Joycemara Cristina Sales de Freitas [*]

Em 13 de Julho de 2008, a Lei 8.069 conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), atingiu sua maioridade. Essa Lei substituiu o chamado "Código de Menores", instituído em 1979, elevando os jovens à condição de cidadãos, garantindo seus direitos sociais e inaugurando a proteção integral às crianças e adolescentes do Brasil. A ênfase na atualidade a respeito desse Estatuto é dada apenas à questão do adolescente em conflito com a lei, porém ele prevê muitos outros direitos destinados à criança propriamente dita (pessoa de 0 a 12 anos) que não estão sendo respeitados, nem discutidos. Primeiramente, uma pesquisa inédita realizada por professores do Departamento de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, mostrou que o número de casos de violência contra crianças é maior do que as estatísticas divulgadas pelos órgãos oficiais, isso já demonstra o descumprimento do artigo 227 da Constituição Federal de 1988 cumulado com o artigo 4° do ECA que ordenam que os assuntos referentes às crianças sejam observados com absoluta prioridade. O ECA disciplina no artigo 5º que "nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais", porém as estatísticas que existem mostram que no Brasil, a violência sexual infanto-juvenil atinge 100 mil crianças por mês (agosto/2008). São crianças vítimas de maus tratos, violência física, abuso sexual, violência psicológica e negligência. A vulnerabilidade das crianças é uma das conseqüências da pobreza, desigualdade social, negligência do Estado e da sociedade. A Unicef, nas pesquisas sobre a situação da criança e da juventude no Brasil em 2007, mostrou que o índice de pobreza da população brasileira é de 27,6%, quando entre as crianças chega a 44%. As crianças negras, por exemplo, tem 78% mais chance de viver na pobreza do que as brancas; e as crianças das áreas rurais estão duas vezes mais expostas à pobreza do que as das regiões urbanas. Na região do Semi-árido, onde vivem 13 milhões de crianças, 75% das crianças e dos adolescentes são classificados como pobres.O ECA dispõe no artigo 15 que "a criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e a dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis", porém dos 3,2 milhões de crianças que completam 1 ano de idade, 370 mil não possuem registro de nascimento (2005), e, portanto, vêem negado seu direito a uma identidade. Diz também o ECA em seu artigo 53 que "acriança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho",no entanto, mais de 70% das crianças pobres nunca foram à escola durante a primeira infância.O inciso I do artigo 54 diz que o Estado deve assegurar o ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; só que com uma taxa de matrícula na educação fundamental de 98%, o Brasil ainda tem 800 mil crianças de 7 a 14 anos de idade fora da escola, das quais 500 mil são negras.Todas as violações do direito da criança são inaceitáveis, porque esses pequenos "cidadãos" não tem capacidade civil, física, muito menos psicológica para reclamar por seus direitos (apenas 1% das denúncias são feitas pelas vítimas). Porém, a violência física e sexual são atitudes intoleráveis, principalmente por, na maioria das vezes, virem de familiares e próximos (96% dos casos de violência física e 64% dos casos de abuso sexual contra crianças de até 6 anos são cometidos por familiares); mais intolerável ainda, é saber que no caso de maus tratos a pena varia de dois meses a um ano. Se a agressão resultar em lesão corporal de natureza grave, a pessoa pode pegar de 1 a 4 anos. Já no caso de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes varia de 1 a 12 anos apenas. Essa é a realidade que os menores tem enfrentado no Brasil, perspectivas bem diferentes do proposto pelo ECA. As crianças não precisam de mais direitos, elas precisam de garantias, elas não "precisam de lágrimas; elas precisam de comida, remédio, escola, casa, salário justo para os pais e respeito, como seres humanos que são". (John Drexel e Leila R. Iannone ).Chegou a hora de a menoridade ter a atenção e investimento de todos, porque,se cuidarmos plenamente de nossas crianças, dificilmente teremos que nos preocupar com o adolescente em conflito com a lei.O interesse de acabar com a violação do direito infanto-juvenil não é dever apenas do Estado, mas também da família e da sociedade. Você está inserido na sociedade. Então comece fazendo a sua parte, denuncie:

100 (disque denúncia: abuso e exploração sexual infanto-juvenil)

0800 31 1119 (disque denúncia direitos humanos)

0800 99 0500 (Telefone nacional para denuncia de exploração e abuso sexual de crianças)

190 (Polícia Militar)

Referências

Jornal A Cidade e O Globo. Disponível em: http://diganaoaerotizacaoinfantil.wordpress.com/2007/08/16/violencia-contra-crianca-e-maior-que-estatisticas/. Acesso em: 03/09/2008, às 11 h.

A situação da criança e juventude no Brasil. Unicef , 05 de dezembro de 2007. Disponível em: http://renascerbrasil.org.br/web/index.php?option=com_content&task=view&id=50&Itemid=481. Acesso em 03/09/2008, às 11 h.

DREXEL, John; IANNONE, Leila Rentrola . Criança e miséria, vida ou morte?. 13. ed . São Paulo: Moderna, 1989.


[*] Acadêmica do Curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros-UNIMONTES