A IMPORTÂNCIA DO ESTUDO DA PSICOLOGIA JURÍDICA PARA A FORMAÇÃO DOS OPERADORES DO DIREITO[1]

João Paulo Fernandes Salviano[2]

Luanne Santos Sales[3]

Paulo Agostinho Pereira Braga Filho[4]

 

RESUMO: Este artigo tem como tema a interdisciplinaridade na interface da Psicologia Jurídica aplicada ao Direito e como objetivo elucidar a importância do estudo da psicologia jurídica para a formação do bacharel em direito. Para seu desenvolvimento, foi usado o método indutivo, partindo da pesquisa bibliográfica e da análise de referenciais teóricos. Buscou-se analisar se o direito é uma disciplina dogmática ou zetética, quando que sua relação com a psicologia passou a ser necessária e estudada e a importância do estudo da disciplina psicologia jurídica para a formação dos operadores do direito. E, mediante o cumprimento da proposta, pôde-se concluir que a compatibilização do Direito e da Psicologia é de extrema importância para a formação de profissionais capazes de compreender os fatores que levam determinado indivíduo a agir contra disposição legal, auxiliando a romper um sistema jurídico em que o rigor da norma acaba por ignorar os fatores sociais e biológicos que moldam o comportamento humano. Mas, para tanto, é necessário que o direito se liberte das amarras dos dogmas e saboreie os postulados zetéticos.

 

PALAVRAS-CHAVE: Dogmática; zetética; subjetividade; técnica; psicologia; jurídica; forense.

ABSTRACT: This article focuses on the interdisciplinary interface of Forensic Psychology applied to Law study and it is aimed to elucidate the importance of the study of forensic psychology to the Law Degree. For its development, we used the inductive method, based on the literature review and theoretical analysis. We sought to examine whether law is a dogmatic or zetetic discipline, while its relation to psychology became necessary, and it is investigated the importance of the study of forensic psychology discipline for the training of the agents who work and deal with Law. And by meeting the proposal, it was concluded that the compatibility of law and psychology is notably important to the training of professionals capable of understanding the factors that lead certain individuals to act contrary statutory provision, helping to break a legal system where the rigor of the rule ends up ignoring the social and biological factors that shape human behavior. But for this, it is necessary that the law gets freed from the shackles of dogma and experiment the zetetic postulates.

 

KEYWORDS: Dogmatic; zetetic; subjectivity; technique; psychology; forensic.

 

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Disciplinas zetéticas x disciplinas dogmáticas. 2.1. Como definir o direito. 2.2. O direito é uma ciência dogmática? 3. Breve histórico da psicologia jurídica 4. A importância da psicologia jurídica na formação dos operadores do direito. 4.1. Os desafios do ensino praticado no Brasil. 5. Considerações finais.  6. Referências.

 

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo acadêmico discorre, em linhas gerais, sobre o quão relevante tem se tornado o estudo da psicologia jurídica na formação acadêmica do conjunto de profissionais chamados de operadores do direito.

É discutido, primeiramente, o âmago do direito enquanto disciplina acadêmica, traçando-se um paralelo entre os aspectos zetéticos e dogmáticos da ciência.

Após, demonstra-se de forma breve um histórico da psicologia e a sua aproximação com o direito, culminando com a chegada e o ganho de prestígio do estudo da psicologia jurídica no Brasil.

Por fim, adentra-se no mérito do tema do presente trabalho, tratando-se de forma mais detalhada a evidente necessidade e também as problemáticas acerca da forma como é estudada a psicologia jurídica no nosso país, enquanto disciplina acadêmica, por aqueles que de alguma forma trabalharão intimamente com as ciências jurídicas – os chamados operadores.

