administração, Giovanni Agnelli destacou-se no grupo de investidores e ganhou reconhecimento por sua determinação e visão estratégica. Em 1902 ele se tornou o diretor-geral da empresa. A primeira fábrica foi inaugurada em 1900 em Corso Dante, onde 150 trabalhadores foram lá empregados e foram produzidos 24 carros, entre os quais o HP 3/12, ainda não equipado com marcha-ré. O logotipo da Fiat, oval sobre um fundo azul e desenhado por Biscaretti, foi aprovado em 1904.

Em 1916, a Fiat inicia a construção de uma nova fábrica em Lingotto, a maior da Europa, com cinco andares e uma pista de provas totalmente futurista no telhado que logo se tornou o emblema da indústria automobilística italiana, sendo concluída em 1922.

Após este período a Fiat expandiu suas atividades para a indústria siderúrgica, estradas de ferro, eletricidade e linhas de transporte público. A empresa adotou então a política de desenvolver a produção industrial em massa como a única maneira de reduzir os preços proibitivos dos carros.

Entre 1934 e 1936 dois carros surgiram e foram destinados ao grande público: o "Balilla", também chamado de "Tariffa mínimos" devido ao seu baixo consumo de combustível, e os "Topolino", um pequeno carro utilitário no mundo, que foi produzido até 1955. Durante a Segunda Guerra mundial, houve uma redução drástica na produção de carros, enquanto que a construção de veículos comerciais aumentou consideravelmente.

Em 1945, o então senador Giovanni Agnelli morreu e a presidência da Fiat foi assumida por Vittorio Valletta. Jáem 1948 a reconstrução das plantas destruídas durante a guerra terminou graças aos subsídios americanos do Plano Marshall. Nesta nova etapa os lucros começaram a crescer e o número de empregados também aumentou. Com dois novos lançamentos, o 500 e o 1400, a Fiat confirmou o seu compromisso com a pesquisa e inovação. Em seguida foram produzidos sistemas de aquecimento e ventilação, além de motores de avião.

Em 1953, o primeiro veículo a utilizar motor diesel foi apresentado, o Fiat 1400. A partir de 1958 a produção começou a crescer muito, tanto para automóveis quanto para máquinas agrícolas. Diante disso, a fábrica em Mirafiori na Itália dobrou sua capacidade produtiva e foram criadas novas fábricas no exterior. Naquele país ocorria o período do "boom" econômico e do setor automobilístico como o "motor" da economia. Em 1955, o Fiat 600 foi desenvolvido como um carro utilitário com um motor montado na traseira.

Em 1957, o novo Fiat 500 foi apresentado e em 1960 o mesmo começou a ser produzido na versão "Giardinetta" um precursor do estilo station wagon.Além disso, estes foram os anos do Fiat 1800, depois dos modelos 1300 e 1500.

A tendência mostrou um aumento de um carro a cada 96 habitantes para um a cada 28 e a Fiat aumentou sua presença no sul da Itália por meio da criação de inúmeras fábricas. Depois do Fiat 850, um carro popular utilitário, foi a vez do Fiat 127, que fez a sua estréia em 1971.

Em 1966 Giovanni Agnelli, neto do fundador, tornou-se presidente da empresa. Naqueles anos, houve uma tendência de aumento da automatização dos processos de fabricação para lidar com a crise do petróleo e continuar no caminho da inovação tecnológica. Era o caminho para a inovação e a automação da produção.

Em 1978, o "Robogate" foi criado, um novo sistema flexível robotizado para montagem da carroceria dos automóveis. Em 1979, o setor automobilístico foi criado como uma empresa independente: a Fiat Auto SpA, que incluia as marcas Fiat, Lancia, Autobianchi, Abarth e Ferrari.
Na marca Ferrari, adquirida inicialmente em 50%, a empresa aumentou mais tarde a sua participação para 87%. Em 1984 a Fiat também assumiu a Alfa Romeo, seguida pela aquisição da Maserati - uma marca de automóveis esportivos de prestígio.

