PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO - LEI 11.419/06 
ALGUNS POSSÍVEIS IMPACTOS DECORRENTES DE SUA ADOÇÃO

Publicado no Documento Técnico 1 -  FGV - TRT 2ª Região

Fausto Bernardes Morey Filho


O Projeto de Lei 5.828 que dispunha sobre a informatização do processo judicial tramitou no Congresso Nacional por vários anos. Em 16 de dezembro de 2006, a Lei 11.419 foi promulgada tendo entrado em vigor no dia 19 de março de 2007. Ela alterou ainda a Lei 5.869 - Código de Processo Civil de 11 de janeiro de 1973, possibilitando modificação importante na organização da prestação de serviços jurisdicionais.

Apesar da Lei não ter natureza impositiva, ela estabeleceu as condições necessárias à modificação do rito processual com vistas à utilização plena dos recursos tecnológicos hoje disponíveis, propiciando uma oportunidade única ao Poder Judiciário nacional para melhorar o atendimento ao público e o seu desempenho. O objetivo deste artigo é tratar, de maneira não intensiva, alguns dos possíveis impactos decorrentes de adoção da Lei.

Contexto

A Reforma da Gestão Pública de 1995/98 estabeleceu um novo princípio para o funcionamento dos órgãos do Poder Público com a introdução do sistema de responsabilização gerencial que inclui o controle por resultados, a busca pela excelência e o controle social por organizações da sociedade civil e pela mídia (Bresser Pereira, 2005).

Os gestores públicos devem atender aos princípios de organização burocrática do Estado e seus controles clássicos de supervisão, regulamentação detalhada, auditoria e também de respeito às leis, impessoalidade, estruturação subordinativa com prefixação de atribuições e controle "a priori". Porém, com a introdução de sistema de responsabilização gerencial, os gestores devem adotar a administração por objetivos e resultados definidos em função dos usuários, com controles "a priori" e "a posteriori".

Os Tribunais de Contas – TC, quando da análise da prestação de contas dos órgãos públicos, tradicionalmente têm focado a sua atuação no exame exaustivo da legalidade dos atos, no cumprimento das formalidades e no cumprimento de aspectos burocráticos. Recentemente (2006), o Tribunal de Contas da União – TCU passou a exigir também a prestação de contas sobre os planos e resultados dos órgãos, fato que aparentemente, com o tempo, será adotado de forma universal.

A conjugação deste dois modelos é a principal novidade conceitual a ser incorporada pelo Poder Público contemporâneo. A responsabilização gerencial torna-se compulsória aos administradores públicos que, além de seguirem as leis e as regras burocráticas, devem simultaneamente buscar os resultados para os usuários e os contribuintes.

No âmbito do Judiciário, surgiram assuntos urgentes a serem cuidadosamente tratados pelos responsáveis de seu funcionamento. Entre outros, são:

- Celeridade e efetividade da prestação de serviço jurisdicional;

- Acessibilidade da população à Justiça;

- Transparência, controle e coordenação administrativa, e

- Eficiência.

A busca pela celeridade e acessibilidade deve ser pautada pelo controle e coordenação administrativa e pela busca intencional e permanente da eficiência[1] nos termos do art. 37 da Constituição Federal. A administração gerencial está inserida no âmbito de um processo de transformação que deu origem à Reforma do Estado. O principio da Eficiência passou a vigorar como preceito constitucional, com missão precípua de internalizar um novo paradigma de atuação pública.

Quando são analisadas as séries temporais de dados e informações[2] obtidas junto à Justiça Federal, Trabalhista e Estadual é possível constatar que os índices médios de eficiência da Justiça têm decrescido sistematicamente nos últimos anos.Na maioria das unidades jurisdicionais o tempo de tramitação de processos tem subido concomitantemente com o crescimento do seu custo de tramitação[3].