 

2. BREVE HISTÓRICO DA PSICOLOGIA JURÍDICA

A vertente jurídica da psicologia encontra suas raízes mais primitivas na França do século XIX, tendo como marco inicial o pioneiro estudo criminal-antropológico do filósofo e psicólogo francês Prosper Despine (1812-92), entitulado de Psychologie naturelle (1868). A obra fazia oposição ao ideal determinista lombrosiano, bastante prestigiado à época. Liene Martha Leal resume o posicionamento do autor, após as constatações obtidas em seu longo trabalho:

Na opinião de Despine, o delinquente possui uma deficiência ou carece em absoluto de verdadeiro interesse por si mesmo, de simpatia para com seus semelhantes, de consciência moral e de sentimento de dever. Não é prudente, nem simpático e nem é capaz de arrependimento. O próprio Despine considera que sua obra era somente uma iniciativa e incitou as demais pessoas para que prossigam nesta mesma linha de investigação. Despine passou então a ser considerado o fundador da Psicologia Criminal – denominação dada naquela época às práticas psicológicas voltadas para o estudo dos aspectos psicológicos do criminoso. (LEAL, 2008, p. 172 e 173)

Mais adiante na história, ganhou força o estudo da psicologia do testemunho, que tem no americano J. McKeen Cattell (1860-1944) um de seus primeiros expoentes. Cattell teve grande importância graças ao uso de métodos quantitativos em seu trabalho, focando sempre no estabelecimento da psicologia como uma ciência legítima. Anteriormente, a psicologia era frequentemente tida como uma ciência subalterna, às vezes até vista como uma pseudociência.

Graziella Ambrosio resume sobre o assunto da seguinte forma:

O testemunho de uma pessoa sobre um fato depende, essencialmente, de como ela percebeu esse acontecimento, de como sua memória o armazenou e o evocou e, ainda, do modo como esse fato pode ser expresso. Sobre esses processos psíquicos (percepção, memória e expressão) atuam uma série de fatores externos e internos ao indivíduo, como hábito, automatismo, memória temporal e tendência afetiva. Nesse sentido, a análise prévia do tipo de personalidade e das relações afetivas da testemunha permite verificar se o testemunho será ou não imparcial. Em outras palavras, é desvendar a intenção do testemunho, que pode ser vingança, compaixão, afeto, egoísmo, etc., podendo o interrogador aplicar técnicas, como o método centrípeto, para obter o exato esclarecimento dos fatos. Embora nenhum testemunho seja perfeito, é possível aferir o grau de fidedignidade do relato da testemunha por meio dos instrumentos de análise psicológica. (AMBROSIO, 2011, p. 395)

A psicologia do testemunho, mais tarde, desenvolveu-se como ramificação da psicologia criminal. Adentrando-se no século XX, o estudo desta passou a se tornar cada vez mais independente. Diversos estudiosos se dedicaram à investigação, fazendo estudos de casos com metodologia cada vez mais apurada. Ganhou destaque na Alemanha, tendo como expoentes o austríaco Hans Gross (1847-1915) – considerado o pai da investição criminal – e o alemão Gustav Aschaffenburg (1866-1944).

Ainda mais tarde, surge como importante nome do campo jurídico da psicologia o espanhol Emilio Mira y Lopez (1896-1964), que veio a exercer grande influência no Brasil. Ensina Leal:

Em 1950, Mira Y Lopez utiliza o termo Psicologia Jurídica ao publicar o Manual de Psicologia Jurídica. Ao longo dos seus dezesseis capítulos o autor procura discutir o papel da Psicologia no campo do Direito e oferecer conhecimentos sobre o comportamento humano que auxiliem os juristas em suas decisões. (LEAL, 2008, p. 175)

As discussões, portanto, deixaram aos poucos de se concentrar somente no campo criminal, tornando-se mais amplas e mais presentes em território brasileiro. Surge, assim, o nome de Cleto Pontes, seguindo a mesma linha de Mira y Lopez, introduzindo conceitos mais modernos, como a definição de Insight:

um insight preservado seria como a água cristalina ou a água de piscina bem tratada. Quando o indivíduo sabe nadar, ele pode mergulhar sem correr risco e obter sucesso no mergulho. Já num insight prejudicado a água é turva. Dependendo do grau de deficiência no insight o turvamento é maior ou menor. Neste caso, mesmo o indivíduo sendo um atleta que sabe nadar, se ele for mergulhar de cabeça, corre o risco de entrar numa enrascada, machucando-se. (PONTES, 1997, p. 74)

Desse modo, Leal elucida um pouco da visão do autor supracitado:

De acordo com as idéias de Pontes (1997), as pessoas que possuem um baixo nível intelectual em concomitância com um insight prejudicado tendem a delirar nos atos e não nas idéias, apresentando sérios transtornos de conduta; podendo vir a ter comportamentos auto-destrutivos, impulsivos e agressivos, cujas conseqüências vão do suicídio ao homicídio. (LEAL, 2008, p. 177)

Ademais, ainda em relação ao Brasil, merece destaque a importante aproximação da psicologia com o direito nos campos dos direitos da criança e do adolescente, notadamente na década de 1990, e com os direitos de família e do trabalho, em tempos mais recentes.

