A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO HUMANÍSTICA DO JUIZ NA PRÁTICA DA MAGISTRATURA: a criação judiciária do direito

Direito Constitucional


Mariana de Cássia Borges de Carvalho
Samarah Thyanne Santos Rabelo
Thayana Bosi Oliveira Ribeiro

Sumário: Introdução. 1. Sistema de Escolha dos Magistrados Aplicado no Brasil 2. A interpretação do juiz como criação do direito. 3. Patologias na magistratura. 4. Formação Humanística para o Exercício da Magistratura. Considerações finais. Referências.

RESUMO
Aborda-se inicialmente o meio de seleção dos magistrados e suas garantias constitucionais dando-se enfoque no juiz. Posteriormente faz-se uma exposição das patologias ? defeitos - existentes na Magistratura e se desmistifica a idéia da imparcialidade. Comenta-se também sobre a formação humanística que todos magistrados deveriam ter. E por fim, faz-se uma conclusão a respeito do assunto.
PALAVRAS-CHAVE:
Concurso Público. Magistrado. Formação Humanística


ABSTRACT
Initially addresses the means of selection of judges and their constitutional guarantees giving up approach on the judges. Subsequently it is an exhibition of pathologies - defects - in the Judiciary and demystifies the idea of impartiality. It was also a comment on the humanistic training that all judges should have. And finally, there is a conclusion about the matter.

KEYWORDS
Public Tender. Magistrate. Humanistic Education


"Jamais houve controvérsia mais estéril do que a concernente á questão de se o juiz é criador do direito. É óbvio que é. Como poderia não sê-lo?."
Lord Radcliffe




Introdução

O objetivo do presente trabalho é demonstrar a importância da aprendizagem de matérias interdisciplinares em meio à atividade realizada pelo juiz. Mostrar o juiz como ser - humano membro de uma sociedade e, portanto inserido a vinculação de costumes, valores, e também conectado as emoção, ao seu psíquico.
Tem-se a finalidade de apresentar as matérias interdisciplinares para a formação do juiz, que haja como tal (ser - humano), mas sempre com uma visão critica para a solução de litígios, sempre entre as pessoas, não em uma posição acima delas ou indiferente a elas. A sua atuação deve ser mais um meio de aproximação das pessoas e a lei, e não de distanciamento através de patologias explanadas ao longo do texto.
Deve-se ressaltar que não é pretendido se formular uma critica sobre o funcionamento do judiciário de uma forma geral, ou as metodologias utilizadas no ambiente acadêmico que servem de bases na formação de bacharéis, possíveis futuros juizes. Focaliza-se na conduta do juiz e no meio de seleção dos mesmos devido a importância do seu papel na sociedade como mediador desta com a justiça (que seja efetiva).

1. Sistema de escolha dos magistrados aplicado no Brasil

A partir do que é explanado a seguir, argüiu-se que o sistema de seleção de juízes no Brasil compõem a legitimação dos mesmos para exercer plenamente tão importante papel. O Sistema de seleção dos magistrados adotado no Brasil é o Concurso Público de provas e títulos. Este é realizado através de duas etapas: A primeira é a prova escrita, elaborada por especialistas em cada matéria e corrigida sem identificação. Os aprovados na primeira etapa seguem para a segunda que se da de forma oral.
Existe ainda o chamado "quinto Constitucional" em que Advogados ou Promotores são escolhidos por nomeação ? pelo Poder Executivo - para ingressar na Magistratura sem prestar Concurso Público. Estes são atribuídos aos cargos por via de méritos. O objetivo do quinto é enriquecer moralmente os Tribunais, trazendo uma mentalidade mais diversificada.
Os magistrados em face do desempenho apropriado das suas funções (dando ênfase na manutenção da dita imparcialidade) contam com certas garantias constitucionais: a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de vencimentos. A primeira se da ao fato de, a principio o juiz só poder perder o cargo através de decisão judiciária (art. 93 constituição federal). Na emenda constitucional nº 7, de abril de 1997, e na Lei orgânica da magistratura nº 35, de 14.03.1997 se encontram algumas limitações a essa garantia. A segunda corresponde a não remoção do juiz da sua sede de atividade, nem mesmo a obrigação de aceitar promoção que implique na sua transferência, salvo se for por interesse público ou pelo voto de dois terços dos membros de seu tribunal. A terceira diz respeito a não redução dos seus vencimentos, do seu salário. Como explica Cavalieri:

