INTRODUÇÃO

O presente trabalho surge de uma preocupação de nós educadoras em contribuir para um processo social em andamento, no sentido de esclarecer os limites e possibilidades para o avanço das práticas pedagógicas, tendo como tema a influência da televisão na vida do educando.

Procuramos formular nossa contribuição, partindo da realidade de que o educando tem a necessidade de estar inserido no contexto, sendo ele o catalisador ao longo de sua proposta educacional.

Constata-se, ao analisar o conflito entre os dedicados à comunicação e outros voltados para a educação algumas problemáticas. A primeira problemática coloca-se ainda na dificuldade muito grande de encontrar comunicadores e educadores que realmente consigam definir o que seria a educação e aprendizagem no caso da televisão.

Conforme Thompson, (1995: 122):

Há mormente dois níveis de preocupação mais recorrentes: de um  lado, a estética da imagem, um problema tipicamente  eletrônico e de arte no manejo da imagem, e, de outro lado, a absorção dela pelo espectador. Na visão de mercado, não interessa o consumidor crítico, mas alegremente compra. Embora esta caricatura possa estar exagerada, representa mais ou  menos o ambiente predominante."

A segunda problemática refere-se a possíveis conflitos entre o comunicador e o educador, supondo que ambos queiram educar, e não só treinar, o comunicador brande a imagem, o educador entra na luta com a palavra:

Coloca Pedro Demo (1998:26):

"Um vídeo didático, por exemplo, destinado a favorecer a aprendizagem, não pode apresentar-se apenas como imagem, mas precisa construir um ambiente de estudos, pesquisa, elaboração, com uso expressivo de manejo da palavra, textos, discursos, debates,, argumentações, etc. Corre logo o risco de se tornar longo e chato. De fato, as expectativas podem ser muito contraditórias: enquanto o comunicador espera que o espectador, tendo visto animadamente o filme, absorva a mensagem sem resistência maior, o educador espera que ocorra o fenômeno da aprendizagem, que implica necessariamente esforço reconstrutivo, pessoal e coletivo, marcado pela consciência crítica."

A terceira problemática seria a necessidade de informar com a de formar. Temos de um lado concreto a absorção e manejo da informação através da televisão que é um meio independente de qualquer contribuição financeira dos espectadores. De outro lado temos a educação, cujo o resultado mais comum é a facilitação, ou seja, promovendo absorções mecânicas de conteúdo.

Segundo Pedro Demo (1998:27):" a informação é necessária para a formação, mas é insumo. Todo processo formativo é, em primeiro lugar, autoformativo."

A metodologia está fundamentada na utilização da abordagem sistêmica para o estudo de uma realidade da televisão na vida do educando. O tema este nos permite colocar em evidência os diferentes processos de aprendizagem em prática pelos educadores e outros envolvidos também no sistema, mostrando as inter-relações de causa e efeito entre os diferentes elementos, tanto externos como internos, que constituem a sua estrutura.

Existem vários outros panoramas de abordagem deste tema que são possíveis e interessantes, mas a escolha que fizemos justifica-se pela preocupação em auxiliar o educador a tornar-se interessado em transformar seus alunos em telespectadores crítico-construtivos, onde tem como ponto de partida a escola. Enfim, esta abordagem mostra-se um potente instrumento de análise das práticas pedagógicas aplicadas na educação.

O educando e o processo televisivo

A televisão como meio de comunicação de massa tem sido pouco valorizada pelos educadores de uma forma geral, embora faça parte do cotidiano de todas as classes sociais brasileiras. A atratividade gerada por ela é conseqüência da linguagem clara que vem de encontro aos desejos, preferências, hábitos e atitudes que habitam tanto o mundo real quanto o imaginário de seus usuários.

Os programas de televisão fazem parte do conjunto de mediações culturais, inserindo o educando de forma indireta, em produções impregnadas de ambivalência que lhes confere um potencial de informação possibilitando uma parceria para a construção do conhecimento. Assim, os educandos, têm tanto a possibilidade de tornarem-se observadores críticos, quanto de tornarem-se vítimas acríticas que não conseguem determinar o que querem, o que podem e o que devem assistir.

Partindo desta realidade, precisa-se conscientizar o educador sobre a necessidade de se realizar, em sala de aula, atividades que propiciem uma leitura crítico-criativa dos programas de televisão. Para tanto, é necessário que o educador esteja preparado e consciente de seu papel de "provocador". Esta conscientização presume uma reflexão séria sobre os assuntos veiculados para que professores e alunos possam estabelecer uma relação com o que fazem, sentem ou pensam.