Portanto, percebe-se que houve uma larga evolução durante quase dois séculos de estudos, por diversos autores e pesquisadores acerca do tema de forma geral. A permeação da ciência no Brasil, embora mais tardia, tem sido reconhecida cada vez mais e, gradualmente, diferentes desdobramentos e enfoques da disciplina no país vêm ganhando força, consolidando-a como essencial pilar da formação jurídica brasileira.

 

3.  DISCIPLINAS ZETÉTICAS X DISCIPLINAS DOGMÁTICAS

3.1 Como definir o direito?

O Direito é uma disciplina que pode ser considerada redefinidora de conceitos porque um conceito anteriormente utilizado antes não é superado como ocorre com os conceitos da física, mas sim redefinidos, pois o direito é uma ciência social e como tal evolui juntamente com a sociedade em que atua. Tércio Sampaio Ferraz Júnior, descreve a evolução social da seguinte maneira:

Em termos de uma concepção convencionalista da língua, diríamos, então, que tanto o físico quanto o jurista têm suas definições guiadas por critérios de utilidades teóricas e de conveniência para a comunicação. Enquanto, porém, para o físico essa comunicação tem um sentido estritamente informativo, para o jurista ela combina um sentido informativo com o diretivo. Uma comunicação tem sentido informativo quando utiliza a linguagem para descrever certo estado das coisas. Por exemplo, “esta mesa está quebrada”. Tem sentido diretivo quando a língua é utilizada para dirigir o comportamento de alguém, induzindo-o a adotar uma ação. Por exemplo, “conserte a mesa”. Ora, quando um físico define o movimento, prepondera a função informativa. Suas definições teóricas superam-se à medida que o estado de coisas referido muda, ou porque se descobrem novos aspectos relevantes, ou porque os aspectos antes tidos por relevantes não o são mais. Já quando o jurista define a posse, mesclam-se as duas funções. Ele não informa apenas como se entende a posse, mas também como ela deve ser entendida. Assim, suas definições teóricas superam-se à medida que deixa de ser guia para a ação. No caso do físico, a definição é superada porque se tornou falsa. No caso do jurista, porque deixou de ser atuante. Ou seja, as definições da física no geral são lexicais, as do jurista são redefinições. Nesse sentido se diz também que a ciência jurídica não apenas informa, mas também conforma o fenômeno que estuda, faz parte dele. A posse não é apenas o que é socialmente, mas também como é interpretada pela doutrina jurídica ( FERRAZ JÚNIOR, 2003,p. 39).

No livro, A Cidade Antiga, Fustel de Coulanges discorre sobre a evolução do direito partindo da premissa de que a família aliada à religião foi a primeira instituição que criou normas. Essas normas familiares, baseadas na religião, deram origem ao direito.

Entre os gregos, entre os romanos, como entre os hindus, a lei era o princípio parte da religião. Os antigos códigos das cidades eram um conjunto de ritos, de prescrições litúrgicas, de preces, ao mesmo tempo que de disposições legislativas. As regras do direito de propriedade e do direito de sucessão estavam dispersas no meio de regras relativas aos sacrifícios, à sepultura e ao culto dos mortos ( COULANGES, 2009, p.289).

Percebe-se, claramente, que o direito é uma ciência extremamente social, o que se nota da leitura do livro é que à medida que o homem foi evoluindo, isso graças ao surgimento de pensadores, as velhas crenças passaram a ser  contestadas.

Uma vez despertada assim a reflexão, o homem não quis mais crer sem conhecer suas crenças, nem quis deixar-se governar sem discutir suas instituições. Duvidou da justiça das suas velhas leis sociais, e surgiram outros princípios (COULANGES, 2006, p. 574).

 

As velhas normas não foram totalmente abandonadas, elas ainda estão aí, fazem parte da formação do homem, apenas foram redefinidas pelas evoluções sociais.

3.2. O direito é uma ciência dogmática?

Antes de tudo, é imperioso conceituar o que é uma ciência com enfoque dogmático, diferenciando-o da ciência revestida do enfoque zetético.

