A língua, o projeto e o resultado 

José Maria Couto Moreira* 

Profissionais da imprensa, comentaristas, juristas, leitores, vamos expungir de nossos textos e até de nossa conversação o termo “impeachment”, que é alienígena. Nada de xenofobia, mas devemos não apenas cultuar nosso idioma como nos fazer libertos de uma expressão que não é vernacular, que não é nossa. Não precisamos substituir nosso vocábulo “impedimento” pelo inglês “impeachment”, pois o significado é exatamente o mesmo, é tradução literal, exprime a mesma ideia e se faz mais inteligível a quem não chega às alturas da compreensão, ainda precária, de milhões de brasileiros. O instituto do impedimento constitui criação norteamericana, é verdade, mas, nem por isso estaríamos subordinados a pronunciá-lo como no original. Se a criação fosse chinesa, iríamos pronunciá-la em mandarim ? Este vício é típico de colonialismo cultural, devemos repudiá-lo. Não sejamos agentes culturais de outros povos. Fiquemos com a última flor do Lácio.

A propósito, nosso apelo decorre da temporada de caça aos corruptos, empreendida pela ágil Polícia Federal, que está destrinchando os intestinos da República apodrecida. O ministro Gilmar Mendes, em entrevista, afirmou que o episódio do mensalão teria revelado mais cedo os achados e efeitos da operação lavajato, não o tendo feito, à época, em virtude da ponderação de que o ambiente estava abrasado e seria recomendável que se poupasse o presidente. A consideração é de todo pertinente, visto que o PT havia abraçado o lema do partido de manter-se por 20 anos no poder, e seu operador, o arrogante José Dirceu, hoje abandonado na Papuda, era o arquiteto do maldito plano, embora o domínio do fato pertencesse a Lula, principalmente, e aos mais chegados, possivelmente até a presidente.

Ora, brasileiros, era muita insolência do “grande chefe” sobre a sociedade. O plano estava em marcha sem que os patrícios, sequer, imaginassem os métodos e objetivos dos petralhas. O mensalão foi um choque para a maioria petista ingênua e para todos os eleitores que Lula galvanizou. O partido invadiu o tesouro, e aproveitou-se, enquanto durou a trama, para nos colocar no figurino de palhaços, ilaqueados, traídos, tolos. Não é aceitável que o homem que perdeu um dedo, de poucas luzes, se arrogue nosso tutor, não por uma estratégia decente, por uma retórica da verdade, da lógica, e até do patriotismo. Ele escolheu o caminho fácil e abominável do apoderamento de recursos públicos para fazê-lo, ao tempo em que distribuía benesses para a maioria desinformada e carente. Não se pode compará-lo a outros líderes latino-americanos, pois estes, por vezes, se eternizavam mais pela emoção do que pelo caminho complacente, mas criminoso, da retirada tranquila de valores vultosos pertencentes aos brasileiros, uma completa perfídia, para semear o dinheiro fácil onde melhor entendesse. A intenção de assim fazer representou não apenas o maior escândalo no país, mas a lembrança do desastre, e de seus autores, nome a nome, e será o maior castigo para o protagonista do projeto e da sua ação temerária de nos fazer de bobos. Sim, o presidente nos subestimou para nos trair, e toda a camarilha que hoje arde nas prisões foram seus artífices e também maiores tolos, por envolverem-se nos negócios escusos apenas para visar resultados rápidos e fáceis, enquanto ignoravam, entanto, o projeto também de resultados fáceis do presidente de cooptar a todos.

O resumo da ópera aí está, porém, ainda longe do último ato.

 

*Advogado