A inacabável polêmica da Lei Seca: Afinal, o Agente de Trânsito tem ou não poder para caracterizar, sem o uso de bafômetro, ou exame de sangue, as sanções judiciais ou administrativas?

Por TALES DIEGO DE MENEZES, Acadêmico e estagiário de Direito. Atualmente cursando o 6º (sexto) período do Curso de Direito da Universidade de Fortaleza – UNIFOR, no Estado do Ceará.

http://lattes.cnpq.br/3735246600407843

(Currículo LATTES)

Diferente dos outros artigos já escritos por mim, este possui condão tão somente de tecer breves comentários à inacabável polêmica que a Lei Seca deixa transparecer.

Acredito que, como eu, os leitores devem estar cansados de clicar em artigos – ou colunas – que falem da Lei Seca, mas que, a fundo, ainda deixam dúvidas quanto às questões mais interessantes. Por exemplo: Recusando-me ao uso do bafômetro, automaticamente estarei infringindo a Lei, em seus liames administrativos? Ou então: Na blitz convencional, o agente de transito pode me obrigar a assinar auto de infração, se eu me recusar aos testes? E basta-o querer me impor à sanção administrativa, não sendo necessário qualquer outro tipo de abordagem?

Vê-se, de logo, que as dúvidas são as mais variadas possíveis. Há, pois, outras já bastante esclarecidas, como, por exemplo, a possibilidade da recusa do exame de bafômetro, ou do exame de sangue.

Apenas reiterando os detalhes dessa possibilidade de recusa, como já exaustivamente mencionado noutras ocasiões, não há qualquer obrigatoriedade nos exames em que o condutor tenha que dar seu corpo para a sua realização, visto que o ditame constitucional já esclarece que ninguém está obrigado a fazer prova contra si mesmo.

Na verdade, a nova lei, já em vigor, não obriga ninguém a produzir prova contra si próprio, tendo em vista que além do bafômetro e o exame de sangue, subsistem os demais meios de provas admitidos em direito para a eventual constatação da embriaguez, sendo, então, supostamente certo que a recusa de tais testes implica às sanções administrativas. Mas isso é certo mesmo? É essa a questão e a razão do presente artigo.

O art. 277 do Código de Trânsito Brasileiro trata dos meios probatórios que podem, eventualmente, conduzir à constatação da embriaguez ao volante. Outrossim, em razão da publicação da Lei 11.705/08, juntou-se ao precitado art. 277 um novo parágrafo – o § 2º -, onde expõe que:

A infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor.

À primeira vista, o que se pensa é: Que poder tem o agente trânsito!

É totalmente incabível dar tal liberdade e poder aos agentes de trânsito, sobretudo quando se trata de BRASIL. Não é desiderato meu criticar os competentes agentes de trânsitos, mas é completamente desarrazoado estipular tal condição a todos os agentes, dentro de todo território nacional.

Estamos, diga-se de passagem, totalmente a mercê de tais funcionários – e lembro: humanos. Ora, imagine você na condição de agente de trânsito numa cidade do interior do Ceará – meu Estado. Você prepara a blitz, para um veículo onde estão cinco jovens amigos. O condutor, respeitando devidamente seu claro direito constitucional de não realizar provar contra si mesmo, recusa ao teste de bafômetro – vale ressaltar, inclusive, que o exame de sangue quase nunca é lembrado pelo agente, em virtude da ausência de pessoa capaz para realizar tal procedimento. Você, sabendo detalhadamente do conteúdo da Lei, fará o auto de infração – pelo visto, a infração é a "recusa do teste" – e pedirá a assinatura do condutor.

Ele, o condutor, irá recusar, é evidente. Depois, você passar por situação financeira difícil, por que o salário é ruim, sua família também passa por difícil situação. Você sabe que se fizer medo ao condutor, ele poderá até oferecer alguma "grana". O que fará?

E outra, e se você não for com a cara do condutor? Aplicará mesmo assim o auto de infração? Sim! O agente tem total liberdade para aplicar o auto de infração para quem quiser, em outras palavras. As sanções administrativas não são "simples sanções administrativas". Resumem-se à cerca de R$ 1.000 (mil reais) de multa e mais 12 (doze) meses de suspensão do direito de dirigir.

Não há sentido aplicar sanção administrativa a quem se recusa a realizar o teste de bafômetro, visto que É INCONCEBÍVEL APLICAR SANÇÃO NESSAS CONDIÇÕES: O QUE ESTÁ CLARAMENTE AUTORIZADO POR UMA NORMA, NÃO PODE ESTAR PROIBIDO POR OUTRA (Teoria da Tipicidade Conglobante de Zaffaroni).

Exalto trecho de artigo publicado por Desembargador do Rio de Janeiro, Senhor BENEDICTO ABICAR:

Na hipótese, é ilegal, arbitrária e discriminatória, a forma de abordagem dos motoristas, por estar sendo violado o princípio da presunção da inocência. Ou seja, cidadão algum pode ter cerceado seu direito de exercer sua liberdade de locomoção, a menos que esteja cometendo flagrante delito, ou exista ordem judicial para sua privação do direito de ir e vir. (http://www.conjur.com.br/2009-jul-21/inconcebivel-abordagem-criterio-ver-motorista-bebado)

Noutras palavras, o que quer dizer o Eminente Desembargador, é que não pode ser punido o cidadão que simplesmente age de acordo com a sua Constituição Federal, apenas nos casos em que cometa algum flagrante delito.

