A INSERÇÃO DO JOGO NA ESCOLA

 

            Durante muitos anos cientistas de diversas áreas vêm tentando esclarecer como então se dá a aprendizagem. As teorias concernentes a este tema foram tomando formas mais significativas e hoje podemos citar sumariamente três formas bem distinta da concepção de aprendizagem humana: comportamentalista, humanista e cognitivista.

            Na abordagem comportamentalista ou behaviorista o conhecimento é visto como uma reprodução do que acontece no mundo externo. Para eles (behaviorista) a aprendizagem pode ser observada através de aspectos objetivos mensuráveis.

            Os adeptos desta corrente psicológica defendida principalmente por Skinner citado por Haidt (1994)

 A aprendizagem dependa da relação compreendida entre o estímulo e a resposta. Para alguns estudiosos desta corrente teórica, o número de tentativas, a quantidade do reforço, a intensidade do estímulo, a inibição reativa e a inibição e a inibição condicionada são funções essenciais para a aprendizagem.(Haidt ,1994,p.28)

 

            É importante ressaltar que a aprendizagem dificilmente ocorre se a criança não estiver motivada.

            A teoria humanista segue uma trilha bem diferente, tendo Carl Rogers citado por Haidt (1994), como seu principal teórico coloca que, o objetivo maior a ser alcançado pelo homem é a sua auto-realização.

Esta teoria valoriza o homem em sua totalidade como indivíduo capaz de sofrer modificações e transformar o seu mundo. Com esta nova visão de ser humano, que defende um potencial natural para aprender, deu-se um grande passo a frente não só no sentido de avançar no campo da Psicologia, mas em algo muito mais profundo. O homem agora era valorizado em seu todo e tinha como objetivo maior a sua auto-realização.

            Rogers, citado por Haidt (1994) indiscutivelmente, inovou e revolucionou os conceitos de ser humano e, desta forma, demonstrou o quanto o homem é capaz de crescer individualmente e levar o conhecimento ao mundo e às pessoas que o cercam.

            A abordagem cognitiva que ficou conhecida como psicologia genética e foi defendida principalmente por Jean Piaget (1998, p.37), defende a idéia de que a aprendizagem se dá na interação com o outro, pois o desenvolvimento pessoal é um processo mediante o qual o ser humano assume a cultura do grupo social a que pertence. O desejo do ser mais a experiência humana culturalmente organizada, ou seja, socialmente produzida e historicamente acumulada, não se excluem nem se confundem, mas interagem nesta concepção.

            A psicologia genética nos propiciou aprofundar a compreensão sobre o processo de desenvolvimento na construção do conhecimento e traz uma contribuição mais significativa, a nosso ver, sobre a aprendizagem humana, pois, esta respeita o princípio de que o ato de conhecer deve ser significativo para o aluno.

            Diante disso, fica evidente que: para a aprendizagem aconteça de forma significativa é necessária a harmonia de vários fatores intrínsecos e extrínsecos ao ser humano, pois é na falta da junção destes fatores que ocorre o insucesso do aprender.

            E, reforçando ainda mais a importância de uma aprendizagem significativa é, que os PCNs (vol.3) a partir de uma proposta construtivista propõem que a multiplicidade de jogos na sala de aula vai facilitar o desenvolvimento de habilidades e favorecer a inserção do aluno na sociedade que o cerca e, progressivamente, em um universo cultural mais amplo.

            Ao lado desses favorecimentos, os jogos também se prestam a multidisciplinaridade e, dessa forma, viabilizam a atuação do próprio aluno na tarefa de construir significados sobre os conteúdos de sua aprendizagem e explorar de forma significativa os temas transversais (meio ambiente, pluralidade cultural) que estruturam a formação do aluno-cidadão.

            É válido recordar estas teorias, visto que, as mesmas nos permitem aprofundar a questão da construção do conhecimento e como se dá o mesmo, dando suporte assim para que possamos nos guiar em uma ou outra teoria com fundamentação.

            E, reafirmando tudo isso é necessário que o professor introduza na sala de aula jogos diversos, sendo que estes segundo Piaget (1945) pode ser classificado em: jogos de exercício, simbólicos e os de regras. Embora haja essa classificação de jogos, proposta por Piaget e Inherlder (1974), esses tipos de jogos predominam durante toda atividade lúdica. 

            O que caracteriza estes tipos de jogos? Qual é a importância deles para a construção do conhecimento na escola? Responder a essas questões é o que delinearemos a seguir.

            Os jogos de exercício são os primeiros a aparecerem na vida da criança, que seria no período de desenvolvimento que Piaget (1936) denominou de sensório-motor (primeiros dezoito meses de vida) e, não incluem intervenções de regras, o que a criança executa é simplesmente pelo prazer que encontra na própria atividade.

