A IMPORTÂNCIA DO PLANO DIRETOR PARA O CUMPRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE URBANA[1]


Jannya Cássia de Sousa Lima

Raquel Guimarães Fiquene Branco[2]

Viviane Gomes de Brito[3]


Sumário: 1 Introdução; 2 Histórico do Direito de Propriedade; 3 Função do Plano Diretor; 4 Função Social da Propriedade Urbana; 5 Considerações Finais; Referências.

 

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo a discussão da função social da propriedade urbana, buscando um retrospecto histórico da ideia de propriedade, bem como de um conceito sobre sua função social. Neste contexto, faz-se também uma análise do plano diretor enquanto instrumento de implantação da política urbana nacional.

PALAVRAS-CHAVE: Função Social da Propriedade. Propriedade Urbana. Plano Diretor


1      INTRODUÇÃO

A propriedade privada constitui uma realidade desde que o homem começou a se organizar através do trabalho, figurando esta como uma espécie de recompensa pelo trabalho humano. Tal noção de propriedade privada passou por várias fases, tendo sido tida como um direito absoluto, intocável e incontestável, direito este, passado de pai para filho.

De acordo com a Constituição Federal de 1988, a propriedade consiste num direito, objetivando o cumprimento de uma função social. A locução função social da propriedade foi mencionada quatro vezes pelo legislador constituinte: arts. 5º, XXIII, 170, III, 182, § 2º, e 186, caput. Portanto, ao referir-se à função social da propriedade, o constituinte coloca a propriedade não mais como um simples direito individual, específica do direito privado, e sim como uma garantidora de existência digna, conforme os preceitos da justiça social (BULOS, 2009).

Conforme Duguit (1975 apud GONÇALVES, 2012), a propriedade deixou de ser o direito subjetivo do indivíduo, implicando assim para todo detentor de uma riqueza, a obrigação de empregá-la para o crescimento da riqueza social e para a interdependência social. Desta forma, a propriedade não seria um direito intangível e sagrado, e sim em constante mudança, devendo adequar-se nas necessidades sociais às quais deve responder.

A Constituição Federal de 1988 também disciplina a matéria relacionada à política urbana, sendo esta definida como um conjunto de providências que tem a finalidade de organizar os espaços habitáveis, ordenando as áreas em que o ser humano exerce suas funções sociais, ou seja, objetivando a melhoria das condições de vida do homem na comunidade (BULOS, 2009). 

Em seu art. 182, § 2º, o constituinte faz menção à função social da propriedade e ao plano diretor: “A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor” (BULOS, 2009).

Sendo assim, as desigualdades sociais forçaram a sociedade a relativizar a noção de propriedade, introduzindo no seio social a ideia de função social da propriedade, onde tal ideia evoluiu de modo a ser admissível nos dias atuais o instituto da desapropriação daquela propriedade privada que não cumpre de fato a sua função social. Evidencia-se neste contexto, enquanto instrumento importante de implantação da política urbana, o plano diretor, capaz de se fazer cumprir a função social da propriedade.

 

2      histórico do direito de propriedade

 

Nos primeiros registros da vida humana na terra, destaca-se o comunismo primitivo, de modo que tudo era comum a todos, não havendo noção de propriedade e o consumo girava apenas em torno do que a natureza podia oferecer, sem transformações.

Friedrich Engels desenvolveu um estudo sobre a origem da família, do Estado e da propriedade privada e, segundo tal estudo, foram os modos de produção que se desenvolveram ao longo da história que determinaram a organização do homem no espaço.

Para Engels, seria possível dividir a evolução da humanidade em três fazes, sendo elas:

1) Estado do homem selvagem: neste período o homem se apropria de produtos da natureza prontos para serem utilizados, sendo que as únicas produções artificiais do homem nesta época se destinavam a facilitar a apropriação  destes produtos;

2) Estado do homem bárbaro: nesta fase registra-se o início da criação de gado pelo homem, da agricultura, estas que contribuíram, de certa forma, para a incrementação da natureza a partir do trabalho humano;

3) Estado do homem civilizado: neste período é que se inicia a fundição do minério de ferro, bem como a presença assim como a escrita alfabética; neste período, o homem realiza uma certa manipulação dos produtos naturais, não sendo mais os mesmos consumidos ou utilizados de forma in natura.

