A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA LEI DO JUIZ SEM FACE: SUPRESSÃO DE DIREITOS CONSTITUCIONAIS OU PROTEÇÃO DOS MAGISTRADOS?

José Mauro dos Santos Carvalho Filho e Renata da Silva Costa

Cleopas Isaías Santos

 

SUMÁRIO: Introdução, 1 Contexto historio da criação; 2 Crime organizado; 3 Cabimento e funcionamento do Julgamento do Juiz sem Face; 3.1 Algumas mudanças na organização dos tribunais; 4 Da Colisão de Direitos; 4.1 Juiz Natural; 4.2 Identificação física do juiz; 4.3 Publicidade das decisões; 4.4 Motivação das decisões judiciais; Conclusão; Referências

 

 

 

RESUMO

 

O presente paper visa elaborar uma pesquisa cientifica e crítica que abordará os elementos articuladores e fundamentais da criação do “Juiz sem face”, bem como suas falhas técnicas e jurídicas, as eventuais mudanças na organização da Justiça Criminal decorrentes da sua aplicação, além das teses de defesa de sua criação e de inconstitucionalidade da mesma, referindo-se deste modo a colisão jurídica decorrente da proteção dos magistrados ou de direitos constitucionalmente garantindo aos réus.

PALAVRAS CHAVE: Crime organizado, Juiz sem Face, Princípios.

 

Introdução

 

O ordenamento jurídico brasileiro é composto por uma série de microssistemas normativos, cada um voltado para disciplinar determinada seara de atuação social. Ao conjunto de normas impostas coercitivamente pelo Estado com a finalidade de manter a paz social, definindo crimes e impondo sanções ou medidas de segurança, denomina-se Direito Penal. (MANSUR, Saulo, 2007). Tal denominação já demonstra a importância e o cuidado que deve ter o Estado quando intervir em assuntos que versam sobre punibilidade e crimes, pois afetam a toda a sociedade e implicam em grandes consequências sociais.

A atuação da Justiça Criminal tem como principais autoridades o Delegado e o Juiz, cada um atuando em fases específicas do Processo Penal, com competências e particularidades distintas, sendo estes indispensáveis para o correto e completo comprimento do procedimento punitivo dos crimes. O avassalador aumento da brutalidade e frequência dos crimes de alta periculosidade, não só atinge a sociedade em relação aos cidadãos protegidos estatalmente, mas também a essas autoridades as quais o Estado conferiu poderes para proteger os demais cidadãos.

A mais recente tentativa de proteção de uma dessas autoridades, o Juiz, foi a criação da Lei 12.694/2012. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), atualmente, 150 juízes estão sob ameaça no Brasil. A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), porém, estima que este número possa ser o dobro. ( NEITSCH, Joana, 2012)

A referida lei versa sobre a criação do “Juiz sem Rosto” ou “Juiz sem Face” uma nova forma de proceder com o julgamento de crimes e uma tentativa de oferecer maior proteção aos magistrados. Esse novo mecanismo funciona com a criação de um grupo de juízes para sentenciar os julgamentos de crimes praticados por organizações criminosas, onde a formação dessa coligação será feita com o juiz do processo e mais outros dois escolhidos eletronicamente.

Grandes discussões acerca do assunto rodeiam o mundo jurídico: de um lado existem os que defendem a nova lei justamente por essa maior proteção conferida aos magistrados, além de ser mais uma arma contra as organizações criminosas, por outro turno, existem os que acastelam a opinião de que este instituto feriria gravemente direitos e princípios constitucionais dos réus como por exemplo os da publicidade e motivação das decisões .

O objetivo do presente trabalho será efetuar um estudo científico acerca deste polêmico assunto. Apesar de serem escassas as fontes de pesquisa, devido ser extremamente recente a imposição desta Lei, também será trago embasamento para a fundamentação de um posicionamento crítico, baseado no entendimento da aplicação e criação da Lei do Juiz sem Rosto.