Em 1980, um novo utilitário foi desenhado por Giugiaro para a Fiat e foi chamado de Panda. Dois anos depois, nasce o carro que se tornaria o símbolo da renovação da Fiat Auto: o Fiat Uno. Ele apresentava inovações radicais em seus componentes eletrônicos, escolha de materiais e a utilização de um motor limpo: o Fire 1000.

Após o lançamento do Fiat Tempra, em 1990, o 500 deixou de ser fabricado em 1991. Dois anos depois, em 1993, foi o momento do Fiat Punto - chamado de "Carro do ano" em 1995 - e do Fiat Coupé, com carroceria desenhada por Pininfarina e pelo Centro Stile Fiat. Com o Fiat Ulysse, lançado em 1994, a empresa se inseriu em um setor que foi progressivamente se expandindo: o SUV. Em 1995 veio a estréia do Barchetta, do Fiat Bravo e do Brava, seguido pelo Fiat Marea e pelo Marea WE já em 1997 foi a vez do Fiat Palio.

Em 1996 Giovanni Agnelli tornou-se presidente honorário do Grupo Fiat, e Cesare Romiti assumiu o cargo de CEO. Em 1997, a matriz deixou a sua loja em Corso Marconi e se mudou para o Fiat Palazzina de Lingotto.

Para lidar com a crise da década de 1990, a empresa intensificou sua expansão nos mercados internacionais e alcançou uma presença mundial que lhe permitiu atingir mais de 60% do seu volume de negócios fora da Itália.
No final de 1990, uma concorrência cada vez mais agressiva levou a Fiat a concentrar a sua atenção nos mercados em desenvolvimento.

O ano de 1998 foi marcado pelo Fiat Seiscentos, um automóvel ideal para a condução da cidade, caracterizado pela utilização flexível e versatilidade incomum. Para celebrar o 100º aniversário da companhia, em 1999, o logotipo da Fiat foi renovado. Resgataram um antigo escudo criado em 1925, porém modificaram a cor para azul, que era originalmente vermelha. Essa versão foi para ser usado como o logotipo de novos produtos. Em 2000, no Paris Motor Show, o Fiat Doblò foi apresentado tratava-se de um carro novo, informal, e que podia ser usado como um veículo comercial . Enquanto isso, no Brasil e no mundo três carros foram totalmente reestilizados: o Palio, o Palio Weekend e o Siena. Este último, anteriormente fabricado na Argentina, passou a ser produzido na fábrica de Betim.

Em 2001 o Fiat Stilo foi lançado, caracterizado por um novo design, com tecnologia sofisticada e inúmeras opções de luxo. No ano seguinte são alçados ao mercado os modelos Fiat Multipla, Fiat Ulysse e Novo Fiat Stilo Multi Wagon numa perspectiva de remodelação.

Em 2003 morre Giovanni Agnelli, que tinha estado à frente da Fiat por quase meio século. Em seu lugar assume seu único irmão Umberto Agnelli.

No mesmo ano o novo Punto foi comercializado (exatamente 10 anos após o modelo ser lançado pela primeira vez) com o inovador motor 1.3 Multijet 16v , e os novos Barchetta foram redesenhados por dentro e por fora. Em 2004 a Fiat retomou sua posição de liderança no segmento super-compacto com o novo Panda, que recebeu o prêmio "Carro do ano".

O Fiat Idea foi o primeiro mono volume criado pela Fiat, mas também o primeiro carro com a tarefa de comunicar a nova missão da marca. O automóvel foi também o responsável pela mudança mais significativa no projeto do carro da Fiat: mais atenção ao conteúdo de alta tecnologia e soluções inteligentes para simplificar vários aspectos da vida cotidiana.

