A importância do Projeto Político-pedagógico como construção coletiva da identidade da escola.

Ângela Dutra

A participação é uma resposta a um dos desejos fundamentais do homem: o de ser respeitado. Todavia ela só se faz existente quando se está disposto em mudar o que realmente for necessário, torna-se um direito e um dever, assumindo a condição de sujeito e não de objeto. A co-responsabilidade é parceira deste processo e é através dele que os indivíduos têm o direito de expressar-se e lutarem por suas convicções, desde que seja respeitada a decisão coletiva. 

O termo participação é definido em situações em que o indivíduo contribui direta ou indiretamente para uma decisão política e pode-se afirmar que o conteúdo relevante desta relação está na descoberta de que o cerne da participação é a educação, se ela for compreendida como motivação para a construção do sujeito social.

Daí, a importância do planejamento participativo dentro da escola, caracterizado como o processo que se inicia pela tomada de consciência crítica e que evolui para o embate dos problemas já conscientes, sendo reconhecida a necessidade de organizar-se de modo competente para sanar problemas existentes no âmbito escolar.

A participação de todos os envolvidos no dia-a-dia da escola e nas decisões tomadas promove um planejamento no qual estejam inseridas as diversas visões da realidade escolar, possibilitando a presença do debate democrático, favorecendo a execução de ações através de compromissos construídos entre aqueles diretamente atingidos pelo planejamento. O agir participativo está focado no diálogo, na exposição constante dos interesses e no entendimento mútuo dos envolvidos e sempre que sentir a necessidade de mudanças, elas deverão ser assumidas coletivamente.

O planejamento participativo é o processo da organização do trabalho coletivo da escola. Entende-se por coletividade aquele realizado por um grupo de pessoas, dentre eles gestores, professores, coordenadores, alunos e funcionários. Cujo trabalho está pautado na ação conjunta desta equipe, em torno da função social da escola. A realização desta coletividade faz-se tarefa desafiadora que exige empenho, paciência e crença naquilo em que se deseja alcançar.

As escolas têm assumido um peso cada vez maior na concepção, planificação e realização de diversas atividades em distintos níveis de funcionamento. Com o progressivo entendimento destas instituições como organizações dotadas de autonomia, faz-se necessário uma ação coletiva para consolidar a melhoria da qualidade política, pedagógica e administrativa da escola. 

A construção do trabalho coletivo está rodeada de valores que extrapolam os muros da escola e envolvem a realidade como um todo, assim, o coletivo na escola deve reforçar o coletivo no contexto social. Uma das exigências que se faz necessário a um trabalho coletivo é a clareza que a comunidade escolar deve ter da real situação de sua escola, característica esta conquistada em longo prazo. Ela é fruto de um processo de planejamento e um meio para a elaboração do projeto político pedagógico que precisa estar incorporada à ação de cada educador.

Quando não existe participação pode ocorrer um processo de fragmentação dos diferentes olhares sobre a escola, ou seja, a escola é vista e vivenciada por uns não necessariamente corresponde àquela analisada e vivenciada por outros. Deve-se fazer o devido discernimento para que a ação coletiva não caia em contradição destruindo ideais construídos pelo conjunto.

Posturas divergentes sobre os problemas da escola devem ser discutidas dentro dos limites éticos, prevalecendo o respeito à diferença, possibilitando um diálogo que valorize propostas coletivas para a melhoria da qualidade política, pedagógica e administrativa da escola.

A diversidade de formas de participação e a intensidade com que ela é exercida correspondem ao grau de identificação e de comprometimento do grupo. A solidariedade, a reciprocidade e o compromisso são os valores que justificam a participação no trabalho coletivo da escola.

 

O planejamento participativo que antes era encarado como atividade individualista, atualmente, transforma-se num ato participativo e comunitário. O planejar na esfera individualista torna condicionante qualquer ação, diminuindo assim a possibilidade de evolução e transformação da realidade. Um planejamento sendo executado dessa forma torna o aluno um sujeito que somente sofre a ação, não participando, deixando o plano desenvolver seu lado mais dinâmico. Segundo Gandin (2002, p. 133):

Trabalhar participativamente significa estar um grupo num processo de construção de suas idéias e de sua prática, de tal modo que todos estejam caminhando no mesmo rumo, com cada pessoa e cada conjunto menor de pessoas realizando suas tarefas próprias.

 

Um dos grandes acertos que o planejamento acarreta com a sua contínua prática, é o desejo de que as coisas planejadas realmente aconteçam. Quanto maior o nível de participação, maior as chances de verificar o planejado realizado. Nesta proposta todos os participantes são convidados a serem sujeitos de construção caracterizada primeiramente pela resposta individual, seguida de sistematização de respostas e análise que favorecem consideravelmente a participação.

Todo esse processo resulta em outro chamado projeto político – pedagógico que ultrapassa a mera elaboração de planos, que só se prestam a cumprir exigências burocráticas.