Para tanto, serão utilizados os métodos descritivos e explicativos de pesquisa. Primeiramente utilizar-se-á o método descritivo por si mostrar indispensável para o estudo e conhecimento do texto normativo, devendo ser explicitados todos os elementos formadores da elaboração desta Lei e da própria lei em si. Após tal etapa, será utilizado o método explicativo, que será fundamentado através do exposto ao longo do texto e do entendimento dos autores do presente trabalho.

Inicialmente, este estudo versará sobre o contexto histórico do surgimento do método de julgamento denominado “Juiz sem Rosto”, buscando-se o contexto fático que ocasionou a necessidade de criação desse artifício, desde sua origem e passagem por outros países até a chegada no Brasil.

Em seguida, será abordado o tema “crime organizado” motivo ensejador dessa proteção aos magistrados. Posteriormente, será examinado as imposições feitas no texto normativo e suas consequências na organização da Justiça Criminal, como por exemplo as mudanças que poderão ocorrer na estruturação dos Tribunais.

A colisão de direitos dos magistrados com os dos réus dos processos será o próximo e principal tópico do trabalho, visto a importância constitucional do tema. Nesse ponto serão destacados os princípios que possivelmente poderão ser afetados com esse novo  regulamento.

Por fim, será dado o posicionamento crítico e o entendimento adquirido através da elaboração deste trabalho.

 

1 Contexto Histórico da Criação.

 

 Em meados de 1984, na Colômbia, foi organizado um atentado o Ministro da Justiça do país daquela época, que resultou na sua morte. Após tal fatalidade, em 1985, dez juízes da Suprema Corte colombiana foram igualmente executados, por ordem de outro grande chefe do crime organizado colombiano.

Matar juízes, policiais, militares e membros do Ministério Público Colombiano, tinha virado prática intimidatória usual da Colômbia exercida pelos chefes de organizações criminosas.

Dada tal situação, na Colômbia surgiu um recurso, estabelecido por lei, dos “juízes sem rosto”, ou seja, aquele que julgava o processo criminal sem ser identificado, salvo pelos órgãos de governo da Magistratura colombiana.

O sistema do “juiz sem rosto” na Colômbia, representou uma opção de emergência, necessária. O sistema era temporário e já foi abolido com o fim dos grandes cartéis e prisões e mortes dos membros do crime organizado daquele país.[1]

A figura do “juiz sem rosto” ou “juiz anônimo” já foi adotada além da Colômbia, em diversos outros países como Peru, México e Nicarágua com o objetivo de conferir, em situações de excepcional gravidade, segurança aos magistrados que atuam em processos envolvendo crime organizado e organizações criminosas de qualquer natureza. 

De outro turno, na Europa, a Itália se destacou no combate ao crime organizado, principalmente a partir de 1992, quando a denominada “operação mãos limpas” foi iniciada pelo promotor Antonio di Pietro, para combater a corrupção que então assolava o país, envolvendo em tráfico de influência e corrupção diversos líderes políticos, ex-chefes de governo e empresários poderosos que foram parar no banco dos réus. As investigações envolviam a máfia, colocando em risco a vida e a integridade corporal dos promotores, juízes e suas famílias, sendo adotada então, na época, figura assemelhada ao “juiz sem rosto” que, embora de contornos diferentes, preservava a identidade das autoridades judiciárias envolvidas nas investigações e julgamentos. (ANDREUCCI, Ricardo, 2012).

No Brasil, fatos como a morte da juíza Patrícia Acioli, em 2011, assassinada por vingança de réus, e o pedido de afastamento, motivado por ameaças, do juiz Paulo Augusto Moreira Lima, responsável pelo caso Cachoeira, contribuíram para a criação da Lei 12.694/2012 que dispõe sobre o processo e o julgamento colegiado em primeiro grau de jurisdição de crimes praticados por organizações criminosas.

