Na época em que amarava cachorro com linguiça, em Mantenópolis, minha terra natal, havia uma advogada chamada doutora Marluce. Ela residia em Vitória, mas sempre estava defendendo alguém nas nossas cercanias. Também militava com o direito o primo de meu pai, de nome Afenir Guerra, que funcionava como rábula. Depois o grande Eliezer Ribeiro deixou o fisco e foi labutar também como advogado. Este sabia muito de direito e de língua portuguesa, porém, não sabia cobrar honorários. Os advogados famosos eram de fora, os irmãos Dartur e Darly, de Mantena. Eu sou uma pessoa que não teve duvida na hora de escolher que curso fazer. Creio que com doze anos eu já sabia que queria estudar direito. O meu avo Miguel me achava inteligente e mandava eu desdobrar a tabuada de cor, só para impressionar os seus fregueses do açougue que possuía. Afinal, como juiz de paz ele nada ganhava. O orgulho dele era me ver juiz. Quando eu me tornei advogado ele ficou muito orgulhoso. Ele só não entendia por que eu sempre dizia que deixaria de ser advogado para ser defensor publico ou promotor de justiça. Não queria ser juiz. Voltando a doutora Marluce, ela e outros já citados também foram boas influencias para a escolha de minha profissão. Sempre fui rato de foro e assistia aos julgamentos no Tribunal do Júri com frequência. Um dia doutora Marluce estava defendendo um homem que havia matado o outro por que aquele tinha inquietado a sua família. Ou seja, a mulher resolve botar uma toca de touro no sujeito e quem paga o pato é quem estava lhe ajudando. A tese da defesa era legitima defesa da honra. Por muitos anos esta tese encontrou aceitação no Tribunal do Júri, reflexo do machismo que vivíamos. Depois os tribunais começaram a anular os julgamentos sob o argumento de que não se pode sacrificar uma vida humana a pretexto de defender a sua honra. Alias não se perde a honra quando se leva cifre. Quem bota o chifre e se deixa pegar é quem fica com a honra maculada. A doutora Marluce, para justificar a sua então excludente de ilicitude, conta para os jurados a seguinte estorieta: Certo homem tinha conhecimento de que sua amada esposa o traia. A própria mulher jogava em sua cara que ele não era de nada, pois sabia que o Ricardão comparecia em sua a residência em determinadas noites e ele, o marido, se fazia de morto. O cabra se enraivou e tomou uma decisão: da próxima vez eu me vingo daquele sujeito. No fatídico dia o marido traído se escondeu debaixo da cama com o intuito de surpreender o Ricardão. A noite cai e o homem que fazia feliz a sua mulher chegou e foi direto para o quarto do casal. Tirou a roupa e pendurou no prego. Os sapados foram deixados do lado da cama. O que estava previsto para acontecer terminou a bom termo e não houve nenhuma surpresa. O Ricardão pegou as suas coisas e se mandou. A mulher, sabedora que o marido estava debaixo da cama, falou: - Você é frouxo mesmo. O cara vem aqui e fica comigo na sua cama e você não tem coragem de fazer nada. É corno conformado mesmo. – É ai que você esta redondamente enganada bobona. Enquanto ele estava na cama com você eu urinei no sapado dele. A doutora Marluce finalizou a defesa perguntando aos se era esta a atitude que um homem traído devia ter.