SINOPSE DO CASE: A intervenção na tarifa de eletricidade¹

 

Gabriela Felix Marão Martins²

Diogo de A. Viana dos Santos³

1 DESCRIÇÃO DO CASO

A presidente Dilma Rousseff, em 2013, alterou a tributação sobre o fornecimento residencial e industrial de energia elétrica em território nacional, por meio do Decreto nº 7.891, de modo que pudesse promover a redução da tarifa para beneficiar, principalmente, os consumidores residenciais. No ano de 2015 uma série de fatores levou o país ao que se chama de “crise energética”.

Muitos estudos responsabilizam a política tarifária do Governo Federal, outros atribuem a crise à estiagem mais severa que o país já vivera, que coincidiu com um período de crescimento do país, que, por ser muito dependente de hidrelétricas, acabou por enfraquecer o país.

 

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

A intervenção do Estado brasileiro na economia é condicionada a diversos fatores que garantem uma melhor participação dos particulares no desenvolvimento do país, levando sempre em consideração o interesse público como postulado essencial. No caso em epígrafe, importante dizer que a intervenção do Executivo Federal foi no mínimo questionável, visto que existe insatisfação tanto das empresas atingidas pela redução das tarifas, quanto dos próprios consumidores, que foram beneficiados à época da implantação da norma, mas que hoje estão sofrendo reflexos da falta de planejamento do Governo Federal em auferir quais seriam os corolários da referida medida tomada.

Há que se consignar que os impactos ocasionados pela implementação da referida norma que impôs a redução de diversas tarifas relacionadas ao setor energético não foram os melhores. Existiu, a curto prazo, satisfação dos consumidores na medida em que pagaram menos pelo uso de energia elétrica, bem como existiu um racionamento por parte das empresas produtoras, o que poupou bastante o meio ambiente. Ademais, a referida medida ajudou a aumentar a pesquisa na área, pois o investimento em tecnologia para a descoberta de uma fonte alternativa de energia poderia ocasionar um benefício à economia brasileira como um todo. (ALMEIDA, 2012). No entanto, tais decorrências positivas não perduraram por muito tempo.

O país tem atravessado a pior crise energética já vivida na história. Essa crise traz grandes e graves problemas: financeiro, que foi criado quando o governo renovou as concessões por meio do decreto, obrigando as empresas a diminuírem as tarifas logo num momento em que o custo estava crescendo no mundo inteiro, e o incentivo exacerbado ao consumo, o que trouxe grandes problemas de abastecimento.

O aumento do consumo de energia influenciou também os níveis de competitividade das empresas nacionais em relação às empresas internacionais, influenciou também na produção de produtos como o alumínio, que é importante no processo de geração de energia. Ademais, na busca pela eficiência operacional, as empresas, forçadas a reduzir custos, terão que sacrificar os gastos com os funcionários, o que pode causar a precarização do trabalho e as demissões em massa - que, na verdade, já são realidade na sociedade brasileira atual.

No que diz respeito aos objetivos levados em consideração à época da implementação da norma em comento, há que se dizer que foram vários. Especialistas afirmam que entre tais objetivos existiu a tentativa de sustentabilidade ambiental e uma transição para uma matriz descarbonizada, bem como o bom funcionamento do setor energético como uma maneira de chamar a atenção de investidores, inclusive internacionais, e garantir a segurança do abastecimento. Vale dizer, ainda, que a intenção era de viabilizar a expansão do setor energético para a distribuição/exportação de energia elétrica, como forma de criar empregos no país. (ALMEIDA, 2012).

Tais objetivos, contudo, não chegaram a vingar após a imposição do regramento normativo. Existiu, na verdade, um efeito reverso. Há que se dizer, portanto, que a intervenção do Estado, no que diz respeito à norma em comento, foi ineficaz, trazendo consequências bastante diferentes dos objetivos almejados, pura e simplesmente por falta de atuação conjunta com os maiores interessados no conteúdo ao qual se direcionou o Decreto de responsabilidade do Executivo Federal. (ALMEIDA, 2012).

À partir dos fatos trazidos, observa-se que a política adotada não cumpriu com os objetivos finais traçados por este governo, pois apesar dos encargos e custos de transmissão reduzidos, o mal planejamento causou a grande crise energética da atual conjectura do país, culminando com o aumento do custo da energia elétrica posteriormente. A lei da oferta e da procura foi ignorada, posto que a tarifa foi abaixada justo no momento que a demanda crescia mais do que a oferta. Nesse sentido, nota-se a inobservância de diversos princípios, que serão tratados a seguir:

 

2.1 PRINCÍPIO DA LIVRE CONCORRÊNCIA

O artigo 170 da Constituição Federal estabelece os princípios da atividade econômica, preconizando que:

“A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

[...] IV – livre concorrência”

Este princípio deriva da manifestação da liberdade de iniciativa de atuação dentro mercado econômico. É, portanto, a garantia da livre iniciativa, de forma que, se não houver livre concorrência, não se terá também a liberdade de iniciativa. É por meio deste princípio que se aprimoram as condições de competitividade das empresas, forçando-as a condições mais favoráveis ao consumidor, posto que o princípio força o constante aperfeiçoamento dos seus métodos tecnológicos, dos seus custos, etc.