 

2                    Crime Organizado.

 

Crime organizado é toda organização cujas atividades são destinadas a obter poder e lucro, transgredindo as leis formais das sociedades. O crime organizado assume três formas públicas no Brasil. Desta forma, existem os Comandos (Primeiro Comando da Capital, Comando Vermelho, Terceiro Comando); existem as Milícias Ilegais; e existem também as chamadas "Máfia do Colarinho Branco". [2]

Os Comandos são formados por quadrilhas que obtém o controle das rotas de tráfico de drogas de uma determinada região.

 As Milícias são grupos paramilitares, formados por policiais e ex-policiais civis e militares, bombeiros, vigilantes, agentes penitenciários e outros, em grande parte moradores das comunidades, que cobram taxas dos moradores por uma suposta proteção e repressão ao tráfico de drogas.

A máfia do colarinho branco é uma designação geral dada a várias quadrilhas formadas por autoridades legais, sem que necessariamente tenham ligação entre si. Geralmente incorrem em crime de tráfico de influência e lavagem de dinheiro.

O crime organizado é investigado pelas Delegacias de Repressão e Investigação ao Crime Organizado (DEIC - Polícia Civil), Polícia Federal e pela Abin.

 No entanto, ao que toca ao objeto do presente estudo, segundo o artigo 2º  da Lei 12.694/2012 considera-se organização criminosa :

“a associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional”

 

Como visto, primeiramente devendo-se recorrer ao Código Penal pra adequar a penalização do tipo normativo o caso concreto, para que deste modo haja a verificação de que se tal delito se encontra no requisito de pena máxima igual ou superior a 4 anos. Após isso deve-se verificar a “estrutura ordenada e a divisão de tarefas”.

De acordo com o artigo 3º do Decreto 5.015/2004 2, será de caráter transnacional o crime se for cometido em mais de um Estado, cometido num só Estado, mas uma parte substancial da sua preparação, planejamento, direção e controle tenha lugar em outro Estado, cometida num só Estado, mas envolva a participação de um grupo criminoso organizado que pratique atividades criminosas em mais de um Estado ou for cometida num só Estado, mas produza efeitos substanciais noutro Estado.[3]

 

3                    Cabimento e Funcionamento do Juiz sem Face.

 

Todas as informações sobre o cabimento e funcionamento do Juiz sem Face encontram se no artigo 1º da Lei 12692/2012. Esse método de julgamento pode ser aplicado em processos ou procedimentos que tenham por objeto crimes praticados por organizações criminosas, como aquelas acima citadas, podendo o juiz decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, mas especialmente para a decretação de prisão ou de medidas assecuratórias, concessão de liberdade provisória ou revogação de prisão, sentença, progressão ou regressão de regime de cumprimento de pena, concessão de liberdade condicional, transferência de preso para estabelecimento prisional de segurança máxima e inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado (RDD).

O colegiado será formado pelo juiz do processo e por 2 (dois) outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro grau de jurisdição.  A competência do colegiado limita-se ao ato para o qual foi convocado.  

 

3.1  Algumas mudanças na organização dos Tribunais.

 

 Em relação aos tribunais estaduais, estes precisarão se adequar a alguns aspectos previstos pela Lei 12.694/2012. Um deles é a exigência do sorteio eletrônico, que definirá os membros do colegiado de juízes para julgamentos do crime organizado. Cada Tribunal deverá portando, estudar uma forma de melhor exercitar esse procedimento.

A nova lei também autoriza os tribunais a reforçar a segurança dos seus prédios, com controle de acesso, identificação, instalação de câmeras e de detectores de metais. Deste modo, muitos Tribunais necessitarão fazer grandes investimentos na estruturação de seus prédios, que necessariamente acarretará em despesas para os cofres públicos.

De acordo com a nova lei também, a segurança dos magistrados que estejam sob ameaça deve ser feita pela Polícia Federal para os que trabalham na Justiça Federal e a Polícia Civil para os que trabalham na Justiça Estadual.  

Indispensável mencionar que tal exigência pode e muito prejudicar a vida da população como um todo, pois se está diante da possibilidade da retirada destes policias da rua, que fazem a proteção da população diariamente, para cuidar exclusivamente a segurança do Judiciário.