A partir disto, oportunizar-se-ão convenções para a mudança de pensamentos, atitudes e até hábitos para que se faça crescer, no educando, a habilidade de construir e defender pontos de vista, utilizando o método do "reaprender a aprender".

Segundo Valdemira Bidone de Azevedo e Souza (2003):

"A aprendizagem envolve representações culturalmente criadas e compartilhadas. Assim, hábitos e formas de comportamento sociais são construídos numa relação não só consigo mesmo, mas também com o mundo. A partir disto, entende-se que pretender mudanças significa ter a consciência de que esta está associada ao aspecto motivacional."

Esta compreensão pressupõe a objetivação de novas aprendizagens para que não deixemos que os programas de televisão em sala de aula se resumam a mera transmissão de informações com base no senso comum, mas que sirvam de estímulo à reflexão e à construção de novos conceitos e reconsideração das próprias idéias. É preciso criar situações de conflito social e até mesmo cognitivo para provocar a comparação entre as atitudes do seu grupo social e as veiculadas nas mensagens midiáticas.

Para tanto, torna-se indispensável a organização de um contexto emocional favorável a fim de que os programas de televisão possam ser aproveitados em sala de aula como propulsores da motivação, para que possam propiciar informações que associem imagens e sons atraentes, que sensibilizem para a reflexão e permitam que o educando aprenda.

Ninguém mais duvida de que a televisão é um veículo poderoso e em expansão. Dentro dos meios de comunicação social, a televisão perde somente para o rádio em termos de audiência. Não podemos negar a sua importância na vida do educando. Ela tornou-se para muitos o único canal de acesso às informações e ao conhecimento, por isso, a força que tem para mobilizar, encantar e informar as massas é inquestionável. Ela oportuniza diversão acessível para muitas famílias que, geográfica ou economicamente, estão isoladas. Mas, se não tomamos alguns cuidados, a televisão acaba sendo um veículo invasor que chega sem pedir licença e vai até onde não queremos.  Não se pode subestimar a força ideológica das grandes redes de televisão, como nos chama a atenção Martín Barbero (2000) :

 "A televisão não nos afeta só quando estamos olhando para ela.(..) A maior influência da televisão não se produz através do tempo material que lhe dedicamos, mas através do imaginário que ela gera e pelo qual estamos sendo penetrados. Apresenta-se aí um desafio para os educadores: como ajudar crianças e adolescentes a receberem criticamente o que a televisão veicula? Como ajudá-los a ter critérios para selecionar o que assistir?"

Neste contexto, cabe ao educador o papel de gerador de alguns dos "filtros" ou "óculos" pelos quais a criança, o adolescente e o jovem enxergará o mundo. Através destes "óculos" é que o educando distingue  o bom e o ruim em tudo o que recebe.

A sociedade moderna se caracteriza pela multiplicidade de linguagem, cuja fonte principal de informação é a mídia, sobretudo a televisiva. A televisão reorganiza a forma de expressão, costumes e hábitos de um povo. A educação não poderá ignorar essa realidade. A imagem e a palavra são fortes instrumentos de comunicação no mundo midiatizado e essa cultura reflete a satisfação do nosso tempo.

Segundo a LDB, a educação abrange todos os processos que se desenvolvem dentro e fora da escola. Partindo dessa assertiva, nada mais natural que usarmos os programas de televisão para auxiliar a construção de uma nova forma de linguagem, mais denotativa, pois a imagem já está ali, pronta, não tem muito que se imaginar. Isso não quer dizer que a televisão venha em prejuízo do educando. Todas as mensagens têm sua ideologia e é aí que entra o educador, tentando fazer do educando um observador, um pesquisador, para que não aceite tudo o que vê como uma verdade irrefutável. Isto permitirá que o educando aprenda sobre o mundo e sobre si mesmo.

John Dewey (apud Priscila Ramalho, 2003)1 pontua "o aprendizado se dá justamente quando os educandos são colocados diante de problemas reais."

A educação na visão deweyana (apud Priscila Ramalho, 2003) é "uma constante reconstrução da experiência, de forma a dar-lhe cada vez mais sentido e habilitar as novas gerações a responder aos desafios da sociedade.

A partir deste pensamento podemos inserir, na sala de aula, programas como as telenovelas e as minisséries que ultimamente vêm trazendo fatos do nosso cotidiano e da nossa história, trabalhando questões como violência, caráter, ética, preconceito e outros. Os programas jornalísticos também podem ser ótimos meios de trabalho, fazendo com que o educando perceba a diferença entre o "bom" jornalismo e o "sensacionalista", que cria reportagens para ganhar audiência.

