A luta pela racionalização da interferência do Poder Judiciário em face ao fornecimento de medicamentos pela Administração Pública.

Julianna Mendonça Neves[1] 

Sumário: Introdução. 1- Direito à saúde; 1.1 – Assistência farmacêutica;  2- Judicialização excessiva 2.1- A Racionalização. Conclusão. Referências.

RESUMO 

O precário serviço de saúde, em especial o fornecimento de remédios oferecido pelo Estado, vêm sendo alvo de inúmeras ações. O Judiciário condena diariamente a Administração pública a custear medicamentos e tratamentos, desconsiderando a realidade da sociedade brasileira. Assim o presente estudo tem por objetivo abordar a judicialização excessiva da saúde, focando, principalmente, no fornecimento de medicamentos para a população. Em um primeiro momento haverá uma discussão acerca do direito fundamental à saúde e do fornecimento de medicamentos. No segundo momento, do presente estudo, organizaremos uma critica a judicialização excessiva fundamentada na doutrina atual, bem como analisaremos parâmetros para uma possível racionalização dessa interferência do Judiciário.

                                                                                                                           

PALAVRAS-CHAVE

Saúde. Medicamento. Judicialização.

 

 

INTRODUÇÃO

 

No hodierno, é comum nos deparamos com situações que nos mostram que o fornecimento de medicamentos por ação judicial tornou-se uma prática um tanto quanto rotineira. Episódios como esses ocorrem, pois com a aprovação da Constituição Federal de 1988, a população tem se convalido do Poder Judiciário para executar essa prestação, tornando-se cada vez mais comum a interferência do poder judiciário em demandas que, originalmente, são da competência dos poderes executivos ou legislativos.

Os preços abusivos praticados pelos fabricantes ou a de falta de estoque, o registro no país e comprovação científica de eficácia, etc. São em situações como essas que fica notório que o Judiciário tem sido provocado a obrigar a Administração a cumprir o dever que a Constituição lhe impõe com o intuito de garantir a plena efetivação do direito à Saúde. Para Luis Roberto Barroso:

A intervenção do Poder Judiciário, mediante determinações à Administração Pública para que forneça gratuitamente medicamentos em uma variedade de hipóteses, procura realizar a promessa constitucional de prestação universalizada do serviço de saúde[2]

 De acordo com Ana Luiza Chieffi e Rita Barradas Barata[3], a este novo papel exercido pelo Judiciário tem sido atribuída a noção de judicialização, ou seja, a noção de que por intermédio de ações judiciais é possível garantir efetivamente o acesso a determinados bens e serviços. Porém, quando a Administração é obrigada juridicamente a prestar assistência farmacêutica, os cofres públicos sofrem uma grave lesão, pois o natural funcionamento do Estado como um todo e não apenas a estrutura do SUS acabam sendo prejudicadas.

Neste paper, se analisará a questão da “judicialização da prestação de assistência farmacêutica” através de um sucinto estudo acerca do direito a saúde, assistência farmacêutica e da judicialização excessiva desta. Indicar-se-á os principais pontos a serem ressaltados por aqueles que a pleiteiam e a concedem, de modo a racionalizar os direitos que dela são objeto.

1 DIREITO A SAÚDE

A Carta Magna de 1988 reservou um lugar de destaque para a saúde, pois a mesma é tratada como um verdadeiro direito fundamental. Podemos ver isso, pois ela expõe em seu artigo 196 o compromisso do Estado para com a garantia a todos os cidadãos do pleno direito à saúde:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Qualificar um direito como fundamental significa que a sua constitucionalização originou um aumento significativo de sua força normativa. Isso traz inúmeras conseqüências práticas, sobretudo no que se refere à sua efetividade, ou seja, a realização do direito, o desempenho de sua função social.

Ao abrir as portas para as críticas realizadas contra o Poder Judiciário nesta seara, nos deparamos com duas situações antagônicas, pois ele não pode deixar de tutelar direitos fundamentais que podem ser promovidos com a sua atuação. Mas o mesmo também não deve presumir demais de si mesmo e, a pretexto de promover os direitos fundamentais de uns, causar grave lesão a direitos da mesma natureza de outros.