No caso em questão o Estado não fomentou o princípio em análise, visto que a diminuição da tarifa energética por meio do decreto foi um ato que prejudicou o desenvolvimento das empresas de fornecimento de energia e inviabilizou a sua atuação nacional. (SZEZERBICKI, 2014). Outrora, este princípio não foi respeitado na MP 579, medida que muitos atribuem o início da crise, posto que antecipou a renovação dos contratos de concessão, renovando-os impositivamente por 30 anos, retirando a oportunidade de participação em processo licitatório das empresas.

2.2 PRINCÍPIO DA DEFESA DO CONSUMIDOR

Princípio intimamente ligado ao princípio da livre concorrência, foi também bastante desrespeitado por essa política, vez que acabou por gerar preços ainda mais caros aos consumidores, tirando-lhes o direito de escolha, devido à disparidade evidenciada entre produção e consumo, frustrando a concorrência das empresas nacionais junto as estrangeiras, por conta do alto custo no setor. À priori, a tentativa do Governo Federal foi beneficiar o consumidor com o abatimento na tarifa de energia, no entanto como não houve um adequado planejamento para a aplicação da norma, vez que sequer observaram-se as consequências posteriores à incidência da norma em questão. (MOURA, 2012).

2.3 PRINCÍPIO DA DEFESA DO MEIO AMBIENTE

Sabe-se que a energia gerada no país se dá, em grande e maior parte, pelas usinas hidrelétricas, e estas, geram grandes prejuízos ao meio ambiente. Com o aumento do consumo, as hidrelétricas chegaram ao seu máximo de produção, evidenciando grande crise da água, resultante da má exploração. Não há que se falar em defesa do meio ambiente onde não há desenvolvimento sustentável.

2.4 PRINCÍPIO DA BUSCA DO PLENO EMPREGO

O princípio do pleno emprego depende diretamente da atuação dos envolvidos nas relações trabalhistas, o empregado e empregador. Neste sentido, esse princípio sugere o desperdício mínimo daquilo que é produzido juntamente com a busca constante de inovação tecnológica, diligência no emprego do capital, recursos humanos capacitados constantemente, de forma que estes são fatores aproveitados devidamente pelos atores da economia, desta feita, observa-se a íntima ligação entre o valor social do trabalho e o valor social da livre concorrência. Como este princípio está ligado à ideia de planejamento entende-se que no caso em questão a redução das tarifas foi realizada de maneira desmedida e sem tomar as devidas precauções. Isso acabou ocasionando uma queda nesse setor da economia prejudicando tanto empregado quanto empregador. (MOURA 2012).

2.5 PRINCÍPIO DO TRATAMENTO FAVORECIDO DE EMPRESAS DE PEQUENO PORTE

No que diz respeito ao princípio do tratamento favorecido as empresas de pequeno porte, que, por sua vez, corresponde à garantia do equilíbrio da concorrência das empresas firmadas no território nacional com as empresas que estão iniciando sua atividade no ramo, é importante ressaltar que o referido princípio também não foi observado no caso em questão, porquanto a redução das tarifas representou um impacto desfavorável a tais empresas de pequeno porte, pois as mesmas necessitam de um lucro maior para se estabilizarem, sendo notório que reduziu a margem de lucro das empresas, não buscando um apoio diferenciado às mesmas. (ALMEIDA, 2012).

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Edimar de. A intervenção estatal no setor energético. Jornal GGN (O Jornal de Todos os Brasis), 14 de agosto de 2012. Disponível em: <http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/a-intervencao-estatal-no-setor-energetico>. Acesso em: Outubro 2015.

Blog do Gabriel Azevedo. Como driblar a crise energética, pagar uma conta de luz menor e promover a sustentabilidade on Gabriel de A a Z. Disponivel em <http://blog.gabrielazevedo.com/como-driblar-a-crise-energetica-pagar-uma-conta-de-luz- menor-e-promover-a-sustentabilidade/> Acesso em Outubro 2015

BRASIL. Presidência da República. Constituição Federal de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm > acesso em Outubro 2015.

DUARTE JÚNIOR, Edvanil Albuquerque. Intervenção direta do Estado no domínio econômico e discricionariedade administrativa. Direito Net, 19 de out. de 2006. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2953/Intervencao-direta-do-Estado-no-dominio-economico-e-discricionariedade-administrativa>. Acesso em: 02 de outubro de 2015.

MOURA, Carolina Figueiredo de. Princípios constitucionais da ordem econômica. Web rtigos, 02 de junho de 2012. Disponível em: <http://www.webartigos.com/artigos/principios-constitucionais-da-ordem-economica/90125/>. Acesso em Outubro de 2015.

SZEZERBICKI, Arquimedes da Silva. Os princípios gerais da ordem econômica brasileira:Avanços e efetividade desde a constituição federal de 1988. Disponível em: < http://eptic.com.br/wp-content/uploads/2014/12/textdisc6.pdf>. Acesso em: Março de 2015.