A Fiat viveu entre 2004 e 2006 um período de profundas mudanças na cultura corporativa. Além disso, a empresa passou a centrar-se na revisão contínua e rápida dos seus produtos, nas pesquisas tecnológicas, na qualidade de seus desenhos e em um novo relacionamento construtivo com o cliente. Durante estes anos, esta nova filosofia deu origem a uma série de novos modelos, e alguns restyling dos antigos modelos: desde o restyling do Fiat Idea Model Year, MY MY Seicento Stilo e para o Multipla novo e com o lançamento do Panda 4x4, em 2004. O ano de 2005 começou com o lançamento do novo Croma, desenhado por Giugiaro, o novo 600 (comemorando seu aniversário de 50 anos), e o Grande Punto – posicionado como belo, sólido e emocionante.

O ano de 2006 viu o lançamento do Doblò Novo e Sedici, o carro oficial dos Jogos Olímpicos de Inverno 2006 e o Panda ampliado e revitalizado. Foi também um ano de grandes mudanças no comando da empresa. Após a morte de Umberto Agnelli, Presidente da Fiat SpA, assume então Luca Cordero de Montezemolo, então Presidente da Ferrari. Este nomeia Sergio Marchioni como o CEO do Grupo Fiat tendo como primeiro desafio reverter a difícil situação financeira que a empresa se encontrava, além romper a aliança com a General Motors ocorrida em 2002.

A partir de então o logotipo da Fiat foi alterado como um sinal tangível da recuperação da empresa. O novo logotipo é na verdade uma releitura do escudo utilizado pelos automóveis da Fiat entre os anos de 1931 e 1968, mas com características tridimensionais, que em termos de forma sugerem tecnologia avançada, design, dinamismo e individualismo. A cor vermelha é similar a outra empresa do grupo, a Ferrari, verdadeiro ícone do consumo de luxo e também idolatrada por inúmeros torcedores das corridas de Fórmula 1, que a cada campeonato vêem a marca conquistando prêmios pelo desempenho tecnológico empregado em seus carros.

De acordo com Kotler (2006) as empresas precisam ir além do posicionamento amplo e apresentar a seu mercado um benefício ou uma razão concreta para a compra. Muitas empresas anunciam um posicionamento com um único benefício principal, entre as seguintes possibilidades: qualidade, desempenho, confiabilidade, durabilidade, segurança, velocidade, melhor valor pelo preço pago, preço, prestígio, estilo ou projeto, facilidade de uso, conveniência. Assim, no mercado automobilístico a Mercedes detém a posição de maior reputação; a BMW detém a posição de melhor desempenho ao volante; a Volvo a posição de maior segurança. Porém, em países como o México, onde o comprador está mais preocupado com a durabilidade que com a segurança, a Volvo acrescentou um posicionamento de segundo benefício para seus automóveis, ao alegar que seus veículos estão entre os mais duráveis.

Com o surgimento de novas marcas oriundas de mercados emergentes (como por exemplo, o BRIC), as organizações detentoras de marcas líderes e de valor sofrem pressões competitivas, e daí pode surgir necessidade de adaptação e modernização para responder à agilidade da concorrência. Para melhor entender este fenômeno que ocorre em muitas empresas líderes e detentoras de marcas de valor, buscou-se com este artigo conhecer a visão dos concessionários da região metropolitana de Belo Horizonte sobre a mudança do escudo da Fiat. Nesta perspectiva, foi importante verificar se a mudança trouxe novo posicionamento de benefícios para a Fiat e se tanto o concessionário quanto o cliente relacionam a cor vermelha utilizada com a marca Ferrari.

Mesmo a Fiat sendo líder de vendas no mercado nacional pela 7ª vez (FENABRAVE, 2009),sentiu necessidade de uma mudança na sua marca visando, agradar aos seus consumidores, trazer uma maior motivação para a equipe de vendas dos seus concessionários, e, sobretudo, contribuir para um maior posicionamento da sua marca.