Isto pode ser observado tanto com relação aos cálculos de médias gerais quanto aos de médias por competência. No geral e em termos reais, o volume da prestação de serviços jurisdicionais cresce a uma taxa proporcionalmente inferior à observada com relação aos recursos aplicados.

A Presidente do Supremo Tribunal Federal Ministra Ellen Gracie, em pronunciamento proferido no Congresso de Inovação e Informática do Judiciário - CONIP JUD, realizado em Brasília em setembro de 2006, tratou de importantes temas e questões relativas ao funcionamento da Justiça no Brasil. Suas declarações, apresentadas a seguir, constituem um diagnóstico preciso sobre a atual realidade do Poder Judiciário no Brasil.

"Há um senso de urgência a nos impelir para o congraçamento de esforços.... Nosso passivo já alcança números insuportáveis.... Temos desenvolvido nosso trabalho, diante da maré montante de demanda, com a dedicação inexcedível de uma magistratura e de um corpo funcional subdimensionados para seguirmos utilizando a metodologia tradicional.

Como são inevitáveis as resistências a aumentos de despesa com a máquina pública, ou revisamos nossos métodos de trabalho ou encararemos a inviabilidade...."

São muitos os desafios a serem enfrentados pela Justiça Brasileira nos próximos anos, alguns deles decorrentes da necessária revisão do seu atual modelo de gestão e métodos de trabalho. Outros, mais complexos e profundos, são decorrentes da difícil tarefa de contornar as barreiras culturais estabelecidas nas arraigadas rotinas cotidianas de trabalho, aprendidas e consolidadas por décadas de prática. A extensão territorial e a abrangência das competências legalmente atribuídas aos entes do Poder Judiciário são alguns dos elementos que demonstram, do ponto de vista finalístico, administrativo e operacional, a complexidade do funcionamento da Justiça.

Parece não ser mais possível obter o incremento da eficiência no Poder Judiciário Brasileiro apenas pela simples ampliação de efetivo - Magistrados e servidores ou de suas estruturas de funcionamento.

Diante das crescentes limitações orçamentárias, entre outras, parece improvável que o Poder Judiciário possa seguir adotando a metodologia tradicional para o atendimento de seus grandes desafios. Não cabe aqui tratar da recorrente discussão que envolve as questões legais ligadas ao rito processual, mas olhar para o interior da organização e buscar a melhoria significativa de desempenho por meio da mudança e aperfeiçoamento da prestação de serviços jurisdicionais.

Padrão ou modelo tecnológico

Claramente, parte da metodologia tradicional citada pela Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministra Ellen Gracie, está relacionada ao atual "padrão ou modelo tecnológico - P.M.T." empregado pela maioria dos órgãos do Poder Judiciário Brasileiro e diz respeito ao conjunto de conhecimentos, técnicas e ferramentas utilizadas pela organização na produção de bens ou serviços aos seus "clientes" ou usuários.

O P.M.T. atualmente em uso pela Justiça é composto por autos ou pasta do processo, capas de cartolina ou de plástico, fitas adesivas coloridas, livros e fichas de registro, carimbos, carrinhos para transporte de autos, sovelas[4], prateleiras para arquivamento de pastas, máquinas de escrever, computadores e sistemas informatizados de apoio, entre outros recursos.

Também fazem parte do atual P.M.T., as atuais habilidades e conhecimentos dos magistrados e servidores, os padrões de operação, as políticas, regras e critérios adotados para seu funcionamento e a estruturação das atividades para prestação de serviço jurisdicional, entre outros componentes.

A utilização de recursos de informática está aquém de seu potencial e o nível de modernidade do atual P.M.T. é baixo e não uniforme. Os sistemas de administração e controle de tramitação de processos judiciais foram desenvolvidos de maneira isolada e, portanto, diferentes em cada um dos entes do Poder Judiciário e, principalmente entre as diferentes instâncias da Justiça.