Partindo desta divisão, percebe-se que na primeira fase, não se tem características da apropriação privada das coisas, fazendo-se presente uma relação de dependência exclusiva da natureza, sem grandes intervenções humanas, não havendo que se falar em dominação. A partir da segunda fase, pode-se perceber um campo fértil para o início da apropriação privada, das coisas pelo homem, pois observa-se o início a criação de animais, fator que por si só determina esta apropriação das coisas. Daí em diante, a noção de propriedade privada tende a se consolidar, na fase da civilização ela já é a ideia preponderante entre os homens. Neste sentido, pontua Fabri (2005, p. 108):

A partir das descobertas como o fogo e da sofisticação do trabalho com as ferramentas inventadas, os primórdios do homo sapiens tendem a viver coletivamente dando origem as primeiras sociedades e ficando raízes em determinados locais. O raciocínio lógico permite admitir que se um grupo se considera capaz de lutar pela sua sobrevivência, nada justifica deixar que outro usufrua disso sem qualquer esforço. Portanto, a contribuição para a construção dessa sobrevivência torna-se condição para uma convivência pacifica. Vê-se assim, que a noção de posse sobre certos bens (inclusive os mais necessários) passa a dominar o convívio e a transgressão de tal ordem implica punição (FABRI, 2005, p. 108).

A proteção da propriedade privada assume então o caráter de valorização do trabalho humano, atribuindo o direito de dono aquele que se dedicou a manipular, a modificar os objetos advindos da natureza ou mesmo beneficiamentos da terra. “Mesmo a noção mais rudimentar do direito, busca proteger a propriedade privada, vinda tanto do trabalho quanto da hereditariedade” (FABRI, 2005, p. 108).

Percebe-se que o direito de propriedade é considerado sagrado, portanto, nada ou quase nada poderá atingi-lo, e, uma vez dono, sempre dono, ao menos que por vontade própria queira-se transmitir a propriedade a outro, ou que por morte deixe para familiares. Vale pontuar que esta noção de direito de propriedade, antecedeu a noção de outros direitos tão importantes ao homem, como é, por exemplo, o direito à liberdade e à vida, ainda que existisse a autotutela, a vingança privada, que não respeitavam os direitos principais do homem, como a liberdade e a vida, a noção de propriedade privada já estava ali presente, presumindo-se talvez como sendo um dos mais antigos direitos consolidados.

 

3      função do plano diretor

 

O direito de propriedade, que nos primórdios e por várias gerações da existência humana fora tido como absoluto, inabalável, na contemporaneidade passa a ser relativizado, de modo que institutos como desapropriação, por exemplo, passam a existir, colocando em cheque o direito que durante muito tempo era tido como inatingível. Nossa Carta Magna discute a função social da propriedade e contempla em seu conteúdo a política urbana, existindo para tanto um capítulo específico, apresentando o plano diretor, que tem como principal função constituir um instrumento da política urbana. Dispõe o art. 182, da Constituição Federal:

Art. 182 – A política de desenvolvimento urbano, executada pelo poder público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. § 1º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. § 2º A propriedade urbana, cumpre sua função social quando atende as exigências fundamentais de ordenação da cidade expresso no plano diretor. § 3º As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro. § 4º É facultado ao poder público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, sub-utilizando ou não utilizando, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena , sucessivamente, de: I – Parcelamento ou edificação compulsórios; II – Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III – Desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas  anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

O plano diretor apresenta-se como importante meio através do qual, regula-se o direito de propriedade, o planejamento e parcelamento do solo, as obras públicas, o direito de construir, as limitações, assim como desapropriações. Tal instituto é único e exclusivo da cidade que o deu criação, não abrangendo o município inteiro, somente a sede administrativa do município deixando de fora a zona rural. Segundo Villaça (2005), o plano diretor “seria um plano que é pensado a partir de um diagnóstico científico da realidade, física, social, econômica, política e administrativa da cidade”.

O instituto denominado de plano diretor deve apresentar um conjunto de propostas para o futuro desenvolvimento econômico e futura organização espacial dos usos do solo urbano, assim como das redes de infra-estrutura e de elementos fundamentais da estrutura urbana para a cidade, ressaltando ainda que tais propostas deverão ser  apresentadas para curto, médio e longo prazo, e como consta no dispositivo constitucional, deve ter aprovação municipal, através da câmara de vereadores.