É sabido que os princípios propriamente ditos abrigam um direito fundamental, um valor, um fim. Mas a nossa Lei Maior acolhe princípios que apontam em diversas direções, gerando assim eventuais colisões entre eles. Barroso[4] nos mostra que estas podem ser de três tipos:

a) colisão entre princípios constitucionais, como, e.g., a livre iniciativa versus a proteção do consumidor, na hipótese de se pretender tabelar o preço de determinado medicamento;

b) colisão entre direitos fundamentais, como, e.g., o direito à vida e à saúde de uma pessoa versus o direito à vida e à saúde de outra pessoa, na hipótese de ambos necessitarem com urgência de transplante de determinado órgão, quando só exista um disponível;

c) colisão entre direitos fundamentais e outros princípios constitucionais, como, e.g., o direito à saúde versus a separação de Poderes, no caso de determinadas opções legais ou administrativas acerca de tratamentos a serem oferecidos.

Caberá à autoridade competente proceder à ponderação dos princípios e fatos relevantes, e não a subsunção do fato a uma norma determinada. É por isso que Robert Alexy[5] diz que princípios são mandados de otimização, pois eles devem ser realizados na maior intensidade possível, à vista dos demais elementos jurídicos e fáticos presentes. Daí decorre que os direitos neles fundados são direitos que poderão ser exercidos em princípio e na medida do possível.

Grandes questionamentos surgirão, pois poder-se-ia supor que se está diante de uma colisão de valores ou de interesses que contrapõe, de um lado, o direito à vida e à saúde e, de outro, a separação de Poderes. A realidade, no entanto, é mais dramática. O que está em jogo, na ponderação aqui avaliada, é o direito à vida e à saúde de uns versus o direito à vida e à saúde de outros. Para Barroso[6], em ocasiões como esta, não existe solução juridicamente fácil nem moralmente simples.

1.1  ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA

 

Na criação do Sistema Único de Saúde (SUS) foi previsto o direito do cidadão à assistência farmacêutica, mas este só fora regulamentado após dez anos, com a publicação da Política Nacional de Medicamentos (PNM). Esta firma os princípios e as diretrizes do SUS, objetivando assim a garantia da eficácia e segurança no uso racional de medicamentos e o acesso da população a estes[7].

Assim, com base nas doutrinas e na visão de Ana Luiza Chieffi e Rita Barradas Barata[8], o SUS, em seus vinte anos de existência, vem se organizando para fornecer medicamentos essenciais à população. Mas, nem sempre a assistência farmacêutica implantada pelo Poder Público “atende” às necessidades do paciente, ora porque as peculiaridades da enfermidade exigem medicamentos especiais e/ou tornaram ineficazes aqueles que constantam da listagem, ora por questões administrativas, tal como obstáculos no procedimento de aquisição ou distribuição do medicamento.

De acordo com o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Sendo assim, a ausência ou a deficiência dos serviços de saúde oferecidos pelo Estado –assistência farmacêutica– acaba ameaçando o direito à vida e, em muitos casos, é capaz de produzir lesão irreparável a ele. Percebe-se que é legítima a intervenção jurisdicional, pois esta justamente visa a afastar tal lesão ou ameaça ao direito supracitado.

De acordo com João Agnaldo Donizeti Gandini, Samantha Ferreira Barione e André Evangelista de Souza[9], alguns critérios devem ser observados nos mecanismos processuais que viabilizam a intervenção jurisdicional na efetivação da assistência farmacêutica pelo Poder Público pois, deve-se evitar prejuízos ao Sistema Único de Saúde e, conseqüentemente, à própria população. Sendo assim, tais autores sugerem alguns critérios, como os seguintes:

 

A)    Observância do princípio ativo prescrito: É notório e rotineiro observar que médicos brasileiros ainda costumam prescrever medicamentos mediante a indicação de seu respectivo nome comercial. Após a edição da Lei nº 9.787/99, tal hábito passou a ser combatido pelo Poder Público que, ao instituir o medicamento genérico e dispor sobre a utilização de nomes genéricos em produtos farmacêuticos, proibiu a prescrição pelo nome comercial. A condenação do Estado no fornecimento de medicamento prescrito pelo nome comercial pode acarretar grandes danos, pois é possível que o Poder Público disponibilize regularmente o mesmo remédio, mas ele não detém a designação prescrita pelo fato de ter sido fabricado por laboratório diverso. Sendo assim, é bom que a formulação do pedido seja feita com base no princípio ativo do medicamento e, na hipótese de não o ser, é indispensável que o magistrado atente para a possibilidade do medicamento constar na listagem do Ministério da Saúde.