Tal como a vitaliciedade, a inamovibilidade destina-se a garantir o exercício da função de julgar. Ás vezes a transferência de uma cidade para a outra, ou da capital para o interior, significa castigo tão violento quanto uma demissão. O juiz, normalmente, começa a sua carreira nas pequenas e longínquas comarcas do interior, e passa anos e anos até chegar as comarcas de entrâncias mais elevadas ou á capital. Se fosse possível pressiona-lo com uma transferência compulsória para que viesse a julgar dessa ou daquela forma, ou premiar outra com a remoção para um lugar melhor como meio de obter uma decisão favorável, acabariam a segurança, a tranqüilidade e a imparcialidade do magistrado, com fatais seqüelas a sociedade. A justiça passaria a ser uma barganha de lugares, sempre ocupando os melhores e mais elevados postos os que mais tiverem dispostos a fazer tudo o que o patrão ordenar (e não a lei) (...) a irredutibilidade tem como objetivo não sujeita-los a qualquer pressão econômica, uma das formas mais eficazes de tirar a segurança e independência de quem quer que seja. (2006, pp. 167-168)

E para evitar a entrada de juizes jovens sem experiência em cargo tão importante a ser exercido é cobrado a partir da Lei Complementar nº 35, de 14.03.1979, habilitação em cursos oficiais de preparação para a magistratura. Apesar de terem muitos deveres a serem cumpridos, vale ressaltar ainda a não existência de um código de ética o qual os magistrados devam seguir, contando-se com a noção de moralidade implícita, a imparcialidade requerida e demais expectativas implícitas ao exercício jurisdicional do magistrado.
A partir dessas informações é possível identificar os benefícios da seleção de juízes pelo concurso público de provas e títulos; neste se garante a democracia através da não identificação do candidato na primeira etapa, logo não se da margem à pessoalização e ao patrimonialismo dos quais as pessoas obtém vantagens, se garante também a escolha apenas dos melhores, a partir de um processo seletivo lento e rigoroso. Com o quinto constitucional, como já observado acima, se garante o ingresso de pessoas de notoriedade e idoneidade comprovadas no decorrer de suas atuações na carreira jurídica, proporcionando o enriquecimento dos debates com a formulação de jurisprudência nos tribunais.

2. A interpretação do juiz como criação do direito

Apesar de ser elencado o melhor método atualmente para a seleção dos juízes, pois como explanado acima faz jus a resolução de todas as dificuldades existentes para a devida atuação dos magistrados, no concurso público são encontradas imperfeições. É comum se deparar com a total credibilidade e endeusamento da figura do juiz que possui prestigiado cargo, e por ter chegado a ocupar tal lugar, sem duvida se acredita que trata-se de pessoa de competência reconhecida, atestada ainda pelo processo de seleção, como expressa o comentário de Cavalieri:
[...] O sistema do concurso público apresenta ainda a vantagem de assegurar ao magistrado a necessária independência para julgar. Não tendo a sua nomeação dependido do prestígio ou influência de quem quer que seja, mas sim da sua própria capacidade, inteligência e esforço, não deve favores a ninguém, podendo decidir os conflitos de interesse que lhe vierem as mãos com total imparcialidade. Ninguém tem nada a lhe cobrar, mas muito a admirar, respeitar e confiar, em face da cultura que revelou possuir a ser aprovado em rigoroso concurso seletivo.(2006, p.153)