Diz-se que o enfoque dogmático é aquele onde a norma posta não aceita interpretação, “O enfoque dogmático releva o ato de opinar e ressalva alguma das opiniões” (FERRAZ JÚNIOR, 2003, p.41). A ciência baseado na dogmática possui normas diretivas, de dever-ser (como deve ser algo?). Ao contrário, a ciência com enfoque zetético se guia através de funções infinitas, especulativas. As ideias, opiniões, são desintegradas, pondo-as em dúvida. O problema que lhes é apresentado é questionado, busca-se compreendê-lo, descobrir o que ele é, o que é algo?

No primeiro caso, usando uma terminologia de Viehweg,temos um enfoque zetético, no segundo, um enfoque dogmático. Zetética vem de zetein,que significa perquirir, dogmática vem de dokein, que significa ensinar,doutrinar. Embora entre ambas não haja uma linha divisória radical ( toda investigação acentua mais um enfoque que o outro, mas sempre tem os dois), sua diferença é importante. O enfoque dogmático releva o ato de opinar  ressalva algumas das opiniões. O zetético, ao contrário, desintegra, dissolve as opiniões, pondo-as em dúvida. Questões zetéticas têm uma função especulativa explícita e são infinitas. Questões dogmáticas têm uma função diretiva explícita e são finitas. Nas primeiras, o problema tematizado é configurado como um ser (o que é algo?). Nas segundas, a situação nelas captada configura-se como um dever-ser ( como deve ser algo?). por isso,o enfoque zetético visa saber o que é uma coisa. Já o enfoque dogmático preocupa-se em possibilitar uma decisão e orientar a ação (FERRAZ JÚNIOR, 2003, p. 41).

 As ciências dogmáticas são mais fechadas, obrigam os problemas a se encaixarem a suas premissas, ou seja, se redefinirem. Enquanto as ciências zetéticas são mais abertas, se os problemas não se encaixam as premissas outrora elucidadas estas são trocadas. A dogmática não costuma questionar seus dogmas por terem sido elaborados com arbítrio, através de um poder supremo. Enquanto as zetéticas, a todo momento,  são questionadas, são alteradas, à medida que as evidências são postas em dúvida. A disciplina zetética é capaz de ignorar a lei vigente para explicar determinada situação.

Por exemplo, para o sociólogo do direito a questão de se saber se funcionário público pode ou não fazer greve tal como qualquer trabalhador é uma questão aberta, na qual a legislação sobre o assunto e um dado entre outros, o qual pode ou não servir de base para a especulação. Sem compromisso com a solução de conflitos gerados por uma greve de ato, ainda que legalmente proibida, o sociólogo se importará com outros pressupostos, podendo, inclusive, desprezar a lei vigente como ponto de partida para explicar  o problema. Já o dogmático, por mais que se esmere em interpretações, está adstrito ao ordenamento vigente. Suas soluções têm de ser propostas nos quadros da ordem vigente, não a ignorando jamais (FERRAZ JÚNIOR, 2003, p.43).

 

Diante de toda essa argumentação chega-se a conclusão que o direito por sua natureza é uma ciência dogmática. A norma posta é a norma a ser utilizada. Mas será que ao se aplicar a lei os juristas têm a obrigação de seguir estritamente o que a norma preconiza?

Ferraz Júnior ao abordar sobre essa indagação coloca que o direito é uma disciplina que sempre foi ensinada  com base única e exclusivamente no viés normativo e isso se dá porque as normas são dogmas, ou seja, são imposições, criações soberanas e vinculantes. Mas é preciso ressaltar que o direito não pode ficar restrito ao que está posto. Os juristas devem buscar interpretar a norma de acordo com o contexto social que lhes foi apresentado. Devem saborear um pouco dos postulados zetéticos, abrir mão de certos dogmas para compreender o que o homem está buscando no judiciário. Como dito anteriormente, o direito é uma ciência redefinidora.

É verdade que o jurista teórico, por outro lado, não pode desprezar as investigações a respeito de qual é o direito efetivo de uma comunidade, quais os fatores sociais que condicionam sua formação, qual sua eficácia social, qual sua relevância como instrumento de poder, quais os valores que o justificam moralmente, etc. Ou seja, ele vale-se também da pesquisa zetética. Apesar disso, porém, em sua perspectiva prepondera o aspecto dogmático (FERRAZ JÚNIOR, 2003, p.42).

