APRESENTAÇÃO

Trata-se o presente de um singelo trabalho de pesquisa, de igual forma singela, sem nenhuma pretensão de se equiparar às grandiosas obras que amontoam as bibliotecas várias do país, que com seu vasto conteúdo vem enaltecer o conhecimento daqueles que um pouco mais buscam.
Nesse apoucado texto iremos discorrer de forma breve e sem maiores delongas acerca da medida de internação em hospital psiquiátrico à luz do constitucionalismo moderno, em especial sobre a dignidade da pessoa humana.
Antes de enfrentarmos o tema em especifico (o seguinte questionamento: Diante dos princípios da dignidade da pessoa humana o inimputável ao cumprir medida de segurança em hospital psiquiátrico judicial será devidamente reintegrado ao meio social?) iremos a fazer ainda uma breve passagem sobre a historicidade dos direitos humanos no Brasil.

DIREITOS HUMANOS NO BRASIL
Historicidade
Historicamente falando, houve um movimento criado pelos iluministas gerando uma grande reviravolta no que diz respeito aos direitos dos cidadãos, posto que foi o movimento precursor para que fosse reconhecido o direito dos cidadãos de se oporem ao próprio Estado, iniciando-se assim um novo pensamento que vinha sendo cogitado pelos grandes pensadores do século XVI.
A França sob a influência dos ideais iluministas, e depois os Estados Unidos e a Inglaterra iniciavam a novel politica voltada para os cidadãos, como forma de aceitação dos anseios das pessoas que no passado tiveram que se sucumbirem à vontade estatal, criando assim, a primeira geração dos direitos humanos que representava uma:
"[...] tentativa de superação do tradicional antagonismo existente entre o direito natural e o direito positivo deu origem a uma nova dogmática que, apesar de incipiente, vem ganhando cada vez mais espaço no mundo jurídico, sobretudo no âmbito do direito constitucional." (Novelino,2008)
O Brasil, ainda quando do movimento iluminista vivia na Fase Colonial com a disputa pelas Capitanias hereditárias e posteriormente a fase monárquica, com influências das novas teorias politicas e o movimento constitucional, já constituindo a nobreza brasileira "assentada sobre a base dos grandes latifúndios, numerosa, rica, orgulhosa, esclarecida pelas ideias novas, que revolucionaram os centros cultos do Rio e de Pernambuco" (Silva,2010)e, ainda, "uma aristocracia intelectual graduada na sua maioria pelas universidades europeias, especialmente a de Coimbra." (Silva,2010)
Logo após, o Brasil saiu da monarquia para a fase Republicana, instalando-se em 1.889, o governo provisório sob a presidência do Marechal Deodoro da Fonseca.
Os Estados Unidos do Brasil galgou então uma nova aspiração politica, passando a ser um pais federado que:
"[...] responde a condições econômicas, sociais e politicas e fora anteriormente uma reivindicação e realidade, da Colônia até a Regência. O segundo reinado abafa-o momentaneamente, jogando com os partidos e cortando os elementos mais exaltados." (Silva,2010)
A essa altura, os Estados Unidos da América, Inglaterra e França vivia uma nova politica industrial e econômica, enquanto que o Brasil caminhava rumo à Revolução de 1930 e a questão social "irrompera a Revolução, que pôs abaixo a Primeira República" (Silva, 2010), mas a economia começava a desmantelar o coronelismo, e Getulio Vargas ganhava projeção e se destacava no cenário politico nacional, inclinando-se para a questão social, ganhando terreno ante a inquietação operária.
No ano de 1934, adveio nova constituição que resultava novo conteúdo, impondo rigor às receitas tributárias entre União, Estados e Municípios, deixando clarividente a base econômica que se assentava, momento em que, no Brasil, se catapultava o desenvolvimento, posto que logo após a era Vargas, veio JK, com que sua politica para industrializar o país.
Entretanto, logo em seguida veio o golpe militar ceifou direitos indispensáveis dos cidadãos, que somente veio a recuperá-los com a Carta Cidadã de 1988.