O plano diretor, mesmo negligenciado, é algo muito discutido no Brasil e observa-se que tais discussões não têm gerado bons frutos, uma vez que apesar de o plano diretor constituir uma imposição legal, nem todas as cidades com mais de vinte mil habitantes tem um plano diretor, podendo-se constatar que na verdade este não constitui uma prioridade das prefeituras do país. Corroborando tal afirmação, pontua Villaça (2005, p. 240):

A elite econômica brasileira, no caso em questão representada pelos interesses imobiliários, não quer saber de plano diretor, pois ele representa uma oportunidade para debater os ditos problemas urbanos que ela prefere ignorar (VILLAÇA, 2005, p. 240).

Ocorre que em nosso país o que predomina no meio político é o que agrada aos empresários de vários segmentos, uma vez que são estes que financiam campanhas políticas milionárias, e, portanto, a discussão do problema imobiliário no país, não constitui de fato interesse das construtoras, por exemplo. Por isso, o que se presencia na realidade em nosso país é uma situação em que o problema imobiliário é tratado num faz de contas, em que os parlamentares fazem de conta sobre discussão da questão, muitas vezes até criando um belíssimo plano diretor, que não é levado a sério. O que de fato ocorre é o que presenciamos na realidade, como construções em áreas de preservação permanentes, imensos terrenos comprados com uma única finalidade, a da especulação imobiliária, e, portanto, não cumprindo com a sua real função social. Observa-se, enfim, verdadeiros descasos para com a função social da propriedade.

4      função social da propriedade urbana

A ideia de função social da propriedade encontra suas raízes na filosofia positivista. Contrário a estatização dos meios de produção, o positivismo apresentava uma proposta que estava entre o anarquismo e o comunismo, e segundo tal doutrina, os empresários se subordinariam à direção do Estado, entretanto conservariam a propriedade dos seus bens, se tornando uma espécie de funcionários públicos. Afirma Pinto:

A regulamentação da atividade produtiva pelo Estado seria completa, não restando aos proprietários qualquer liberdade de iniciativa. Esta é a concepção a qual foi dada a denominação função social da propriedade. A formulação inicial da doutrina deveu-se a Saint-Simon (PINTO, 2011, p. 163).

A propriedade privada naquele sentido era considerada como sendo uma das principais causas dos problemas econômicos e sociais, pois a partir desta, cada pessoa agia sozinha, de maneira desordenada, faltando assim, um órgão que controlasse estas ações.

Foi neste contexto que entre os positivistas surgiu a ideia da propriedade intermediária, que nem seria privada nem pública, seria uma forma de propriedade onde as pessoas teriam a posse da mesma, mas o verdadeiro proprietário seria o Estado, e sendo assim, os possuidores constituiriam o que denominamos no direito moderno, depositários fiéis da riqueza da sociedade. Pontua Pinto:

Todos trabalham e são funcionários. A propriedade é a função. A centralização é o índice, a condição do progresso necessário.  O Estado distribuiria a propriedade segundo os méritos e a competência de cada um. O proprietário seria um depositário, um administrador, a agir em nome da sociedade. A propriedade seria vitalícia, mas não hereditária. Com a morte do proprietário, o bem voltaria ao Estado. O comando da economia seria feito principalmente por meio de um banco central, encarregado de planejar as áreas de investimento prioritário (PINTO, 2011, p. 165).

Ainda segundo a doutrina positivista, enquanto depositários da riqueza da sociedade, os proprietários da indústria deveriam utilizá-la em benefício da coletividade, e não com interesses individuais.

Baseada na doutrina positivista, a nossa Constituição Federal dispõe que a propriedade deverá cumprir sua função social, mas por outro lado, garante o direito de propriedade, admitindo assim que a propriedade não é uma função social, mas um direito subjetivo que deve cumprir sua função social. No que tange a propriedade urbana, a Constituição vinculou o exercício da propriedade ao plano diretor e para que se caracterize que a propriedade urbana esta cumprindo a sua função social, é necessário que o proprietário esteja utilizando produtivamente o bem, citando-se como exemplo, as situações em que o imóvel esteja servindo de moradia para alguém, mesmo que não seja para o proprietário, esteja servindo ao comércio de um modo geral, enfim, que este imóvel não esteja ocioso, sem utilidade.

