A ÍNTIMA RELAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS JURÍDICOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 

Autor: Igor Pinheiro Pará[1] 

1 INTRODUÇÃO                                

Princípios são os parâmetros que subsidiam e orientam a construção de uma disciplina. A partir desses fundamentos que surgem estruturas e institutos concernentes a determinado objeto. No conceito resumido, porém suficiente, de Diógenes Gasparini[2], “constituem os princípios um conjunto de proposições que alicerçam ou embasam um sistema e lhe garantem a validade.”

Tamanha a complexidade do sistema que regula a administração pública, faz-se notória a pluralidade de princípios que o regem. Tanto assim o é que podemos identificar Princípios da Administração Pública expressos e implícitos dentro do ordenamento jurídico.

Os princípios da Administração Pública estão expressamente dispostos, notadamente, em duas situações. Na Constituição da República, encontraremos o que Fernanda Marinela chama de “princípios mínimos a que a Administração Direta e a Indireta devem obedecer”. Trazidos no caput do artigo 37, os princípios constitucionais da Administração Pública são a Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência. Em plano infraconstitucional, destacamos Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que, ao regular o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, expressa os princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Mesmo que se tenha valorizado o arrolamento de princípios em dois momentos, não se deve assumir que só nestes há estabelecimento expresso de princípios. Seja no texto constitucional ou em legislação ordinária, estão expressos outros princípios que, derivando dos já citados ou um dos outros, regerão aspectos específicos da administração pública.

O que chamamos de princípios implícitos são aqueles que deduzidos logicamente a partir dos estabelecidos ou mesmo das próprias características do Estado de Direito em si. Estes não são, de nenhuma forma inferior aos expressos. Para explicar a forma como essa fundamentação diversa funciona de forma harmônica, recorremos, novamente, aos dizeres de Celso Antônio Bandeira de Mello:

“Todos estes princípios vigoram segundo determinadas condições, regulamentações e limites, admitindo variantes, temperamentos e qualificações particulares à vista do significado singular que assumem em função da legislação concernente aos diversos intuitos do Direito Administrativo. Sem embargo, desempenham o papel; norte que orienta a compreensão desta disciplina e radical que unifica e lhe organicidade e coesão.”[3]

2 PRINCÍPIOS EM ESPÉCIE

Pretende-se analisar especificamente os princípios da Administração Pública que se mostram relevantes aos propósitos desta dissertação, permitindo-nos postergar a abordagem de um princípio específico, o da Eficiência. Com isso, pretende-se demonstrar como os princípios estão intimamente relacionados entre si, subsidiando a aplicação bem como reforçando o sentido um dos outros.

2.1 Supremacia do Interesse Público

Inobstante a sua ausência do rol trazido pela Constituição Federal, juntamo-nos a Celso Antônio Bandeira de Mello para evidenciar a relevância deste princípio que pautará não somente a Administração Pública, mas o Direito como um todo.

Fundamentado na própria concepção moderna de Estado, em que os indivíduos aceitam a mitigação de suas liberdades pessoais em prol do convívio social, o Princípio da Supremacia do Interesse Público determina o privilégio da satisfação coletiva em detrimento da individual.

Assumindo essa linha de raciocínio, conclui-se que o Interesse Público exaltado por este princípio se refere ao interesse da sociedade como um todo e não o do Estado propriamente dito, meramente aparelho para satisfação coletiva. Não se refuta a hipótese em que esses interesses se confundam, quando o interesse da personalidade estatal é pressuposto de um benefício à sociedade. Dessa forma, ainda que se busque a satisfação da personalidade estatal, esta não deverá ser mais do que meio para a perseguição do interesse coletivo.

É importante, a este ponto, deixar claro que ainda que o trabalho que se desenvolve pretenda um aprofundamento maior no que tange o princípio da Eficiência, entende-se que é a partir do princípio aqui abordado que se originam e justificam os demais. Sobre isso, nos apropriamos das palavras do renomado jurista:

“O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é princípio geral de Direito inerente a qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência. Assim, não se radica em dispositivo específico algum da Constituição, ainda que inúmeros aludam ou impliquem manifestações concretas dele (...). Afinal, o princípio em causa é um pressuposto lógico do convívio social.”[4]

2.2 Legalidade

O princípio define objetivamente a fonte do poder-dever de agir da Administração Pública. Desse princípio, entendemos que os limites de atuação do Estado serão definidos pela lei e somente por ela. Assim, é a lei que estabelece as prerrogativas administrativas bem como delimita seu exercício.

