Thiago Vinicius Pinto Santos

A INCIDÊNCIA DO ICMS SOBRE O SOFTWARE NO COMÉRCIO ELETRÔNICO DIRETO: a transmissão de dados como meio de circulação de mercadorias. 

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Davi Niemann Ottoni

 RESUMO

 Esta monografia realizou uma análise sobre a tributação dos softwares comercializados pela rede mundial de computadores e disponibilizados por meio de transferência de dados. Foi utilizado o método qualitativo, baseado na dogmática tributária brasileira, no CTN, na lei complementar 87/96, na Constituição da República. Seu objetivo foi demonstrar que o conceito de mercadoria é elástico e sua definição não esta limitada a ideia de bens corpóreos, tendo em vista que as mudanças sociais e econômicas alteram o significado de determinados termos e a interpretação da própria norma. A partir de tal abordagem é examinado os conceitos basilares do aspecto material do ICMS, para identificar sua incidência no âmbito do comércio eletrônico direto, tendo em vista a comercialização de mercadorias virtuais por meio eletrônico. É realizada uma distinção entre o software por encomenda e software padronizado, sendo este ultimo o objeto de análise desse trabalho. Ademais, é ainda apontada a discussão da ADI 1945 pelo Supremo Tribunal Federal que vem demonstrando que, por maioria dos votos, o conceito de mercadoria deve ser interpretado de acordo com a evolução social.

Palavras-chave: ICMS. Comércio Eletrônico. Transferência de dados. ADI 1945. Mercadoria virtual. 

 ABSTRACT

This end-of-studies paper analyses the taxation of software products which are commercialized and made available on the Web environment by means of dada transfer. It uses a qualitative research method based on the Brazilian dogmatic tax system, the Brazilian National Tributary Code, the supplementary law 87/96, and the Constitution of Brazil. It aims at demonstrating that the concept of goods is elastic and its definition is not limited to the idea of corporeal goods, considering the fact that social and economic change alters the meaning of certain terms and the interpretation of the norm. Based on this approach, the fundamental concepts of the material aspect of the ICMS taxation were examined in order to identify how it applies to direct electronic trade. A distinction is made between custom software and commercial off-the-shelf software, the latter of which is studied in this paper. Furthermore, it points out the debate concerning the Supreme Court’s ADI 1945, which has demonstrated by a majority of votes that the concept of goods should be interpreted according to social evolution.

Keywords: ICMS. electronic trade,  Data Transfer,  ADI 1945, virtual goods

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho parte da análise da tributação sobre bens digitais, levada a cabo pela atual discussão sobre a incidência do ICMS na transferência de dados, via internet.

O objetivo do presente trabalho é contribuir na análise de um tema que envolve conceitos tradicionais do aspecto material do ICMS, como o de operações, circulação e mercadoria, realizando apontamentos sobre a tributação de programas de computadores, denominados softwares, via transferência de dado no comércio eletrônico direto.

Doravante, objetiva-se ainda demonstrar que a mudança nos hábitos dos consumidores, que abandonam cada vez mais o modo tradicional de aquisição de bens, em prol da aquisição virtual, cria o risco de esvaziamento da maior forma de arrecadação de recursos do estado.

Esse fato vem ocorrendo com a inovação dos meios de comunicação, que atualmente dispõem ao usuário-consumidor uma grande ferramenta de disseminação de informações e transferência de dados, a internet.

Com o advento desta nova concepção de aquisição de bens, delimitando a discussão no que tange o comércio eletrônico direto e a abrangência do conceito de mercadoria ao programa de computador, esse trabalho busca contribuir na solução do problema envolto a incidência do ICMS sobre os softwares.

Assim, nos capítulos seguintes será demonstrada a necessidade de uma releitura do conceito de mercadoria para fins de incidência do ICMS na venda de programas de computador no âmbito virtual.

2 A LEI DO SOFTWARE

A Lei 9.609 sancionada em 19 de fevereiro de 1998, mais conhecida como Lei do software, é a norma especifica que dispõe sobre a definição de programa de computador no ordenamento jurídico brasileiro.