Por exemplo, se eu bato meu carro num poste. Ao chegar no local, o agente observará se eu estou, ou não, embriagado. Sendo assim, tem total poder e liberdade o agente de indicar ou não o crime, no mínimo, administrativo.

Todavia, em seu habitual trabalho, numa blitz comum, não há no que se falar em auto de infração pela simples recusa do teste de bafômetro.

Inconcebível, sob o ponto de vista legal, são as medidas desmotivadas de abordagem, sem qualquer critério objetivo, mas, ao contrário, realizadas indiscriminadamente. Resta, ainda, destacar, que a fiscalização deve ser aplicada a todos que cometam infrações no trânsito, para, então, ser possível levantar suspeitas sobre motoristas alcoolizados, pois são muitos os que sóbrios são mais perigosos que alguns com pequena dosagem de álcool no sangue.

O objetivo de qualquer legislação não é punir, mas, sempre, disciplinar, educar e vedar a prática de atos danosos à sociedade. Agindo dentro da legalidade, sem suspeitas sobre fins políticos ou escusos de medidas fiscalizadoras, ter-se-á, com certeza, a preocupação dos motoristas em cumprirem as regras de trânsito, evitando a ingestão de bebidas alcoólicas ou ingerindo-as comedidamente, para não se sujeitarem aos transtornos policiais e judiciais.

Essa última frase do Desembargador traduz, de forma clara e evidente, o real objetivo da Lei aprovada e sancionada. Ela, ao ser utilizada pelas pessoas competentes, tem que respeitar as outras, sobretudo as normas constitucionais. O cumprimento de um possível direito, não pode, de forma alguma, ensejar sanção judicial, quiçá, administrativa.

Em suma, e ainda nesse diapasão, faz-se imprescindível que os agentes de trânsito tenham em mente que o bafômetro não é meio de prova irrefutável, sequer contundente.

O auto de infração, nos dias atuais, reflete, nada mais, nada menos, em uma nova "condição" dos agentes de trânsito, a qual pode ser utilizada da forma mais cruel e agressiva possível. E, lembro, quem fiscaliza os agentes?

Há pouco um grande amigo meu passou por situação semelhante. Teve seu carro parado em blitz e, seguindo preceito constitucional, recusou-se a realizar teste de bafômetro.

Sem pensar duas vezes, o agente realizou o auto de infração e, de forma bem visível, escreveu: "O CONDUTOR ESTÁ NITIDAMENTE EMBRIAGADO". É claro que o amigo não assinou, mas dias depois chegou multa de quase R$ 1.000 em sua casa.

Na hábil defesa, alegamos tudo, inclusive a grosseria do agente ao solicitar a documentação do meu amigo. Pasme, a defesa foi totalmente indeferida, sem qualquer fundamentação. Ao final, dizia que se o meu amigo pagasse sem apresentar novo recurso, teria 20% (vinte por cento) de desconto na multa. A defesa do tempo de suspensão (12 (doze) meses) foi aceita e não houve punição quanto a isso.

 Conclui-se, facilmente, que a intenção dos agentes, bem como dos que julgam as defesas, é simplesmente ganhar dinheiro, sem preocupar-se com a realidade dos fatos. Parece, ouso dizer, que existam, aqui ou ali, ordens superiores para que os agentes multem – façam o auto de infração – uma "vezinha ou outra".

Os 20% (vinte por cento) de desconto dão estimulo ao cidadão para que desista de buscar seus reais direitos. Ora, como já sabido que o brasileiro é "meio preguiçoso", o certo seria pagar antecipado e com desconto, assim as coisas se resolveriam facilmente. Mas não é assim!

Pelo menos, comigo não! E acredito que com você, que lê este artigo, também não!

Os agentes não podem, em nenhuma hipótese, IMAGINAR – como é o que ocorre na prática, infelizmente – que condutores que não tenham praticado qualquer infração ou delito no trânsito, estejam supostamente alcoolizados. A abordagem deve ocorrer TÃO SOMENTE quando constatada eventual prática ilícita.

Em suma, e sendo bem sucinto, ainda estamos à mercê do humor diário dos agentes de trânsitos.

Na verdade, e já concluindo, como sabemos que os agentes não serão substituídos, o que tem que ser feito é correr atrás do prejuízo, conforme ressalta, indiretamente, a essência da Lei. Assim, não passamos por eventuais constrangimentos, não gastamos com eventuais "favores" e, finalmente, por consequência, asseguramos que nossas carteiras - a de motorista e a de dinheiro - ficarão intactas.

É essa minha breve opinião sobre o tema.

A dica é: Vendo seus direitos infringidos, não pensem duas vezes e procurem o Judiciário. Haverá, certamente, boa justiça no final das contas. É melhor, sim, ficar anos no Judiciário, do que aceitar injustiça e malgrados de pessoas improbas.