Para explicarmos a influencia prática deste princípio na Administração Pública, recorremos à comparação – notadamente feita por Hely Lopes Meirelles e reiteradamente apreciada na doutrina - entre a legalidade aplicada ao campo privado e a aplicada no âmbito público.

 Nas relações privadas, é garantido ao indivíduo agir conforme sua vontade desde que disto não decorra ilícito. Tanto é valorizada a autonomia da vontade dos indivíduos, que esta é contemplada pela Lei Maior que garante que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa se não em virtude da lei”. Enquanto isso, a Administração Pública, terá sua vontade expressa em lei, que estabelece – no caso do poder vinculado - ou autoriza – no caso do poder discricionário - a atuação administrativa, limitando claramente a atuação administrativa.

Em resumo pode ser dito que aos indivíduos é garantida a possibilidade de fazer tudo aquilo que não lhe é vedado ao mesmo tempo em que da Administração Pública exige-se somente atuar conforme aquilo que lhe é expressamente permitido.

Uma abordagem estritamente objetiva desse princípio faz com que ele se pareça uma oficialização do rigor técnico burocrático, inflexível e contraproducente, ideia esta cristalizada no senso comum. Indo além dessa perspectiva limitada, Celso Antônio Bandeira de Mello interpreta a legalidade à luz da supremacia do interesse público.

O princípio da legalidade servirá não como manutenção de uma tecnicidade excessiva, mas como garantia à sociedade de que a administração pública não se transforme em instrumento de imposição de interesses particulares. Dessa forma, assevera-se:

“Para avaliar corretamente o princípio da legalidade e captar-lhe o sentido profundo cumpre atentar para o fato cumpre atentar para o fato e que ele é a tradução jurídica de um propósito político: o de submeter os exercentes do poder em concreto – o administrativo – a um quadro normativo que embargue favoritismos, perseguições ou desmandos.”[5]

2.3 Impessoalidade

Ainda que tenha um tratamento mais raso e objetivo na doutrina, cabe uma maior atenção a esse princípio devido à duplicidade do seu entendimento.

O primeiro sentido se confunde com a finalidade pública, conforme sugere Hely Lopes Meirelles ao tratar os dois princípios como um, impedindo que a vontade do agente substitua a vontade da administração. Nesse sentido afirma:

“O princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37, caput), nada mais é que o clássico princípio da finalidade o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para seu fim legal.” [6]

É fácil perceber que, dada essa interpretação, supõe-se uma mera decorrência prática do princípio da legalidade, no entanto há uma interpretação mais aprofundada desse princípio. Notadamente evidenciada por Maria Sylvia Zanella Di Pietro[7], baseada nos ensinos de José Afonso da Silva e Gordillo, a segunda abordagem do princípio da Impessoalidade nos impede de confundir a figura do agente com a da administração. Tão importante é esse caráter dissociativo do princípio que é comum à indicação de seus efeitos práticos por todo o ordenamento jurídico.

A Constituição Federal não somente coroa a impessoalidade como princípio, mas como também aponta aplicações deste no plano prático. Do mesmo dispositivo que traz o rol de princípios, artigo 37, a Carta Maior reserva o primeiro parágrafo[8] para vedar a constância de nomes, símbolos ou imagens que promovam pessoalmente autoridades e servidores públicos em publicidade de atos, programas, obras, serviços e campanhas de órgãos públicos.

No campo da legislação ordinária, voltamos a Lei 9.784/99, que assim como a Constituição, posiciona a vedação a promoção pessoal em um parágrafo[9] do mesmo artigo em que arrola os princípios.

2.4 Moralidade

Quando estudamos sobre esse princípio lidamos com o mesmo problema enfrentado no levantamento do “dever de probidade”: é bastante difícil estabelecer uma concepção objetiva e prática da matéria. Ainda assim, a doutrina se esforça na construção do conceito de moralidade administrativa.

A estruturação conceitual começa abstratamente, assumindo além da legalidade, conveniência e oportunidade dos atos a serem praticados, deverão ser levados em consideração também valores como honestidade e justiça, conforme prega José dos Santos Carvalho Filho:

“O princípio da moralidade impõe que o administrador público não dispense os preceitos éticos que devem estar presentes em sua conduta. Deve não só averiguar os critérios de conveniência, oportunidade e justiça em suas ações, mas também distinguir o que é honesto e desonesto.” [10]

A partir dessa noção, é que se busca uma colocação factual do princípio. Nesse sentido, Hely Lopes Meirelles utiliza, mais uma vez de forma brilhante, sua técnica comparativa. Para o autor, uma abordagem prática da Moralidade pode se apoiar no conceito de boa-fé objetiva, do Direito Civil. Dessa forma, a Moralidade seria uma espécie de “norma de comportamento leal ou um modelo de conduta social, arquétipo ou standart jurídico”[11].