A adoção do Processo Judicial Eletrônico previsto na nova legislação pode contribuir significativamente para o incremento e modernização do modelo tecnológico empregado na Justiça Brasileira.

A Lei 11.419 introduz a possibilidade de alterações significativas no funcionamento da Justiça e permite a radical mudança do P.M.T. vigente. Resumidamente, as principais mudanças previstas são[5]:

- Rompimento com a formulação do processo tradicional;

- Os atos processuais passam a ser praticados diretamente no sistema pelo magistrado, promotor, procurador, advogado, defensor e pela própria parte, mediante a assinatura digital certificada e sem a intervenção de servidores de cartórios ou ofícios;

- A assinatura digital baseada em certificado digital emitido por Autoridade Certificadora credenciada entra em vigor;

- As fases e eventos dos processos são unificados, havendo um único registro de todos os atos processuais;

- Interação completa de todos os atores do processo por meio do sistema;

- A juntada de documentos e expedição de certidões é automatizada eliminando a burocracia;

- Possibilidade de Consulta e Controle, em tempo real e de maneira remota, do andamento dos processos pelos envolvidos;

- Maior rapidez na distribuição, processamento e julgamento de todo tipo de processo ou recurso, pois a petição, entre outros atos, pode ser realizada de forma totalmente eletrônica;

- Acesso instantâneo aos dados dos processos;

- Publicação de atos no Diário da Justiça Eletrônico, de maneira totalmente eletrônica e assinada digitalmente, entre outros.

Para a adoção do processo judicial eletrônico e sua operação estão previstos mecanismos técnicos que deverão ser implementados previamente, quais são:

Documentos Eletrônicos - são considerados originais para todos os efeitos legais e os digitalizados têm a mesma força probante dos originais;

Assinatura Eletrônica - Assinatura digital baseada em certificado digital emitido por Autoridade Certificadora credenciada. Válida para petições, recursos e todos os atos processuais (Padrão ICP-Brasil);

Protocolo Eletrônico – O Poder Judiciário fornecerá protocolo eletrônico dos atos processuais realizados em meio eletrônico, no dia e hora do seu envio ao sistema;

Diário da Justiça Eletrônico - Publicação eletrônica substituindo, para quaisquer efeitos legais, outro meio ou publicação oficial à exceção dos casos que, por lei, exigem intimação ou vista pessoal. O conteúdo das publicações deve ser assinado digitalmente com base em certificado emitido por Autoridade Certificadora;

Portal Próprio - A Intimação eletrônica deverá ser em portal próprio da Justiça e dispensa a publicação no órgão oficial. A intimação eletrônica é considerada intimação pessoal, inclusive para a Fazenda Pública. A consulta do intimando deve ser certificada eletronicamente nos autos;

Intervenção Direta – A distribuição de petição inicial, a juntada de contestação, a juntada de recurso e juntadas em geral poderão ser praticadas diretamente pelos advogados públicos e privados, sem intervenção do cartório judicial, devendo se dar autuação automática;

Governança de processos - Acesso instantâneo aos dados dos processos pelos magistrados, advogados públicos e privados, procuradores, partes, e Ministério Público, atentando para as cautelas nas situações de sigilo e segredo de justiça e garantindo a integridade dos dados e andamentos.

Considerando que as leis podem suscitar diferentes interpretações por parte dos variados atores envolvidos na sua aplicação, é esperado que os profissionais da área busquem o entendimento sobre a sua aplicação e efeito diretamente no texto da Lei e nas eventuais análises jurídicas proferidas por entidades técnicas como a OAB.

Cada Tribunal deverá, por previsão legal, regulamentar Lei. Este ato oferecerá novos subsídios para o completo entendimento de sua abrangência.

Alguns possíveis impactos

A efetiva aplicação da Lei possibilitará, nos próximos anos, a introdução de modificações significativas no funcionamento da Justiça, com profundo impacto nas rotinas de trabalho e nas atribuições dos servidores, principalmente de escreventes[6] e oficiais de justiça, mas inclusive de magistrados.