DIREITOS HUMANOS (DIG. DA PESSOA HUMANA) NA CF/88
Novos Direitos
Segundo a lição balizada por Marcelino Novelino em sua obra Direito Constitucional, Constituição pode ser definida,
"em sentido jurídico, como o conjunto sistematizado de normas originárias e estruturantes do Estado que tem por objeto nuclear os direitos fundamentais a estruturação do Estado e a organização dos podres." (Novelino,2008)
Uma importante observação a se fazer é que as constituições podem variar de acordo com cada sociedade, o local e a época de sua comissão constituinte, posto que cada povo tem uma necessidade diferenciada.
O professor Marcelo Novelino, leciona que foi estabelecido:
"um fenomeno constatado no tocante a este aspecto é a ampliação gradativa do conteúdo das constituições, que passaram a tratar não apenas as normas constitutivas do Estado, mas tambem de outros assuntos, dando distinção doutrinária entre normas materialmente e formalmente constitucionais." (Novelino,2008)
Marcelo Novelino continua aduzindo que:
"Da primeira espécie, as normas referentes a estruturação do Estado e dos Poderes, bem como aos direitos fundamentais, matérias constitucionais clássicas, que vem consagradas desde as primeiras constituições escritas. Da segunda, as normas que são constitucionais não em razão de seu conteúdo, mas sim da forma como foram elaboradas e do documento ao qual aderiram." (Novelino,2008)
Da doutrina dominante se extraí que a Carta Politica de 1988 tem como fundamento básico os direitos e garantias fundamentais, para ao depois normatizar a organização e estrutura do Estado e de seus órgãos, relegando para último plano os fins econômicos do Estado, que devem atender os ditames da justiça social.
É certo que a ordem econômica no Brasil adquiriu status e importância a partir da promulgação da Carta Magna de 1988, que institui um capitulo para tratar deste assunto i.e., a atuação do Estado,
"[...] uma tentativa de pôr ordem na vida econômica e social, de arrumar a desordem que provinha do liberalismo. Isso tem efeitos especiais, porque importa em impor condicionamentos à atividade econômica, do que derivam os direitos econômicos que consubstanciam o conteúdo da constituição econômica." (Silva,2010)
Não é despiciendo observar que ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os princípios constitucionais, dentre eles, a defesa do consumidor, redução das desigualdades regionais e sociais, e a busca do pleno emprego (CF/88, art. 170, Incisos V, VII e VIII), vale dizer, princípios que estão intimamente ligados com a dignidade da pessoa humana, além de propiciar a geração de riquezas.
Ademais, dispõe o art. 1º da Constituição Federal, Inciso III, que traz como cláusula fundamental e imutável a dignidade da pessoa humana; De suma relevância também é o texto inserido no art. 3° Inciso IV, da Carta Política de 1988, que impõe o dever objetivo da República Federativa do Brasil em promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
É indiscutível que a dignidade é fator primordial ao ser humano, por isso já diz a cientista política Maria Victoria Benevides :
"Dignidade é a qualidade própria da espécie humana que confere a todos e a cada um o direito à realização plena como ser em permanente inacabamento, à proteção de sua integridade física e psíquica, ao respeito a suas singularidades, ao respeito a certos bens e valores, em qualquer circunstância, mesmo quando não reconhecidos em leis e tratados. Dignidade é aquele valor ? sem preço! ? que está encarnado em todo ser humano."
É, portanto, o principio da dignidade da pessoa humana que dota de unidade nosso sistema constitucional, emanando seus efeitos a todos o que integram o meio social, informando e conformando, assim, todo o ordenamento jurídico posto e pressuposto, definindo seu conteúdo que superpõe todos os demais ramos do direito.
O insigne Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Rizzato Nunes, verbera:
"A dignidade nasce com a pessoa. É-lhe inata. Inerente à sua essência, [mas] sua dignidade ganha um acréscimo de dignidade. Ele [o individuo] nasce com sua integridade física e psíquica, mas chega um momento de seu desenvolvimento que seu pensamento tem de ser respeitados, suas ações e seu comportamento ? isto é ? sua liberdade -, sua imagem, sua intimidade, sua consciência ? religiosa, cientifica, espiritual ? etc., tudo compõe sua dignidade."