 

B)    Observância da existência de registro do medicamento pleiteado: Em atendimento à Portaria MS 3916/98, a prescrição de medicamentos no âmbito do SUS deve observar o “Formulário Terapêutico Nacional”, que objetiva orientar os profissionais de saúde quanto ao manejo de produtos farmacêuticos disponíveis no mercado. A comercialização de um medicamento no Brasil pressupõe sua aprovação e registro no Ministério da Saúde, conforme dispõe o art. 12 da Lei 6.360/76, pois a natureza e a finalidade dessa espécie de substância exigem o monitoramento de sua segurança, eficácia e qualidade terapêutica. Atualmente, a entidade competente para proceder a inscrição ou a sua alteração, suspensão e cancelamento é a Anvisa, sendo assim, tanto o profissional médico, quando da prescrição, quanto o magistrado, quando da apreciação do pedido de fornecimento formulado em sede de ação judicial, devem atentar para a existência de registro do medicamento nesta entidade. A inexistência de registro do princípio ativo pleiteado em ação judicial não consubstancia causa de indeferimento do pedido, caso a existência de protocolo de registro na Anvisa e/ou as demais circunstâncias trazidas aos autos sejam suficientes para que o magistrado forme sua convicção.

 

C)    Observância da pertinência da prescrição no tratamento do paciente: O fornecimento de medicamento pelo Estado não pode perder de vista a preocupação com a racionalização no consumo, ditada pela política nacional de medicamentos e pelas demais normas pertinentes. Além disso, infelizmente a utilização do processo judicial como instrumento de efetivação da assistência farmacêutica tornou-se alvo de uma “indústria”, na qual atuam profissionais médicos, advogados e laboratórios. Assim, é indispensável que o magistrado verifique se a prescrição médica é condizente com o diagnóstico da moléstia que acomete o paciente e com os tratamentos a que ele já se submeteu, bem como é necessário constatar se a emissão de receita foi efetuada por profissional habilitado e se a dosagem prescrita atende as finalidades do tratamento. No entanto, é prudente que o magistrado verifique, no caso concreto, as peculiaridades do tratamento, com a finalidade de impedir que o Poder Judiciário aprove prescrições negligentes e tratamentos inócuos. A verificação da habilitação do médico para prescrever o medicamento pleiteado e a verificação da dosagem prescrita é necessária não só para a constatação da pertinência do tratamento, mas também para reduzir o uso desvirtuado do processo judicial.

 

2. A JUDICIALIZAÇÃO EXCESSIVA

 

O direito à saúde é um mandamento constitucional, que adquiriu com a Constituição de 1988, o status de direito fundamental social. Sendo assim, é um direito de todos, que deve ser assegurado pelo Estado. A precária qualidade dos serviços de saúde oferecidos pelo governo, no entanto, gera insatisfações por parte da população e o Judiciário é chamado para intervir, a fim de resolver o conflito.

A variedade de instrumentos processuais que podem ser utilizados para pleitear assistência farmacêutica é grande, entretanto, “freqüentemente são utilizados: a ação civil pública, disciplinada pela Lei n. 7347/85; o mandado de segurança; e as ações condenatórias de obrigação de fazer ou de obrigação de dar.”[10]

O número de ações ajuizadas transborda nos Tribunais, que proferem decisões esdrúxulas ou emocionais, condenando a “Administração ao custeio de tratamentos irrazoáveis – seja porque inacessíveis, seja porque destituídos de essencialidade –, bem como de medicamentos experimentais ou de eficácia duvidosa, associados a terapias alternativas.” [11] O Judiciário não deve desconsiderar a realidade da Administração Pública ao proferir suas decisões, uma vez que “o casuísmo da jurisprudência brasileira pode impedir que políticas coletivas, dirigidas à promoção da saúde pública, sejam devidamente implementadas.” [12]