Não basta somente aplicar a norma posta, buscar conhecer os litigantes e o que eles buscam nas leis também é função essencial dos operadores do direito.

4. A IMPORTÂNCIA DA PSICOLOGIA JURÍDICA NA FORMAÇÃO DOS OPERADORES DO DIREITO

Frente aos avanços e modernizações desta disciplina no Brasil, busca-se com o presente estudo entender a real aplicação e utilidade deste ramo autônomo e relativamente novo na formação dos operadores do direito no país.

A necessidade de entender dos estudos da psicologia jurídica no curso de direito passa pela compreensão da importância da interdisciplinaridade característica do curso, que deverá formar profissionais mais completos possíveis seja qual for o campo no qual irá atuar. Neste sentido, escreve Hugo de Brito Machado ao defender a complementação da ciência jurídica que não mais poderá ser estudada isoladamente:

Demonstrando o objeto específico de cada uma das disciplinas jurídicas, como forma de encarar o direito, chega-se à conclusão de que é insuficiente o conhecimento de qualquer dessas formas isolada mente. O verdadeiro jurista, portanto, há de conhecer o direito sob aquelas diversas formas. Embora possa aprofundar o seu conhecimento no que denominamos ciência do direito, ele não pode ignorar as demais disciplinas jurídicas (MACHADO. 2004, p. 50).

 

Já esclarecida, a autonomia da psicologia jurídica credenciou tal disciplina a figurar nas grades dos cursos de direito, mas sua evolução vem mostrando que seu alcance deve ser mais valorizado, uma vez que ainda não foi superada a retrograda ideia de que esta é uma disciplina que deve ser esquecida, subaproveitada por não ser diretamente ligada ao conteúdo das leis.

Equívoco reiterado é dispensar a efetividade das técnicas e pesquisas produzidas pelos psicólogos do direito, que estudam tanto fatores biológicos quanto fatores de experimentação social para fornecer aos juristas a possibilidade de tratamentos mais adequados  para os sujeitos, considerados em sua individualidade.

A eficácia da análise tanto sintética quanto analítica da conduta humana aperfeiçoa os estudantes do direito ao não permitir que a objetividade própria da ciência jurídica mais pura retire a capacidade de compreensão de que fatores íntimos dos sujeitos do processo tem sim um fator decisivo no desenvolvimento dos litígios. Assim pensa Maria Helena Diniz na obra Compendio de Introdução à Ciência do Direito:

A psicologia jurídica ao estudar os fenômenos mentais ligados ao direito e os princípios de onde procedem, proporcionando um conhecimento do homem, de suas faculdades e inclinações, vem facilitar o trabalho do jurista, do legislador, que dita normas sobre o comportamento humano, e do magistrado, que as aplica ao prenunciar-se sobre a conduta humana (DINIZ. 2011, p. 242).

 

Um aspecto crucial do conhecimento de psicologia jurídica é o discernimento do fator gerador da vontade, elemento chave na apuração de crimes, do interesse do menor e da compreensão sobre as experiências causaram nas partes. Conhecer a fonte interesse das partes em um processo é imprescindível para que o direito além de legal seja também legítimo.

Não se deve, portanto, limitar a psicologia jurídica na psicologia forense, pois esta em suma é a que se pratica nos tribunais e aquela é extensível não só aos integrantes judiciários, mas também aos bacharéis integrantes do poder executivo, como aqueles que irão trabalhar no Ministério Público, além dos que irão trabalhar na produção do conteúdo normativo.

Uma lei que considere os fatores subjetivos do comportamento humano, certamente será mais útil a um sistema inflexível que pune sem a preocupação dos agravamentos de possíveis psicopatologias que foram determinantes para a prática da conduta ilícita.

4 .1. Os desafios do ensino praticado no Brasil

 

Newton Fernandes ao falar da criminologia ressalta importância da explicação dos instintos humanos e tal observação não se restringe aos ilícitos penais. Conhecer o “porquê”  da conduta pode explicar as atitudes dos sujeitos em todos os estágios de um processo judicial:

O desafio que a vida em sociedade apresenta não se limita a apontar uma única e simplificada explicação do “porquê” o homem mata outro homem, mas de descobrir o “porquê”, em circunstâncias similares, um homem mata, outro socorre e um terceiro finge que nada viu. A explicação não pode estar em supostos instintos humanos, que tenderiam a dirigir sempre todos os homens numa única direção, mas, principalmente, nas experiências de suas vidas inteiras, que variam amplamente de uma pessoa para outra (FERNANDES. 2002, p.126).

