INTRODUÇÃO

 

A manutenção de uma cidade ou região, em parte sempre foi devida aos caminhos que a ela levam. Já que, é por meio deles que se desenvolvem os fluxos migratórios, as trocas de mercadorias, entre outros fatores materiais e imateriais, os quais são necessários para o surgimento, crescimento ou decadência de um núcleo urbano.

Os caminhos, portanto são cruciais para determinar a importância e influência de uma cidade em uma região.

O presente artigo é parte de um estudo realizado em Diamantina sobre o crescimento urbano dessa cidade, no qual se procurou compreender a importância das estradas e dos caminhos para o seu crescimento urbano,  desde a sua fundação até os dias atuais.

 

 

A antiga estrada e sua importância

 

Como a maioria das cidades mineiras do período colonial, Diamantina surgiu seguindo o traçado dos primeiros caminhos abertos. Inicialmente o crescimento do sitio urbano se deu pelo caminho que, vindo do Serro, conduzia a cidade e sua continuação em direção ao nordeste se tornou a rota para as novas descobertas na região de Minas Novas e Salvador, na época Capital da Colônia. Esse caminho principal, chamado atualmente de Estrada Real, vem da cidade de Serro e passa pelo atual bairro da Palha atravessando a parte mais baixa do município, aonde se deu a ocupação inicial na Rua do Burgalhau e entorno. Ele continua pela atual Trilha dos Escravos tomando o rumo para a região nordeste de Minas Gerais.

As estradas daquela época geralmente seguiam as sinuosidades do terreno e a que levava à Diamantina não fugia a regra. Era um caminho tortuoso, com grandes declives e em alguns trechos extremamente penosos de se vencer, o que ocorre ainda hoje. MARTINS (2003, p.154) afirma que:

 

 

No século XVIII, os caminhos que chegavam ao arraial do Tijuco correspondiam a essa descrição. Eram picadas sinuosas, repletas de rampas acentuadas, atravessando matas espessas nos vales dos rios e nas encostas, brejos nos terrenos planos ocupados pelos campos rupestres; os viajantes esbarravam amiúde em grandes maciços de pedra, cujo contorno era demorado. Precisavam ainda evitar fossos profundos e encontrar passagens estreitas entre obstáculos do terreno acidentado.

 

A estrada que saía de Vila Rica até o Arraial do Tejuco (Diamantina), passando por Vila do Príncipe, atual Serro era a principal ligação do Arraial com o resto do Estado. Mesmo sendo a principal estrada ela não passava de uma “picada”, como afirmou Saint-Hilaire:

 

(...) segui a estrada real que vai de Vila Rica a Tejuco; mas, apesar do nome pomposo que tem esta estrada, muito menos freqüentada que a do Rio de Janeiro a Vila Rica não é, em certos lugares, mais que uma picada tão estreita, que às vezes se tem dificuldade de seguir-lhe o traçado (SAINT-HILAIRE, 1974, p. 130).

 

A estrada era mantida pelos moradores que a utilizavam e pelas Câmaras Municipais, isentando o governo central de qualquer obrigação com a sua conservação segundo as leis vigentes da época. Em geral eram caminhos pouco habitados, pois o governo fazia inúmeras restrições para a ocupação das suas margens com a finalidade da sua conservação e, no caso de Diamantina, a ocupação era ainda mais restrita devido às leis vigentes dentro da demarcação.  

MARTINS (2003, p.154), afirma que as estradas:

 

(...) limitavam-se à limpeza de alguns trechos, desvio de banhados e, quanto ao mais, seguiam todas as sinuosidades do terreno, procurando sempre os vales e as gargantas. Eram caminhos simplesmente indicados na paisagem, peça freqüência do transito de pessoas e animais.