O objetivo geral deste artigo consistiu em estudar o caso Fiat, suas estratégias utilizadas para a mudança da marca, bem como conhecer o impacto da mudança perante o consumidor, na visão do concessionário. Os objetivos específicos foram: diagnosticar as principais tendências e estratégias utilizadas para o fortalecimento da imagem, analisar a resposta e aceitação do consumidor perante a mudança, analisar a história da marca em questão, desde sua criação até os tempos atuais e analisar se houve mudança no posicionamento da marca na visão dos concessionários Fiat da grande Belo Horizonte.

Para Ander-Egg (1978) a pesquisa é um procedimento reflexivo sistemático, controlado e crítico que permite descobrir novos fatos ou dados, relações ou leis, em qualquer campo do conhecimento. Portanto, a pesquisa se torna um procedimento formal, com método de pensamento reflexivo, que requer tratamento científico.

Pesquisa é uma indagação minuciosa ou exame crítico e exaustivo na procura de fatos e princípios, uma diligente busca para averiguar algo. A pesquisa não é apenas procurar a verdade, é encontrar respostas para as questões propostas, utilizando métodos científicos.

Para alguns autores e estudiosos, como Asti Vera (1974) o ponto de partida de uma pesquisa é o problema que deverá ser definido, examinado, avaliado, analisado e, conseqüentemente, solucionado. A finalidade da pesquisa é descobrir respostas para questões propostas.

"Problema é uma dificuldade, teórica ou prática, no conhecimento de alguma coisa de real importância, para qual se deve encontrar uma solução. Definir um problema significa especificá-lo em detalhes precisos e exatos. Na formulação de um problema deve haver clareza, concisão e objetividade. A colocação clara do problema pode facilitar a construção da hipótese real." (LAKATOS E MARCONI, 1991, p.159)

A pesquisa qualitativa exploratória, utilizada neste estudo, estimulou o entrevistado a pensar livremente sobre o tema em questão, seu objeto ou conceito. Fazem surgir aspectos subjetivos e atingem motivações não explícitas, ou mesmo conscientes, de maneira espontânea. É usada quando se busca percepção e entendimento sobre a natureza geral de uma questão, abrindo espaço para a interpretação (IBOPE, 2009).

Para avaliar a percepção dos consumidores e vendedores perante a mudança da marca Fiat, foi utilizada a pesquisa qualitativa com os concessionários da região metropolitana de Belo Horizonte.

"Uma boa pesquisa exige fontes que sejam capazes de ajudar a responder sobre o problema proposto. São preferíveis poucas fontes, mas de qualidade. Boa parte da validade da pesquisa está associada a seleção. É possível, entrevistando pequeno número de pessoas, adequadamente selecionadas, fazer um relato bastante consistente sobre um tema bem definido. Sendo assim, utilizaremos a seleção dos informantes com base na teoria acima, partindo do pressuposto que informantes aleatoriamente escolhidos nos ajudarão a analisar melhor os objetivos iniciais."(DUARTE, 2005, p. 65).

Neste estudo de caso foi utilizado o formulário de entrevista como instrumento de coleta de dados e os concessionários da marca Fiat na grande Belo Horizonte - por serem os elos do fabricante e seus consumidores - foram escolhidos como unidades empíricas de pesquisa. As informações coletadas foram posteriormente compiladas e analisadas à luz dos conhecimentos empíricos acumulados e da teoria estudada.

2. Marcas: origem e conceito

No mundo contemporâneo e em pleno século XXI, falar sobre marcas soa como algo já estabelecido e definido na mente do consumidor. O bombardeio na mídia é tão intenso que muitas vezes é preciso estabelecer leis que monitorem esta exploração. Falar hoje para um jovem de 20 anos que os horários nobres das emissoras eram invadidos de publicidade de tabaco soa até mesmo falso. Num futuro bem próximo o mesmo poderá acontecer com relação às cervejas e outras bebidas, que investem atualmente milhões com publicidade e têm ainda a pressão da lei seca que pode levar à inibição e veiculações de tais produtos. Daqui a alguns anos também pode-se achar absurdo a maneira como que as propagandas de cerveja invadiam a TV nos horários nobres (BORGES, 2009, comunicado em sala de aula).