Sobre esse princípio é importante, aos fins estabelecidos no estudo, lembrar a ideia trazida por Maria Sylvia Zanella, assumidamente influenciada por Augustin Gordillo. Para os autores, em planos práticos, há a criação de um sistema alternativo dentro da  Administração Pública, onde os princípios e são ignorados ou modificados conforme o interesse dos agentes, criando uma “moral paralela”[12], dissonante da que se espera, que só pode ser eliminada mediante uma maior participação popular no controle da administração.

2.5 Publicidade

O princípio da publicidade é estruturado dentro da mesma linha de raciocínio que determina o dever de prestar contas. Se a administração atua em prol de toda a sociedade, é de interesse amplo irrestrito os meio pelos quais e os fins para que aja, devendo facilitar a “fiscalização popular” de seus atos, exaltada no tópico anterior.

Assim como ocorre com o princípio da Impessoalidade, a Constituição não só o prevê abstratamente, mas aponta manifestações concretas do princípio da Publicidade. Em seu rol de direitos individuais e coletivos[13], a Carta Maior já estabelece que o caráter sigiloso de informações seja excepcional, só sendo cabível quando imprescindível a segurança da Sociedade e do Estado, adotando-se como regra a publicidade irrestrita, o garante ao cidadão o direito à informação.

Ainda preocupada com a publicidade das informações competidas à administração, a Constituição estabelece no mesmo dispositivo, instrumento para fazer valer esse princípio em casos específicos de desrespeito. O Habeas Data[14] que garantirá o recebimento pelo requerente das informações sobre ele constantes em registros públicos quando estas lhe forem negadas pelas vias ordinárias.

A publicidade é de tal forma valorizada, que os atos administrativos que sofrerem negligência em sua publicidade serão incapazes de gerar efeito, pois a obediência ao princípio é condição de sua eficácia. O posicionamento dos juristas mais clássicos é ainda mais rígidos, entendendo a publicidade com requisito de validade do ato e, portanto, se ausente a devida publicidade – sobretudo publicação – teremos um ato inválido.

Por fim, lembramos a irradiação desse princípio da publicidade influenciando os demais. Esse fenômeno é identificado e explicado por José dos Santos Carvalho Filho:

“Indica que os atos da Administração devem merecer a mais ampla divulgação possível entre os administrados, e isso porque constitui fundamento do princípio propiciar-lhes a possibilidade de controlar a legitimidade da conduta dos agentes administrativos. Só com a transparência dessa conduta é que poderão aquilatar a legalidade ou não dos atos e o grau de eficiência de que se revestem. (grifo nosso)” [15]

2.6 Finalidade

Conforme já vimos, o princípio da finalidade é visto muitas vezes como decorrência prática do princípio da Legalidade e, por isso, muitas vezes, negligenciado pela doutrina, que lhe reserva análises sumárias ou mesmo o ignora especificamente. Sendo a principiologia da administração pública o eixo que movimenta essa pesquisa, é natural que não nos satisfaçamos antes de um estudo mais cuidadoso do princípio que julgamos relevantes.

Dessa forma, nos associamos a corrente doutrinária que afirma que o princípio da Finalidade não se limita a observação da lei, mas exige que os atos jurídicos se adéquem principalmente a fim jurídico para o qual foi previsto. Mais uma vez encontramos ratificação ideológica nos escritos de Celso Antônio Bandeira de Mello, onde lemos que  “na finalidade da lei que reside o critério norteador de sua correta aplicação, pois é em nome de um dado objetivo que se confere competência os agentes da administração.” [16]

Portanto, há de se entender que o atendimento dos pressupostos legais não implica necessariamente a adequação ao princípio da finalidade. Utilizar-se de uma lei como fundamento para prática de ato com finalidade imprópria não caracteriza sua aplicação, mas sim seu burlamento. Os atos que não atendem aos seus intuitos que motivaram sua previsão possuem um vício que chamamos “desvio de finalidade” e, portanto, nulos.