Partindo de uma análise sobre o comentário de Cavalieri, verifica-se que o Juiz deve sim ser cobrado pela população, pois este é um funcionário do Estado, e o Estado pertence a todos que nele vivem, é de se lembrar também que é da população que os juízes recebem o seu salário, este apenas são intermediados nos cofres do Estado. Reitera-se que o juiz deve ter as suas decisões acompanhadas, deve ser cobrado, pois se este fez o concurso, passou e escolheu exercer tal profissão, submeteu-se a ser funcionário do Estado, e cumprir o seu dever de solucionar lides e perpetuar a justiça. Vale ainda ressaltar a fragilidade e ingenuidade da crença em uma imparcialidade, quando a seguir menciona-se que o juiz é criador inevitável do direito ao interpretá-lo.
Faz-se menção a clássica expressão sobre a atividade do juiz ? legitimado a interpretação das normas - como "somente a boca da lei". Temos a lei como objeto passível de interpretação como qualquer outro objeto, e o juiz como qualquer outro interprete. Assim como observamos na metáfora da Vênus de Milo, comentada por Eros Grau, se for pedido a três pessoas que façam uma cópia de tal estatua, mesmo se tratando de como cópia, teremos como resultado 3 estatuas diferentes nos detalhes, mas "dentro da moldura", ou seja, com a essência do que foi pedido. (2006, sem p., parte II)
Observamos que tanto os conhecimentos, tendência e ideologias da pessoa que interpreta, tanto quanto o momento em que se encontra, acabam influenciando fortemente na sua interpretação, assim uma pessoa pode ler o mesmo texto em dois momentos diferentes da sua vida e ter duas interpretações diferentes, como duas pessoas podem ter interpretações diferentes sobre um mesmo texto lido no mesmo momento por ambas. Quebra-se a falsa idéia de transparência do objeto e objetividade do sujeito. Assim como qualquer obra e pessoa a ser interpretada e interpretar, a lei e o juiz, não estão livres de parcialidade.
Como traz Lenio Streck ; "compreender não é um modo de conhecer, mas um modo de ser". (2008, p.99) Com isso o juiz também faz parte da criação do direito, ao interpretar a norma para aplicá-la. Denota-se a fragilidade do já citado bordão; "o juiz é somente a boca da lei". A respeito da interpretação construtiva realizada pelo juiz coloca Eros Grau o seguinte:

[...] o fato é que praticamos sua interpretação não ? ou não apenas ? por que a linguagem jurídica seja ambígua e imprecisa, mas porque interpretação e aplicação do direito são uma só operação, de modo que interpretamos para aplicação do direito e , ao fazê-lo, não nos limitamos a interpretar (= compreender) os textos normativos, mas também compreendemos (=interpretamos) os fatos.(2006, sem p., parte II)

Por esta conexão entre interpretar e aplicar como uma mesma fase, é que se arma ruptura á concepção que o objeto de interpretação e o sujeito são duas coisas altamente distintas, quando na verdade o sujeito acaba determinando, criando a visão do objeto.
A atividade do juiz já delatada também como parte da criação do direito, é legitimada para tanto, (criação da jurisdição) a partir dos fundamentos democráticos da constituição. Podemos simplificar em termos históricos a importância e fundamentação da mesma através de Thomas Hobbes e Rousseau em contrato social e "natural". É em face da segurança, convivência e tranquilidade social, evitando assim a anarquia e guerra de todos contra todos, que se "simula" um contrato social. Neste as pessoas passam ao poder do Estado o direito de uso de coerção e coação. O estado irá regular a sociedade para assegurar a sua coexistência. Temos o juiz como autoridade detentora de tais poderes, que deve trabalhar para efetiva proteção dos objetivos da constituição.
Gilmar Ferreira Mendes coloca que; "se o Estado é a forma por excelência de manifestação do poder político, e a Constituição, o seu estatuto fundamental, então onde quer que se institucionalizem relações de mando, alguém terá de arbitrar os invitais conflitos entre os fatores reais de poder." (2007, p.124)
Portanto é em prol do funcionamento do Estado de direito e sua Constituição, no que concerne a definição e aplicação do direito realizada pelo magistrado, que se analisa a importância da formação humanística do mesmo.