 

Essa estrada foi utilizada por viajantes e Tropeiros por mais de duzentos anos, até o inicio da Década de 1960 do século XX, só deixando de ser utilizada após a consolidação do transporte rodoviário, tornando obsoleto o serviço de carga dos Tropeiros à longas distancias de serem percorridas. Atualmente, é utilizado mais pelo turismo, por ser a rota principal da Estrada Real, e também pela população local. É um caminho que deverá sofrer nos próximos anos uma grande intervenção por parte do Governo Estadual,  segundo informações cedidas pela Prefeitura Municipal de Diamantina. A intervenção prevê uma pavimentação intertravada no trecho Serro – Diamantina melhorando o acesso da população dos núcleos urbanos existentes ao longo da estrada aos serviços oferecidos em Diamantina. A utilização desse tipo de pavimento está em conformidade com a proposta do turismo para a região, pois ele promove o acesso às regiões e mantém certa rusticidade, a qual a região poderia deixar de oferecer ao turista caso fosse usado o asfalto na pavimentação.

 

       

          Figura 01: Trecho da antiga estrada Diamantina – Serro, atual

          Estrada Real.

          Fonte: Alessandro Borsagli (2007)

 

A ferrovia

 

No final do século XIX com o crescente comércio em Diamantina, então chamada de “Empório do Norte”, começaram a ocorrer pressões para a construção de um ramal ferroviário que aumentasse o desenvolvimento da cidade, paralisado devido às precariedades dos poucos caminhos existentes.

A principal estrada, utilizada há mais de duzentos anos, carecia de manutenção freqüente por causa da sua grande utilização pelas tropas e viajantes, porém era visto pelo governo mineiro com indiferença, já que as leis vigentes na época ainda isentavam o governo do Estado de cuidar de sua manutenção e também era uma época em que o país estava tendo o seu interior cortado pelas Ferrovias prometendo progresso e desenvolvimento aos lugares mais longínquos. O engenheiro B. Jardim escreveu em 1917 um relatório sobre as condições da estrada na época:

A estrada de Diamantina a Serro foi construída nos tempos coloniais, quando o antigo Tijuco se achava dependente da Vila do Príncipe e o seu traçado com poucas modificações é até hoje o mesmo, defeituosíssimo, se não podendo ser modificado sem grandes dispêndios devido à topografia da zona e a constituição do solo. (Relatório sobre a realização de obras públicas. Secretaria da Agricultura — AS. Série AS, anexo. n.917. Arquivo Público Mineiro).

Em 1907, iniciou-se o serviço de Diligências que levavam até quatro passageiros de Diamantina a estação de Curralinho, atual Corinto. Porém, o serviço não deu certo, principalmente pela falta de manutenção das estradas e em 1910 foi extinto. Em 1914 o ramal ferroviário chega finalmente a Diamantina, inaugurando uma nova fase de comunicação com os centros mais importantes do Estado aumentando o escoamento das mercadorias de todo o norte de Minas e Alto Jequitinhonha, na qual Diamantina era o entreposto comercial. A cidade então se expande, consolidando-se no entorno da Estação Ferroviária.  Contudo, mesmo com o trem facilitando e agilizando todo o processo de comunicação com o restante do estado, o transporte de mercadorias através das tropas continuou persistindo até meados dos anos 1960. Após o asfaltamento da Rodovia BR-367 em 1968, o transporte ferroviário passou a ser pouco utilizado, sendo extinto em 1973 pela Rede Ferroviária Federal sob alegação de ser o serviço anti-econômico.

 

 

 

            

    Figura 02: Mapa da EFCB em 1954.       Figura 03: Antiga Estação Ferroviária de Diamantina.

    Fonte: I Centenário das Ferrovias          Fonte: Alessandro Borsagli (2009)

    Brasileiras. (IBGE, 1954)

 

 

            A figura 02 mostra o itinerário da Linha do Centro da EFCB no estado de Minas Gerais. Nele podemos ver o ramal de Diamantina, que era a linha final dessa linha adjacente. Daí pode-se concluir a importância que a cidade já representava na região, pelo fato de possuir uma linha férrea que a ligava ao ramal mais importante do Estado. 

 

A BR- 367 como eixo norteador do crescimento urbano

 

Em 1925, o governo iniciou a abertura de uma estrada de rodagem ligando Diamantina a Teófilo Otoni, porém teve sua obra paralisada diversas vezes por falta de verba. Então, os próprios moradores passaram a abrir e custear alguns trechos da estrada.