"... Marcas existem há séculos. Já no antigo Egito, os fabricantes de tijolos colocavam símbolos em seu produto para identificá-los. Na Europa Medieval, as associações de comércio usavam "marca" para assegurar ao consumidor uma quantidade consistente e obter proteção legal para o fabricante." (TAVARES, 1998, p. 2)

Segundo Tavares (1998) as marcas registradas surgiram no século XVI. Os escoceses destiladores de uísque embarcavam seus produtos em barris de madeira com o nome do fabricante marcado a fogo em sua parte superior.

O mesmo autor menciona que no século XIX a marca foi usada para aumentar o valor percebido do produto. Em 1835 a marca de uísque Old Smuggler foi introduzida para capitalizar a reputação da qualidade desenvolvida por determinados engarrafadores que usavam um processo especial de destilação. Conforme relata Pinho (1996) remonta também aos primeiros anos do século XIX o início da preocupação com as questões de proteção e de registro das marcas, principalmente na Inglaterra, Estados Unidos e Alemanha, apesar da revolução lenta e confusa da legislação de proteção. As dificuldades são decorrentes em função das marcas terem um valor intangível e portanto difíceis de serem provadas nos tribunais. A demanda legal acarretou na segunda metade do século a promulgação da Lei de Marcas de Mercadorias na Inglaterra (1862), da Lei Federal de Marcas de Comércio nos Estados Unidos (1870) e da Lei para a Proteção de Marcas na Alemanha (1874).

Segundo Pinho (1996) o Comitê de Definições da American Marketing Association estabeleceu em 1960 os conceitos de marca, nome de marca e marca registrada.

"Marca é um nome, termo, sinal, símbolo ou desenho, ou uma combinação dos mesmos, que pretende identificar os bens e serviços de um vendedor ou grupo de vendedores e diferenciá-los daqueles dos concorrentes." "Nome de marca é aquela parte da marca que pode ser pronunciada, ou pronunciável." "Marca registrada é uma marca ou parte de uma marca à qual é dada proteção legal, porque é capaz de apropriação exclusiva".

Para Tavares (1998) a marca é um dos ingredientes que as empresas utilizam em suas estratégias para diferenciar sua oferta.

"A marca é mais que um simples nome. O significado de uma marca resulta dos esforços de pesquisa, inovação, comunicação e outros que, ao longo do tempo, vão sendo agregados ao processo de sua construção. Isso significa que sua criação e manutenção não podem ficar restritas a designers, artistas gráficos e agências de publicidade." (TAVARES, 1998, p. 17)

Para Aaker (1998) a marca é um nome diferenciado e/ou símbolo destinado a identificar os bens ou serviços de um vendedor ou de um grupo de vendedores e a diferenciar esses bens e serviços daqueles dos concorrentes. Assim, uma marca sinaliza ao consumidor a origem do produto e protege tanto o consumidor quanto o fabricante dos concorrentes que oferecem produtos que pareçam idênticos.

Segundo Martins (2000) a identidade corporativa compreende a execução de mais uma etapa do compromisso de posicionamento, que é quando um nome se transforma em uma marca.

"Contudo, a identidade corporativa não é formada, como pensa a maioria, por um desenho, nome ou slogan. Tudo em uma empresa precisa estar integrado a sua identidade: valores, metas e compromissos. Os produtos, serviços, atendimento, pessoas, produção, distribuição e afins fazem parte de um sistema de comunicação que é visto pelos consumidores como os elementos de identidade da marca que eles escolheram comprar." (MARTINS, 2000, p.74)