Resumidamente concluímos que o princípio da Finalidade é mais do que decorrência da Legalidade, sendo aquele, na verdade, condição para a plena aplicação deste, pois quem desatende ao fim legal desatende à própria lei.

2.7 Motivação

Ponto pacífico na doutrina, o princípio da motivação não requer uma análise mais aprofundada, no entanto, é a partir do seu estudo que podemos explicar melhor algumas ideias levantadas. Conforme informa Diógenes Gasparini, o princípio da motivação exige que “devem ser mencionadas para a prática de qualquer ato administrativo as razões de fato e de direito que levaram a Administração a proceder daquele modo”[17].

Podemos observar que o princípio da motivação surge a partir de uma derivação concomitante dos princípios da Finalidade e da Publicidade. Ao mesmo tempo em que se exige que os atos administrativos se subsumam ao fim legal que lhe motiva, é necessário que se dê publicidade a essa correspondência.

Também é nesta abordagem que poderemos demonstrar praticamente um raciocínio anteriormente levantado. A exigência constitucional de que os Tribunais motivem suas decisões nos confirma que os princípios aqui estudados serão aplicáveis a todo exercício da função administrativa do Estado, seja típica ou atipicamente função do órgão que o pratica.

Chegado esse ponto, a simbiose principiológica começa a se delinear de forma mais clara. Identificados pontos de interseção nas origens, fundamentações, requisitos, efeitos e consequências de vários princípios, podemos supor de que nenhum princípio é independente ou bastante por si só.

2.8 Razoabilidade

Nesse ponto do estudo, aprofundaremos a cadeia de ligação entre princípios. Semelhantemente a forma que se relacionam o princípio da legalidade e finalidade, o princípio da razoabilidade se ata a este último.

Esse princípio nos relembra que ainda quando exerce o poder discricionário, onde o agente é livre para julgamentos de valor, não lhe é permitido agir a seu bel prazer, devendo sempre conservar, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello, “atributos normais de prudência, sensatez e disposição de acatamento às finalidades da lei atributiva da discrição manejada.”[18]

É absurdo pensar em uma conduta que, desarrazoada possa ser sustentada pelo ordenamento jurídico e, portanto, idônea a cumprir sua finalidade original. De tal maneira, verifica-se tão intimamente ligados os princípios da razoabilidade e finalidade, consequentemente também da legalidade, que não se permite imaginar uma situação em que se encontre ofendido apenas um dos três. Dessa forma também entende José dos Santos Carvalho Filho dizendo que quando se pretender imputar à conduta administrativa a condição de ofensiva ao princípio da razoabilidade, terá que estar presente a ideia de que a ação é efetiva e indiscutivelmente ilegal.”[19]

2.9 Proporcionalidade

Esse princípio enuncia que as prerrogativas administrativas só devem ser exercidas na intensidade e extensão que lhe exige a finalidade pública para a qual foram respectivamente desenhadas. É, portanto o princípio que exige que a Administração Pública só se utilize de seus poderes somente para a satisfação do interesse coletivo, e apenas no limite do minimamente necessário, vedando – lhe o excesso.

É da opinião de alguns dos mais gabaritados doutrinadores - notadamente Maria Sylvia Zanella Di Pietro[20] e Diógenes Gasparini[21] – que o princípio proporcionalidade está contido no princípio da razoabilidade, sendo aquele apenas uma característica deste e, portanto os analisam conjuntamente.

Mantendo coerência com o raciocínio adotado para este estudo, preferimos assemelhar nossa abordagem com a de Celso Antônio Bandeira de Mello e José dos Santos Carvalho Filho que os tratam separadamente, ainda que o primeiro se junte ao primeiro grupo identificando a continência principiológica[22]. Elegido esse método, podemos melhorar demonstrar como este princípio carrega características intrínsecas do outro, tornando-se um necessário a efetivação do outro, o que, segundo supomos, acontece entre todos os princípios em maior ou menor intensidade.

Válido lembrar que sendo o fim expresso da proporcionalidade o mesmo fim implícito, porém principal, da legalidade, esses princípios estão diretamente ligados. Ao mesmo tempo, considerado seu vínculo com o princípio da razoabilidade, a proporcionalidade também se liga indiretamente a legalidade. Essa complexidade de relações nos permite ratificar a cadeia principiológica que conjecturamos.

2.10 Ampla Defesa e Contraditório

Aparentemente incoerente com a abordagem adotada, que estuda separadamente princípios assumidamente indissociáveis, essa análise conjunta se justifica pelo intuito de evidenciar a relação dos princípios administrativos com os demais princípios do Direito e não somente entre si.

