Mislene Aparecida Silva
Pedagoga pela UNIARARAS.
Psicopedagoga Clínica e Institucional pelo UNASP ? Campus de Engenheiro Coelho.
Docente na Educação Infantil na rede municipal da Prefeitura de Cosmópolis-SP.
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Resumo: Este artigo trata da importância do resgate da cultura infantil, que a muito tempo vem se perdendo, pela introdução dos brinquedos modernos que acabam até por manter distante o contato com outras crianças, e a falta de tempo dos pais para participar de brincadeiras onde se estabelece vínculos afetivos e contato com outras pessoas. Salienta como é relevante e possível a introdução deste resgate na sala de aula pelo professor de forma lúdica, favorecendo também a aprendizagem, pois podem ser introduzidas nas diferentes disciplinas.

Palavras-chave: cultura infantil, vínculos afetivos, lúdico, aprendizagem.

Abstract: This article discusses the importance of the rescue of children's culture, that long time it has been losing by the introduction of modern toys that end up to maintain distant the contact with other children, and the lack of time of the parents in participating in games where it establishes affective ties and contact with other people. Underlines how is relevant and possible the introduction of this rescue in the classroom by the teacher in a playful way, encouraging also the learning, as they may be introduced in different disciplines.

Keywords: children's culture, affective ties, leisure, learning

Introdução

Todos os processos e experiências vividas pelas crianças ajudarão a conhecerem o mundo que as rodeia. Por isso, a importância do resgate da cultura infantil, destacando as brincadeiras e jogos que alimentam e estimulam a imaginação, exploração do mundo e incentivo do faz-de-conta, o que chamamos de lúdico.
Buscamos considerar nesse estudo o desenvolvimento físico, emocional e sócio-emocional, além da história das brincadeiras e jogos infantis, que auxiliem em nossas práticas docentes mostrando um universo de possibilidades que o lúdico oferece dentro do processo de ensino e aprendizagem e no resgate de comportamentos e valores que ajudarão as crianças a desenvolverem a confiança, autonomia e a estabelecer vínculos muito importantes para o seu desenvolvimento global.
Meu objetivo com essa pesquisa é refletir sobre a cultura infantil e sua influência e uso de atividades lúdicas na escola, demonstrando a importância do resgate da mesma.

O que é cultura infantil

Hoje em dia, o próprio conceito de cultura, o falar sobre a mesma provoca discussões. Conh (2005, p.20) afirma que:

(...) a cultura não está nos artefatos nem nas frases, mas na simbologia e nas relações sociais que as conformam e lhes dão sentido. Assim, um texto, uma crença ou o valor da vida em família podem mudar, sem que isso signifique que a cultura mudou ou se corrompeu. A cultura continuará existindo enquanto consistir esse sistema simbólico. Nesse sentido, está sempre em formação e mudança.

Isso significa que há muito o que se fazer para chegar a uma escola onde se possa dizer que lá é cultivado valores e saberes produzidas através da cultura da infância e em uma sociedade onde a criança é encarada como um ser que possui uma história.
Wurning (2007, p.276), relata que:

O tempo da infância era vivido intensamente na rua. Era possível brincar o tempo todo na rua, palco de nossas brincadeiras e estripulias, (...) Fora da escola, vivenciei as maiores e melhores, experiências lúdicas. Não me lembro de minhas professoras perguntarem sobre as coisas que fazíamos e nem brincar com nossas brincadeiras. A escola era um espaço de seriedade e de aprender a ler e a escrever, não havia tempo para as brincadeiras, com exceção dos 15 minutos do recreio. (...)