 Porém, esse problema poder ser resolvido com a contratação de policias especializadas para esse tipo de proteção, para que não houvesse uma mistura de competências e consequentemente uma deficiência de atuação em ambas das aéreas citadas.

 

4 Colisão de Princípios.

 

A Lei 12.694/2012, popular “Lei do Juiz Sem Face” busca por um garantir a segurança dos magistrados brasileiros, quando lhes confere o anonimato no julgamento de crimes praticados por organizações criminosas. Salutar ressaltar que esta lei não somente cria esse colegiado, como também aumenta a segurança pessoal de cada magistrado, garantindo assim um julgamento seguro e o agir do juiz sem qualquer possível interferência externa.

Por outro lado, encontram-se posicionamentos que afirmam que tal artifício supri garantias constitucionais, e na visão de Paulo Rebouças viola, inclusive, a Convenção Americana de Direitos Humanos. Ora, como pode o réu ver seus direitos suprimidos e ver sua expectativa de um julgamento transparente comprimida? Busca-se então, pela análise da supressão de direitos do réu em prol da segurança individual dos magistrados.

4.1 Juiz Natural

O princípio do juiz natural busca pela imparcialidade do juiz, e procura, portanto, assegurar ao acusado sua liberdade diante de possíveis desmandos dos detentores do poder. Encontra base legal no art. 5, LIII, que garante que ninguém será sentenciado senão pela autoridade competente, além disso garante que não se crie tribunais de exceção constituídos posteriormente à infração penal, e especificamente para julgá-la, caso da lei do juiz sem face quando assevera em seu art. 1:

“§ 1o  O juiz poderá instaurar o colegiado, indicando os motivos e as circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física em decisão fundamentada, da qual será dado conhecimento ao órgão correicional.”  

No sentido da constitucionalidade da lei 12.694/12, expõe Márcio Cavalcante que:

“Não há violação ao princípio do juiz natural, considerando que é ele quem convoca o colegiado, dele fazendo parte. Ressalte-se, ainda, que a composição do colegiado é feita mediante sorteio eletrônico (critério impessoal) que envolve apenas os magistrados com competência criminal, não havendo designações casuísticas dos julgadores. Em verdade, a previsão legal reforça uma das facetas da garantia do

juízo natural, que é a da certeza de um julgamento imparcial, o que somente é possível quando o magistrado encontra-se isento de pressões espúrias.” (CAVALCANTE, Márcio, 2012)

Ora, vê-se que durante o processo, buscou a lei manter a imparcialidade no julgamento quando o legislador optou pela composição do colegiado por meio de sorteio eletrônico, não infringindo  o princípio do juiz natural, garantindo a constitucionalidade da lei do juiz sem face.

4.2 Identidade Física do Juiz

Em verdade, não é considerado princípio constitucional, foi introduzido no ordenamento jurídico com a promulgação da Lei 11.719/08, e deu origem ao § 2 do art. 399, CPP que assinala que o juiz que presidiu a instrução deverá proferir sentença.

A crítica se dá, porque os juízes que irão compor o colegiado não presidem instrução e somente participarão limitadamente ao ato em que foram convocados. No entanto, no próprio entendimento do STJ é possível que afirmemos que sua aplicação depende do caso concreto, sendo esta, portanto, regra subsidiária.

Afirmar que os outros magistrados que irão compor o colegiado não conhecerão da causa é falacioso, visto que poderá o magistrado primeiro, passar suas impressões aos posteriores.

4.3 Publicidade das decisões

A publicidade age no sentido de garantir a imparcialidade do julgamento, além de evitar uma forma ostensiva de julgamento, os críticos entendem que de certa forma, esse princípio é atingido pela lei do juiz sem face quando esta dispõe:

“Art. 1.: Em processos ou procedimentos que tenham por objeto crimes praticados por organizações criminosas, o juiz poderá decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, especialmente:

§ 6.: As decisões dos colegiados, devidamente fundamentadas e firmadas, sem excecão, por todos os seus integrantes, serão publicadas sem referências a qualquer voto divergente de qualquer membro.”