3. Mudança de marca

A entropia (do grego, entrope) que etimologicamente significa transformação, pode ser entendida como uma medida de desordem ou de imprevisibilidade da informação, certa tendência à degradação, à desintegração e até ao desaparecimento. O termo também é amplamente usado na teoria dos sistemas apropriado aos estudos da administração de empresas. Segundo Perez (2004) nessa perspectiva a organização é vista como um sistema e, portanto, está sujeita à perda de energia, à desordem e à degradação - a entropia. Transportando o entendimento da organização como sistema para as marcas percebe-se que seus elementos constitutivos vão desde seu nome, logotipo, forma, cores, até a publicidade que lhe dá sustentação e o discurso sociocultural dos executivos e da organização que lhe deu origem. Portanto, se a marca é um sistema, assim como todos os outros sistemas, tende ao desgaste. Se não for injetada constantemente energia, a marca perde sua atratividade, desgasta-se, degrada-se e pode desaparecer. A marca deve estar constantemente presente se auto-referenciando. Assim, se um competidor passa a cuidar de sua marca de maneira vigorosa e a empresa não o faz, naturalmente com o tempo sua marca se esvai. A marca deve ir incorporando as tendências de sua época e as mudanças socioculturais para manter a identificação com seu público consumidor. Um exemplo desse cuidado foi o lançamento do carro Ford Ka em fins dos anos 90. O lançamento do produto, bastante arrojado, tinha por principal objetivo trazer jovialidade à marca Ford, que estava desgastada e envelhecida. Esse é um tipo de estratégia, mas às vezes pequenas alterações na logotipia ou na abordagem publicitária são suficientes para se manter atualizado com seus consumidores.

"...Cuidar da marca, envolvê-la em ambientações estrategicamente planejadas, revesti-las de modernidade sem perder seus traços de memória distintiva, agregá-la a situações agradáveis, prazerosas, até mesmo hedonísticas em algumas situações (nem todas são adequadas), e calibrar seu discurso com o público, talvez seja o caminho para se chegar à entropia negativa, ou seja, ao equilíbrio sistêmico de seus elementos, evitando a degradação." (PEREZ, 2004, p. 15)

Segundo Aaker (1998) quando um nome tem associações que se tornam prejudiciais ou limitativas, ou quando novas associações incompatíveis com o antigo nome são necessárias, outro, novo nome, pode ser requerido. De fato, perto de dois mil nomes de corporações são mudados anualmente, em grande parte porque o nome abandonado não reflete mais o negócio da empresa. A Consolidated Foods mudou para Sara Lee. Embora "Sara Lee" não refletisse o que a empresa fazia, era um nome bem conhecido e muito apreciado, e que, dentre outras coisas, seria bem recebido pelos investidores, um importante alvo do nome. O interessante é que o mercado de ações, em geral, reaja positivamente a uma mudança de nome, provavelmente porque isto sinalize uma mudança de visão ou de estratégia da empresa.

"... Com tanta coisa investida num símbolo, é arriscado alterá-lo, em vista do reaprendizado que deverá ocorrer. Por outro lado, ele pode ficar envelhecido e começar a desenvolver algumas conotações antiquadas indesejáveis e indigestas. Diversas empresas modernizaram os seus símbolos com sucesso ao longo do tempo, para mantê-las de acordo com os novos tempos, embora ainda retendo a herança e as associações." (AAKER, 1998, p.213)

Segundo Tavares (1998) a passagem de uma para outra identidade pode provocar uma crise, relacionada aos novos papéis que estão sendo demandados. Essa é semelhante à chamada crise de identidade que ocorre com as pessoas. A sociedade mantém ritos de passagem para essas ocasiões e o mesmo deve ocorrer com as organizações. Ainda segundo Tavares (1998) em algumas vezes a mudança de identidade significa apenas estendê-la. Outras vezes, contudo, requer evolução. Nesse caso, a empresa procura reter os traços positivos da identidade e incluir novos. Características de diferentes atributos ou personalidade, novos segmentos de mercado, novas imagens do usuário, a extensão de produto e novos benefícios emocionais são questões a serem trabalhadas.