Serão afetadas também as estruturas físicas dos próprios Fóruns, a forma de realizar o atendimento ao público, a gestão de pautas trabalho típicose audiências, entre outros. A seguir veremos alguns impactos.

1.Nos processos de trabalho típicos

O processo digital exige uma reinvenção total dos processos de trabalhos de prestação de serviços jurisdicionais para a 1ª, 2ª Instância e Instância Superior. A adequada aplicação da nova Lei e dos novos sistemas, tais como o SUAP / JT[7], permitirão que muitas das atividades realizadas hoje pelos servidores e magistrados possam ser cumpridas de maneira automática e completamente distinta da atual, porém, a regulamentação da Lei não deverá corresponder à mera automação do processo de trabalho judiciário nos termos de seu funcionamento atual, mas também considerar a sua completa reformulação.

Não se trata de informatizar a "burocracia e as atuais rotinas de trabalho" mas, ao contrário, é a busca por sua mais radical modificação possível.

A reinvenção dos processos de trabalho deverá incorporar as expectativas da Sociedade, dos Jurisdicionados, do Poder Judiciário e considerar todas as modificações e possibilidades técnicas previstas na Lei. Deveria inspirar a concepção de idéias, premissas e diretrizes para o re-projeto radical do funcionamento dos Fóruns, Turmas, Câmaras, Ofícios ou Varas eletrônicas visando à construção do Poder Judiciário do futuro.

Citamos como exemplo, o plano que a Justiça Trabalhista adotou para a sua modernização. Durante o ano de 2006, o Tribunal Superior do Trabalho - TST estabeleceu os requisitos e as definições para o desenvolvimento do seu novo sistema informatizado e unificado nacionalmente, o SUAP / JT. A implantação de Ofícios e Fóruns digitais, bem como o início de operação de tal rito em unidades que já possuem processo tramitando em papel, deve ser precedida por criteriosa análise da estrutura física, capacitação das pessoas nos novos processos de trabalho e sistemas, além do adequado dimensionamento dos impactos do novo rito sobre os magistrados e servidores.

A complexidade e extensão do processo de trabalho típico da esfera judiciária é um obstáculo concreto que pode tornar esta tarefa mais difícil e demorada.

2.Nas atribuições dos envolvidos

A aplicação da nova Lei conjugada com a implantação dos novos sistemas informatizados propiciará, num futuro próximo, mudanças importantes no escopo do trabalho dos servidores, nas rotinas das unidades judiciárias e em suas estruturas organizacionais. A mudança do ferramental tecnológico utilizado para a realização dos trabalhos afetará as atribuições dos servidores, em decorrência, por exemplo:

- Da substituição de autos físicos (pastas de processo), livros de registro, fichas e carimbos, entre outros, por processos eletrônicos,

- Das decorrentes modificações na tramitação processual com a eliminação da necessidade de intervenção de servidores, como por exemplo, no processamento de petições iniciais, intimações e publicações.

- Do fato que muitas intimações e notificações serão realizadas pelo Portal da Justiça, entre outros.

Os servidores do futuro terão atividades muito mais próximas às de um assessor técnico de Desembargadores e Juízes, com conhecimento em tecnologia de informação e gestão administrativa, pois muito da responsabilidade pelo desempenho da unidade será sua atribuição. As atividades hoje desenvolvidas por eles são predominantemente de caráter manual, tais como, juntada de petições, registros em livros e em fichas de controle.

Modificações nas atribuições constantes no plano de cargos e carreiras tornam-se necessárias em função da aplicação da Lei e de outras mudanças no funcionamento da Justiça, que se tornarão cada vez mais constantes.As novas contratações de pessoal deverão ser precedidas por estes ajustes.