Erige-se, portanto, em valor fundamental a dignidade da pessoa humana que se acolhe no constitucionalismo contemporâneo como principio matricial dos sistemas elaborados, dotando-o de vigor legitimado no qual se fundamenta o direito dos povos ? a vida e a dignidade da pessoa humana.
Percebe-se que de acordo com o texto constitucional a função precípua do Estado é fomentar a dignidade da pessoa humana.
Como já dito alhures, com o surgimento dos ideais iluministas criou-se um sentimento de necessidade de mudança, surgindo após a revolução francesa (1789) a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, para que fosse então instituídos os Direitos Humanos, amplamente consagrados na Constituição Federal Brasileira de 1988.
Uma importante observação a se fazer é que estudiosos como Lombroso, Ferri e Garafalo mapearam o perfil do criminoso e porque esse indivíduo tinha uma conduta criminalizável, constatando-o como sendo um sujeito atávico (Lombroso), com problemas psicológicos e de ordem social (Ferri) e a pena tomou um rumo diferente, com caráter corretivo do delinquente (Garofalo).
Não há registro de quando foi que surgiu a primeira lei penal, sendo o mais aceito pelos estudiosos é que tenha sido criada pelo povo Hebreu e as primeiras leis foram escritas por Moisés, no livro de Levítico, que faz parte do Pentateuco, e o seu caráter legislativo era de cunho religioso, evoluindo depois para a vingança privada e a vingança pública, sempre com penas cruéis e de morte.
No Brasil neoliberal, o Direito Penal constitui um ramo do Direito Público que reúne um conjunto de normas e disposições jurídicas que permite ao Estado a prerrogativa de punir o cidadão transgressor.
Através deste conjunto de normas e disposições jurídicas que o Estado aplica um castigo ao transgressor da norma positivada, sancionado desta forma os delitos e as infrações penais para manter a ordem social.
De acordo com os art. 91 e 92 do Código Penal Brasileiro, o sujeito ao ser condenado pelo Estado-Juiz, terá a suspensão, e até mesmo a perda de vários direitos, mas o que se questiona atualmente é que o individuo condenado, ou qual teve contra si aplicada uma medida de segurança cumprirá medida de ressocialização (cumprindo pena ou medida de segurança) perderá também sua dignidade, posto que a CF garante que não haverá tratamento desumano, pena de morte e nem prisão perpetua.
Neste diapasão temos o questionamento seguinte: diante dos princípios da dignidade da pessoa humana o inimputável ao cumprir medida de segurança em nosocômio judicial será devidamente reintegrado ao meio social posto que o art. 96, Inciso I do Código Penal dizer que " a internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta em outro estabelecimento adequado"? (grifo nosso)
Não é despiciendo observar que Guilherme de Souza Nucci obtempera que, "atualmente, prevalecendo o sistema vicariante (?que faz as vezes de outra coisa?), o juiz somente pode aplicar pena ou medida de segurança. Caso o réu seja imputável à época do crime, receberá pena; se for inimputável, caberá medida de segurança..." (Nucci,2009)
Pois bem!
O individuo internado no hospital psiquiátrico, diante da precariedade do tratamento que lhe é dispensado, tem sim aplicada verdadeira pena contrária ao estatuído na Constituição Federal, posto que o art. 1º, Inciso III, lhe garante o direito da "dignidade da pessoa humana"; Ademais, temos outras disposições constitucionais v.g., art. 5º, Inciso III, "ninguém será submetido a tratamento desumano ou degradante" dentre outros, tais como, Art. 5º, Incisos XLVII, alíneas ?a?, ?b?, ?c?, ?d? e ?e?, além dos Incisos XLVIII, XLIX, L, dentre outros dispositivos da legislação infraconstitucional.