Na região de Diamantina o processo de desenvolvimento da rede viária foi extremamente lento devido ao relevo acidentado dificultando a abertura e a manutenção das estradas e a falta de interesse local para a abertura das mesmas, persistindo ainda o transporte de muares até meados da década de 1960. A BR-259/367 teve o seu asfaltamento concluído apenas em 1968. Em relação a isso, Martins afirma que:

 

(...) Apenas na década de 1960 as tropas de muares perderam a condição de principal meio de ligação entre a cidade, os distritos, os povoados e os diversos municípios do Vale do Jequitinhonha sob a influência comercial, político-administrativa e educacional de Diamantina. (...) a combinação de ferrovia e rodovias pavimentadas no entorno de Diamantina teria quebrado a inércia e o baixo dinamismo econômico associados ao antigo sistema de circulação (MARTINS, 2003, p.167)

 

Nos anos 50, iniciou-se a construção da rodovia BR-367 ligando Belo Horizonte a Diamantina, passando por Curvelo. Após a pavimentação do trecho entre Curvelo e Diamantina em 1968, a rodovia torna-se o principal acesso à cidade, antes feito via Conceição do Mato Dentro. Nos anos seguintes construiu-se uma variante desviando a estrada para evitar que o trafego de veículos, principalmente pesados, causasse transtornos para a população da recém ocupada parte baixa de Diamantina, onde passava a Rodovia original.

Nos últimos anos verifica-se uma ocupação sistemática das margens da rodovia, no sentido Belo Horizonte e na porção noroeste da cidade, em torno da variante construída para o desvio do trânsito pesado. Essa estrada tem como projeto alcançar a cidade de Salto da Divisa, mas atualmente está paralisada a pavimentação nos poucos trechos que faltam. Na figura 06 temos em destaque no centro da figura a BR-367 que, passando por Diamantina segue em direção a região nordeste do estado e serve de ligação entre as cidades do Alto Jequitinhonha e Diamantina.

 

Figura 04: BR-367 que liga Diamantina a região nordeste de Minas Gerais.

Fonte: DER - MG (2007)

 

Considerações Finais

 

Os caminhos foram e são de grande importância para o desenvolvimento de Diamantina, pois são peças chave para a ligação entre Diamantina e outras cidades da região. Além da sua importância para a consolidação da malha urbana da cidade nos diferentes períodos de crescimento urbano, os caminhos e as estradas delimitam o crescimento dessa malha, uma vez que as construções surgiram e surgem ao longo deles. Eles também foram determinantes para a consolidação da centralidade exercida por Diamantina na região norte e nordeste de Minas Gerais, do Século XVIII até meados dos anos 1950, quando a cidade começava a ter sua área de influência diminuída devido ao crescimento de Curvelo e Montes Claros, estas ligadas a Belo Horizonte por estradas de rodagem asfaltadas.

O crescimento urbano que se verifica em Diamantina atualmente se deve entre outros fatores, à facilidade de deslocamento da população para a cidade através de sua malha rodoviária. A expansão em torno da estrada é visível e a prova disso é o planejamento da prefeitura, norteando o crescimento urbano para estas áreas. 

 

 

REFERÊNCIAS

 

MARTINS, Marcos Lobato. As variáveis ambientais, as estradas regionais e o fluxo das tropas em Diamantina, MG: 1870-1930. Revista Brasileira de História. São Paulo. v. 26, n.51, p. 141-169. 2006.

 

SAINT-HILAIRE, A.; Viagem pelas Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. São Paulo : Editora Itatiaia, 1974.

 

SILVA TELLES, Augusto Carlos da. A ocupação do território e a trama urbana. Revista Barroco, Belo Horizonte, v. 10, 1978/79.

 

SOUZA, José Moreira de. Cidade: momentos e processos. Serro e Diamantina na formação do Norte Mineiro no século XIX. São Paulo: Marco Zero,1993.