3.Na carga de trabalho

O processamento eletrônico dos autos previsto na Lei 11.419 representará uma significativa redução da atual carga de trabalho dos profissionais envolvidos[8]. Esta redução implicará em modificações no dimensionamento e na distribuição dos recursos humanos pelas unidades judiciárias e estas questões deverão ser consideradas quando da regulamentação da Lei pelos entes da Justiça.

4.Nas atividades das seções e serviços de distribuição

A Lei 11.419 permite que as partes peticionem diretamente no sistema, inclusive a petição inicial. Com o passar do tempo, a estrutura organizacional e as atribuições dos Ofícios / Seções de Distribuição deverão ser reavaliadas, pois suas atribuições serão esvaziadas, dado que não haverá mais processo em papel e os sistemas cuidarão automaticamente das regras e critérios pertinentes ao assunto.

5.Nas rotinas de trabalho dos magistrados

A adoção do processamento eletrônico de autos acarretará modificações nas rotinas trabalho dos magistrados podendo, inclusive, ampliar-lhes a carga de trabalho num primeiro momento.Não se pode dimensionar precisamente o impacto decorrente da aplicação da Lei e nem utilizar o atual trâmite processual em papel como referência. Será necessário estudar os efeitos práticos nas atividades desenvolvidas e, num segundo momento, empreender os ajustes necessários que poderão determinar uma eventual mudança relativa entre o número de magistrados e servidores e na celeridade da tramitação do processo, entre outros.

6.Nas instalações físicas

A aplicação da Lei culminará na eliminação gradual e quase total dos processos em papel, exceção feita ao processo de competência criminal. Assim, pode-se esperar uma redução progressiva da necessidade de espaços físicos hoje destinados ao armazenamento de processo nas instalações da Justiça.

Mudanças do "Padrão ou Modelo Tecnológico", incluindo as facilidades previstas pela Lei, terão como conseqüência a necessidade de adaptação do uso das instalações físicas das unidades, adaptando-se à conseqüente diminuição do fluxo de pessoas nas instalações da Justiça. A titulo de ilustração, citamos os seguintes serviços passíveis de realização pela Internet.

- Vista ao processo pelos envolvidos;

- A distribuição de feitos e petições;

- Publicações eletrônicas em diários oficiais;

- A citação ou notificação, entre outros.

7.No atendimento ao público

Os recursos tecnológicos previstos pela Lei poderão ser utilizados para melhorar e modificar a forma como é realizado o atendimento ao público.

O uso intensivo da Internet levará a uma significativa redução do fluxo de pessoas pelas unidades da Justiça, resumindo-se esta necessidade apenas para o caso das audiências. Porém, mesmo neste caso, está em discussão a autorização legislativa para a realização de tele-audiência, prevista inicialmente para o atendimento aos detentos, que não mais serão deslocados de suas unidades prisionais.

A eliminação de espaços físicos de armazenagem de processos, a instalação de equipamentos de auto-atendimento, a diminuição do fluxo de atendimento no protocolo de atos, entre outros, indica que haverá a necessidade de re-projetar todas as instalações físicas dos Fóruns e também suas rotinas de atendimento ao público. Aqui cabe o exemplo das agências bancárias. À medida que ampliavam sua informatização e ofereciam mais recursos de auto-atendimento em suas instalações ou por meio da Internet, foram modificando as suas instalações para atender às novas demandas de seus usuários.

8.Na integração entre os entes do Poder Judiciário

O Poder Judiciário tem se mobilizado para a padronização da nomenclatura utilizada nas cortes. Este trabalho de taxonomia associado à padronização que poderá ser obtida por ocasião da regulamentação da Lei 11.419 pelos vários entes da Justiça poderá resultar em um sistema judiciário completamente integrado e mais ágil, facilitando, não só o trâmite processual entre a 1ª e 2ª Instância, mas entre estas e as superiores.