Como educadores nosso objetivo é formar seres criativos e críticos, por isso a relevância do enriquecimento do cotidiano infantil com brinquedos e brincadeiras indispensáveis para a criação de situações imaginárias.
Ao brincar, a criança se movimenta; explora objetos; comunica-se; se expressa, buscando assim a construção do seu conhecimento e socialização.
De acordo com Coutinho:

As manifestações infantis são provenientes de uma cultura própria das crianças. Suas expressões, nas variadas linguagens, decorrem da relação com a cultura que as cerca, ou seja, com os bens culturais que a sociedade disponibiliza para elas. A representação de cenas do cotidiano pelas crianças expressando conhecimentos produzidos socialmente são reelaborados pelas mesmas em suas vivências, elas recriam situações já presenciadas e criam, assim, uma cultura infantil, pois, como afirmam Sarmento e Pinto: "As culturas infantis não nascem no universo simbólico exclusivo da infância, este universo não é fechado - pelo contrário, é, mais do que qualquer outro, extremamente permeável - nem lhes é alheia a reflexibilidade social global. (COUTINHO, 2002, p. 99)

Para Sarmento (1997) a cultura da infância exprime a cultura da sociedade onde está inserida. Na brincadeira a criança transforma e amplia os conhecimentos previamente adquiridos. No entanto, a forma como ela amplia esse conhecimento é muito diversificada, pois depende de experiências e possibilidades. A brincadeira é, sem dúvida, uma das principais atividades da infância. Durante as brincadeiras elas podem ser muito mais do que são, expressando as diferentes dimensões humanas, tornando-se crianças a sua moda.
Embora a história da cultura infantil seja tão antiga quanto a própria infância, vemos neste estudo que a escola é um lugar de socialização, estímulo a criação e desenvolvimento de potencialidades, buscando compreender fatores que possam contribuir para a organização do sistema educacional e atuações pedagógicas capazes de intervir nos diferentes períodos do desenvolvimento da criança.
Destaca-se, portanto, em minhas observações, os jogos e brincadeiras como atividades que exercem maior influência no desenvolvimento das funções psicológica superiores e da motricidade da criança pré-escolar.
Através dessas atividades, formam-se os conhecimentos, hábitos e qualidades psíquicas necessários para a realização das diversas atividades humanas. A educação infantil, como se tem visto, trabalha a escrita, os números, inserindo-os nos elementos da cultura como o carnaval, futebol, lendas, contos e diversas brincadeiras oferecidas pelo folclore infantil. Também se insere no contexto escolar, a cultura retratada por pintores como Portinari.
Para Cottle (1975, p.150) "o jogo é um dos primeiros passos da evolução pessoal e social. É um passo de formação e de entrar em contacto com um mundo aparentemente de infinitas possibilidades."
O jogo infantil é um processo espontâneo, instintivo, onde se procura alcançar plenitude e perfeição, e onde se fortalece o organismo, adquiri-se idéias e se racionaliza como ser social. Possibilitando o estímulo e reconhecimento de sua sensibilidade, modelando seu caráter e sentimentos. Através do jogo e recreação, a criança aprende a agir como ser social, a cooperar, a competir, a se submeter e a valorizar as regras sociais existentes.
A educação do pré-escolar é o primeiro e decisivo passo para se atingir a continuidade no ensino. Sua personalidade começa a consolidar-se; o auto-controle e a segurança interna começam a firmar-se, por isso, a importância do cuidado que deve ser tomado pelos educadores para desenvolverem, personalidades ajustadas e equilibradas.
Na pesquisa de Agostinho (2003), podemos observar que:

[...] as crianças durante as brincadeiras davam outros sentidos e significados aos objetos, interagindo com eles de outro jeito, fugindo ao convencionalmente colocado, mas em outras ocasiões ou num momento seguinte utilizavam um objeto de forma real, demonstrando que a criança não se comporta de forma puramente simbólica no brinquedo. Assim quando brincam, as crianças repetem e também inovam as ações esperadas pelos adultos. Nessa sua inovação, nesse seu outro jeito de se apropriar dos objetos, por vezes, confrontam-se com a lógica adulta. (AGOSTINHO, 2003, p.80)