Quando a marca Fiat chegou ao país com seu Fiat 147, a empresa passou por muitos problemas com os consumidores que reclamavam do desempenho do carro. A empresa enfrentou uma crise de imagem que fez com que muitos consumidores traduzissem a marca Fiat para "Fui Iludido Agora é Tarde". Mas hoje com um portfólio que inclui praticamente todos os segmentos de automóveis, com motores que vão desde os mais econômicos até os mais velozes, a empresa mantém a liderança no Brasil com a participação de 25% do mercado nacional (ANFAVEA, 2009). A brincadeira de traduzir o nome da Fiat parece que ficou no passado. No Brasil os maiores concorrentes da Fiat são Volkswagen, Chevrolet e Ford. Curiosamente todas estas marcas são na cor azul, agora com exceção da Fiat, que ousou diferenciar-se de seus concorrentes, resgatou o escudo vermelho em referência a marca Ferrari.

"... a valoração da marca realiza-se pela criação e manutenção de um conjunto organizado de características funcionais e aspectos simbólicos em uma relação que sustente uma vantagem competitiva da empresa perante seus concorrentes no mercado. Do ponto de vista do consumidor, estas associações de idéias direcionam fortemente a imagem de marca, já definida como o conjunto de atributos e associações que os consumidores reconhecem e conectam com o nome de marca..." (PINHO, 1996, p. 136)

4. O estudo da mudança da marca Fiat nos concessionários

Na região metropolitana de Belo Horizonte existe atualmente oito concessionárias da marca Fiat, sendo uma em Betim, uma em Contagem e as demais Belo Horizonte. Dentre tais concessionários foram escolhidos quatro, sendo dois de Belo Horizonte, um de Contagem e um de Betim. As demais cidades da grande Belo Horizonte não possuem concessionária Fiat.

Os entrevistados, supervisores e vendedores, foram tanto do sexo masculino quanto do feminino, com idade variando entre 25 e 40 anos, e que já trabalham há no mínimo três anos com a marca Fiat e, portanto, já estavam na empresa quando ocorreu a mudança da marca. Segundo os entrevistados, quando os automóveis da Fiat começaram a chegar às lojas com o novo logotipo, o cliente percebeu de imediato. "Não era preciso nem mencionar tal mudança, pois eles mesmos já faziam esta observação", afirmaram. A associação do novo escudo vermelho com a Ferrari também foi percebida pelo cliente, principalmente os do sexo masculino que normalmente acompanham o campeonato de Fórmula 1. "Muitos já chegam às lojas com o modelo e a cor escolhidos e quando se trata do vermelho já dizem que preferem tal modelo na cor 'vermelho Ferrari', afirmou um vendedor. Na verdade o nome desta cor é "vermelho modena", mas o cliente intuitivamente se refere à mesma desta maneira. Não foram poucos os casos de consumidores que gostaram tanto da mudança que chegaram a adquirir o escudo vermelho e fizeram a substituição no seu veículo mais antigo, destacaram os entrevistados.

A Fiat aumentou a participação no mercado desde 2007, quando houve a mudança da marca, mas o resultado não pode ser creditado unicamente a tal alteração, como pôde ser percebido no estudo

O consumidor compra os produtos da Fiat pelo preço que é atrativo, mas percebe que ele ganha em qualidade, custo baixo, manutenção barata e acabamento superior à concorrência. A montadora conquistou a confiança do brasileiro quando lançou no mercado o motor Fire, deixando para trás a desconfiança com relação à qualidade e custo de manutenção. Um outro aspecto verificado a partir das análises dos resultados das entrevistas foi a resistência do motor. A empresa possui uma grande rede de oficinas especializadas, sendo que tal fato contribuiu para diminuir a insegurança dos consumidores em relação aos custos de manutenção da marca nos últimos anos.