Em relação à função social da propriedade, vale aqui salientar a decisão proferida no AgRg no REsp nº. 1. 138. 517 – MG (2009/0085811-0), tendo como relator Ministro Humberto Martins:

ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. SUSPENSÃO DO PROCESSO EXPROPRIATÓRIO. MEDIDA CAUTELAR PELO JUIZ SINGULAR. POSSIBILIDADE. CONCEITO DE FUNÇÃO SOCIAL QUE NÃO SE RESUME À PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL. DESCUMPRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL NÃO RECONHECIDA PELA CORTE DE ORIGEM. MATÉRIA PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ.

1. Entendeu o Tribunal de origem que os recorridos não atacaram o decreto expropriatório, mas sim atos administrativos outros que podem ser sustados para impedir a edição e publicação de Decreto Presidencial.

2. Assim, são inaplicáveis os arts. 1º, § 1º, da Lei n. 8.437/92 e 1º da Lei n. 9.494/97, que vedam a concessão de medidas cautelares ou antecipatórias que objetivem a impugnação de ato de autoridade sujeita, na via de mandado de segurança, à competência originária de tribunal.

3. Nos moldes em que foi consagrado como um Direito Fundamental, o direito de propriedade tem uma finalidade específica, no sentido de que não representa um fim em si mesmo, mas sim um meio destinado a proteger o indivíduo e sua família contra as necessidades materiais. Enquanto adstrita a essa finalidade, a propriedade consiste em um direito individual e, iniludivelmente, cumpre a sua função individual.

4. Em situação diferente, porém, encontra-se a propriedade de bens que, pela sua importância no campo da ordem econômica, não fica adstrita à finalidade de prover o sustento do indivíduo e o de sua família. Tal propriedade é representada basicamente pelos bens de produção, bem como, por aquilo que exceda o suficiente para o cumprimento da função individual.

5. Sobre essa propriedade recai o influxo de outros interesses - que não os meramente individuais do proprietário – que a condicionam ao cumprimento de uma função social.

6. O cumprimento da função social exige do proprietário uma postura ativa. A função social torna a propriedade em um poder-dever. Para estar em conformidade com o Direito, em estado de licitude, o proprietário tem a obrigação de explorar a sua propriedade. É o que se observa, por exemplo, no art. 185, II, da CF.

7. Todavia, a função social da propriedade não se resume à exploração econômica do bem. A conduta ativa do proprietário deve operar-se de maneira racional, sustentável, em respeito aos ditames da justiça social, e como instrumento para a realização do fim de assegurar a todos uma existência digna.

8. Há, conforme se observa, uma nítida distinção entre a propriedade que realiza uma função individual e aquela condicionada pela função social. Enquanto a primeira exige que o proprietário não a utilize em prejuízo de outrem (sob pena de sofrer restrições decorrentes do poder de polícia), a segunda, de modo inverso, impõe a exploração do bem em benefício de terceiros.

9. Assim, nos termos dos arts. 186 da CF, e 9º da Lei n. 8.629/1993, a função social só estará sendo cumprida quando o proprietário promover a exploração racional e adequada de sua terra e, simultaneamente, respeitar a legislação trabalhista e ambiental, além de favorecer o bem-estar dos trabalhadores.

10. No caso concreto, a situação fática fixada pela instância ordinária é a de que não houve comprovação do descumprimento da função social da propriedade. Com efeito, não há como aferir se a propriedade – apesar de produtiva do ponto de vista econômico, este aliás, o único fato incontroverso – deixou de atender à função social por desrespeito aos requisitos constantes no art. 9º da Lei n. 8.629/93.

11. Analisar a existência desses fatos, conforme narrado pelo agravante, implica revolvimento de matéria probatória, o que é vedado a esta Corte Superior em razão do óbice imposto pela Súmula 7/STJ.

Agravo regimental improvido. (grifos nossos).

É sabido que um dos grandes problemas urbanos gira em torno da especulação imobiliária, sendo comum a compra de imóveis com o único objetivo de esperar o momento mais propício para vendê-lo, aguardar, por exemplo, a construção de uma obra nos arredores da propriedade que consequentemente valorizará o imóvel. Enquanto isso não acontece, aquele imóvel adquirido com vistas à especulação imobiliária fica vazio, ocioso, ao mesmo tempo em que inúmeras famílias estão sem uma moradia digna, ou mesmo sem nenhuma moradia, fazendo de baixo das pontes e viadutos seus abrigos.