A padronização da nomenclatura e o processo judicial eletrônico podem contribuir para a integração do Poder Judiciário com os sistemas informatizados de outros órgãos públicos, em patamares substancialmente superiores aos hoje existentes, atendendo ao objetivo de aumentar a eficiência e a eficácia na prestação de serviços jurisdicionais.

Hoje, por exemplo, há um acordo conhecido como BACEN/JUD celebrado entre Tribunais e o Banco Central que permite aos magistrados acesso às contas bancárias de devedores através do CPF ou CNPJ e o conseqüente bloqueio dos saldos ali existentes para fazer frente ao pagamento à parte. No futuro, convênios desta natureza poderão ser celebrados visando integrar, por exemplo, a Justiça com os cartórios de registros de imóveis, de registros de patentes e com DETRANs, entre outros.

Convênios com as secretarias de administração penitenciária, delegacias e até mesmo com a Empresa de Correios e Telégrafos permitirão a troca de informações digitais certificadas, propiciando substancial mudança na forma da Justiça operar, com ganhos de eficiência e celeridade.

9.Na coleta e no tratamento de descritores estatísticos e indicadores de desempenho

Dentre as rotinas de trabalho das unidades do Poder Judiciário existe uma em especial que demanda muito esforço: obter dados e descritores estatísticos para o apoio à gestão dos tribunais e para atender à determinação da Resolução no 15 do CNJ.

A modernização dos sistemas informatizados deve adicionar funcionalidades relativas à automação da coleta e tratamento de dados sobre a administração dos processos. O SUAP / JT já tem tais funcionalidades previstas em sua especificação. A incorporação de funcionalidades estatísticas no sistema, além de propiciar a redução de trabalho nas unidades judiciais, poderá facilitar a adoção de um modelo de gestão que considere os indicadores de desempenho no processo de tomada de decisão administrativa.

10.Nas rotinas de trabalho de profissionais envolvidos com o Poder Judiciário

Considerando que trabalhos burocráticos típicos, hoje realizados pelos escritórios de advocacia, poderão ser totalmente realizados por meio eletrônico. É possível prever que ocorrerão significativas mudanças na rotina destes escritórios, dos advogados públicos e privados e, até mesmo, das partes e do público em geral.

Mesmo antes da promulgação da Lei, muitos Tribunais, como o Tribunal Regional do Trabalho - 2ª Região - Varas da Capital de São Paulo, já haviam adotado o pré-cadastramento de petição inicial pela Internet. Porém, antes da entrada em vigor da Lei 11.419, o advogado necessitava deslocar-se até a unidade de atendimento do TRT para dar entrada nos documentos em papel. Este procedimento poderá ser completamente abolido.

A tradicional atividade de "fazer o fórum", realizada geralmente por estagiários do direito, será radicalmente mudada ou mesmo extinta. É possível especular como seriam as réplicas e tréplicas dos advogados no Tribunal do Júri, sem que eles tivessem as pastas de processo em suas mãos para consultá-las ou mostrá-las aos jurados...

Poderá ocorrer ainda, a necessidade de modificação no currículo dos cursos de direito visando possibilitar a adequada preparação para que os alunos possam atuar no novo padrão tecnológico e rito processual.

11.Outras considerações

Certos aspectos decorrentes da adoção e aplicação dos processos eletrônicos previstos pela Lei merecem atenção especial.

Regulamentação

A Lei 11.419 prevê no artigo 18 que os órgãos do Poder Judiciário deverão, para permitir a sua aplicação, regulamentá-la, no que couber, no âmbito de suas respectivas competências. A regulamentação a ser definida por cada um dos entes do Poder Judiciário deverá levar em conta o estágio do processo de informatização em curso em cada unidade, mas também os avanços proporcionados pela aplicação da própria Lei.

Recentemente o TST concluiu a regulamentação da Lei. Ele levou em consideração aspectos decorrentes da disponibilidade incremental e evolutiva já planejada para os seus recursos e sistemas informatizados e que deverá ser adotada nacionalmente.