Para fins ilustrativos cite-se o art. 1º da referida lei:

Art. 1º.Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instrumento em linguagem natural ou codificada, ou contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento de informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados. (BRASIL, 1998).

A Lei do software juntamente com a lei 9.610 de 1998, foi responsável pela disposição da natureza jurídica dos programas de computador, inferindo que estes são bens móveis, portanto por definição legal, tendo em vista o tratamento de direito autoral dado ao software por ambas as leis.

Mesmo com essa disposição expressa pela lei do software, nota-se uma preocupação da doutrina em estabelecer a natureza jurídica do programa de computador, tendo em vista a discussão sobre a tributação desse produto, que será abordada em um capítulo a parte nesse trabalho.

Doravante, conforme deste tratamento jurídico como direito autoral, fica claro a indicação de que o software é um bem móvel, de acordo redação do art. 3º da Lei 6.910/98 que preceitua que: “os direitos autorais reputam-se, para os efeitos legais, bens móveis.” (BRASIL, 1998, p.1209, grifo nosso).

Diante de tais referencias a Lei do software, cuidou de regular ainda a comercialização desse produto, que denominamos programa de computador, dispondo que:

Art.3º. Os atos e contratos de licença de direitos de comercialização referentes a programas de computador de origem externa deverão fixar, quanto aos tributos e encargos exigíveis, a responsabilidade pelos respectivos pagamentos e estabelecerão a remuneração do titular dos direitos de programa de computador residente ou domiciliado no exterior. (BRASIL, 1998, grifo nosso)

Dessa forma, nesse primeiro contato do software com o ordenamento jurídico brasileiro, fica demonstrada a importância do tratamento legal dado a tal produto, tendo em vista a sua potencial comercialização, tanto no comércio tradicional quanto no comércio eletrônico, este último proveniente da evolução da rede mundial de computadores.

Mas cabe ainda uma discussão mais minuciosa sobre esse produto, uma vez que os entes federativos vislumbram sua tributação, tendo em vista a capacidade contributiva encontrada na comercialização do software.

3 COMÉRCIO ELETRÔNICO

            A evolução da internet[1] gerou grandes avanços e modificações no modo de circulação de bens, através da rede mundial de computadores, tendo em vista a comodidade e, a mudança de hábito dos consumidores que cada vez mais utilizam desse meio, onde o contato entre vendedor e comprador se torna virtual, e a aquisição de bens ocorre mediante aceitação do consumidor através de um clique.

            Segundo ensina Lanari “a expressão comércio eletrônico é utilizada para se referir à utilização combinada e otimizada das novas tecnologias de comunicação disponível, principalmente as redes de computadores [...].” (LANARI, 2005, p. 9).          A tempo que, esse novo modo de comercialização de bens, se tornou uma constante no âmbito comercial. Esse fato vem ocorrendo devido o crescimento desta rede mundial de computadores denominada internet.

            O e-commerce[2], também chamado de comércio eletrônico, possibilita a circulação de bens com a mediação da internet, seja de modo convencional, pelo comércio eletrônico indireto em que ocorre a entrega do bem físico ao comprador, seja de modo virtual, pelo comércio eletrônico direto onde não há entrega do bem físico, mas sim a transferência de um bem via download[3].

Nesses termos, como ensina Guilherme Cezaroti, o comércio eletrônico é a contraposição do comércio tradicional, pois o primeiro exclui-se das operações de vendas de mercadorias contratadas presencialmente entre vendedor e consumidor, tendo em vista que, no comércio eletrônico as relações jurídicas estabelecidas entre vendedor e consumidor envolvem a utilização de meios eletrônicos, e no comércio tradicional o que prevalece é exatamente o contato físico, presencial entre as partes para a ocorrência da operação de compra e venda. (CEZAROTI, 2005).