Acerca do assunto Luis Roberto Barroso comenta que

Em muitas situações envolvendo direitos sociais, direito a saúde e mesmo fornecimento de medicamentos, o Judiciário poderá e devera intervir. Tal constatação, todavia, não torna tal intervenção imune a objeções diversas, sobretudo quando excessivamente invasiva da deliberação dos outros Poderes. De fato, existe um conjunto variado de criticas ao ativismo judicial nessa matéria, algumas delas dotadas de seriedade e consistência.[13]

A maior critica que existe, quando o assunto é fornecimento de medicamentos para casos individuais, embasa-se no art. 196 da Constituição Federal, que se classifica como uma norma programática. O texto legal supracitado prioriza acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde, no entanto, o desvio de somas exorbitantes para suprir necessidades individuais, pode prejudicar ou impedir a implementação de outras políticas públicas, que beneficiariam a população. Sendo assim, as decisões dos tribunais revelam uma realidade extremamente prejudicial á toda a população. Neste sentido Dallari leciona:

É preciso ter muito claro, entretanto, que para a real proteção judicial dos direitos humanos não é suficiente e, pelo contrário, é perigoso só cumprir as formalidades judiciárias, ter uma aparência de proteção judicial, que adormece a vigilância e que não é, porém, mais do que uma ilusão de justiça.[14]

A intervenção excessiva do judiciário, quando se trata de saúde pública, decorre também por um desconhecimento do complexo sistema único de saúde. Vale ressaltar que “a complexidade do setor da saúde exige do juiz uma adequada e proporcional decisão e nem sempre os tribunais pátrios analisam corretamente matérias envolvendo a saúde.”[15] Nestes casos, a clássica lição aristotélica acerca da virtude e do meio termo é plausível, pois “o juiz deve reconhecer a dimensão do direito à saúde, mas não perder de vista os limites estruturais do setor e a compreensão dos atos administrativos que integram a política pública sanitária.”[16]

A indústria farmacêutica também tem forte influência neste meio, uma vez que, de acordo com pesquisa realizada pela Anvisa, a propaganda de medicamentos

aumenta o custo dos tratamentos porque influencia a prescrição médica, levando a um aumento de prescrições medicamentosas em detrimento de alternativas mais saudáveis para a manutenção da saúde, a fim de restringir o uso dos medicamentos àqueles casos em que realmente sua utilização é imprescindível, cria demandas decorrentes da medicalização da sociedade, leva ao aumento de utilização de novos fármacos que geralmente são mais caros e, na maioria das vezes, não têm nenhuma vantagem sobre aqueles que já existentes no mercado.[17]

Sendo assim, o número de demandas por medicamentos, que são novos no mercado e não constam na lista do SUS é cada vez maior, os médicos seduzidos pelo mercado farmacêutico, prescrevem tópicos novos, que, no entanto, fazem o mesmo efeito daqueles presentes na lista elaborada pelo governo, para serem distribuídos a população.

Vale ressaltar, que os magistrados também devem observar o constante argumento levantado pela Administração, o da reserva do possível, que trata da questão da disponibilidade financeira para custear o fornecimento dos medicamentos. Aufere-se que “cada uma das decisões pode atender às necessidades imediatas do jurisdicionado, mas, globalmente, impediria a otimização das possibilidades estatais no que toca à promoção da saúde pública.”[18] As decisões judiciais causam, ainda, uma desorganização na administração pública, pois retirariam a sua capacidade de se “planejar, comprometendo a eficiência administrativa no atendimento ao cidadão.”[19]

A partir da análise dos argumentos supracitados, percebe-se que a interferência excessiva do Judiciário atinge a sociedade de forma negativa. As inúmeras ações ajuizadas demonstram um “desvirtuamento na utilização dos instrumentos processuais postos pela lei à disposição da sociedade.”[20] O fato ocorre tanto pela “falta de informação dos operadores do direito, no que diz respeito às políticas públicas de saúde e aos aspectos técnicos que envolvem a prescrição medicamentosa”[21] como pela má-fé de profissionais médicos e da indústria farmacêutica.