Não basta apenas a Constituição dizer ser direito à dignidade da pessoa humana, pois impor ao reeducando e aos internos uma inclusão social, sem nenhum aparo que lhe de suporte no futuro, tal qual ocorre, irá apenas lançar essas pessoas em uma sociedade paralela, posto que ao saírem do Hospital Psiquiátrico e dos Centros de Inserção Social, não terão nenhuma perspectiva de futuro sólido.
Neste sentido, o Sociólogo José de Souza Martins nos revela:
"[...] é exatamente este caso que revela o lado oculto ou que nós queremos ocultar dessa inclusão, elas se integram economicamente, mas se desintegram moral e socialmente. O mesmo ocorre com vários outros grupos alocados em favelas, cortiços ou assentamentos. Já não é o mundo do pobre, porque as pessoas são reincluídas economicamente, em vários graus e diferentes modos, que no fundo comprometem radicalmente sua condição humana. Este processo que nos chamamos de exclusão não cria mais pobres que nós conhecíamos e reconhecíamos até outro dia. Ele cria uma sociedade paralela que é includente do ponto de vista econômico e excludente do ponto de vista social e moral"
De acordo com o Art. 97, § 1º do Código penal a medida de segurança tem duração indefinida, contrariando assim, a duração máxima de 30 (trinta) anos, bem como dispositivo constitucional que diz que não haverá prisão perpetua.
CONCLUSÃO
Temos que a Constituição Brasileira de 1988 tem como garantia a dignidade da pessoa humana, cujo direito superpõe a todos os outros, que a ela (dignidade da pessoa humana) deve sucumbir para atender os ditames da justiça social.
É através do conjunto inserido nas normas constitucionais e infraconstitucionais que o Estado impõe um castigo ao delinquente, seja ele imputável, através da pena e se inimputável, uma medida de segurança como meio de intimidar outros para que não venha transgredir a norma positivada, e ao mesmo tempo manter a ordem social, propiciando a reintegração social de forma gradativa.
Neste diapasão, o individuo internado em hospital psiquiátrico, sob custódia do Estado, não vem dispensando atenção adequada ao interno, impondo-lhe uma verdadeira pena, de caráter perpetua, em flagrante infração as normas previstas na Constituição Federal, e outros dispositivos da legislação infraconstitucional.
Assim necessário se faz a harmonização do Art. 26 com o art. 97 do Código Penal, tal qual proposto pelos "especialistas da área de psiquiatria forense em relação ao critério adotado pelo art. 97 do Código Penal, buscando associar a espécie de medida de segurança ao crime praticado. O correto seria a fixação de medida de internação ou de tratamento ambulatorial baseado na natureza e gravidade do transtorno psiquiátrico, segundo critérios médicos." (Apud Nucci,2009) dispensando-lhes verdadeiro tratamento médico, posto que se trata de cidadãos doentes, e em sua maioria sem uma familia e um lar.
Assim ocorrendo, estará sendo garantido o principio da dignidade da pessoa humana que emana de nosso sistema constitucional, dimanando seus efeitos a todos que associam o meio social, informando e conformando, assim, todo o ordenamento jurídico posto e pressuposto.


REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA

Benevides, Maria Victoria. Prefácio. In: SCHILLING, Flávia (Org.) Direitos Humanos e Educação: outras palavras, outras práticas.
Martins, José de Souza. Exclusão social e a nova igualdade.
Neto, Inacio de Carvalho Novos Direitos.s.l.,Juruá,2009.
Netto, José Oliveira Mini Dicionário Jurídico Universitário - Terminologia Jurídica e Latim Forense.Leme - SP,Editora Edijur,2010.
Novelino, Marcelo Direito Constitucional.s.l.,Método,2008.
Nucci, Guillhermede Souza Manual de direito penal.s.l.,Revista dos Tribunais,2009.
Nunes, Rizzato. O principio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana
Silva, José Afonso da Curso de direito constitucional positivo.São Paulo,Malheiros Editora Ltda.,33ª,2010.
http://www.webartigosos.com/articles/28363/1/O-Direito-Penal-constitui-instrumento-habil-para-diminuir-a-criminalidade/pagina1.html#ixzz1HkjnbUwX