As crianças em suas brincadeiras atribuem outros sentidos e significados aos objetos, recriando o mundo, o que leva muitas vezes o adulto, entendendo isso como um ato desordenado,a impossibilitá-la de manifestar sua espontaneidade, criatividade e liberdade.
Na infância faz-se necessário guiar as crianças com cautela, com explicações condizentes com sua idade, pois nesta fase, são ávidas para explorar, experimentar, colecionar, perguntar, aprendem depressa e desejam exibir suas habilidades.
A Declaração dos Direitos da Criança nos deixa claro que "a criança deve ter plena oportunidade para brincar e para se dedicar as atividades recreativas, que devem ser orientadas para os mesmos objetivos da educação; a sociedade e as autoridades públicas deverão esforçar-se para promover o gozo destes direitos."
A criança passa grande parte do seu tempo brincando, em atividades espontâneas, onde seu esquema motor é acionado, suas emoções afloram, sua socialização e integração com outros é solicitada, vivem situações de simbolismo e abstração, estimulando assim seu desenvolvimento intelectual, cognitivo, social e psicomotor.
Piaget nos assegura que a natureza livre do jogo simbólico tem um valor essencialmente funcional e não é uma simples diversão. E também classifica os jogos em três categorias:


- Jogo de Exercício: onde o objetivo é exercitar a função de si;
-Jogo Simbólico: onde o indivíduo coloca significado independente das características do objeto, funcionando em esquemas de assimilação;
- Jogo de Regras: onde está implícita uma relação inter individual.

O Piaget (1989) ainda salienta a quarta modalidade, que é o jogo de construção, onde a criança cria algo.
Rousseau e Pestalozzi salientam a importância dos jogos como instrumento formativo, pois além de exercitar o corpo, os sentidos e as aptidões, os jogos preparam a criança para a vida em comum e para as relações sociais.
Segundo Froebel, jogos e brinquedos fazem com que a criança adquira a primeira representação do mundo, a importância das relações sociais e desenvolve o senso de iniciativa e auxílio mútuo.
Para Friedmann (1996) a criança pode se expressar através do jogo, descarregar energias e agressividade, interagir com outras crianças, desenvolver e aprender.
Cottle (1975) acredita que o jogo é um dos primeiros passos da evolução pessoal e social. É um passo de formação e de entrar em contato com o mundo aparentemente de infinitas possibilidades.
Jacquim (1963) defende o jogo como facilitador tanto no progresso da personalidade integral da criança, como no progresso de cada uma de suas funções psicológicas, intelectuais e morais.
Para Piaget (1998), os jogos implicam significados, pois é no faz-de-conta que um objeto qualquer é usado como símbolo para representar situações não percebidas no momento.
No entanto, Vigotsky (1984) fundamenta o jogo como facilitador da ação, estimulador da curiosidade propiciando à criança a auto-confiança e iniciativa, desenvolvimento da linguagem, do pensamento e da concentração.
Muitos pesquisadores defendem a importância do jogo e da brincadeira, pois, propiciam o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, ao conhecimento das potencialidades corporais, afetivas, emocionais, estéticas e éticas, contribuindo para a formação de crianças felizes e saudáveis.
 