O projeto político-pedagógico busca um rumo, uma direção. É uma ação intencional, com um sentido explícito, com um compromisso definido coletivamente. Por isso, todo projeto pedagógico da escola é, também, um projeto político por estar intimamente articulado ao compromisso sócio - político e com os interesses reais e coletivos da população majoritária. É também pedagógico no sentido que todas essas ações tem um objetivo comum que é o aprendizado do aluno e assim o cumprimento da função social da escola. Sobre isso Veiga (1995, p. 48) completa:

[...] Na dimensão pedagógica reside a possibilidade da efetivação da intencionalidade da escola, que é a formação do cidadão participativo, responsável, compromissado, crítico e criativo. Pedagógico, no sentido de se definir as ações educativas e as características necessárias às escolas de cumprirem seus propósitos e sua intencionalidade.

 

O projeto político-pedagógico é o fruto da interação entre os objetivos e prioridades estabelecidas pela coletividade, que estabelece, através da reflexão, as ações necessárias à construção de uma nova realidade. É, antes de tudo, um trabalho que exige comprometimento de todos os envolvidos no processo educativo: professores, equipe técnica, alunos, pais e a comunidade como um todo.

Essa prática de construção de um projeto deve estar amparada por concepções teóricas sólidas e supõe o aperfeiçoamento e a formação de seus agentes. Só assim serão rompidas as resistências em relação a novas práticas educativas. Os agentes educativos devem sentir-se atraídos por essa proposta, pois só assim terão uma postura comprometida e responsável. Trata-se, portanto, da conquista coletiva de um espaço para o exercício da autonomia.

Chega-se ao ponto crucial dessa discussão: O que realmente significa autonomia na escola e para a escola?

Para que a escola seja realmente um espaço democrático e não se limite a reproduzir a realidade sócio-econômica em que está inserida, cumprindo ordens e normas a ela impostas por órgãos centrais da educação, deve-se criar um espaço para a participação e reflexão coletiva sobre o seu papel junto à comunidade.

Torna-se importante reforçar a compreensão cada vez mais ampliada de projeto educativo como instrumento de autonomia e domínio do trabalho docente pelos profissionais da educação, com vistas à alteração de uma prática conservadora vigente no sistema público de ensino.

É essa concepção de projeto político-pedagógico como espaço conquistado que deve constituir o elemento diferencial para o aparente consenso sobre as atuais formas de orientação da prática pedagógica. Essa é a necessidade de conquistar a autonomia, para estabelecer uma identidade própria da escola, na superação dos problemas da comunidade a que pertence e conhece bem, mais do que o próprio sistema de ensino.

Essa autonomia, porém, não deve ser confundida com apologia a um trabalho isolado, marcado por uma liberdade ilimitada, que transforme a escola numa ilha de procedimentos sem fundamentação nas considerações legais de todo o sistema de ensino, perdendo, assim, a perspectiva da sociedade como um todo.

Deve-se, portanto, estar atento ao perigo do descaso político, que confunde autonomia com descompromisso do poder público, dando margem a este de eximir-se de suas obrigações.

A autonomia implica em responsabilidade e também comprometimento com as instituições que representam a comunidade (conselhos de escola, associações de pais e mestres, grêmios estudantis, entre outras), para que haja participação e compromisso de todos.

Concluindo as reflexões, acredita-se que é este o papel social da escola, atuando frente às profundas desigualdades sócio-econômicas, que excluem da escola uma parcela da população, marginalizada pelas concepções e práticas de caráter conservador, inspiradas no neoliberalismo.

Deve-se mobilizar pela garantia do acesso e da permanência do aluno na escola. Não basta esperar por soluções que venham verticalmente dos sistemas educacionais. Urge criar propostas que resultem de fato na construção de uma escola democrática e com qualidade social, fazendo com que os órgãos dirigentes do sistema educacional, possam reconhecê-la como prioritária e criem dispositivos legais que sejam coerentes e justos, disponibilizando os recursos necessários à realização dos projetos em cada escola.

Do contrário, a escola não estará efetivamente cumprindo o seu papel, socializando o conhecimento e investindo na qualidade do ensino. A escola tem um papel bem mais amplo do que passar conteúdos. Porém, deve modificar a sua própria prática, muitas vezes, fragmentada e individualista, reflexo da divisão social em que está inserida. Assim, teremos uma escola mais democrática e justa onde a prioridade é a formação integral dos alunos.

 

REFERENCIAS

 GANDIM, Adriana B. Metodologia de projetos na sala de aula. São Paulo, Loyola, 2002

 LOBROT, M. Para que serve a escola. Lisboa: Terramar, 1992.

 PADILHA, R.P Planejamento dialógico:Como construir o projeto político-pedagógicoda escola.São  Paulo:Cortez; Instituto Paulo Freire,2001.

 VEIGA, I. P. (Org.). Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. Campinas: Papirus, 1995.