Por princípio da ampla defesa, temos a noção de que a parte tem o direito de ser informado claramente aquilo que lhe é imputado no processo, bem como a forma que isto é feito, cabendo-lhe saber as acusações que lhe são feitas e as provas que lhe embasam. Dessa forma, permite-se que a parte possa se preparar para aquilo que o processo eventualmente lhe exigirá: apresentação de defesa preliminar, reunião de material probatório, busca de um defensor técnico etecetera. Tudo em prol da possibilidade dos indivíduos protegerem plenamente seus interesses

O contraditório, por sua vez, é a oportunidade aberta às partes de apresentar suas considerações a cada avanço processual, permitindo a impugnação das matérias apresentadas em cada ato processual produzido, sejam elas de fato ou de direito. Este princípio será, portanto, servente ao da ampla defesa, já que sua função é permitir a defesa individual plena.

Inerente ao âmbito processual, esses princípios, além de estreitamente relacionados, se ligam a um princípio maior. A constituição prevê que “ninguém será privado da sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Esse princípio constitucional exige, pois, que não lhe seja imputado a ninguém nada que não lhe seja indubitavelmente cabível, atestada por um processo formal regular. É a partir dessa ideia que decorrem os princípios em causa, sendo recursos para a satisfação do devido processo legal.

Com essa linha de raciocínio, mostra-se equívoca a ideia que a Administração Pública é regida sob um sistema hermético e ininfluenciável pelos demais campos do Direito. Mesmo atendo-se ao estudo dos princípios, é possível entender que a administração carregará consigo não só valores próprios, mas também os geralmente válidos ao Direito.

2.11 Segurança Jurídica

Invocando novamente a ideia basilar do Estado trazido nesse estudo, vamos seguir com o raciocínio de que as concessões individuais feitas a um ente maior regulador são feitas em prol da segurança no convívio social. A segurança jurídica não é, senão, a consagração dessa ideia no âmbito do Direito.

O princípio da segurança jurídica vem para consolidar as situações construídas pelo Direito, garantindo ao indivíduo de boa-fé que aquilo que lhe foi devidamente conferido não será tirado, dando-lhe a segurança almejada quando se submete ao Estado. Maria Sylvia Zanella Di Pietro se aproveita da condição de elaboradora do anteprojeto da lei, para nos revelar a intenção prática da positivação legal desse princípio:

“O princípio se justifica pelo fato de ser comum na esfera administrativa, haver mudança de interpretação de determinadas normas legais, com a consequente mudança de orientação, em caráter normativo, afetando situações já reconhecidas e consolidadas na vigência de orientação anterior. Essa possibilidade de mudança é inevitável, porém gera insegurança jurídica, pois os interessados nunca sabem quando sua situação será passível de contestação pela Administração Pública.”

Sabido sua utilidade prática, o princípio da segurança jurídica é aprofundado no parágrafo único do inciso que o prevê, precisamente no ultimo inciso, que autoriza a “interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação”.

Di Pietro nos alerta os perigos de uma intransigência na consideração desse princípio. Tão mais rígida seja a preservação dos efeitos dos atos da Administração, garantindo maior segurança, mais provável a manutenção de atos dissonantes da lei, prejudicando a Legalidade.

3 CONCLUSÃO

Identificada à conexão entre princípios, observando a influencia que um exerce no outro, é importante reiterar a ideia de que não há hierarquia entre os princípios, devendo todos ser considerados e aplicados juntamente, sendo privilegiados aqueles que levem a uma situação mais satisfatória ao interesse coletivo, sem que se desconsiderem totalmente os demais.



[1] Igor Pinheiro Pará é graduando em Direito pela Universidade Federal do Ceará – UFC.

[2] GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 6.

[3] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros. p. 94

[4] IDEM. Ibidem p.  96

[5] IDEM. Ibidem  p. 100

[6] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 34 ed. São Paulo: Malheiros. p. 93

[7] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 71

[8] § 1º - A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

[9] Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: (…)

III - objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades;

[10] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 23

[11] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 34 ed. São Paulo: Malheiros. p. 93

[12] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 80

[13] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

[14] LXXII - conceder-se-á "habeas-data":

a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público;

b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo;

[15] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 28

[16] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros. p. 106

[17] GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 23

[18] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros. p. 108

[19] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 43

[20] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 81

[21] GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 25

[22] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros. p. 111