2.2 RACIONALIZAÇÃO

 

Uma análise racional dos casos ajuizados é essencial, a fim de evitar condenações que impeçam o desenvolvimento de novas políticas públicas e prejudiquem a coletividade. Desta forma, o Judiciário “no exame dos casos concretos, pode – e deve – afastar qualquer lesão ou ameaça a direito, mas apenas nas situações em que a política pública relacionada à saúde se revelar defeituosa ou insuficiente.”[22]

No campo da saúde pública, no que tange ao fornecimento de medicamentos, o Judiciário deve se amoldar a certos condicionamentos, a fim de oferecer uma racionalidade em suas sentenças. Sendo assim, o desempenho do Poder Judiciário, no ponto, “só pode ser exceptiva, nunca podendo ser realizada de forma ampla, aberta e incondicional, sob pena de se agredir o princípio constitucional da divisão funcional do Poder, colocando-se em risco a efetividade das políticas econômicas e sociais do setor.’[23]

O critério de desempenho exceptivo modela o interesse de agir do postulante, uma vez que o mesmo deverá ter se submetido previamente ao sistema único de saúde, ressalvado os casos de urgência, para que reste provado a insuficiência e defeituosidade das políticas públicas, caso em que será admissível a atuação do Judiciário.

Ressalta-se que nos casos de fornecimento de medicamentos, é importante enfatizar que a falta de “prova de uso anterior de outros medicamentos fornecidos pelo Sistema Único de Saúde pode impedir o acolhimento da pretensão, salvo nos casos em que os documentos médicos atestem que apenas certo e determinado fármaco irá atender às necessidades do postulante.”[24]

Outros condicionamentos, como a condição de hipossuficiência e a efetiva necessidade do postulante também são critérios importantes que devem ser considerados na análise do caso. Acerca dos hipossuficientes, aplica-se o princípio da isonomia, pois não se deve admitir que pessoas “abastadas, que tenham condições de, sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, custear as ações e serviços de saúde de que necessitem, lancem mão de recursos públicos, em detrimento de pessoas carentes e igualmente necessitadas desses serviços.”[25]

A efetiva necessidade do postulante é outro fator de grande importância, que deve ser considerado. Deve existir prova basilar, que comprove a necessidade do medicamento para a saúde do requerente. Considerando tudo o que foi exposto resta destacar

que, por se tratar de recursos públicos, não deve haver lugar para experimentalismos, pelo que só se deve autorizar a realização de procedimentos cirúrgicos que gozem de credibilidade científica, bem como só se deve determinar, como regra, o fornecimento de medicamentos devidamente registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA.[26]

 

A doutrina sugere, ainda, outras medidas, que possam ajudar o Poder Judiciário a decidir de forma correta e coerente. Luis Roberto Barroso elenca, em artigo cientifico produzido sobre o assunto, alguns parâmetros que podem ser seguidos pelo Judiciário como: a adoção de medicamentos genéricos, que possuem menor custo e a escolha por substâncias produzidas no Brasil.

A atuação do Judiciário, nos casos em que envolvem a saúde, requer, ainda, conhecimentos técnicos específicos da área médica. Destarte, a fim de se obter decisões devidamente fundamentadas, coerentes e racionais, seria essencial a “criação de um conselho composto por juristas e médicos renomados, que prestariam assessoria aos magistrados nas questões relativas à saúde em geral – e não só nas ações destinadas a compelir o Estado a fornecer medicamentos.” [27]

 

3. CONCLUSÃO

A luta pela racionalização das decisões judiciais, que envolvem o fornecimento de medicamentos, é importante, uma vez que

“O Judiciário não pode ser menos do que deve ser, deixando de tutelar direitos fundamentais que podem ser promovidos com a sua atuação. De outra parte, não deve querer ser mais do que pode ser, presumindo demais de si mesmo e, a pretexto de promover os direitos fundamentais de uns, causar grave lesão a direitos da mesma natureza de outros tantos.”[28]

Conclui-se, então, que o fenômeno da judicialização excessiva deve ser combatido, entretanto, não se pode tolher a iniciativa do Poder Judiciário de garantir à população uma vida digna e saudável. Deve-se visar uma medida de pesos e contrapesos, a fim de encontrar um meio termo. A atual conjuntura da sociedade clama por medidas bilaterais, ou seja, medidas que tornem as decisões do Judiciário mais racionais, bem como aquelas que melhorem as políticas públicas de saúde, a fim de evitar o afogamento do Judiciário com ações deste gênero.