 

Crítica contundente é feita por Rizzatto Nunes em sua obra quando questiona o modelo adotado nas escolas de direito que oferecem um pacote fechado, com disciplinas clássicas e pouco abertas ao questionamento e interação. Esse é um dos desafios à psicologia jurídica nas faculdades de direito, pois os educadores que atuam na área, geralmente psicólogos especializados na disciplina ou juristas com apreço pelo conteúdo desta, não podem limitar o aluno à sua visão da psicologia jurídica, sendo necessária a apresentação dos diversos pontos de vista tanto da psicanálise, quanto da psicologia comportamental, social e outras vertentes da psicologia necessárias a uma compreensão mais completa da subjetividade dos indivíduos.

Por tal razão, será necessário que a matéria seja desenvolvida de forma a ser completamente transpassada, evitando uma excessiva condensação do conteúdo programático que se contente com uma visão rasa das técnicas a serem utilizadas. Desta forma a Psicologia Jurídica fará com que o bacharel em direito seja capaz de aplicar além do correto direito, a técnica mais apurada na compreensão do comportamento dos integrantes dos litígios em que venham a operar, seja qual for a sua posição neste processo.

 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ensino da psicologia jurídica, sobretudo no Brasil, enfrenta dificuldades muito em virtude da criação relativamente recente da disciplina. A aplicação das técnicas e pesquisas advindas destes profissionais terá por função a capacitação dos bacharéis de psicologia e do direito, viabilizando que a visão objetiva do direito seja complementada pela análise do comportamento individual dos sujeitos das contendas judiciais.

Os desafios enfrentados pela disciplina passam pela defasagem do ensino dos cursos de direito que ainda não dão o merecido espaço a esta disciplina, o que leva a uma visão distorcida sobre sua importância. A formação de profissionais capazes de compreender os fatores que levaram determinado indivíduo a agir contra disposição legal pode auxiliar a romper um sistema jurídico em que o rigor da norma acaba por ignorar os fatores sociais e biológicos que moldam o comportamento humano.

Por fim, a psicologia jurídica vem dar caráter mais científico às decisões dos tribunais, bem como à defesa feita pelos futuros procuradores operadores do direito. O intuito é os estudantes de tal matéria possam respaldar a análise de um indivíduo em fatores mais concretos provenientes da observação mais específica da conduta, objeto do estudo sobre os indivíduos.

 

 

 

6. REFERÊNCIAS

 

COULANGES, Numa-Denis Fustel de. A Cidade Antiga. Tradução de Frederico Ozanam Pessoa de Barros. São Paulo: EDAMERIS, 2006.

 

DINIZ, Maria Helena. Compendio de introdução à ciência do direito. -22.ed.rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011.

 

FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito: técnica, decisão, dominação. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

 

LEAL, Liene Martha. Psicologia jurídica: história, ramificações e áreas de atuação. In: Revista Diversa. Ano I, Ed. 2. Parnaíba: UFPI, 2008. Disponível em http://www.ufpi.br/subsiteFiles/parnaiba/arquivos/files/rd-ed2ano1_artigo11_Liene_Leal.PDF Acesso em: 06/11/2013, às 14h.

 

MACHADO, Hugo de Brito. Introdução ao estudo do direito. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2004.

 

NUNES, Rizzatto. Manual de Introdução ao estudo do direito: com exercícios para sala de aula e lições de casa. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

 

UNIMONTES. Resolução n° 182 - Cepex/2008 - aprova manual para elaboração e

normatização de trabalhos acadêmicos para os cursos de graduação da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES. – Trabalho de Conclusão de Curso – TCC. Disponível em: <http://www.unimontes.br/arquivos/resolucao/2008/resolucao_cepex182.pdf>. Acesso em: 24 ago. 2013.

 



[1]Artigo científico apresentado como requisito parcial para aprovação na disciplina Psicologia Jurídica, do Curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).

[2]Graduando do 8º Período de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).

[3]Graduanda do 8º Período de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).

[4]Graduando do 8º Período de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).