Muito se tem discutido ultimamente a respeito da formação do professor universitário. Segundo a lei, para lecionar no ensino superior, o candidato deve ter apenas um curso de especialização em uma área à sua escolha. Não é necessário, portanto, formação em docência ou prática de ensino superior. Dependendo da área escolhida para a especialização, a universidade não oferece formação acadêmica na área da didática, apenas na de escolha do pós-graduando.
Assim, o pós-graduado que tem por finalidade a docência, já está teoricamente preparado para a carreira. Ao entrar na sala de aula, possivelmente ele vai se portar de acordo com os professores que teve, apenas seus conhecimentos que poderão ser diferentes. Ele não terá referências didáticas para o pleno desempenho da profissão. O resultado será uma aula apenas de transmissão de conhecimentos adquiridos pelo professor. As técnicas de ensino, metodologias e avaliação ficam em segundo plano.
Em seu artigo entitulado “Docência na universidade: ensino e pesquisa”, a Profª Selma G. Pimenta, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo afirma
A problemática profissional do professor do ensino superior precisa ser considerada tanto no que se refere à identidade, que diz sobre o que é ser professor, quanto no que se refere à profissão, que diz sobre as condições do exercício profissional. O que identifica um professor? E um professor universitário? Essa questão tem sido considerada em vários países, tanto no âmbito da pesquisa sobre os processos de formação, como nas formulações das políticas de ensino superior no que se refere ao ensino e à pesquisa, exigências que caracterizam o exercício da profissão de modo geral. No que se refere à formação, os estudos têm mostrado que: “(...) o professor universitário aprende a sê-lo mediante um processo de socialização em parte intuitiva, autodidata ou (...) seguindo a rotina dos 'outros'. Isso se explica, sem dúvida, devido à inexistência de uma formação específica como professor universitário. (Pimenta, 2005)

Esse é o painel atual do ensino superior no Brasil. As aulas acabam sendo basicamente teóricas, com conteúdos maçantes e muitas vezes sem significado ou descontextualizado. Sabe-se que o processo de ensino-aprendizagem não é apenas conteúdo. É muito mais do que isso. As estratégias de ensino são fundamentais para que ocorra o processo. Esse professor, recém-saído do curso de Especialização, com certeza não terá domínio sobre tais estratégias. Maria Isabel da Cunha, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Unisinos, RS, afirma

(...) a forma como se transmite o conhecimento pode ter mais significado do que o próprio conhecimento, porque ela é dependente da base material da sociedade, produzindo a consciência dos sujeitos, na simbiose entre o coletivo e o individual onde os níveis macro e micro se relacionam. Não são os conteúdos ou as informações que carregam as relações sociais que geram a reprodução social ou cultural, mas a forma de transmissão, entendida como a teia de relações de poder e de subjetividade que a permeiam. (Cunha, 2001, p. 104)

Ora, se a forma de transmissão é mais significativa do que o conteúdo em si, deduz-se que o especialista que ministra aula na universidade, muitas vezes, não tem a competência necessária para o exercício da profissão. Esse fato tem gerado muita polêmica no mundo acadêmico. Por outro lado, as universidades que têm passado por dificuldades financeiras acabam optando por esse perfil de docente, já que ele “custa” menos.
Os cursos de Pós-Graduação oferecidos pelas universidades priorizam, em sua maioria, a especialização em uma área específica, preterindo, assim, a formação acadêmica global do aluno. Como esses cursos podem direcionar à docência, o formando fica incompleto: conhece mais a sua área de especialização e menos as técnicas e métodos de ensino. O problema maior passa a ser, então, a falta de inovação no processo. As aulas no ensino superior são reduzidas à simples transmissão de um conhecimento. Esse conhecimento torna-se sem importância diante do método como foi transmitido. Como o processo não se inova, o conhecimento então é meramente decorado. Faltam estratégias adequadas à turma, à área e à formação em si.
Como consequência disso, deparamo-nos com profissionais malpreparados para o exercício da profissão, já que tudo aquilo que não muda, que não se inova, não provoca interesse. Forma-se, assim, um círculo vicioso. Esse profissional malpreparado vai encontrar dificuldade para se encaixar no mercado. Vai, então, para a especialização na Pós-Graduação. Escolhe uma área específica, forma-se, e vai dar aula. Seu método será o mesmo utilizado pelo professor que ele teve durante a graduação.
E a inovação? Sem ela, não há mudança. E a tendência é continuar esse crise sem precedentes no ensino superior. Sobre esse assunto, Maria Izabel Cunha afirma
A análise das experiências significativas apontadas pelos estudantes dos Cursos de Licenciatura foi trabalhada como objeto de pesquisa, na perspectiva de entender se elas trazem, na sua constituição, os embriões da mudança paradigmática, que aqui entendemos como inovação. Por esta explicação é possível identificar que o conceito de inovação aqui adotado refere-se à ruptura epistemológica necessária que permite reconfigurar conhecimentos para além das regularidades propostas pelo paradigma da modernidade. (Cunha, 2001, p. 105)