O educando é um telespectador de muitas horas diárias, que somadas ao longo de seu processo educativo, indicará maior tempo de exposição à televisão do que às aulas e estudos.

Os conteúdos trabalhados pela escola são sistematicamente organizados, produzidos racional e metodologicamente que devem orientar condutas e atitudes mais adequadas com a sociedade, utilizando como principal instrumento desse procedimento a linguagem oral e escrita, identificando-se mais intensamente o texto escrito ou didático, que na maioria das vezes, é destituído de significado para aqueles aos quais se destinam.

Diferentemente da escola, a televisão mostra conteúdos "do momento", "da atualidade", diretamente unido e intervindo na vida do educando porque são acontecimentos do seu cotidiano, reproduzidos na sua frente, todos os dias.

Partindo do pressuposto de que aprendizagem é sempre a descoberta do novo e que ensino é comunicação, faz-se necessária a colaboração dos programas de televisão nos conteúdos escolares, pois aqueles estão intrinsecamente relacionados à vida do educando, enquanto o texto televisivo é, com certeza, algo amplamente difundido no contexto social.

Diante do exposto, há ainda que se considerar que alguns educadores temem ser substituídos, ou ainda, perder espaço para as novas tecnologias, sendo assim, mostram-se resistentes ao incorporar o uso da televisão na sala de aula. Com base nesta questão, a revista Nova Escola realizou uma enquete para saber qual a porcentagem de professores que teme perder espaço para as novas tecnologias e, para nossa satisfação, nota-se pelo resultado, que são poucos. A pergunta foi a seguinte: Você acredita que perdeu espaço na educação para as novas tecnologias? 83 % dos educadores responderam que não (3.809), contra 17% que responderam sim (796).

Antes para ser um bom professor, bastava saber transmitir conhecimentos e exercer autoridade em sala de aula. Hoje, sabe-se que este processo é bem mais complexo. O conhecimento já não é transmitido. A obrigação do educador é instigar o aluno, jogar os problemas para que ele mesmo os resolva e, assim, levá-lo a construir o seu próprio conhecimento.

Apesar das transformações ocorridas na educação, a figura do professor continua sendo o centro no processo educacional, está longe de ser descartável. A figura do professor é insuperável no sentido da relação que ele estabelece com o aluno.

Perante esta constatação citamos Paulo Freire (2003) que diz "ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo."

Considerações Finais

Na sociedade de classes, apesar das sérias limitações no espaço da escola pública, é possível aprimorar a ligação entre a televisão e a escola promovendo relações participativas para a formação de um saber crítico e articulado com as necessidades objetivas dos educandos.

As constatações feitas neste trabalho nos fizeram considerar que há uma significativa parcela de responsabilidade do educador em tornar a criança, o jovem e até o adulto, em um sujeito crítico, capaz de refletir sobre o que assiste na televisão.

Independentemente das críticas que são feitas à televisão, ela está aí. Diante dela o educando, de olhos atentos, com perguntas silenciosas, necessitando de alguém que o auxilie a perceber o que está implícito no conteúdo televisivo, o que ele pode ou não aproveitar para sua vida.

Não é sensato ignorar a presença desse poderoso instrumento midiático na educação. Deve-se, sim integrar as atividades escolares e passar a ver na televisão, não uma ameaça e sim, um recurso.

Partindo dessa ótica com este estudo pretendemos fundamentar a contribuição do fazer pedagógico, onde a escola torna-se um local social em que os participantes devam tomar conhecimento de sua identidade e de seu potencial crítico, que possibilite a expressão do conhecimento das camadas sociais presentes; práticas pedagógicas criadoras de um clima de troca cultural prazerosa propiciadora de um encontro real entre os indivíduos envolvidos no processo educativo.
    
BIBLIOGRAFIA
 

     THOMPSON, J. B. Ideologia e Cultura Moderna. Op. Cit., 1995.

     DEMO, Pedro. Questões para a Teleducação. Petrópolis, RJ : Vozes,   1941.

     PENTEADO, Heloísa Dupas. Televisão e escola: conflito ou cooperação?

     São Paulo: Cortez, 1991.

     SOUZA, Valdemira Bidone de Azevedo.  Site: [email protected]

     FREIRE, Paulo. Site: www.paulofreire.org

     Nova Escola. Site: www.novaescola.com.br

     Revista Nova Escola. Grandes Pensadores - John Dewey. São Paulo: Ed.     Abril. Janeiro/fevereiro, 2003.

     Revista Mundo Jovem. Site: www.mundojovem.pucrs.br


1 Fonte: Revista Nova Escola. Grandes Pensadores. John Dewey. São Paulo: Ed. Abril. Janeiro e fevereiro, 2003.