Entende a doutrina que não é violado o princípio da publicidade, pois a decisão do colegiado deverá ser fundamentada, poderá então o réu impugnar, em instância superior, argumentos contidos naquela sentença. Se houver voto divergente daqueles que o sentenciaram, não há porquê o réu conhecê-lo, ora, somente irá o réu impugnar aqueles votos que o condenaram, devendo este conhecer de seus argumentos, argumentos estes que momento algum deixam de ser conferidos ao réu, garantindo-lhe, sobretudo, a ampla defesa. Na visão de Márcio Cavalcante:

“ Inexiste qualquer violação ao princípio da publicidade, tendo em vista que a decisão do colegiado será publicada. Ademais, o interesse social na proteção da independência do Poder Judiciário e da segurança dos magistrados recomenda o sigilo do voto, sendo neste caso, mínimo sacrifício à publicidade em prol da segurança dos juízes.” (CAVALCANTE, Márcio, 2012).

Ora, essa restrição é validada pela própria Carta Magna, quando em seus arts. 5, LX e 93, IX, dispõe sobre as motivações da violação deste princípio, entenda-se:

“ LX – a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;”

A lei 12.694/12 expõe também quando poderá a reunião ser sigilosa, faz isso com a finalidade de preservar a integridade física do juiz:

“Art. 1.: Em processos ou procedimentos que tenham por objeto crimes praticados por organizações criminosas, o juiz poderá decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, especialmente:

 §4.: As reuniões poderão ser sigilosas sempre que houver risco de que a publicidade resulte em prejuízo eficácia da decisão judicial.”

A lei consegue, então, sob o ponto de vista do princípio da publicidade, ser constitucional, na medida que a própria Lei Maior legitima sua supressão em prol do interesse social.

4.4 Motivação das decisões Judiciais.

 É uma garantia fundamental para o exercício do Estado Democrático de Direito, ele garante a lisura do processo, afastando qualquer vício ou qualquer interferência externa no convencimento do juiz, afasta também qualquer subjetividade que possa ser invocada pelo magistrado no exercício da sentença da causa. O princípio encontra reforco no art. 93, IX:

“Art. 93 - Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;”

O referido princípio é encontrado ao longo de todo o ordenamento, com o intuito de ressaltar sua manifesta inerência ao Estado Democrático de Direito:

“Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formam o convencimento.Art. 165. As sentenças e acórdãos serão proferidos com observância do disposto no art. 458; as demais decisões serão fundamentadas, ainda que de modo conciso.Art. 458. São requisitos essenciais da sentença:II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito.”

Nesse sentido, fazem-se preciosas as palavras do ilustre jurista Nelson Jorge Junior que assim assevera:

“a motivação dos atos jurisdicionais exigida pela Constituição acarreta a limitação dos poderes exercidos pelo magistrado, exigindo-se adequada aplicação do princípio da legalidade, demonstrando-se não ter aquele descumprido os direitos fundamentais, ou decidido contra a lei ou ter extrapolado de suas funções. Dessa forma tem o jurisdicionado assegurado a garantia de conhecer as razões que convenceram o juiz a julgar, cuja decisão, se correta, será aplicada em virtude da aplicação dos efeitos do princípio da coisa julgada. A motivação das decisões judiciais espelha, repercute a vereda do pensamento empregado pelo juiz para alcançar a conclusão apresentada para a solução do caso conflituoso e caso contenha erro será este prontamente verificado pelo conteúdo da motivação, podendo ser impugnada.” (JUNIOR, Nelson, 2012).

 

Ora, em qualquer momento deixa o réu de saber o porquê de sua condenação, podendo rechaçar qualquer argumento que tenha achado ser equívoco do juiz, já que estes não deixarão de serem publicados, o que somente não acontecerá é a publicação do voto divergente, atentando para o fato de que estaria sim atingido o princípio da motivação das decisões judiciais caso houvesse risco para o magistrado, porém não houvesse oportunidade pela formação do colegiado com o intuito de protegê-lo.