Os entrevistados foram unânimes em afirmar que a opção de compra realizada pelo cliente está diretamente ligada à marca Fiat. O fato de a empresa ser líder de vendas no país tem motivado muitos consumidores a trocar os produtos concorrentes por veículos da marca, pensando muitas vezes no valor de revenda, já que os carros da Fiat são os mais procurados no mercado de usados, como também foi apurado neste estudo.

A nova marca em estilo retrô, uma tendência que está em alta num consumidor mais exigente,aliada ao lançamento do Fiat Línea, um sedã de luxo, além da chegada do Fiat 500, um produto de nicho, deixa claro que a Fiat quer um novo posicionamento, afirmaram os entrevistados. Na ocasião do lançamento da marca a Fiat fez uma apresentação prévia com toda a rede de concessionários, mas não explicitou o motivo da mudança, talvez como parte de sua estratégia de marca. Tal situação levou alguns vendedores mais interessados a buscarem informações a respeito do fato na internet.

Contudo, foi observado que todas as concessionárias visitadas continuam com os letreiros da entrada com a antiga marca. De acordo com as mesmas, até o momento não foi exigida a substituição pela montadora.Mas para as lojas que vendem os modelos Línea e Fiat 500 foram exigidas algumas modificações para deixar o show room mais sofisticado, como a mudança no piso, a pintura do ambiente e a introdução de texturas novas em vermelho e branco, TV de plasma com imagens dos veículos, etc, o que demonstra que a empresa está em busca de um novo posicionamento.

Algumas concessionárias adotaram a cor vermelha no nome das lojas, inclusive com novos uniformes para a equipe de vendas, mas já mencionaram em reuniões que a Fiat determinou que até 2010 toda a rede de concessionários terá os uniformes padronizados na cor cinza e vermelha.

A Fiat investe muito na capacitação das equipes de vendas e nestes treinamentos 30% do tempo é destinado a argumentações sobre o produto e 70% é voltado para a marca, o que, dentre outras ações, demonstra que a montadora investe na fixação de sua identidade.

A mudança da marca agradou completamente às equipes de vendas nas concessionárias pesquisadas. O vermelhovibrante , aliado ao prata trouxe mais sofisticação à marca. Outro aspecto constatado foi que a mudança do escudo trouxe vigor à marca e o lançamento de novos produtos aumentou a motivação das equipes. Além disso, os vendedores têm orgulho de trabalhar com a marca e outro aspecto observado deixa evidente que muitas vezes os vendedores não precisam se esforçar para vender, já que a marca por si só atrai os clientes para as concessionárias.

Verificou-se também que a Fiat conseguiu se diferenciar dos seus concorrentes devido a este novo posicionamento na busca de um público jovem que vivencia e aprecia a tecnologia.

5. Conclusão

A liderança se constrói dia a dia. É preciso estar atento às necessidades do consumidor e principalmente à frente da concorrência. A Fiat chegou ao país há trinta anos e nesse período fez duas mudanças em sua marca, buscando sempre comunicar um novo posicionamento. Nos últimos dez anos, a montadora aumentou consideravelmente o seu share e o seu portfólio de produtos tem crescido ano após ano. Um reflexo disso é que em 2008, a empresa lançou 25 produtos, entre eles reestilizações de alguns já existentes. Hoje a empresa possui produtos de todos os segmentos, inclusive de luxo com o lançamento do Fiat Línea e de nicho como o Fiat 500, destinado a um público cult. A mudança da marca juntamente com a chegada de produtos de luxo são estratégias que a Fiat adotou para conquistar um novo posicionamento no mercado e enfrentar melhor seus concorrentes que já estavam estabelecidos neste segmento.

Após todo o levantamento histórico e bibliográfico acerca da evolução da marca Fiat ao longo dos anos e das entrevistas com os concessionários pode-se considerar que o esforço da mudança recente da marca alcançou resultados significativos tanto para os revendedores, quanto para os clientes - os verdadeiros alvos de todos os esforços empresariais - mas que a montadora ainda tem muito a empreender para solidificar o novo posicionamento, sobretudo na adequação dos pontos de vendas.