Versando também sobre o tema, Greco (2000) conceitua que termo comércio eletrônico tem dois significados, sendo um relacionado ao seu objeto, no que diz respeito à atividade de intermediação mercantil que tem como objetivo bens corpóreos, e outro, que está relacionado com o comércio de bens corpóreos ou não, por meios eletrônicos, como é o caso das transferências de dados.

Assim, “como podemos verificar as definições são amplas e incluem forma de transação nas quais as partes interagem eletronicamente, em vez de fazê-lo de modo tradicional.” (CEZAROTI, 2005, p. 29).

Dentro desta perceptiva de existência de uma nova e crescente modalidade comercial, há a necessidade de caracterização jurídica do comércio eletrônico para fins de aplicação das normas.

Nesse sentido, Adelmo da Silva Emerenciano citado por Cezaroti (2005, p. 29) ensina que “o aspecto fundamental para caracterização jurídica do comércio eletrônico é o transporte das mensagens entre fornecedor e consumidor por meio de elétrons”.

De acordo com as diversas definições verificadas, considerando a ocorrência de transação mercantil por meio de elétrons[4] como forma fundamental de caracterização do comércio eletrônico. Pode-se considerar que a internet é o meio mais conhecido de disseminação desse comércio eletrônico que deve ser regulado amplamente pelo direito.

Doravante, ao abordar sobre a aplicação do direito no comércio eletrônico, mais especificamente ao tratar de normas tributárias, Flavia Lanari afirma que:

 

Quando a internet é usada apenas como (mais) um meio de contato entre vendedor e o comprador para promoção, oferta e, mesmo, aceitação de produtos e serviços que são então despachados de modo convencional e recebidos em formato tangível o negócio não discrepa das tradicionais vendas a distância, [...] as facilidades proporcionadas pela internet, nesse caso, não impedem ou dificultam a aplicação das legislações tributárias atualmente em vigor, [...] o mesmo não pode ser dito do comércio eletrônico direto, em que todo negócio é realizado pela Rede, do contrato inicial até o fornecimento do produto. Para essa categoria de comércio, as normas tributárias, criadas e desenvolvidas para um mundo de circulação e consumo de bens tangíveis [...] afiguram-se claramente inadequadas. (LANARI, 2005, p. 168-169).

 

Por tanto, “em tema de comércio eletrônico direto há evidente e premente necessidade de adaptação dos sistemas tributários às exigências da sociedade informacional e a realidade da nova economia.” (LANARI, 2005, p. 171. grifo nosso).

Ainda, segundo André Portela:

 

[...] o advento das novas tecnologias da informação, por exemplo, e aí incluídos a internet, o comércio eletrônico, bem como o movimento de digitalização de bens subjacentes àqueles, terminou por instabilizar entendimentos doutrinários e jurisprudenciais considerados tradicionais acerca do Direito e da própria realidade objeto de incidência da norma tributária. (PORTELA, 2011, p. 244, grifo nosso).

 

OBS: VER RESTANTE DO ARTIGO NO ARQUIVO A SER BAIXADO VIA DOWLOAD COM O TRABALHO COMPLETO.

Att,
Thiago Santos
OAB/MG 146.659

 REFERÊNCIAS

ATALIBA, Geraldo; GIARDINO, Cleber. Núcleo da definição constitucional do ICM. Revista de Direito Tributário. 7 ed. São Paulo, v. 25-26, 2004.

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[1]internet: rede mundial de computadores.

[2]e-commerce: é a compra e venda de mercadorias ou serviços por meio da internet.

[3]download: mecanismo utilizado para transferência de dados provenientes de um servidor para outro, ou para um dispositivo de armazenamento

[4] elétrons: carga elétrica. São responsáveis pela corrente elétrica.

[5] revolução tecnológica: no contexto do tema abordado, refere-se à evolução rede mundial de computadores que proporciona uma nova realidade, criada para um mundo virtual.

[6] Ciberespaço: mundo virtual, utilizado para transferir dados. Rede mundial de computadores.

[7] compact-disc: disco de armazenamento, CD-ROM.

[8] cibernético: mundo virtual.