 

Conclusão

 

Diante do exposto, faz-se necessário afirmar que os autores da pesquisa, veêm pela constitucionalidade da Lei 12.694/12, a popular lei do juiz sem face. Apesar de parte da doutrina invocar garantias constitucionais (a publicidade, a motivação das decisões judiciais, a identidade física do juiz e o juiz natural) para dizer que a lei é inconstitucional, a própria parte da doutrina a favor do juiz sem face encontra argumentos nos princípios que questionam a constitucionalidade da lei.

Cabe aqui mencionar que nenhum princípio foi violado pela lei em questão, somente o da publicidade, que encontra aparato legal para que seja suprimido. O juiz sem face serve não somente para garantir a integridade física do magistrado, ou mesmo psíquica, afirmar isso seria analisar a questão superficialmente, não levando em conta o contexto social em que estamos envolvidos. Pede-se aqui pela análise do para-poder exercido por organizações criminosas no nosso país, para tanto, garantir as integridades física e psíquica do juiz será garantir a lisura do processo, a não interferência externa em qualquer fase do julgamento do réu. Claro que nenhum réu poderia ver seus direitos suprimidos de forma irresponsável, nesse sentido o legislador criou a lei de modo que esta não ‘atropelasse’ qualquer garantia constitucional.

Não há aqui total influência midiática na formação do legislador ou do judiciário quanto à interpretação ou criação da lei, percebe-se isso com a existência anterior do juiz sem face, na Colômbia, por exemplo, desde 1985, na Europa, desde 1992, ou seja, o legislador do ordenamento brasileiro não somente modernizou como garantiu o bom funcionamento do ordenamento brasileiro.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS:

CAVALCANTE, Márcio. Comentários à Lei 12.694/12: julgamento colegiado em crime praticado por organizacoes criminosas. Disponível em: <http://www.dizerodireito.com.br/2012/08/comentarios-lei-126942012-julgamento.html>. Acesso em: 4 nov. 2012;

Decreto 5015/2004. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5015.htm> Acesso em: 28.10.2012

Entenda o crime organizado. Disponível em: <http://www.domtotal.com/especiais/468> Acesso em: 28.10.2012

MAYA, André. Princípio da identidade física do juiz. Disponível em: <http://devidoprocessopenal.com.br/2011/08/12/principio-da-identidade-fisica-do-juiz/>. Acesso em: 5 nov. 2012;

NEITSCH, Joana. Lei que protege Juiz sofre críticas. Disponível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/vidapublica/justica-direito/conteudo.phtml?id=1289478> Acesso em: 15.10.2012

PACHECO, ELIANA. Princípios norteadores do proceso penal. Disponível em: <http://www.webartigos.com/artigos/principios-norteadores-do-direito-processo-penal/9154/>. Acesso em: 6 nov. 2012;

Pacto contra o crime organizado. Acesso em: <http://terramagazine.terra.com.br/semfronteiras/blog/2009/04/13/lula-mendes-e-temer-pacto-contra-o-crime-organizado-dos-juizes-sem-rosto-a-dantas/> Acesso em: 28.10.2012

PRUDENTE, Neemias. Lei do ‘juiz sem rosto’ viola garantias constitucionais. Disponível em: <http://infodireito.blogspot.com.br/2012/07/lei-do-juiz-sem-rosto-viola-garantias.html>. Acesso em: 6 nov. 2012;



[1]  Pacto contra o crime organizado. Acesso em: <http://terramagazine.terra.com.br/semfronteiras/blog/2009/04/13/lula-mendes-e-temer-pacto-contra-o-crime-organizado-dos-juizes-sem-rosto-a-dantas/> Acesso em: 28.10.2012

[2]  Entenda o crime organizado. Disponível em: <http://www.domtotal.com/especiais/468> Acesso em: 28.10.2012

[3]  Decreto 5015/2004. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5015.htm> Acesso em: 28.10.2012