3. Patologias na Magistratura

O nosso sistema de escolha de magistrados é o que Cappelletti chama de magistratura de carreira: "Magistratura de carreira significa, efetivamente, tornar-se juiz em idade juvenil, sendo a seleção baseada não numa experiência de vida ? uma experiência coroada pelo sucesso na advocacia e na sociedade -, mas antes em exames e competições largamente fortuitos." (1989, p.78).
A maioria das Patologias comentadas neste artigo, ocorre pelo fato de Juízes noviços adentrarem na Magistratura sem qualquer experiência. Como exemplo pode-se citar um Juiz de 26 anos que não é casado, não tem filhos e deve decidir casos que envolvem divórcio, pensão alimentícia, guarda dos filhos, etc. É preciso que o operador do direito, além de uma boa formação acadêmica, tenha uma boa formação ética, moral, e novamente, uma experiência de vida. Por isso Francisco Araújo comenta que o mínimo de idade que um Juiz deveria ter para exercer tal carreira, é de trinta e cinco anos. Para se candidatar a senador, exige-se que o candidato tenha no mínimo trinta e cinco anos. Por que não, então, o Juiz não poderia ter também um mínimo de idade para exercer tal carreira? O juiz é tão importante quanto o senador. Sobre o assunto Francisco Araújo opina da seguinte forma:

Sou de opinião que para ser juiz deveria se ter pelo menos cinco anos de comprovado exercício da advocacia, em todas as áreas, porque em comarcas menores não existem nem mesmo juntas trabalhistas, e o juiz tem de julgar até questões dessa natureza, (...) a idade mínima para ser juiz deveria ser 35 anos.(1995, p.215)


Sobre o quinto Constitucional tratado no primeiro tópico, deve-se lembrar que a maioria dos Juizes que são admitidos diretamente nos tribunais, não se encontram nos mesmos por questões de méritos, mas sim por questões meramente políticas, o que não é orgulho nenhum para o Brasil.
Há também uma dúvida constante sobre a idoneidade dos Concursos Públicos, pois não raro, por meio da imprensa, ouve-se falar em fraudes que possibilitam a entrada de pessoas no concurso por meios ilícitos. É o famoso nepotismo, no qual parentes são nomeados para exercerem cargos importantes. Não é apenas nos concursos públicos que existem protegidos, mas também ao longo da carreira. São aqueles que não cumprem seus deveres, nada lhes acontecendo, ganhando as melhores varas e comarcas, assumindo diretorias de fórum em vez de colegas mais capacitados, etc.
Alguns defeitos dos Juizes serão mencionado de acordo com o livro Da conduta do Juiz de Sidnei Agostinho Beneti. Tais defeitos são: Trato pessoal agressivo, Descortesia, Displicência no ouvir e no atender, Desrespeito a prerrogativas profissionais, Falta de educação, Recusa de atendimento, Deboche, Desregramento familiar, Amizades de comportamento duvidoso, Abuso de bebida alcoólica, Informalidade excessiva, Conduta pessoal desregrada, Indumentária inadequada no trabalho ou fora dele, Linguagem inadequada na sala de audiências, Linguagem inadequada nos autos, Residência fora da Comarca (Um dos defeitos mais sérios), Ausência da Comarca,Impontualidade de audiências, Atraso no serviço, Descontrole pessoal em atividade desportivas em geral, Freqüências a locais de desregramento de costumes, Incontinência libertina, Descontrole Financeiro,Ataque crítico a decisões de Tribunais ou outros Juízes, Permeabilidade a influências, Temor diante da pressão da mídia, Devassamento de segredo de ofício, Submissão ao poder de ocupantes de cargos políticos, Hostilização, Preconceitos, Ironia, Mau tratamento ou falta de consideração para com os funcionários, Formalismo excessivo, Reduzida produção Jurisdicional, Designação de audiências para datas extremamente distantes, Recebimento de dádivas, Realização de favores jurisdicionais.(1997, p.173-177)
No mesmo livro Beneti cita os pecados capitais do Juiz, que praticamente são os defeitos citados acima, apenas simplificados. São estes: A improbidade, o medo, a indecisão, a vaidade, a prepotência, a subserviência, o formalismo, a vulgaridade, o obscurantismo, o novidadismo, a lentidão, a preguiça e a ignorância. (ibidem, p.225)
Por conta de alguns desses defeitos, pecados capitais, ou patologias algumas vezes ouvem-se falar por meio da mídia, que algum Juiz foi acusado por algo ilícito. Exemplo disso foram dois casos bastante repercutidos:

[...] Quando os principais suspeitos são membros da Magistratura, a Justiça no Brasil costuma falhar. Em dezembro de 2001, foragido da Justiça havia sete meses e treze dias, o juiz Nicolau dos Santos Neto, o Lalau, entregou-se e foi preso como único personagem punido pelo escândalo do desvio de recursos da construção do Fórum trabalhista de São Paulo. Num país em que Juízes rarament são julgados, a imprensa destacou aquela prisão solitária, mas não atentou para os expedientes judiciais que livraram da condenação os cúmplices de Lalau. Três anos depois, o juiz federal João Carlosda Rocha Matos foi preso preventivamente, acusado de ser o mentor de uma quadrilha que negociava sentenças judiciais [..](VASCONCELOS, 2005. pp.09)

4. Formação Humanística para o Exercício da Magistratura

Apesar de todos os meios propiciados ao juiz para o exercício da sua função, como foi visto acima, se encontram patologias em sua conduta, que são determinadas através da falta de certos requisitos morais, éticos, entre outros, que podem ser construídos através de matérias interdisciplinares e que no caso não são tão levadas em conta na hora da seleção dos magistrados. Comenta-se acerca do processo de seleção dos magistrados:

Os concursos públicos produziram entre nós um judiciário digno e têm prestado serviços inestimável á causa da justiça. Continuam a representar a alternativa mais adequada de recrutamento, a conciliares vertentes democrática e aristocráticas. Mas é o momento de se substituir sua metodologia para a inserção de critérios mais consistentes de seleção, priorizando-se os aspectos éticos e vocacionais, até mesmo em detrimento do apuro técnico, sabido que uma pessoa destinada a julgar seu semelhante se auto-motivará ao estudo permanente, enquanto o intelectual aético nunca será um verdadeiro juiz. (TEXEIRA, 1999, p. 92)

Ao interpretar a norma o que pesa na sua interpretação não é só o lado técnico, como também as sua perspectivas, esperasse então participar da formação dessas perspectivas. Mas no Concurso Público não se avalia esse tipo de concepção. Em uma entrevista concedida á revista Visão Jurídica, José Renato Nalini fala sobre dois tipos de juizes; o técnico voltado para o conhecimento exato das leis, e o ético, que constrói uma ética pessoal:

O ser humano que leva consigo uma preocupação ética vai estudar necessariamente, para não agir com ingenuidade. Senão, pode tomar decisões levianas, temerárias. Quem só conhece a lei, mas não tem ética, pode se fazer valer só do conhecimento para praticar a injustiça. Até papagaio sabe decorar, mas não significa que ele possa ser um bom juiz. (2007 pp.11)


Através do presente teste de seleção dos magistrados, se destaca aquele que na primeira etapa teve uma capacidade maior de armazenamento de dados, não necessariamente aquele que vá desempenhar melhor o papel de juiz. Como comenta Maria Luiza Pinto Lima:


A visão fragmentada da realidade repercute na atuação do juiz, pois o seu saber também é fragmentado, dissociado de outras disciplinas, que não o Direito, tão necessárias á formação integral que o juiz precisa para melhor distribuir a justiça. É chamada transdisciplinaridade, que envolve a arte, a filosofia, a historia, a economia, a política, a ética, a sociologia, a psicologia.( 2003. pp. 70)


A fragmentação do conhecimento para uma forma mais pratica e eficiente de produção, exercida atualmente, limita a esfera do saber, ter noção das conseqüências sociais que vão além do simples enquadramento do caso ao texto legal, se aplicando uma norma, ter idéia da repercussão para alem da letra abstrata do ordenamento jurídico.
Afinal ser juiz é trabalhar com a vida de outras pessoas, é trabalhar para outras pessoas (para todos nos), pois decidindo se tem o propósito de alcançar a justiça para a serenidade de toda a sociedade. O juiz é um ser humano, e como ser humano esta a mercê de cometer falhas, o que se espera no mínimo, então é a utilização da sua condição humana de um jeito que se sobressaia a sua sensibilidade, com maior aproximação das pessoas e não o declínio primeiro das suas fraquezas em relação as patologias, e sim uma resistência a elas através de uma boa formação desse juiz que irá exercer tal controle sobre a vida das pessoas e no andamento da sociedade, uma formação que lhe instrua devidamente.
Um juiz sem um pingo de vocação no que faz, ou sem o mínimo de sensibilidade para com o próximo, não irá se empenhar o suficiente para a interpretação da norma de uma forma mais eqüitativa. Por isso Eustáquio Nunes Silveira defende uma maneira diferente de se selecionar a magistratura:

Que o concurso público para ingresso na magistratura seja constituído por duas etapas eliminatórias. Na primeira, seriam aplicadas as provas de conhecimentos teóricos, na segunda seriam ministrado o curso de preparação ao longo do qual não só os candidatos seriam treinados para o exercício da função, assim como avaliados, psicológica e moralmente, inclusive no tocante da sua vocação. O conteúdo programático do curso seria voltado menos para o ensino do Direito ? pois esse conhecimento os candidatos aprovados na primeira fase do concurso já teriam mostrado possuir ? e mais para a ética, a hermenêutica, o inter-relacionamento pessoal, o raciocínio lógico, a arte da liderança, a administração de pessoas e coisas, bem como para os ensinamentos práticos de como conduzir uma audiência e solucionar seus incidentes, [...] também não seria desprezada a discussão de temas econômicos, políticos e sociais. Enfim, o objetivo é dar uma formação holística ao futuro magistrado, pois o exercício da judicatura além do preparo intelectual exige experiência do mundo e das pessoas, equilíbrio, serenidade, perspicácia, agudeza de espírito [...] para que os autoritários, vaidosos, orgulhosos, paranóicos, megalomaníacos e outros doentes não se aproveitem de seu cargo para atuar perniciosamente. (2002, p. p. 114-116 )


Considerações finais:

Ultrapassa-se o sonho da imparcialidade no exercício de interpretação e aplicação da lei pelos magistrados, contudo, a partir de tal noção, ressalta-se o fortalecimento da humanidade do juiz e da sua formação social para o bom funcionamento do judiciário e o alcance da equidade e defesa dos direitos humanos e garantias sociais. É importante desmitificar a figura do juiz ético, idôneo e competente de natureza, simplesmente por ter chegado a tal posto.
No sistema de seleção de magistrados no Brasil deve ser dada ás matérias de cunho humanístico uma maior ênfase no intuito de só assim se constituir juízes realmente comprometidos para efetivar o proposto ao seu cargo, botando em pratica todos os parâmetros que espera-se que sejam seguidos.
Considera-se um bom juiz aquele que se mostra preocupado com causas sociais, com os menores e com os idosos; aquele que trabalha de portas abertas mantendo o serviço em ordem, atendendo bem a todos, que é presente e integro, promove o acesso a justiça, dentre outros.




REFERÊNCIAS


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BENETI, Sidnei Agostinho. Da conduta do juiz. São Paulo: Saraiva, 1997.

CAPPELLETTI, Mauro. Juízes Irresponsáveis? Trad. Carlos Alberto de Oliveira. Porto Alegre: Fabris, 1989.

_____. Juízes Legisladores? Trad. Carlos Alberto de Oliveira. Porto Alegre: Fabris, 1999.

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Sociologia Jurídica. 11ª ed. Rio de Janeiro: FORENSE, 2006.

GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretação/ aplicação do direito. 2ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

LIMA, Maria Luiza Pinto. Temas Contemporâneos do Direito. São Luiz, Ed. TRT, 2003.

MENDES, Gilmar Ferreira. COELHO, Inocêncio Mártires. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007.

NALINI, José Roberto. Saudável rebeldia de um juiz.In: Visão Jurídica, n 12, São Paulo: ed. Escala, 2007.

SILVEIRA, Eustáquio Nunes. A crise do judiciário e a formação do juiz. RJ. CEJ, Brasília, n.18, p. 114-116, jul./set. 2002.

STRECK, Lenio Luiz. Desconstruindo os modelos de juiz: a hermenêutica jurídica e a superação do esquema sujeito-objeto. In: STRECK, Lenio Luiz. MORAIS, José Luis Bolzan de (Orgs.). Constituição, sistemas sociais e hermenêutica. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2008.

TEXEIRA, Sálvio de Figueiredo.(Org.) O Juiz: Seleção e Formação do Magistrado no Mundo Contemporâneo. Belo Horizonte: DelRey, 1999.

VASCONCELOS, Frederico. Juízes no banco dos réus. São Paulo: Publifolha, 2005.