            Dos jogos de exercícios, a criança herda a imaginação, a criatividade, à vivência antecipada do real e, sua importância sociocultural é muito grande, visto que, representa a graça, a leveza, à malícia seja nos jogos ou em quaisquer outras situações da vida.

            Os jogos de exercícios são formas de, repetir uma seqüência motora e por isso formas de formar um hábito. E, os hábitos como diz Piaget (1936), são a principal forma de aprendizagem no primeiro ano de vida e constituem a base para as futuras operações mentais.

            A repetição utilizada como parâmetro neste jogo é uma das formas de aprendizagem escolar e aprendizagem para a vida.

            Segundo Macedo (1997):

           

Os jogos de exercício permitem à criança enfrentar as atividades escolares, utilizando os valores e a produção de conhecimentos, como um fim e não como um meio, ou seja, estes ajudam a formar futuros cidadãos, cidadãos que deverão dominar as letras, os números e as ciências.(Macedo1997,P.19)

           

            Mas todo esse conhecimento muitas vezes para a criança se torna algo chato e abstrato. E, poder pensar e tratar o conhecimento como algo interessante e estimulador (como por exemplo, trabalhar com jogos), faz sempre muito mais sentido para ela.

            O Jogo Simbólico constitui uma atividade real essencialmente egocêntrica e sua função consiste em atender o eu por meio de uma transformação do real em função de sua própria satisfação.

            Por exemplo: ao brincar de boneca a criança se vê como mãe. Em outras palavras, as fantasias, as mitificações, os medos de pensar ou inventar a realidade são uma espécie de iniciação para as futuras teorizações das crianças na escola primária e mesmo dos futuros cientistas.

            Neste tipo de jogo, é hora de repetir, como conteúdo, o que a criança assimilou como forma nos jogos de exercício, ou seja, o contexto do jogo se torna mais profundo, graças à troca recíproca.

            Segundo MACEDO (1997,p.25), é neste tipo de jogo que: “... a criança pode firmar vínculo entre os objetos ou acontecimentos e suas possíveis representações.”

            De um ponto de vista estrutural, os jogos simbólicos, têm uma importância muito grande para a produção do conhecimento na escola, porque a teoria formula-se e ganha contexto neste tipo de jogo.

            Em síntese, se os jogos e exercícios são a base para o “como”, os jogos simbólicos são a base para ‘porque’. Mas a organização entre o como e o porquê só se dará com a estrutura dos jogos de regra, graças à troca recíproca.

            Em vez de símbolo, o jogo de regra irá implicar nas relações sociais das crianças, possibilitando-lhes seguirem as regras estabelecidas ou compreende-las. Mesmo sendo uma atividade lúdica da criança socializada, o jogo de regras se desenvolve continuamente durante toda a vida. Por isso, o seu aparecimento é mais tardio; só se constitui entre os quatro e os sete anos, intensificando-se dos sete aos onze anos.

            A importância dos jogos de regras na construção do conhecimento na escola é de atualizar o jogo de significados que a criança conheceu no primeiro ano de vida. Jogo de significados, porque, para ganhar o jogador tem de competir em um contexto no qual, por princípio, seu adversário tem as mesmas condições.

            No jogo de regras, para ganhar é preciso ser habilidoso, estar atento, concentrado, ter boa memória, saber abstrair, etc.

            Por isso, o jogo de regras é um jogo de significados em que o desafio é superar a si mesmo ou ao outro. Esse desafio se renova a cada partida, é um jogo que tem caráter competitivo. A competência é o desafio de superar a si mesmo. A criança herda do jogo vários conceitos que carregará pela vida afora.

            Do jogo simbólico ela pode herdar a possibilidade de representar papéis, dramatizar, criar novas situações, o que irá ser muito útil na sua futura vida de trabalho.

            No jogo de regras, ela se vê frente aos limites, restrições, regras, possibilidades, portanto, com uma vida regularizada, proporcionada. E isso tudo, ela irá usar também na sua vida pessoal e profissional, visto que, a vida só pode ser normal através de regras e solidariedade.

             E, finalmente, podemos afirmar que: Os jogos de regras herdam dos jogos simbólicos as regras, mas existe algo que é original e próprio de sua estrutura, o caráter coletivo. Ou seja, nesse jogo, só se pode jogar em função dos movimentos de seu adversário. Aqui, os jogadores sempre dependem uns dos outros.

            A importância dos jogos de regras na construção do conhecimento na escola é no sentido de que atualiza o jogo de significados (exercício) que a criança conheceu no primeiro ano de vida.

            Após todas essas considerações, vimos que os jogos além de serem importantes na escola, são antes importantes para a vida. No jogo podem-se encontrar respostas, ainda não definidas para perguntas que não se sabe responder. O jogo pode preencher nas crianças esse vazio.

            Para esclarecermos melhor a importância do jogo na construção do conhecimento das crianças, é necessário reportarmos à teoria que diz que: “a função da escola é instrumental, ou seja, ela existe para formar futuros cidadãos” e, que a freqüentamos para aprender a ler, escrever e calcular.