O Direito à saúde, como um direito fundamental de todos, deve ser resguardado e aplicado de forma igualitária, caberá ao judiciário utilizar o método hermenêutico da ponderação, a fim de racionalizar suas decisões e evitar uma aplicação cega das normas jurídicas, pois tal fato acarretaria a criação da ilusão de justiça e um retrocesso a Escola da Exegese, de toda forma, os prejuízos a população brasileira seriam evidentes.

REFERÊNCIA

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[1] Acadêmica do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB

[2] BARROSO, Luis Roberto. Da falta de efetividade à judicialização excessiva: Direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para a atuação judicial. Rio de Janeiro: Idéiais, 2007. p.03

[3] CHIEFFI, Ana Luiza; BARATA, Rita Barradas. Judicialização da política pública de assistência farmacêutica e eqüidade. Cad. Saúde Pública,  Rio de Janeiro,  v. 25,  n. 8, ago.  2009. p.09

[4] BARROSO, Luis Roberto. Op. Cit. p.08

[5] AMORIM, Letícia Balsamão. A distinção entre regras e princípios segundo Robert Alexy: esboço e críticas. Revista de Informação Legislativa, Brasília, a 42, n 165, jan/mar 2005. p.21

[6] BARROSO, Luis Roberto. Op.Cit. p.09

[7] Ministério da Saúde. Portaria nº. 3.916, de 30 de outubro de 1998. Dispõe sobre a aprovação da Política Nacional de Medicamentos. Diário Oficial da União 1998; 1 out. Disponível em:< http://www.anvisa.gov.br/legis/consolidada/portaria_3916_98.pdf>. Acesso em 17 maio 2011.

[8] BARROSO, Luis Roberto. Op. Cit. p.09

[9] GANDINI, João Agnaldo Donizeti; BARIONE, Samantha Ferreira; SOUZA, André Evangelista de. A Judicialização do Direito à Saúde: a obtenção de atendimento médico, medicamentos e insumos terapêuticos por via judicial: critérios e experiências. BDJur, Brasília, DF, 24 mar. 2008. P.28

[10] Id. Ibid. p.28

[11] Barroso, Luis Roberto. Op.Cit. p.03

[12] Id. Ibid. p.04

[13] Id. Ibid. p.22

[14]DALLARI, Dalmo de Abreu. O poder dos juízes. 2ª ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2002.p.38

[15] DELDUQUE, Maria Célia; OLIVEIRA, Mariana S. de Carvalho. Tijolo por tijolo: a construção permanente do direito à saúde. In.:O Direito Achado na Rua: introdução crítica ao Direito à Saúde. org. Costa, Alexandre Bernadino; Dallari, Sueli Gandolfi; Delduque, Maria Célia; et al.  Brasília: CEAD/UNB, 2008. pg. 109.

[16] Id. Ibid. p.109

[17] ANVISA. Diagnóstico situacional da promoção de medicamentos em unidades de saúde do sistema único de saúde (sus). Brasília, 2010. p.63

[18] Barroso, Luis Roberto. Op. Cit. p.25

[19] Id. Ibid. p.25

[20] GANDINI, João Agnaldo Donizeti; BARIONE, Samantha Ferreira; SOUZA, André Evangelista de. Op. Cit. p.20

[21] Id. Ibid. p.20

[22] Valle, Gustavo Henrique Moreira do. A judicialização da saúde. In.: Encontro de Vitaliciamento de Magistrados. Belo Horizonte:Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes, 2008.  p.01

[23] Id. Ibid. p.02

[24] Id. Ibid. p.03

[25] Id. Ibid. p.03

[26] Id. Ibid. p.03

[27] GANDINI, João Agnaldo Donizeti; BARIONE, Samantha Ferreira; SOUZA, André Evangelista de. Op. Cit. p.33

[28] Barroso, Luis Roberto Barroso. Op. Cit. p.04