O uso de jogos em sala de aula

Na escola temos uma grande diversidade, tanto de alunos quanto de professores cada qual com seus objetivos, projetos, conhecimentos e interesses. E é assim, em meio a essa diversidade que a escola tem que funcionar.
Se quisermos obter resultados positivos no processo de aprendizagem, precisamos construir, para cada aluno e, especialmente para aqueles que possuem dificuldades de aprendizagem, um novo olhar... uma busca do que esse aluno pode aprender e realizar no contexto do que é ensinado. Esse olhar de crédito e acolhimento pode transformar as práticas de ensino e as respostas de aprendizagem.
A utilização do jogo em sala de aula tem função lúdica e pedagógica permitindo brincar e ensinar ao mesmo tempo. O jogo possibilita a consecução de objetivos, a introdução e a fixação de conteúdos já trabalhados, bem como a descoberta e a fixação de conceitos que serão introduzidos ou reforçados, possibilitando o desenvolvimento do raciocínio e a utilização de diferentes estratégias, entre outras possibilidades.
Através dos jogos e brincadeiras, não se permite somente o desenvolvimento da leitura, escrita e outras disciplinas, mas também possibilitam o saber trabalhar em grupo, a autonomia, a obedecerem regras, respeito ao outro, controle de emoções e cooperação.Seguindo as regras tanto dos jogos como das brincadeiras, o grupo pode modificar a situação apresentada, e transformar a oposição (tanto entre alunos como entre professores) em cooperação.
É nessa diferença de tempo que ambos podem ajudar. São atividades que fogem do convencional, são diferentes e podem ser praticados por toda a classe, garantindo a realização das capacidades individuais e, ao mesmo tempo, propondo desafios e incentivos capazes de prender a atenção de cada aluno.
Os jogos e brincadeiras permitem uma investigação bem precisa sobre hipóteses que o aluno já tem a respeito das disciplinas trabalhadas na sala de aula. Com o resultado dessa investigação, avaliação é que cada professor deve adaptar os jogos em termos de conteúdo que está sendo estudado ou dos objetivos a serem atingidos. Essas adaptações asseguram diferentes níveis e etapas de ensino.
Portanto, acredito que o uso dessas estratégias seja prazerosa não somente para quem está aprendendo, mas curiosamente, também para quem os confecciona. Quanto mais jogos e brincadeiras vão sendo elaborados, mais idéias vão surgindo. Como docentes, podemos aprender e nos aprimorar sobre todas as hipóteses apresentadas e desenvolvidas pelos alunos, e viabilizando outras formas de mediar essa aquisição. Essa habilidade e oportunidade de entender o processo de crescimento e construção pelos alunos são muito produtivas para a nossa prática. Seremos instigados e desafiados a criar, aumentando, ao mesmo tempo, nossa capacidade cognitiva e pedagógica.
É bem trabalhoso, mas sem dúvida, enriquecedor, o envolvimento do professor com os alunos, individualmente, nos grupos e nas atividades que envolvem jogos e brincadeiras. Tal atitude demonstra uma vontade bastante positiva de querer ensinar a todos e, ainda, de acreditar que todos podem aprender. Mais do que isso, construindo jogos e brincadeiras, jogando e brincando,vamos assumindo de forma criativa e construtiva nosso trabalho, nos envolvendo afetiva e prazerosamente com nossos alunos.

Metodologia

Esta pesquisa está classificada nos critérios de pesquisa bibliográfica para o embasamento teórico.
Partindo da pesquisa realizada, os dados foram analisados a partir de leitura crítica e redação dialógica a partir dos autores apresentados.

Considerações finais

Concluo essa pesquisa acreditando que os jogos e as brincadeiras podem em muito ajudar nas práticas pedagógicas, pois contribui para a aprendizagem do nosso grande repertório de valores culturais, bem como: lendas, mitos, contos, memórias populares e etc.
Dentro desse contexto, os momentos de jogo e de brincadeira devem se constituir em atividades permanentes nas quais as crianças poderão estar em contato também com temas relacionados ao mundo social e natural. O professor poderá ensinar às crianças jogos e brincadeiras de outras épocas, propondo pesquisas junto aos familiares e outras pessoas da comunidade.
Para a criança é interessante conhecer as regras das brincadeiras de outros tempos, observar o que mudou em relação às regras atuais, saber do que eram feitos os brinquedos, etc.
Estas são situações significativas que o professor deve propor para as crianças, para que se sintam confiantes para exporem suas idéias, hipóteses e opiniões. Elas devem sentir-se acolhidas de maneira a avançar seus conhecimentos por meio de situações desafiadores que lhes proporcionam prazer e satisfação.
Além da prazerosa ajuda que os jogos e brincadeiras pode nos proporcionar dentro da sala de aula, estaremos contribuindo para que essa cultura não caia no esquecimento.

Referências bibliográficas

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