            Enfim, o futuro da criança envolve sua inserção no mundo do trabalho, e nessa inserção, o jogo representa um papel muito importante, pois, pode proporcionar a ela um futuro mais promissor. O conhecimento tratado através do jogo pode fazer sentido à criança, visto que, é um conhecimento que acontece meio que naturalmente e com muito prazer.

            Não se quer dizer aqui que todos os conteúdos escolares deverão ser ministrados através de jogos, trata-se de analisar as relações pedagógicas como um jogo, jogo esse que os jogadores não têm consciência que estão jogando.

            A proposta é que os conteúdos sejam ensinados de forma como os jogos o são, com prazer, com criatividade, para que os alunos conheçam o gozo da construção do conhecimento.

            O jogo pode significar para a criança uma experiência fundamental, de entrar na intimidade do conhecimento e de construir respostas. Do ponto de vista competitivo, os jogos motivam a criança a pensar de modo ativo e, pode contribuir para o desenvolvimento da mesma porque o jogo requer elaboração e cumprimento de regras.

            Desse modo, percebemos que por eles exigirem regras, os mesmos oferecem oportunidades para as crianças se envolverem na sua elaboração e decisão, e, faz com que elas se sintam livres para alterá-las.

            Concordando com esta idéia, Kamii (1981) diz que obedecer a regras de cuja elaboração a própria criança participou facilita o caminho para o desenvolvimento da autonomia.

             O que o professor deve passar aos seus alunos antes de um jogo em grupo a respeito da competição é que a criança deve saber lidar com a vitória de forma natural e saber que perder também faz parte do jogo.

            Algumas crianças têm dificuldades emocionais de competir. Então é hora do professor respeitar essas condições. Jamais o professor pode obrigá-la a jogar, pois o valor do jogo se perde quando é imposto.

            O medo também é uma das razões pelas quais as crianças evitam o jogo. Cabe ao docente estar atento a esses sentimentos para ajudá-las a superar esse medo.

            Em relação à competição, a teoria de Piaget mostra que a mesma nos jogos é a parte de um desenvolvimento maior que vai do egocentrismo a uma habilidade em saber lidar com diversos pontos de vista. Esse processo de desenvolvimento pode não só ser visto nos jogos, mas também na vida. Ao invés de evitar os jogos competitivos até que as crianças se tornem “prontas” para eles é necessário tentar desde o início, mostrar que a vitória ou a derrota é inevitável.

            Sendo assim, a criança é encorajada para se desenvolver intelectualmente. Se a maior razão para se jogar é encorajar o desenvolvimento intelectual e social da criança, é importante que o poder do adulto seja reduzido pra que as crianças tomem decisões e enfrentem desafios.

            A dificuldade e o desafio, passíveis de serem superados é que agrada à criança no jogo, e, para que seja interessante jogar, é necessário que a criança esteja interessada, não pode ser proposto jamais como uma imposição, tem que ser trabalhado a partir de um desejo. Isto porque é o próprio jogador que deseja provar seu poder.

            Para Piaget (1945), o jogo na escola só tem importância quando munido de seu significado funcional, ou seja, o jogo só se torna importante quando é trabalhado a partir de um objetivo, e é por meio dele que a criança assimila ou interpreta a realidade.

            Nesse sentido, é que a escola deve proporcionar as crianças, o manuseio com jogos, para que sua inteligência observa essas mesmas realidades.

            E, portanto, o principal do manuseio com jogos é possibilitar a troca entre sujeito e meio. E, essas trocas é que desafiam o raciocínio de um sujeito que é construtor de seu próprio saber (aluno).

            Para que o nosso trabalho enquanto professores que trabalham com jogos seja reconhecido, é necessário que mostremos aos pais, sua importância dentro da sala de aula. Como diz Kamii, é preciso que os pais reconheçam o valor educacional dos jogos e apóiem os professores que os usarem na sala de aula... Muitos professores têm medo de usar jogos por receio de que os pais venham a reclamar que as crianças não levam lições para casa, deixando claro que as crianças aprendem bem mais em jogos em grupo do que em muitas lições mimeografadas.

            A partir da hora em que os pais conheçam a maneira como trabalhamos em sala de aula, podem compreender melhor o nosso trabalho e nos apoiar.

 

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

HAIDT, Regina Célia Cazaux. Curso de Didática Geral. São Paulo: ática, 1994

KAMI, Constance e Rheta de Vires. (trad. Marina Célia Dias Carrasqueira): Jogos em grupos na educação infantil: Implicações da teoria de Piaget. São Paulo: Trajetória Cultural, 1991. P. 269-299.

MACEDO, Lino. Quatro cores, senha dominó: oficina de jogos em uma perspectiva

construtivista e psicopedagógica. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.