Normas de trabalho

Será necessário adaptar as Normas de Trabalho Judiciárias de Primeira e Segunda Instância com o objetivo de permitir que a informatização seja realizada em um ambiente livre dos excessos burocráticos e considerando o processamento eletrônico de feitos nos termos da Lei 11.419, evitando informatizar a burocracia.

Observações

O texto tratou alguns dos possíveis impactos da aplicação da Lei 11.419 com foco, principalmente, nos aspectos organizacionais e operacionais. Outros aspectos poderão ser discutidos e aprofundados considerando o ponto de vista técnico e profissional dos magistrados, servidores da Justiça, advogados, procuradores e membros do Ministério Público, entre outros.

Referência bibliográfica

- AGUILAR CORTEZ Luís Francisco. Estudos sobre os Serviços de Execução Fiscal do Tribunal de Justiça de São Paulo.

- BRESSER-PEREIRA, L.C. Reforma da Gestão e avanço social em uma economia semi-estagnada in LEVY, E. e DRAGO, P.A. (org), Gestão Pública no Brasil Contemporâneo, edições FUNDAP 2005.

- CALHAO, A.E.P. O princípio da eficiência na administração da Justiça, Edição RSC Editora, 2007. p. 88.

-  MOREY FILHO, F.B., Os impactos operacionais da Lei 11.419/06 no funcionamento da Justiça in LIMA GONÇALVES, J.E (org) A construção do novo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – V.II, Editora Plêiade, 2007.

- MODESTO, PAULO, Notas para um Debate sobre o Princípio da Eficiência. Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Ano 2, n. 7, p. 40


[1] "O princípio da eficiência, além disso, pode ser percebido também como uma exigência inerente a toda atividade pública. Se entendermos a atividade de gestão pública como necessariamente racional e instrumental, voltada a servir ao público, na justa proporção das necessidades coletivas, temos de admitir como inadmissível juridicamente o comportamento administrativo negligente, contra-produtivo, ineficiente. Não se trata de uma extravagância retórica. Raciocínio semelhante vem sendo adotado há anos pela doutrina alemã, que chega a afirmar ser o princípio da eficiência um princípio constitucional estrutural pré-dado ou, como parece melhor, uma decorrência necessária da cláusula do Estado Social".

[2] Em especial as constantes da resolução 15 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Ressalva-se que o CNJ ainda estáaprimorando seu sistema de estatísticas, o que inclui a definição e nomenclatura dos descritores estatísticos e a padronização da obtençãodos dados.

[3]Dado atualizado pelo IPC.

[4] Instrumento longo e afilado de metal utilizado para alinhar as perfurações existentes em processos em papel.

[5] Conforme explanação do Juiz Federal Sérgio Renato Tejada Garcia, Secretário-Geral do Conselho Nacional de Justiça, no CONIP Judiciário em setembro de 2006.

[6]A nomenclatura do cargo possui outras denominações em diferentes unidades da Justiça tais como: analistas ou técnicos judiciários.

[7] Sistema Unificado de Administração de Processos – SUAP / JT será a principal ferramenta para a integração digital e a informatização do processo judicial na Justiça do Trabalho. (TST).O sistema absorverá os sistemas e-DOC, e-JUS, Cálculo Trabalhista Rápido, Carta Precatória Eletrônica e AUD (de informatização de salas de audiência) e outros sistemas hoje em funcionamento nos Tribunais trabalhistas.

Observação: Há uma proposta da parceria entre o CSJT e o CNJ para usar a "coluna vertebral" do SUAP como ponto de partida para a criação do processo eletrônico para o Poder Judiciário. – FONTE (Carmem Feijó)- Assessoria de Comunicação Social - Tribunal Superior do Trabalho.

[8] Analistas, Técnicos Judiciários e Escreventes, entre outros.