A utilização compulsória de terrenos ociosos foi uma das soluções pensadas na Constituição para minimizar a especulação imobiliária, de modo que o proprietário seja induzido a edificar a terreno. O IPTU progressivo no tempo foi outra forma, que apesar de não ter função expropriativa, e por tanto não poderá crescer tanto, estimulará o proprietário a construir naquele terreno para que o imposto se torne mais baixo. Tem-se ainda a figura da desapropriação, que por sua vez tem caráter punitivo, podendo ser considerada como a mais séria das punições em se tratando em direito de propriedade. Inclusive os tribunais brasileiros têm admitido que as desapropriações realizadas com fundamento no descumprimento da função social da propriedade são consideradas como sanção.

Contudo, a intervenção na propriedade particular pelo poder público não é novidade no ordenamento jurídico brasileiro, porém destaca-se que a inovação da Constituição vigente se deu no sentido de que esta teve um grande avanço em se tratando de política urbanística, quando previu e estabeleceu que a propriedade deverá cumprir sua função social, e como forma de sanção para os casos descumprimento desta previsão, estabeleceu a desapropriação.

5  CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A noção de propriedade privada vem ao longo do tempo sofrendo modificações, assim como restrições, de modo que hodiernamente, não é possível falar em direito absoluto de dispor da propriedade privada como bem entender. A intervenção estatal na propriedade privada é uma realidade, fundamentada na ideia de justiça social.

O plano diretor previsto na Constituição Federal atual, constitui um importante instrumento para implantação de uma política urbana que contemple a questão da moradia digna para todos, e em contrapartida desestimule a especulação imobiliária.

Apesar de constituir obrigação para as cidades com mais de vinte mil habitantes, o plano diretor ainda não é discutido como deveria, uma vez que por traz deste fato existem interesses diversos, que não convergem com discutir do problema habitacional e imobiliário do país.

O cumprimento da função social da propriedade urbana é um dos mecanismos mais eficientes para a promoção do desenvolvimento justo das cidades. Porém a ausência de vontade política e interesses outros que não a promoção do bem social permitiram que diversos grandes centros urbanos se transformassem em cidades com problemas aparentemente insolúveis em questões essenciais como moradia, transporte e meio ambiente, fato este que deixa a sociedade como um todo entristecida, uma vez que constitui anseio geral, que problemas como estes sejam resolvidos em nosso país.

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (2ª. Turma). Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.138.517 – MG (2009/0085811-0). Agravante: Instituto de Colonização e Reforma Agrária – INCRA. Agravado: Adriano Chafik Luedy e outros. Relator: Min. Humberto Martins. Brasília (DF), 18 de agosto de 2011. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=descumprimento+da+fun%E7%E3o+social+da+propriedade&b=ACOR>. Acesso em: 04 nov. 2012.

BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das coisas. v. 4. São Paulo: Saraiva, 2007.

ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Coleção Os Grandes Pensadores. São Paulo: Escala.

FABRI, Andréa Queiroz. Função social da propriedade e os novos ramos do direito. Revista Jurídica UNIJUS, Uberaba-MG, v. 8, n. 8, p. 107-118, maio 2005. Disponível em: <http://www.uniube.br/publicacoes/unijus/arquivos/unijus_8.pdf#page=107>. Acesso em: 24 ago. 2012.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. v. 5. 7. ed. São Paulo: Saraiva: 2012.

MOREIRA, Helion França. O plano diretor e as funções sociais da cidade. Rio de Janeiro: 2008. Disponível em: < http://www.cprm.gov.br/publique/media/plano_diretor_helion.pdf >. Acesso em: 23 ago. 2012.

PINTO, Victor Carvalho. Direito Urbanístico, Plano Diretor e Direito de Propriedade. 3. Ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

VILLAÇA, Flávio. As Ilusões do Plano Diretor. São Paulo: 2005. Disponível em: <http://www.flaviovillaca.arq.br/pdf/ilusao_pd.pdf>. Acesso em: 24 ago. 2012.



[1] Paper apresentado à disciplina de Direitos Reais da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Alunas do 9º período, do curso de Direito Noturno da UNDB.

[3] Professora, Especialista, Orientadora.