Nota-se que a inovação no processo ensino-aprendizagem se faz necessária para a formação plena do educando universitário. Afinal, em um mundo competitivo e globalizado, poucos são os que se destacam. Se sua formação não for aberta a inovações, perceber-se-á que ele estará no mesmo nível da maioria, condição insuficiente para o exercício da profissão e o sucesso na carreira.
O processo ensino-aprendizagem deve, aqui, ser visto de forma separada. No processo de ensino centraliza-se a figura do professor que, por meio de sua formação em docência do ensino superior, deve refletir sobre o referido processo, deve saber o que ensinar, por que ensinar e como ensinar. Dada sua formação precária, muitas vezes, ele só define o que ensinar. Isso é insuficiente para o processo.
Por outro lado, temos o processo de aprendizagem, em cujo centro encontra-se o aluno. A ele cabe aprender o que o professor se propõe a ensinar. Se a formação docente é precária, o aluno tem que fazer do processo uma interação entre ele e o conhecimento que pretende adquirir. Entende-se por esse processo a formação do aluno em sua totalidade, que envolve o conhecimento, o afetivo-emocional, as habilidades e os valores ético-morais.
Em sua maioria, as universidades enfatizam o processo de ensino, organizando seus currículos de forma fechada, estanque, que prioriza apenas o conhecimento, esquecendo-se de que o futuro profissional, que elas lançam no mercado de trabalho, precisa muito mais do que isso. Seus professores têm metodologias quase sempre centradas na aula expositiva, na leitura de livros e artigos e em sua repetição em classe. A avaliação acaba sendo apenas uma averiguação do que foi assimilado ou decorado pelo aluno ao final de um componente curricular.
Sobre isso, Marcos Tarcisio Masetto, ao analisar a competência pedagógica do professor universitário, afirma
No meu entender, de modo geral, até hoje a docência universitária colocou sua ênfase no processo de ensino. Por isso, a organização curricular continua fechada e estanque, as disciplinas são maximamente conteudísticas e só são oferecidas as concernentes aos assuntos técnicos e profissionalizantes dos cursos, com pouca abertura para outras áreas de conhecimento, quase nenhuma para a interdisciplinaridade ou para temas transversais, pouco incentivo à investigação científica na graduação. (Masetto, 2003, p. 36)

E a outra parte da formação do aluno? Se a docência universitária priorizasse o outro processo, o de aprendizagem, com certeza o aluno seria formado integralmente e estaria preparado para entrar no mercado de trabalho globalizado. Disso depende o sucesso de sua carreira. Entraria, então, a inovação, que exige a procura de uma nova situação que se instala a partir de um sentimento de insatisfação. Produzir-se-ia, assim, o processo significativo, já que ensinar não é apenas saber, mas sim compartilhar. E para compartilhar são necessários os dois lados do processo: o aluno e o professor.
Enquanto isso não acontecer e as instituições que oferecem cursos de Pós-Graduação não se conscientizarem de que não basta a especialização, mas a formação na sua totalidade, vamos continuar tendo profissionais desmotivados e malpreparados. Tanto no mercado de trabalho quanto na sala de aula.

REFERÊNCIAS

CUNHA, Maria Izabel da. Aprendizagens significativas na formação inicial de professores: um estudo no espaço dos Cursos de Licenciatura. Interface – Comunicação, Saúde e Educação. Agosto, 2001.

MASETTO, Marcos Tarciso. Competência pedagógica do professor universitário. Summus editorial. São Paulo, 2003.

PIMENTA, Selma G. Docência na universidade: ensino e pesquisa. Disponível em http://naeg.prg.usp.br/gap/secoes/seminario/docencia_na_universidade_-_ensino_e_pesquisa.pdf > acesso em 31 mar 2009.